GLOBALIZAÇÃO, SERVIÇOS E O SETOR DE TELECOMUNICAÇÕES
1.2 Terceirização dos serviços de teleatendimento e precarização do trabalho como estratégia competitiva
A gênese e a expansão das atividades de Contact Center estão intimamente relacionadas ao atual período de mundialização do capital e de forte externalização das atividades das grandes corporações. Como salienta Chesnais (1996, p. 28), as redes mundiais privadas de telecomunicações permitem a extensão das relações de terceirização, particularmente, entre empresas dispersas territorialmente, bem como a deslocalização de tarefas rotineiras das indústrias.
Para Castillo (2000), as alterações no regime de produção fordista para a acumulação flexível e suas diversas formas híbridas, conferiram maior relevância à informação em todo o ciclo de produção, distribuição, consumo, e, sobretudo, na gestão dos fluxos. Segundo Lojkine (1995), o atual período caracteriza‐se por uma verdadeira “Revolução Informacional”, decorrente da interconexão entre a produção e a esfera dos serviços, isto é, a informação deixa de ser apenas utilizada, para ser também produzida, conformando‐se como uma mercadoria. Dessa forma, como analisado por Silva (2001, p. 107), as corporações, ao produzir e comercializar
informações na forma de banco de dados, consultoria e assessoria, promovem uma maior aproximação entre os setores produtivo e de serviços.
Kon (2004, p. 37) enfatiza o crescimento dos serviços prestados às empresas, caracterizados como intensivos em conhecimento e informação. Para a autora, as divisões tradicionais entre manufatura e serviços não fazem mais muito sentido, já que em certos setores manufatureiros de alta tecnologia, o trabalho de pesquisa e desenvolvimento de produtos torna‐se fundamental. Na atualidade, cada vez mais tais atividades têm sido transferidas para o setor de serviços por intermédio da terceirização.
Como demonstra Cavalcante (2003), a transferência de atividades para outras empresas no setor de telecomunicações brasileiro ocorre desde a década de 1970. Porém, com as privatizações, na década de 1990, a terceirização se expandiu e alcançou praticamente todas as áreas das empresas. Para o autor, após as privatizações, tornou‐se recorrente o discurso da redução de custos por meio da externalização de atividades secundárias.
No Brasil, a estratégia de transferência dos custos trabalhistas foi dissimulada pela ideia de especialização e criação de atividades modernas e qualificadas, supostamente desempenhadas pelas empresas subcontratadas. Tais práticas corporativas foram apoiadas pelo discurso da competitividade, que de acordo com Ardinat (2012), trata‐se de uma “singular unanimidade” proclamada como prioridade absoluta, não se restringindo apenas ao meio empresarial, incorporando também cidades e regiões.
Como asseveram Marcelino e Cavalcante (2012), a partir da década de 1990, a terceirização passou a ter um lugar preciso no mercado de trabalho brasileiro, se tornando o mais importante recurso estratégico das empresas para a gestão e a redução dos custos com a força de trabalho. Com isso, ao invés da suposta
transferência de tarefas que deveriam ser desempenhadas por empresas especializadas, com trabalhadores mais qualificados, a ênfase é dada à redução dos custos, por meio do enxugamento dos quadros funcionais e da precarização das relações de trabalho. Para os autores, “a terceirização é todo processo de contratação de trabalhadores por empresa interposta, cujo objetivo último é a redução de custos com a força de trabalho e/ou a externalização dos conflitos trabalhistas”.
As transformações decorrentes da privatização do setor de telecomunicações brasileiro deu origem a uma nova estratégia para a ampliação da terceirização, com a criação de novas empresas, como é o caso das operadoras de Contact Center. A dispensa de um grande número de funcionários das empresas de telecomunicações fazia parte da reorganização produtiva do setor, e não raro, os ex‐funcionários eram contratados pelas empresas de teleatendimento recém‐criadas para desempenhar funções iguais ou semelhantes às que desempenhavam antes. Como mencionado na seção anterior, os principais exemplos são as empresas Atento, Contax e Brasil Center, que nasceram como subsidiárias e com vínculos patrimoniais com as companhias telefônicas que lhes deram origem, respectivamente, a Telefônica, a Telemar e a Embratel.
Como no plano jurídico a terceirização é restrita à atividade‐meio, ou seja, aquela que não é a atividade central da empresa, as operações transferidas das “teles” para as operadoras de Contact Center tornaram‐se alvo de intenso debate. O Tribunal Superior do Trabalho não definiu uma posição consensual nos processos julgados. O reconhecimento das atividades de teleatendimento como forma lícita de terceirização pelas empresas telefônicas tem se apoiado em argumentos associados ao ganho de produtividade e à eficiência, alcançados, supostamente, pela especialização. Nesses casos, a distinção entre atividade meio e atividade fim é
defendida pela suposta necessidade de concentração dos esforços no interesse central da empresa.
Em outra perspectiva, o caráter ilícito da terceirização do teleatendimento pelas empresas de telecomunicações tem sido associado aos efeitos precarizantes da terceirização e ao desrespeito aos direitos fundamentais conquistados pelos trabalhadores, como o princípio da isonomia salarial.
A especialização dos serviços prestados e a geração de emprego qualificado estão entre os contrassensos proclamados pelos setores empresariais na tentativa de justificar a terceirização. Entretanto, a realidade do trabalho nas centrais de atendimento expressa justamente o contrário: a simplificação, a falta de autonomia e a desqualificação.
1.3 Expansão e características dos Contact Centers brasileiros
O ramo de teleatendimento brasileiro, praticamente inexistente antes das privatizações, teve um crescimento expressivo entre 1999 e 2011, com aumento médio de 15% a.a. no seu faturamento, ao passar de R$ 95,9 milhões para R$ 9,76 bilhões (callcenter.info.br, 2012). O número de posições de atendimento (PAs) também aumentou sensivelmente no período, de 5.078 para 228.576, como demonstrado na tabela 1.
Tabela 1. Crescimento do número de PAs e do faturamento no ramo de Contact Center, Brasil, 1999 ‐ 2011 Ano 1999 2003 2007 2011 PAs 5.078 46.747 151.563 228.576 Faturamento (milhões R$) 95,9 2.150 4.820 9.766 Fonte: Anuário Brasileiro de Call Center e CRM, 2011/2012; callcenter.inf.br/ranking, 2013.
Na mesma direção, os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), do Ministério do Trabalho e Emprego, demonstram que o