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CAPÍTULO 3 - A PRESERVAÇÃO DA EMPRESA NA LEI DE RECUPERAÇÃO

3.3 Noções gerais sobre os institutos recuperatórios na Lei de Recuperação de Empresar e de

3.3.2 A recuperação judicial

isto é, a empresa propriamente dita, e não o empresário, seja pessoa física, seja pessoa jurídica. Finalmente, devemos levar em consideração que o princípio da preservação da empresa não pode ser aplicado indistintamente, eis que há a necessidade de se apurar a viabilidade do empreendimento em crise. Constatada a viabilidade, deve-se preservar a empresa; caso o contrário, deve-se instaurar a falência.

3.3 Noções gerais sobre os institutos recuperatórios na Lei de Recuperação

A recuperação judicial propende a viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do empresário ou sociedade empresária, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, desse modo, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica, tal qual estabelece o art. 47 da lei recentemente editada.

Fazzio Júnior (2005, p. 125), por seu turno, nos lega magistério complementar:

A recuperação judicial não se restringe à satisfação dos credores nem ao mero saneamento da crise econômico-financeira em que se encontra a empresa destinatária. Alimenta a pretensão de conservar a fonte produtora e resguardar o emprego, ensejando a realização da função social da empresa, que, afinal de contas, é mandamento constitucional.

Por oposição ao caráter liquidatório da falência e, até mesmo, como prevenção desse remédio extremo, a recuperação judicial é uma tentativa de solução construtiva para a crise econômico-financeira do agente econômico.

A concessão da recuperação judicial ao devedor empresário, seja pessoa física, isto é, empresário individual, seja pessoa jurídica, ou seja, sociedade empresária, exige o preenchimento de determinados requisitos estipulados pelo legislador no art. 48 da Lei de Recuperação de Empresas e de Falências. Com efeito, prevê o art. 48 da Lei de Recuperação de Empresas e de Falências os seguintes requisitos para a concessão da recuperação judicial, a saber:

Art. 48. Poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas atividades há mais de 2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos, cumulativamente:

I - não ser falido e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes;

II - não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial;

III - não ter, há menos de 8 (oito) anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial de que trata a Seção V deste Capítulo;

IV - não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos nesta Lei.

Parágrafo único. A recuperação judicial também poderá ser requerida pelo cônjuge sobrevivente, herdeiros do devedor, inventariante ou sócio remanescente. (BRASIL, 2012).

Cumpre ressaltar, todavia, que estão excluídas da possibilidade de obtenção de recuperação judicial as seguintes sociedades empresárias, consoante o magistério de Coelho (2005a, p. 124):

As sociedades em comum, de economia mista, cooperativa ou simples não podem pleitear a recuperação judicial exatamente porque nunca podem ter a falência decretada. Nesse contexto, estão também excluídas do benefício, por razões ligadas à regulação econômica, as instituições financeiras, integrantes do sistema de distribuição de títulos ou valores mobiliários no mercado de capitais, corretoras de câmbio (Lei n° 6.024/74, art. 53), seguradoras (Dec. Lei n° 73/66, art. 26) e as operadoras de planos privados de assistência à saúde (Lei n° 7.565/86, art. 187). Também convém lembrar a entidade de previdência complementar, a sociedade de capitalização e outras equiparadas (art. 2°, II).

Pelo art. 49, caput, da Lei de Recuperação de Empresas e de Falências estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos.

Por conseguinte, os credores cujos créditos se constituírem depois de o devedor ter ingressado em juízo com o pedido de recuperação judicial estão absolutamente excluídos dos efeitos deste (COELHO, 2005a).

Certos créditos, no entanto, não se sujeitam à recuperação judicial, segundo o ensinamento de Coelho (2005, p. 131-132):

Também estão excluídos dos efeitos da recuperação judicial o fiduciário, o arrendador mercantil ou o negociante de imóvel (como vendedor, compromitente vendedor ou titular de reserva de domínio) se houver cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade no contrato.

Igualmente, os bancos credores por adiantamento aos exportadores (ACC) não se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial.

Esses credores excluídos dos efeitos da recuperação judicial não são minimamente atingidos pela medida, e podem continuar exercendo seus direitos reais e contratuais nos termos da lei própria.

