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CAPÍTULO II Separação de resíduos e reciclagem – da Escola à Sociedade

2.1. Resíduos sólidos

2.1.3. Reciclagem vs Desenvolvimento

Desde o aparecimento da vida humana na Terra até à segunda metade do século XVIII, as quantidades produzidas de lixo eram praticamente insignificantes e passavam essencialmente por resíduos orgânicos, nomeadamente por, restos alimentares, papel, papelão e alguns tecidos. Porém, após a Revolução Industrial, as fábricas desenvolveram-se fortemente, começando a produzir materiais de consumo em massa e novos tipos de embalagens, aumentando, consequentemente, a quantidade e a variedade de resíduos produzidos nas áreas urbanas (Rodrigues & Cavinatto, 1997). Oxinalde & Guerediaga (1999) apresentam uma visão histórica da evolução da produção de resíduos aliada ao forte e crescente consumo, sendo que referem que de tantos nomes com os quais já se baptizou a sociedade, podemos afirmar sem receio que estamos actualmente numa “sociedade de consumo”. Neste sentido, a massiva produção e consumismo provocam inevitavelmente toneladas e toneladas de resíduos cuja eliminação cria fortes dores de cabeça aos responsáveis pela gestão dos resíduos.

Hoje, a recolha de resíduos para tratamento e reciclagem abrangem realidades completamente distintas entre os países subdesenvolvidos nomeadamente na África, os países em desenvolvimento na América Latina, Europa de Leste ou na Ásia e os países industrializados da Europa Ocidental e da América do Norte. Rodrigues & Cavinatto (1997) indicam que nos países desenvolvidos como os EUA, o Japão e alguns países da Europa, a reciclagem teve início na década de 1950. Por outro lado, em países menos desenvolvidos, como por exemplo o caso do Brasil, o processo de reciclagem só surgiu na década de 1980. Assim, e segundo os referidos autores, verifica-se uma relação directa entre os níveis de industrialização de uma cidade e a sua produção de resíduos, sendo que quanto mais desenvolvida for a cidade, mais elevado será o seu consumo de produtos e, consequentemente, maior será a quantidade e diversidade de resíduos produzidos.

Na Europa Ocidental, Japão e na América do Norte o lixo é visto como um problema ambiental a minimizar e procura-se que o cidadão comum faça a separação de

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resíduos em casa e posteriormente os deposite nos receptáculos estrategicamente colocados em zonas residenciais e comerciais. Dessa forma, as empresas especializadas ou os municípios podem fazer a recolha e posterior encaminhamento para unidades industriais de tratamento, de transformação e reaproveitamento ou de reciclagem, minimizando assim custos de recolha e problemas ambientais verificados em países da América Latina da Europa de Leste ou da Ásia.

Em países em desenvolvimento como Brasil, México, Rússia, Índia, Tailândia ou China, com uma densidade populacional tão elevada e uma indústria bastante desenvolvida que tem como objectivo principal elevar os níveis de produção, melhorar a qualidade dos seus produtos e reduzir custos para ser competitiva no mercado, as questões ambientais como a recolha de resíduos e sua separação para tratamento são postas em segundo plano, em prol do desenvolvimento. Mas para as indústrias produzirem a grande escala é necessária matéria-prima, que ou escasseia ou tem um preço elevado, o que faz com que as empresas não sejam tão competitivas como o desejado. Também a baixa qualificação profissional e nível de escolaridade vêm acentuar assimetrias entre ricos e pobres e limitar expectativas e oportunidades aos mais desfavorecidos.

Mas a grande quantidade de desempregados, onde se incluem mulheres, negros, idosos e deficientes físicos, dado serem os mais afectados pela restrição de oportunidades, procuram uma ocupação ou trabalho precário dentro do imenso espaço urbano ou na sua periferia que lhes possa dar algum sustento e a recolha de resíduos é uma dessas ocupações (Ferreira, 2005).

