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3. Reconhecimento e Campanha de 1907

3.2. Reconhecimento dos Dembos

O ano de 1907 foi de grande regozijo para os portugueses, por causa da campanha do Cuamato, mas também pela campanha dos Dembos, liderada pelo Capitão João de Almeida. Havia vontade para alterar o estado de paragem no tempo que a província sofria. Para começar a impor a autoridade no território Angolano, além do litoral, o Governador da província, proibiu a venda de armas raiadas ou estriadas. Estas armas tinham maior alcance e precisão que as de cano liso.

“Portaria Nº67,

Tomando em consideração o parecer da commissão nomeada em portaria provincial de 23 de julho de 1906, ácerca da definição de typos de arma de commercio com o gentio, e a informação conforme do administrador do circulo aduaneiro, datada de 5 de novembro de 1906:

Hei por conveniente determinar o seguinte:

1º Que seja anullada a portaria provincial nº515, de 16 de agosto de 1905;

2º Que o typo de armado commercio para gentio, definido pelo regulamento de 13 de setembro de 1899 é o da espingarda «de arma lisa, de pederneira ou percussão,

3º Que em vista das disposições legais sobre o assumpto nenhuma arma raiada, como as do modelo U.S., poderá ser considerada como arma de commercio, por mais fraco que seja o seu valor guerreiro.

As auctoridades e mais pessoas a quem o conhecimento d’este competir, assim o tenham entendido e cumpram.

Palacio do governo em Loanda, 30 de janeiro de1907.

Eduardo Augusto Ferreira da Costa, Governador-geral:” (GGPA, 1907a, p.56).

A nomeação de João de Almeida para reconhecer a região dos Dembos surgiu de um desentendimento. Vejamos, Eduardo da Costa, o Governador-geral de Angola, destitui o Capitão João de Almeida do cargo de Chefe de Estado-maior interino da província e o motivo, segundo ele foi insubordinação. Em Setembro de 1906, João de Almeida, pretendia continuar as operações e telegrafou do Humbe ao Rei D Carlos I, pedindo autorização, de marchar sobre o Cuamato, a partir do forte Roçadas. Este telegrama foi interceptado pelo Governador-geral e nunca chegou ao seu destino. Esta atitude ia contra a decisão de Eduardo da Costa, que pretendia, protagonizar a honra de organizar e comandar uma grande coluna branca, destinada a acabar com os Ovambos, a de 1907 (Galvão, 1934).

Este episódio explica-se como um choque de egos. Ambos os intervenientes pretendiam protagonismo e João de Almeida estava ansioso por alterar o estado apático em que vivia a colónia. Eduardo Costa estava sedento de protagonismo que só poderia ser obtido com colunas constituídas por soldados Europeus que poderiam depois receber os louros no terreiro do paço.

Pélissier, considera que João de Almeida, é anti-ancilose, anti-rotina que possui uma vontade férrea de recuperar o tempo perdido e contrariar a apatia23 que se instalara. Pensamos que João de Almeida, pela carreira militar que desenvolveu faz parte de uma pequena elite que soube honrar a instituição militar e ajudou a consolidar os interesses de Portugal naquela época.

No início de 1907, Eduardo da Costa, numa atitude aparentemente de vingança, impõe a João de Almeida, ou que regressa à metrópole destituído do seu cargo ou parte em reconhecimento em redor dos Dembos. Bolsa insubmissa desde 1872, às portas de Luanda, enviado na estação das chuvas, para uma zona esquecida, hostil, insalubre, esta missão de espionagem atribuída, equivale a uma condenação à morte que esteve quase a acontecer. Quis o destino que sobrevivesse e entretanto, foi nomeado novo Governador-geral, Paiva Couceiro, por falecimento do anterior. Tudo mudou, para João de Almeida (Galvão, 1934).

