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De modo geral, antes de haver uma regulamentação clara e que obrigasse todos os Estados signatários da Organização Mundial do Comércio a cumprir esse conjunto de normas internacionais, era, de certa forma, livre a imposição de uma conceituação do que viria a ser o dumping e também o estabelecimento de medidas punitivas por parte dos países lesados para coibir essa prática desleal de comércio.

Devido a esse quadro de instabilidade no cenário internacional, em que não se sabia quem deveria ser punido, se deveria haver algum tipo de punição, ou até mesmo, se deveria ser considerado o dumping como uma prática desleal no comércio internacional, surge a OMC, obrigando os seus signatários a aderir a um conjunto de normas sobre o referido assunto. Esse conjunto de normas teria um caráter mais moderado na determinação do que viria a ser considerado dumping, vez que não se poderia aplicar um modelo que abarcasse uma quantidade exagerada de casos para ser enquadrada como dumping, pois do contrário, ao invés de se zelar por uma maior integração entre os Estados, ocorreria maior dificuldade para o desenvolvimento do comércio entre os mesmos, contrariando a própria razão

de existência da OMC. Esse tipo de entrave comercial ocorreria, já que passaria a existir um protecionismo exacerbado e que traria conseqüências extremamente negativas para as relações comerciais, provocando um nacionalismo entre as indústrias e prejudicando o consumidor que não iria ter acesso à livre-concorrência do mercado. Como conseqüência principal, o preço final dos produtos seria maior e também a qualidade dos mesmos iria diminuir, haja vista que, no momento em que não houvesse concorrência, ocorreria uma acomodação por parte dos investidores que não iriam procurar aprimorar seus produtos, mas sim mantê-los no estado em que estivessem, ou seja, incentivar-se-ia a não inovação e a falta de competitividade entre os produtores, gerando, assim, uma estagnação sem precedentes no mundo moderno e globalizado.

Além de obrigar os países signatários a cumprir os ordenamentos da OMC, ocorre também a necessidade desses países submeterem-se ao Entendimento de Solução de Controvérsias. A fim de que tal mecanismo funcione sem os impeditivos verificados no sistema anterior, que era o sistema do GATT de painéis não obrigatórios, que constantemente tinham atrasos e que também tinha uma difícil implementação de suas decisões, o ESC estipulou várias fases procedimentais, para as quais se aplicam prazos pré-determinados. Assim como vem descrito na obra de Welber Barral27:

a) A primeira fase consiste em consultas bilaterais entre os Estados envolvidos. Esgotadas as consultas sem uma solução satisfatória, no prazo de sessenta dias, o Estado Reclamante poderá solicitar a criação de um painel;

b) Havendo anuência das partes, proceder-se-á com tentativas de bons ofícios, conciliação e mediação, prorrogando-se o prazo por mais sessenta dias;

c) Em seguida, parte-se para a criação de um painel pelo Órgão de Solução de Controvérsias, através de pedido escrito do Estado reclamante que deverá fornecer um resumo contendo o fundamento jurídico da controvérsia;

27 BARRAL, Welber Oliveira. Dumping e Comércio Internacional: a regulamentação antidumping

d) Esse fundamento jurídico será transposto num termo de referência, tornando padrão do ESC, e que será fornecido aos demais Estados- Membros, para que eventualmente manifestem seu interesse na controvérsia em questão;

e) A seleção dos membros do painel será proposta pela Secretaria da OMC, a partir de uma lista preexistente. O Diretor-Geral selecionará os nomes, se não houver acordo entre os Estados envolvidos na controvérsia;

f) Na fase seguinte, ocorre o procedimento de primeira instância, quando o painel ouvirá as partes, examinará os documentos apresentados e elaborará seu relatório final, cujo processamento tardará em regra de seis a oito meses;

g) O relatório do painel será submetido ao OSC, que considerará sua adoção, a não ser que um Estado envolvido no litígio manifeste sua intenção de recorrer ou que o OSC decida por consenso não adotar o relatório (“consenso reverso”);

