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CAPÍTULO II – O PESADELO: A LÓGICA DO CAPITAL E A EDUCAÇÃO COMO

2.4 REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E TAYOTISMO

O taylorismo/fordismo predominou até o início dos anos 1980, quando o modelo japonês (toyotismo) surgiu no contexto mundial, trazendo grande impacto devido à revolução tecnológica e rapidez de sua propagação.

A reestruturação produtiva consiste na mudança do modelo de produção fordista/taylorista para o toyotismo. O fordismo tinha como principal característica a produção em série, pouco variada e com produção em grande escala. A principal característica do toyotismo era a flexibilização, rejeitando todas as formas rígidas do fordismo na busca de liberação dos processos produtivos.

O toyotismo surgiu nos anos 1950, na fábrica de automóveis Toyota após a Segunda Guerra Mundial, a fim de adaptar as estratégias de produção a um mercado consumidor restrito no Japão. A nova palavra de ordem passa a ser “flexibilização”, rejeitando todas as formas rígidas do fordismo na busca de liberação dos processos produtivos com diversificação de produtos para atender as novas expectativas do mercado consumidor, fazendo com que houvesse redução no custo de produção sem diminuir a qualidade do produto, uma vez que a mesma agora passa pelo controle dos ciclos de qualidade e a responsabilidade fica distribuída em todo o processo de produção, buscando eliminar os defeitos e fazendo com que as equipes de trabalho responsabilizassem-se pela qualidade do produto, com margem zero de erro.

Nesse contexto, as organizações investem em tecnologia de ponta e maquinaria complexa e inteligente, a qual proporciona grande aumento de produtividade. A nova visão de gestão provocou mudanças nos perfis dos trabalhadores e de suas relações com o trabalho, bem diferentes dos moldes fordistas. “O resultado é um tipo de trabalhador com maior iniciativa e maior capacitação do que o trabalhador fordista.” (FILGUEIRAS, 1997, p. 66).

Segundo Peres (2004, p. 6), difundiu-se:

[...] um discurso voltado para a valorização do trabalho em equipe, da qualidade no e do trabalho, da multifuncionalidade, da flexibilização e da qualificação do trabalhador. Oculta, porém, a exploração, a intensificação e a precarização do trabalho, inerentes à busca desenfreada do lucro pelo sistema de metabolismo social do capital, que, por não ter limites, configura-se como ontologicamente incontrolável.

Para Antunes (2009), surge então a “flexibilidade profissional”, que é o trabalhador que, além das suas responsabilidades diretas, conhece o processo como um todo, aumentando a eficiência e a produtividade em favor do capitalismo, tornando-se polivalente e multifuncional.

Os operários tinham se mostrado capazes de controlar diretamente não só o movimento reivindicatório mas o próprio funcionamento das empresas. Eles demonstraram, em suma, que não possuem apenas uma força bruta, sendo

dotados também de inteligência, iniciativa e capacidade organizacional. Os capitalistas compreenderam que, em vez de limitar a explorar a força de trabalho muscular dos trabalhadores, privando-os de qualquer iniciativa e mantendo-os enclausurados nas compartimentações estritas do taylorismo e do fordismo, podiam multiplicar seu lucro explorando-lhes a imaginação, os dotes organizativos, a capacidade de cooperação, todas as virtudes da inteligência. (ANTUNES, 1995, p. 44-45).

Cria-se a falsa ideia de que os empresários passaram a estimular suas capacidades criativas, sua inteligência, pró-atividade e habilidades de planejamento, com o desejo de promover o bem- estar e a qualidade de vida dos funcionários, mas na verdade, esses estímulos visavam uma nova e maior possibilidade de exploração para aumentar a produtividade e os lucros.

Nesse cenário de flexibilização e reestruturação produtiva, as empresas enxugam seus quadros e sobrecarregam os trabalhadores que permanecem nas organizações, além de flexibilizar também as relações de trabalho.

Filgueiras (1997, p. 66) explica que,

[...] a busca da flexibilidade exige a “livre contratação” entre capital e trabalho, sem nenhum tipo de restrição; exige a “livre negociação” sem intervenção e regulamentação por parte do Estado. O objetivo é flexibilizar a jornada de trabalho, a remuneração e os direitos sociais existentes.

O padrão de sociedade do pleno emprego e o alto grau de desenvolvimento econômico e social que alguns países conquistaram, principalmente, os que adotaram as políticas dos Estados de Bem Estar Social, desestruturaram-se e deram lugar a “[...] uma sociedade de desempregados e de formas precárias de trabalho, de emprego e de vida.” (DRUCK, 2011, p. 43).

