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Refletindo sobre a área de conhecimento e ação da educação ambiental

1.3 A educação ambiental: um campo em construção

1.3.2 Refletindo sobre a área de conhecimento e ação da educação ambiental

A delimitação da área de conhecimento e ação da educação ambiental ou de seu objeto de conhecimento está também, inserido no questionamento sobre qual a especificidade da educação ambiental, frente à dificuldade de se definir um objeto, ou área de conhecimento e ação que se diferencie da área de atuação da educação. Como em Tbilisi, muitos autores (LIMA & BRANDÃO, 1989; MAZZOTTI, 1994; MEDINA, 1994; CARVALHO, 2004; GUIMARÃES, 2007; GRÜN, 2007) trabalham a temática da educação ambiental buscando delinear, não um objeto de conhecimento, mas uma área de conhecimento e ação a partir do conceito de ambiente que articula a dinâmica dos elementos e das relações entre a sociedade e a natureza. Isto porque, em termos conceituais a educação ambiental, como se viu acima, não está proposta como uma ciência, mas como um processo que busca: numa perspectiva, constituir-se como processo educativo para incorporar à educação a abordagem sobre a questão ambiental (LIMA & BRANDÃO, 1989; MAZZOTTI, 1994; MEDINA, 1994); em outra, constituir-se também como um processo educativo, mas, no seio de uma nova pedagogia da complexidade e de uma racionalidade ambiental (LEFF, 2001).

Quando se remonta a Tbilisi esta discussão com relação ao objeto de conhecimento ou área de conhecimento e ação da educação ambiental não está posta explicitamente. Nas entrelinhas do documento produzido por esta Conferência é, no entanto, possível identificar que a questão ambiental é definida como sendo a área de conhecimento e ação da educação ambiental. O que está proposto na medida da reconstrução de um conceito de meio ambiente, que se propõe agora, como relação sociedade/natureza.

A preocupação é de tratar as questões ambientais a partir de um conceito de ambiente que considere então os elementos físicos, biológicos e químicos da natureza na sua dinâmica de relações entre si e com os elementos que constituem a sociedade humana, enquanto suas construções sociais, culturais, econômicas, filosóficas e políticas. Nesta direção, a educação ambiental vai sendo então definida, em Tbilisi, como um meio para a abordagem das questões ambientais:

“... a educação deverá proporcionar meios que permitam compreender as relações entre os

evolução no tempo e sua transformação no espaço. Como esse conhecimento deve

culminar em mudanças de comportamento e em medidas de proteção e melhoria do meio ambiente, ele deve ser adquirido por esforço de estruturação, a partir da observação, da análise e da experiência prática de determinados tipos de meio ambiente... tratando-se, então de transmitir um conhecimento profundo do funcionamento dos ecossistemas, bem

como dos fatores socioeconômicos que regem as relações entre o homem e o meio ambiente no contexto do desenvolvimento... Um dos objetivos fundamentais da educação ambiental é

conseguir que os indivíduos e as coletividades compreendam a natureza complexa do meio

ambiente natural e do meio criado pelo homem, resultante da interação de seus aspectos biológicos, físicos, sociais, econômicos e culturais, e que adquiram conhecimentos, valores, comportamentos e habilidades práticas para participarem, com responsabilidade e eficácia, da prevenção e solução dos problemas ambientais e da gestão do problema da qualidade do meio ambiente.” (UNESCO, 1997, p. 38, 63, 98. Os grifos são meus).

No Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis a área de conhecimento e ação da educação ambiental está, também, diluída entre os motivos, objetivos e os princípios definidos para a educação ambiental. É possível, no entanto destacar dois princípios que revelam mais explicitamente, como área de atuação da educação ambiental, um ambiente em termos das relações da sociedade/natureza, como também definido em Tbilisi:

“A educação ambiental deve envolver uma perspectiva holística, enfocando a relação entre o ser humano, a natureza e o universo de forma interdisciplinar... A educação deve tratar as questões globais críticas, suas causas e inter-relações em uma perspectiva sistêmica, em seu contexto social e histórico. Aspectos primordiais relacionados ao desenvolvimento e ao meio ambiente, tais como população, saúde, paz direitos humanos, democracia, fome degradação da flora e fauna, devem ser abordados dessa maneira. (BRASIL, 2004, p. 48).

Estas orientações de Tbilisi e do Tratado de Educação Ambiental – sobre a questão ambiental a partir de um conceito de ambiente que integra as relações sociedade natureza, em seus aspectos físicos, biológicos, sociais, econômicos, políticos e culturais como área de conhecimento e ação da educação ambiental – são um consenso entre os que fazem educação ambiental. Elas estão, no entanto, inseridas no contexto de um debate sobre diferentes concepções epistemológicas do conhecimento e teorias que orientam abordagens e proposições metodológicas de ação.

O debate, então, não é delimitar a área de conhecimento e ação da educação ambiental, que parece está claramente elucidada, mas de lembrar que existem diferentes concepções de educação ambiental, resultantes das diferentes concepções da ciência e de seus métodos de conhecer, como se viu no título anterior.

No contexto do debate entre estas diferentes concepções da ciência, duas tendências vem sendo mais frequentemente discutidas, como visto no título que discutiu as bases epistemológicas da educação ambiental. Este debate está se dando em duas direções. Numa direção, a posição é da necessidade de construção de uma nova ciência, ou até de uma nova racionalidade ambiental, que articule as disciplinas científicas a outras formas de conhecimento, a partir de um novo paradigma do conhecer; que tem como referência a complexa unidade do universo material, que considera o caos, a desordem, a incerteza e a impossibilidade de conhecimento verdadeiramente objetivo, ou que articula conhecimento científico com a espiritualidade e religiosidade humana.

Na outra direção está a defesa do desenvolvimento da ciência moderna, como um processo histórico em construção, que também reconhece em seu desenvolvimento, a totalidade como expressão de uma dialética do real e do conhecimento, mas rompe com a possibilidade de identidade entre o objeto material e o objeto de conhecimento, considerando o último como um construto teórico definido por um conjunto de relações que interessam as ciências, em dado contexto social. Em oposição à perspectiva de uma ciência que tenha por base o caos, a desordem, assume-se com Piaget a posição indemonstrável da existência de regularidades no universo material e humano, como condição que dá à ciência o caráter de grande utilidade para a ação humana.

Assim, o ambiente enquanto a relação sociedade/natureza é referência como área de conhecimento e ação para a educação ambiental. O que está colocado também, em termos das diferenças entre as diferentes teorias do conhecimento. Por um lado, o ambiente como um objeto material que coincide com a unidade do universo para uma ciência que se pretende holística, sistêmica, nova. Por outro, a posição adotada neste trabalho, de um ambiente como um conceito, um construto científico histórico, que é referência para a ciência. Uma ciência que está orientada numa perspectiva histórica, construtivista e dialética do conhecimento e da natureza, e que define, a necessidade da interdisciplinaridade a partir das abordagens disciplinares das ciências naturais e sociais no

contexto da abordagem das questões ambientais concretas, que podem ser tratadas, por exemplo, como propõe Garcia (1986), enquanto sistemas complexos.