h) Somente os Estados-Partes no litígio poderão recorrer ao Órgão de Apelação, que deverá examinar as questões jurídicas tratadas pelo painel, no prazo de 60 dias (ou excepcionalmente, no prazo de 90 dias). Sua decisão poderá manter, modificar ou inverter o relatório do painel, e deverá ser adotada incondicionalmente pelas partes envolvidas;

i) Por fim, o OSC monitorará o cumprimento da decisão do painel ou do Órgão de Apelação, que envolve em regra a revogação de norma interna do Estado vencido. O prazo razoável para o cumprimento da medida será a regra de quinze meses;

j) No caso da decisão do OSC não ser implementada pelo Estado vencido,

existe a possibilidade de que o Estado vencedor retire ou suspenda concessões negociadas no âmbito da Rodada Uruguai.

No caso do dumping, a competência do Órgão de Solução de Controvérsias (OSC) é a de julgar as medidas antidumping aplicadas pelos Estados, analisando se foram abusivas ou se realmente foram utilizadas para coibir a referida prática desleal no comércio internacional. Deste modo, aborda Welber Barral28:

Observe-se, por outro lado, que a competência do painel será a de reexaminar as medidas aplicadas pelas autoridades nacionais quanto à prática de dumping. OAARU reconhece a legitimidade de três medidas: as medidas provisórias, as medidas definitivas e o compromisso de preços. Desta forma, não se poderá requerer um painel para analisar decisão administrativa que decide pelo início da investigação contra o exportador estrangeiro acusado de dumping.

Fica claro, portanto, que o papel da OMC não é o de analisar se as exportações de um dado país estão sendo beneficiadas com o dumping,

28 BARRAL, Welber Oliveira. Dumping e comércio internacional: a regulamentação antidumping

prejudicando assim os interesses de outros, já que este é um processo administrativo e que deve ser exercido pelo país que estiver sendo lesado, mas o papel do referido órgão comercial é o de fiscalizar se a punição, com relação à prática de dumping, é, ou não, legítima. Portanto, analisa-se somente a medida antidumping aplicada pelo Estado.

Dessa feita, conclui-se que o objetivo do painel não é o de modificar aquilo que já foi decidido pela autoridade de modo imediato, mas sim, concluir e avaliar se as autoridades nacionais investigaram corretamente os fatos apresentados e se a decisão adotada e implementada foi imparcial e objetiva.

Uma outra questão que vem despertando o interesse de grande parte dos juristas que se envolvem com os painéis e o OSC é a de saber se é necessário o esgotamento dos recursos internos para que determinado país venha a utilizar-se do referido procedimento.

Apesar de saber que, na maior parte dos litígios internacionais, é necessário chegar ao esgotamento dos recursos internos para, então, utilizar-se das normas internacionais; no que tange ao assunto dos painéis e, mais precisamente, sobre o julgamento das medidas antidumping, não é necessário o procedimento acima mencionado, vez que, quando ocorre o julgamento administrativo favorável por parte de um país para se aplicar medidas antidumping, dificilmente conseguir-se- á reverter a decisão tomada pela via administrativa. Dessa feita, vem se argumentando, principalmente depois dos norte-americanos terem adotado como defesa em um dos painéis a idéia de que deveria haver o esgotamento dos recursos internos como pré-requisito para o acesso às vias internacionais (casos do Cement from México e Salmon from Norway), que não é um critério necessário como pré- requisito o esgotamento dos recursos internos para a utilização da via internacional

com o intuito de solucionar o litígio ora abordado. Tal afirmativa justifica-se pelo fato de que não se julga a ocorrência, ou não, do dumping, mas, sim, se a medida de repressão à prática desleal foi aplicada corretamente, ou seja, de forma imparcial e não arbitrária pelo Estado lesado.

3 DUMPING E SUAS FORMAS DE REPRESSÃO