Como dito por Druck (2011, p. 42), o Estado “[...] passa a desempenhar um papel cada vez mais de ‘gestor dos negócios da burguesia’, já que ele age agora em defesa da desregulamentação dos mercados, especialmente o financeiro e o de trabalho.”

A flexibilização torna-se uma nova estratégia de precarização, um novo tipo de dominação, conforme explica Druck e Franco (2007, p. 8): “[...] fundado na instituição de uma situação generalizada e permanente de insegurança, visando obrigar os trabalhadores à submissão, à aceitação da exploração.” Diante da constante ameaça de desemprego estrutural, os trabalhadores acabam criando uma concorrência entre si e/ou aceitam qualquer situação de

submissão e subordinação, pois internalizam que é melhor viver assim do que ficar desempregado.

Segundo Antunes (2009, p. 3),

[...] criou-se, de um lado, em escala minoritária, o trabalhador “polivalente e muntifuncional”, capaz de operar com máquinas com controle numérico e, de outro, uma massa precarizada, sem qualificação, que hoje está presenciando o desemprego estrutural.

Assim, na medida em que se flexibilizam as relações de trabalho com a desregulamentação dos direitos dos trabalhadores, aumentam-se os índices de desemprego e subemprego, levando o ser humano à condição precária de existência.

Surgem termos como “empreendedorismo”, “cooperativismo”, “trabalho voluntário”, “terceirização”, dentre outros, para justificar a precarização do trabalho.

Bulgacov et al. (2011, p. 700) dizem que “É necessário deixar claro que o trabalho autônomo, avulso e eventual e a atividade empreendedora não são emprego, nem são assalariamento.” É preciso identificar se alguém resolveu ser um empreendedor ou fazer um trabalho voluntário por vontade própria, por um desejo legítimo, ou se foi por falta de oportunidade, como uma alternativa para o desemprego.

Bulgacov et al. (2011, p. 700) também afirmam que

A precarização do trabalho se revela como uma sequência de perdas, como: redução da perspectiva profissional (contratos temporários, flexibilidade de demissões) e supressão de direitos (como descanso remunerado, férias, licenças de saúde, aposentadoria e regulação dos salários, entre outros).

Outra falácia que as novas formas de gestão utilizam para seduzir é dizer que agora o trabalhador é “dono do seu dia e horário” e que por isso terão a liberdade para programá-lo como desejarem, pois agora o trabalho tornou-se dinâmico e sem rotinas.

A flexibilização pode ser entendida como “liberdade da empresa” para desempregar trabalhadores; sem penalidades, quando a produção e as vendas diminuem; liberdade, sempre para a empresa, para reduzir o horário de trabalho ou de recorrer a mais horas de trabalho; possibilidade de pagar salários reais mais baixos do que a paridade de trabalho exige; possibilidade de subdividir a jornada de trabalho em dia e semana segundo as conveniências das empresas, mudando os horários e as características do trabalho... dentre tantas formas de precarização da força de trabalho.

Como definido por Seligmann-Silva (1995), as novas concepções organizacionais, baseadas no toyotismo, investem na “neurose de excelência”, fazendo com que o controle da execução do trabalho passe a ser feito por uma dominação introjetada que força o sujeito a ultrapassar seus limites em busca da “qualidade total”. Equipes de recursos humanos, com o objetivo de aumentar a eficiência e a produtividade, manipulam a fragilidade em que se encontra o assalariado, colocando em prática a “gestão dos afetos”. (SELIGMANN-SILVA, 1994). Tal gestão faz com que o assalariado internalize a ideologia do sistema empresarial do qual faz parte, ficando mais suscetível à dominação, perdendo então seu senso crítico e facilitando o controle sobre seu aparelho psíquico. Pacificando as relações desiguais dentro da empresa e pulverizando a ideologia de que “o trabalho dignifica o homem”, essa gestão favorece a exploração do indivíduo que se sujeita a continuar correspondendo à expectativa social do trabalho, ou seja, com a adequação do trabalhador à cultura do contentamento.

A submissão ao papel social pré-estabelecido leva o trabalhador a se ajustar às normas internas de disciplina e “[...] quanto mais minuciosos forem esses corpos de regras e quanto maior for o aparato destinado a controlar o seu rigoroso cumprimento, mais fortemente estabelecida estará a disciplina e menor será a liberdade.” (SELIGMANN-SILVA, 1994, p. 98). Esse controle recíproco – entre organizações, trabalhador, cliente, leis de mercado e tecnologias de ponta – tem grande peso na vida psíquica dos trabalhadores.

É nesse cenário histórico que se insere o processo de reforma do Estado brasileiro, onde o mercado competitivo globalizado passa a ser a referência para a adoção de medidas de cunho neoliberal, como por exemplo, o processo de privatização, desregulamentação das relações de trabalho e reforma da educação.