GLOBALIZAÇÃO, SERVIÇOS E O SETOR DE TELECOMUNICAÇÕES
Mapa 4. Cidades com sede de empresas de Contact Center e rede de fibra ótica,
3.3 Rede telemática: fatores de localização e mecanismos de exclusão
A principal atividade que caracteriza os Contact Centers é a transmissão de dados e informações. Ela é realizada por um conjunto de recursos de telecomunicações, que compreende telefonia, satélite e fibra óptica, integrados com elementos da informática, como computadores, softwares e sistemas de redes. A integração entre telefonia e informática permite a obtenção, o tratamento, o armazenamento e a comunicação de grande quantidade de dados (no formato de texto, imagem ou voz), de forma simultânea entre agentes localizados em qualquer ponto do globo.
Tais especificidades técnicas demandadas para o funcionamento de uma central de atendimento, especialmente a necessidade de uma conexão à Internet
estável e de alta velocidade, deveriam significar um impedimento para a saída das operações das principais metrópoles brasileiras, precisamente quando tomamos os dados acerca da distribuição da banda larga no país.
Entretanto, quando se trata de uma demanda corporativa, a rede alcança de forma pontual diversas partes do território brasileiro, o que contrasta com a realidade vivenciada pela maioria da população. De acordo com o Relatório da Akamai (2011)14, a Internet brasileira, além de se limitar a apenas alguns pontos do território, está entre as mais caras e mais lentas do mundo.
A pesquisa avaliou a velocidade da Internet em 50 países, no primeiro lugar ficou a Coréia do Sul, com uma velocidade média de 17,5 megabits por segundo (Mbps), quase 10 vezes mais rápida que a do Brasil, localizado na 40ª posição. A tabela a seguir apresenta a classificação do Brasil e dos dez países com as melhores colocações, de acordo com o relatório da Akamai (2011). Tabela 3. Velocidade média de conexão à Internet, em diferentes países, 2011 País Velocidade média de conexão (em Megabit por segundo/Mbps) 1º ‐ Coréia do Sul 17,5 2º ‐ Japão 9,1 3º ‐ Hong Kong 9,1 4º ‐ Holanda 8,2 5º ‐ Letônia 7,8 6º ‐ Suíça 7,2 7º ‐ Irlanda 6,8 8º ‐ República Checa 6,7 9º ‐ Romênia 6,4 10º ‐ Bélgica 6,1 40º ‐ Brasil 1,8 Fonte: Akamai, 2011 No que se refere ao preço, a Internet brasileira é a mais cara do mundo, e o mais agravante é que os valores pagos pela conexão banda larga expõe o abismo
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criado pelas desigualdades presentes no país. Como já mencionado, as mensalidades pagas por usuários nas diferentes regiões do Brasil podem variar em até 30 vezes (VALOR ECONÔMICO, 17/01/2012). O quadro a seguir apresenta alguns exemplos de valores cobrados por um megabit por segundo de velocidade, por diferentes prestadores do serviço em 2009.
Quadro 4. Valor mensal de Internet por operadora, Brasil, 2009
Operadora Produto Mensalidade
(por megabit) Localidade
Telefônica Speedy R$ 78,85 São Paulo/ SP Oi Oi Velox R$ 69,90 Rio de Janeiro/ RJ Oi BrTelecom ‐ turbo adsl R$ 49,90 Paraná Oi Oi Velox R$ 24,90 Amazonas NET Mega Flash R$ 28,30 São Paulo/ SP GVT Turbonet Mega Maxx R$ 16,64 Paraná Fonte: tecmundo.com.br (acesso em 18/02/2003)
No exterior, convertidos para reais, o valor equivalente a um megabit por segundo de velocidade é muito inferior. O quadro a seguir apresenta exemplos de mensalidades em diferentes países, em 2009.
Quadro 5. Valor mensal de Internet por operadora em diferentes países, 2009
Operadora Produto Mensalidade
(por megabit) País
AOL High Speed R$ 8,54 Estados Unidos FreeNet DSL R$ 6,46 Alemanha Madafish Max R$ 13,85 Reino Unido
Tiscali Tiscali ADSL R$ 3,69 Itália Orange Internet Mégamax R$ 4,91 França Yahoo! Eastern Japan R$ 1,93 Japão Fonte: tecmundo.com.br (acesso em 18/02/2003)
O alto custo para os usuários contribui para a desigualdade digital brasileira. Segundo levantamento realizado pelo Centro de Estudos Sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (Cetic.br), 62% dos domicílios brasileiros não têm acesso à Internet (TIC DOMICÍLIOS e EMPRESAS, 2011). Porém, a população
desconectada não está distribuída de forma homogênea no território brasileiro. Trata‐se da exclusão digital associada à desigualdade territorial, social e econômica.
De acordo com a pesquisa do Hitwise (2013)15, a região Sudeste liderava as visitas à rede em 2011, com 61,25%, seguida pelas regiões Sul (16,04%), Nordeste (12,35%), Centro‐Oeste (7,12%) e Norte, com apenas 3,24%.
No estado da Paraíba, a maior parte da sua população possui um acesso à Internet caro e muito lento, via rádio. Isso, ao que parece, não atrapalha as operações da empresa de Contact Center A&C, que inaugurou, em janeiro de 2013, sua primeira unidade em João Pessoa, com 400 posições de atendimento (PAs), com a expectativa de abertura de mais uma operação na cidade, em 2014.