A guerra em África era feita ao sabor das personalidades que detinham o poder, não havendo um plano, nem um rumo mas sim impulsos, que traziam ao de cima os interesses pessoais dos actores. Assim se entende o que se passou entre Eduardo Costa e João de Almeida (Pélissier, 1997a).

“ Eduardo Costa, oficial dos mais distintos e colonial de grande folego, tinha um grande

defeito, o ódio e a vingança que criava contra aqueles que feriam a sua externa vaidade.”

(Weimar et al, 1927, p.26).

Durante o reconhecimento levado a cabo pelo Capitão João de Almeida, importa salientar alguns episódios como a sua captura e o improviso da fuga.

“ Os sobas e captores querem que o soba os julgue imediatamente, mas ele, com o seu espirito de justiça de cafre, bem superior á de muitos europeus, diz que só pode fazer em conselho de macotas, que manda convocar. J.A. e a sua ordenança vêm diante de si mais algumas horas de vida e portanto probabilidades de salvação.

...era o rio Lombige, era a salvação. Para ele se dirigem.” (Weimar et al, 1927, p.31).

Na parte final do reconhecimento, o companheiro de viagem do Capitão João de Almeida era a sua ordenança, Manuel Morgado. Estavam sózinhos:

“...,descahindo com a corrente, uma saraivada de zagalotes fazia saltar a agua em grosass borbulhas; fôra a salvação, pois o ruido das balas fizera afuguentar os crocodilos e os dois fugitivos puderam alcançar a margem esquerda,...” (Weimar et al,

1927, p.31).

23

Diria mesmo que alguns oficiais estariam cafrealizados. Cafre, zona sul do continente africano habitado por indivíduos indolentes.

Este episódio de fuga, mostra as dificuldades passadas por João de Almeida logo no reconhecimento.

Paiva Couceiro, mal tomou posse do cargo de governador começou de imediato a agir. Aprovou o regulamento provisório para a cobrança do imposto de cubata:

“Portaria Nº414

Tendo o decreto de 13 de Setembro de 1906 criado na provincia de Angola um imposto sobre todas as casas habitadas por indígenas e denominadas cubatas; sendo necessário regular a cobrança d’esse imposto; attendendo ás raports do governo e comformando- se com o seu parecer;

Hei por conveniente, nos termos do artigo 8º d’aquelle decreto, approvar o regulamento provisório para cobrança do imposto de cubata, que baixa assignado pelo secretario geral interino. (…)

Palácio do governo em Loanda, 30 de Julho de 1907. Henrique Paiva Couceiro, Governador-geral interino.

Regulamento provisório para a cobrança do imposto de cubata

Art 1º Ao Governador-geral, por intermédio dos governadores dos districtos, pertence a superintendência sobre todos os serviços relativos ao imposto de cubata.

Art 2º Os Chefes de concelho, capitães – mores, administradores de circunscripções, residentes e seus delegados, e commandantes militares são os arroladores e fiscaes da cobrança do imposto de cubata nas respectivas areas.

& 1ºA cobrança do imposto será applicada gradualmente em cada área administrativa, começando por aquelles povos a quem antecipadamente se reconheçam os necessários requisitos de riqueza e de submissão (…) (GGPA, 1907d, p.332).

A portaria acima transcrita conhecida como imposto da cubata, mostra até que ponto, Paiva Couceiro era pragmático. Afirma que a portaria só é aplicável aos povos que apresentem riqueza e estejam submissos, o que não era o caso da região dos Dembos.

Pela portaria provincial nº485, (ver GGPA, 1907e, p.386), Henrique Paiva Couceiro, Governador-geral interino, estabelece a proibição total do comércio de pólvora e armas na província e além disso aplica taxas ao uso e porte de arma.

”Determina que seja de 400 réis o sello de licença para o uso e porte de arma de commercio (regulamento 13-9-99) e de 100 réis o emolumento que expede a mesma licença” (GGPA, 1907j, p.547).