Finalmente, o legislador arrola no art. 50 da Lei de Recuperação de Empresas e de Falências os meios de recuperação judicial. Trata-se, sem dúvida, de um elenco extremamente generoso (FAZZIO JÚNIOR, 2005), eis que se encontra distribuído em dezesseis incisos.

Com efeito, prevê o art. 50 da Lei de Recuperação de Empresas e de Falências os seguintes meios de recuperação judicial:

Art. 50. Constituem meios de recuperação judicial, observada a legislação pertinente a cada caso, dentre outros:

I - concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas;

II - cisão, incorporação, fusão ou transformação de sociedade, constituição de subsidiária integral, ou cessão de cotas ou ações, respeitados os direitos dos sócios, nos termos da legislação vigente;

III - alteração do controle societário;

IV - substituição total ou parcial dos administradores do devedor ou modificação de seus órgãos administrativos;

V - concessão aos credores de direito de eleição em separado de administradores e de poder de veto em relação às matérias que o plano especificar;

VI - aumento de capital social;

VII - trespasse ou arrendamento de estabelecimento, inclusive à sociedade constituída pelos próprios empregados;

VIII - redução salarial, compensação de horários e redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva;

IX - dação em pagamento ou novação de dívidas do passivo, com ou sem constituição de garantia própria ou de terceiro;

X - constituição de sociedade de credores;

XI - venda parcial dos bens;

XII - equalização de encargos financeiros relativos a débitos de qualquer natureza, tendo como termo inicial a data da distribuição do pedido de recuperação judicial, aplicando-se inclusive aos contratos de crédito rural, sem prejuízo do disposto em legislação específica;

XIII - usufruto da empresa;

XIV - administração compartilhada;

XV - emissão de valores mobiliários;

XVI - constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar, em pagamento dos créditos, os ativos do devedor.

[...] (BRASIL, 2012).

Lecionando sobre o dispositivo acima transcrito encontramos o posicionamento de Coelho (2005a, p. 134):

A lei contempla lista exemplificativa dos meios de recuperação da atividade econômica. Nela, encontram-se instrumentos financeiros, administrativos e jurídicos que normalmente são empregados na superação de crises em empresas. O empresário individual ou os administradores da sociedade empresária interessada em pleitear o benefício em juízo devem analisar, junto com o advogado e demais profissionais que os assessoram no caso, se entre os meios indicados há um ou mais que possam mostrar-se eficazes no reerguimento da atividade econômica.

Como se trata de lista exemplificativa, outros meios de recuperação da empresa em crise podem ser examinados e considerados no plano de recuperação. Normalmente, aliás, os planos deverão combinar dois ou mais meios, tendo em vista a complexidade que cerca as recuperações empresariais.

Fazzio Júnior (2005, p. 142), por sua vez, nos proporciona magistério complementar:

[...] a LRE alinha diversos meios de recuperação judicial da empresa.

Embora não o faça com pretensão exaustiva (o que se evidencia pela adoção da expressão 'dentre outros’), o legislador cataloga as opções mais plausíveis.

[...] é bom consignar que as modalidades de recuperação alvitradas não são excludentes umas das outras. A relação entre elas é de interação, na medida em que podem ser combinadas duas ou mais modalidades, conforme o caso e desde que compatíveis.

Aliás, é da própria índole da recuperação judicial que os diversos meios legais sejam fungíveis, de acordo com as peculiaridades do caso.

Vemos, em síntese, que a recuperação judicial tem o seu conceito presente no art. 47 da Lei de Recuperação de Empresas e de Falências. O devedor empresário, seja pessoa física, seja pessoa jurídica, que exerça atividade econômica organizada há mais dois anos, tem a possibilidade de lançar mão da recuperação judicial, desde que cumpridos os requisitos estampados no art. 48 da Lei de Recuperação de Empresas e de Falências. Determinadas sociedades empresárias, no entanto, estão excluídas da possibilidade de obtenção da recuperação judicial. Paralelamente, consoante o art. 49, caput, da Lei de Recuperação de Empresas e de Falências, os créditos existentes ao tempo da impetração do pedido de recuperação judicial estão sujeitos aos seus efeitos, ainda que não vencidos.