Apesar de o acesso domiciliar à rede ser uma realidade muito longe da maioria dos brasileiros, a situação das empresas instaladas no país é bem diferente. Praticamente todas as empresas (98%) com dez ou mais funcionários possuíam acesso à Internet em 2011 (TIC DOMICÍLIOS E EMPRESAS, 2011). Ainda que a velocidade média de acesso no país esteja muito abaixo da média mundial, as empresas e os consumidores de alta renda utilizam velocidades muito superiores.
Algumas operadoras de Internet, como Telefônica, Vivo, Oi e GVT, oferecem serviços diferenciados, tais como a “banda larga de ultravelocidade”, restrita a alguns bairros de determinadas cidades brasileiras e com custo que pode chegar a R$ 600,00 por mês. Na cidade de São Paulo, esse tipo de serviço prestado pela empresa Telefônica está disponível em apenas 22 bairros dos mais de dois mil existentes, com valores mensais em torno de R$ 350,00.
O acesso à Internet é tratado como um privilégio no Brasil. Enquanto a maior parte da população é excluída, por falta de infraestrutura e pelos altos preços das conexões, algumas empresas repartem os benefícios consentidos pelo Estado.
Apenas três operadoras de Internet eram responsáveis por 86% do mercado brasileiro em 2009 (TIC DOMICÍLIOS e EMPRESAS, 2009), o que, inquestionavelmente, lhes autorizava a praticar tarifas abusivas.
A distribuição desigual das redes de transmissão de informações, denominadas Backbones, no território brasileiro reflete o privilégio de determinados lugares e agentes, em detrimento da universalização do acesso. O significado de Backbone é “espinha dorsal”, expressão bem apropriada, já que são as redes principais por onde trafegam os dados e as informações disponíveis na Internet, conectando parte da rede urbana brasileira e o exterior. Quando um email ou um pacote de dados é enviado, as informações saem de um determinado computador, passam pela rede local para depois chegarem ao Backbone, responsável por carregá‐las até seu destino final. Os Backbones são as grandes vias por onde as informações circulam e acessam as vias menores. Os principais Backbones de Internet existentes no Brasil se concentram na região Sudeste e no Distrito Federal, com ramificações de menor velocidade para as demais capitais. A figura a seguir demonstra os principais Backbones de Internet existentes no Brasil.
Figura 3. Principais Backbones de Internet da rede pública (RNP), Brasil, 2012
Fonte: Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP), 2012
A velocidade indicada na figura se refere a uma média calculada a partir da capacidade instalada. Na realidade, as cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Distrito Federal contam com uma velocidade de transmissão de dados cerca de quatro vezes maior do que as capitais dos estados do Sul e do Nordeste (BERNARDES, 2010, p. 148). De acordo com o autor, “as demais regiões brasileiras utilizam, em sua transmissão de dados, tecnologias inferiores o que acarreta menor velocidade e menor densidade das informações veiculadas”.
As redes geográficas implantadas no território brasileiro servem ao poder corporativo que hierarquiza os lugares. As diferentes velocidades de conexão à
Internet, por exemplo, determinam o uso das possibilidades da rede, como a troca de grandes arquivos, a realização de vídeo conferências e o uso da telefonia VOIP16. As cidades e as regiões se tornam uma etapa técnica da produção, isto é, a base territorial para a manutenção da acumulação das empresas. E assim, a vida nos lugares é reorganizada a partir da lógica do capital que ali se instala, impondo as regras da competitividade global.
A submissão dos lugares às divisões do trabalho particulares das empresas intensifica as disparidades regionais. A restrição do acesso à informação é apenas uma das dimensões da desigualdade social e da exclusão que impede os indivíduos de uma vida mais justa. Como assevera Vainer (2007, p. 5), os processos de privatização de setores estratégicos, ao lado da ausência ou fragilidade de um projeto nacional, autoriza “o império de opções e decisões de empresas privadas, estas sim tornadas soberanas”.
Apesar do acesso à Internet no Brasil ser restrito a poucos, em 2010, o país estava na oitava posição mundial no que se refere à troca de informações pela rede, concentrando 4,4% da circulação total de dados na Internet (AKAMAI, 2011). Os Estados Unidos lideravam o grupo com 10% do total, o que confirma a expressiva participação do Brasil.
Ao tratar da circulação e da comunicação enquanto duas faces indissociáveis da mobilidade, Raffestin (1993) afirma que “um dos trunfos do poder é hoje informacional, e a informática é um dos meios”. A análise acerca do acesso às redes de informação no território brasileiro e a primazia consentida às empresas parece confirmar essa lógica. Para o autor (1993, p. 204), “a rede faz e desfaz as prisões do espaço”. E, complementa, por isso “ela é ‘instrumento’ por excelência do poder”. A
16 VOIP significa Voice Over Internet Protocol ‐ Voz Sobre Protocolo de Internet, um sistema de
circulação de bens e mercadorias e a comunicação de informações estão a serviço das estratégicas dos agentes capazes de definir o traço, “o desenho” do poder. Apenas a intervenção estatal, com o intuito real de universalização do acesso à informação, tornaria factível a inclusão digital de áreas longínquas e de populações menos abastadas. Para as operadoras de Internet, ao contrário, não existe altruísmo, apenas o lucro. Dessa forma, ainda que distante dos grandes centros, o atendimento a determinadas empresas, como as de Contact Center, é viabilizado. Como resultado, temos um acesso relativamente estável e rápido em qualquer parte do território brasileiro, restrito àqueles que podem pagar. Os números que nos colocam em oitavo lugar em fluxos de informações demonstram que o Brasil tem sido um território atraente para as empresas que movimentam grande quantidade de dados e informações a partir das redes aqui instaladas.
3.4 Flexibilidade locacional das operações: o uso da tecnologia VOIP (Voz Sobre