Papel e cartão, alumínio, vidro e garrafas de plástico são alguns dos resíduos recolhidos pelos catadores para posterior venda a empresas de reciclagem ou transformação de resíduos.

Numa sociedade onde o simples gesto quotidiano de separar os resíduos não está ainda enraizado na população, talvez pelo desconhecimento dos seus benefícios, ou como referimos atrás, por não ser uma prioridade ou por falta de consciencialização, o papel dos catadores acaba por ser bastante significativo para a sociedade onde estão inseridos, visto que além de fazerem a recolha de resíduos que demorariam anos e séculos a serem degradados e que contaminariam os diversos ecossistemas, ainda asseguram matéria-prima mais barata para as indústrias, poupando energia e a exploração de recursos naturais, factores não menos importantes na conservação do meio ambiente (Rodrigues & Cavinatto, 1997).

27 Como podemos ver, os danos causados ao ambiente bem como os períodos de decomposição dos resíduos variam consideravelmente, dependendo do tipo de resíduos. Não seria, por isso, coerente pedir, ou exigir a um país subdesenvolvido da África ou da Ásia, que tivesse as mesmas preocupações ambientais que um país industrializado ou em vias de desenvolvimento, quando a produção e os tipos de resíduos não são sequer equiparáveis e quando a preocupação desses países deve ser a de proporcionar as condições mínimas de sobrevivência à sua população.

Assim, parece-nos mais lógico e sensato que os países mais desenvolvidos apostem ainda mais e mais na reciclagem como forma de poupar os recursos naturais ainda disponíveis e de reutilizar e dar um destino diferente às quantidades industriais de resíduos que produzem. Por sua vez, os subdesenvolvidos ou em vias de desenvolvimento devem também ter em consideração estes factores, embora possam estar mais ocupados com a sua sobrevivência ou forma de ascensão e desenvolvimento, tentando, preferencialmente, desenvolver-se sem pôr em risco a Natureza da forma que os países desenvolvidos já perderam a vergonha e a timidez de o fazerem.

No caso particular do país onde realizámos o nosso estudo, Espanha, não se verificam estas situações extremas uma vez que é, indubitavelmente, considerado um país desenvolvido. Ainda que se verifiquem situações de pobreza extrema e a presença de uma fatia de população que pertence à classe social mais desfavorecida, o próprio país já promove um processo de gestão de recolha e tratamento dos resíduos suficientemente eficaz para que não possam verificar-se situações como as anteriormente mencionadas.

É também sabido que os benefícios da separação dos resíduos para reciclagem passam por campos mais diferenciados do que somente o ambiental. Aqui, o campo económico está também patente, de forma positiva ou não, no sentido em que os resíduos produzidos são recolhidos para posterior triagem nas centrais de reciclagem por parte de trabalhadores cuja sobrevivência depende fortemente deste trabalho, tal como no caso dos catadores de lixo. Significa isto que para quem vive e trabalha tanto na recolha como na separação dos lixos esta prática doméstica é fundamental para que possam prosseguir com o seu emprego. Para além destes, também ganham, obviamente, os gestores destes centros de reciclagem cujos lucros principais provêm da venda dos materiais a serem reaproveitados ou dos novos materiais já reciclados (Rodrigues & Cavinatto, 1997).

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Assim sendo, a reciclagem beneficia a economia e a sociedade, uma vez que reduz a poluição, melhora as condições de limpeza da cidade, gera emprego, promove a produção de produtos com materiais reutilizados ou matérias-primas recicláveis e valoriza a consciência ecológica. Desta feita, parece-nos legítimo defender que todos os cidadãos devem participar activamente no dinamismo da reciclagem (pelo menos doméstica), procedendo à separação dos resíduos que produzem para posteriormente serem reciclados. Importa também que esta prática não se resuma apenas aos resíduos mais imediatos e comuns mas também aos que podem igualmente ser reciclados, como por exemplo como os óleos usados, os electrodomésticos, as baterias, as pilhas, entre outros.