Por conseguinte, os créditos constituídos posteriormente ao pedido de recuperação judicial não se subordinam aos seus efeitos. Certos créditos, todavia, não podem estar sujeitos à recuperação judicial. Por derradeiro, o legislador estabelece no art. 50 da Lei de Recuperação de Empresas e de Falências um extenso rol meramente exemplificativo dos meios de recuperação judicial, os quais podem ser combinados entre si, desde que compatíveis, a fim de atender as exigências do caso em concreto. Ainda tratando acerca do pedido de recuperação judicial, precisamente quanto ao art. 51, I da lei de recuperação e falência, cumpre salientar:

A exigência deste inciso tem uma razão muito lógica: é um direito dos credores entenderem o motivo que levou o devedor a estar numa situação de crise econômico financeira. A lei neste item sinaliza que o devedor deve primeiro saber explicar aos seus credores o que o levou a uma situação financeira complicada e por que o pedido de recuperação judicial é a única forma de solucionar tal situação. (JUNIOR, 2012. p. 373.)

É interessante destacar que a ordem lógica disposta pela lei de falência e recuperação é disposta de forma muito distinta e verdadeiramente existe a intensão pressuposta de ajudar aqueles que se encontram em um padrão onde deverão socorrer-se da recuperação, ainda, sobre este aspecto:

Um devedor que detecta o que errou, indubitavelmente, já demonstra um primeiro sinal de recuperação. Ao contrário, um devedor que não sabe explicar os motivos de sua crise jamais poderá solucioná-la, visto que não detectou a causa que deve ser combatida para sua recuperação. (JUNIOR, 2012. p. 373.)

A literatura que trata dos diversos meios de recuperação judicial é vasta, é importante lembrar que o rol é exemplificativo e não taxativo, isto é, o que importa em verdade é o cumprimento do que está pressuposto a lei de recuperação, mais especificamente ao que pressupôs a intenção do legislador quando pensou a redação do artigo 50.

Um exemplo interessante de meio de recuperação encontra-se no inciso VII do artigo 50, que trata a respeito da celebração de contrato de trespasse, arrendamento do estabelecimento e uma derivação desta possibilidade que é a sociedade constituída pelos empregados do devedor, que também pode praticar atos na intenção de recuperar a empresa com a finalidade de obter o pagamento de suas verbas trabalhistas, nesse sentido:

A iniciativa de autorizar a constituição de sociedade formada por empregados do próprio devedor, em recuperação, como meio de recuperação, podendo, ela, celebrar contratos de trespasse ou de arrendamento para a exploração do estabelecimento mercantil é oportuna e atual, se analisada sob a dupla ordem de idéias:

a) no plano institucional – a autorização legal, como meio de recuperação, de constituição de sociedade formada por empregados do devedor instaura, de forma democrática, acirrada disputa entre interessados na celebração de atos de trepasse ou de arrendamento visando a exploração da atividade econômica. Esta alternativa dará oportunidade aos empregados de conhecer a realidade do mundo empresarial, com a exploração da empresa, com a responsabilidade de administrar o destino da pessoa jurídica constituída;

b) no plano obrigacional – a constituição da sociedade formada por empregados do devedor, em recuperação, poderá viabilizar a quitação de direitos decorrentes da relação de trabalho.

Embora o legislador tenha silenciado sobre o tema de quitação de direitos trabalhistas, na hipótese de celebração de atos de trepasse ou de arrendamento com sociedade formada por empregados do próprio devedor, certamente, tal meio não foi inserido na LRF sem o propósito de servir, a um só tempo, como meio de recuperação e quitação de direitos derivados da legislação do trabalho. (GUERRA, 2012).

É interessante a análise que surge diante de tal possibilidade, o legislador teve uma visão muito abrangente e os juristas acompanharam sua intensão, sobretudo quanto aquilo que talvez não foi dito, mas que estava contido na intensão.

A lei de recuperação e falência está recheada de exemplos onde pode-se observar o que há de mais moderno dentro do Direito, isto é, a tentativa de atender ao direito pressuposto, ao grande “iceberg” jurídico que existe sob o mar do direito posto, nesse aspecto é possível compreender o que foi anteriormente pontuado quanto aos elementos contidos na esfera privada que acabam, diante de um novo posicionamento, também atendendo o interesse da coletividade.

Dados estes apontamentos gerais, passa-se a discorrer especificamente sob o que se agrega, isto é, as espécies extrajudicial e recuperação judicial com base no plano para as microempresas e empresas de pequeno porte.