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CAPÍTULO 3: DA DEMOCRATIZAÇÃO AO GERENCIALISMO: OU COMO ACHATAR O INTERESSE PÚBLICO EM EFICÁCIA

3.3. A REFORMA DO APARELHO DO ESTADO: PONDO EM PRÁTICA AS TESES SOBRE O BRASIL

Vale lembrar que, tal como Fernando Henrique Cardoso, o titular da pasta, Bresser-Pereira, inscreve-se no debate sob dupla condição. Para além de um ator político, Bresser é um pensador das questões brasileiras, especialmente aquelas ligadas ao Estado e à administração pública. Possivelmente pela dupla condição de Bresser, o MARE, sob seu comando, procurou sistematicamente racionalizar sua intervenção, procurando interpretar o movimento histórico de constituição do Estado, em suas relações com questões políticas e econômicas da formação brasileira, mas também do sistema capitalista mundial.

Vale iniciar pela referência a documento do MARE, de 1997, voltado a produzir uma perspectiva oficial sobre o caráter imperativo de uma reforma ou reconstrução estatal na década de 1990.

A grande tarefa política dos anos 90 é a reforma ou a reconstrução do Estado. Entre os anos 30 e os anos 60 deste século, o Estado foi um fator de desenvolvimento econômico e social. Nesse período, e particularmente depois da segunda guerra mundial, assistimos a um período de prosperidade econômica e de aumento dos padrões de vida sem precedentes na história da humanidade. A partir dos anos 70, porém, face ao seu crescimento distorcido e ao processo de globalização, o Estado entrou em crise e se transformou na principal causa da redução das taxas de crescimento econômico, da elevação das taxas de desemprego e do aumento da taxa de inflação que, desde então, ocorreram em todo o mundo (Bresser-Pereira, 1997, 7).

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A passagem procura estabelecer conexões causais decisivas para justificar a reforma do Estado. Nos termos da passagem, este havia sido um “fator de desenvolvimento econômico e social” entre as décadas de 1930 e 1960. A partir daí, contudo, teria se convertido na razão principal para o baixo crescimento econômico e elevação do desemprego e da inflação, sobretudo pelo crescimento distorcido de suas funções entre 1930 e 1980, posicionando-se como árbitro do desenvolvimento. O crescimento de suas funções teria levado, entre outros, a um elevado padrão de gastos públicos para sustentar a máquina administrativa.

O aparelho do Estado se estruturou a partir de 1930, como resposta ao modelo anterior, em que a desregulamentação do mercado levou à crise, à queda da atividade produtiva e ao desemprego. O novo modelo, nos países desenvolvidos, ganhou a forma do Estado do Bem- Estar, enquanto nos países periféricos constituiu-se como um Estado promotor e indutor da industrialização.

Para realizar suas novas tarefas, o Estado internalizou em suas estruturas interesses econômicos e sociais diversos, ampliando seu papel como regulador das relações econômicas, tomando como de interesse público o avanço na industrialização. Desse modo, promoveu uma associação entre o interesse público e o privado, sob as formas já vistas no capítulo anterior, apoiando setores específicos da indústria. A ampliação do papel do Estado pressupôs o crescimento da carga tributária, bem como da burocracia, diante de seu papel no modelo baseado em intervenção estatal.

Para Bresser-Pereira, essa ampliação, na década de 1980, implicou uma crise fiscal, ficando o Estado impossibilitado de fazer frente a tantos desafios. Em outros termos, a solução gestada desde 1930 para um novo modelo de regulação do capitalismo no Brasil teria levado a um excesso de Estado na provisão das soluções e, por conseguinte, a uma participação distorcida da burocracia nos domínios sociais e econômicos. Portanto, não se tratava apenas de uma questão fiscal, mas de uma crise na administração burocrática do Estado e em seu modo de intervenção.

O Estado passava a ser apreendido como negatividade, instância social impeditiva de um desenvolvimento de tipo novo, ajustado às condições do capitalismo pós-década de 1970. Estas condições são condensadas sob o feixe da globalização. Na segunda metade do século XX, ocorreram profundas mudanças no sistema econômico mundial, especialmente a redução

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dos custos de transporte e comunicação. Com isso, a economia mundial se tornou mais integrada, acirrando a competição capitalista, com efeitos sobre os governos nacionais.

Diante do fato de que o centro das decisões econômicas passava a ser um espaço econômico mundial e integrado, os governos nacionais já não dispunham de elevado grau de autonomia para realizar suas escolhas. Tornava-se, portanto, disfuncional o aparelho estatal construído em cinquenta anos de política desenvolvimentista no Brasil, indutor da industrialização e dotado de instrumentos para impulsionar a decisão de produção que se associava aos planos e a suas prioridades.

No lugar de absorver o interesse industrial, dando-lhe o caráter de interesse nacional, era preciso que o Estado preparasse a atividade econômica à concorrência internacional. O novo papel do Estado passava por outro arranjo político-institucional. Já não teriam os instrumentos de intervenção estatal a incumbência de centralização da alocação de recursos e valores, definindo, por uma racionalidade tecnocrática, as atividades econômicas e segmentos que seriam classificados como prioritários. O centro das decisões de alocação teria de se deslocar em direção aos agentes do mercado, expostos à concorrência internacional.

A interpretação dos novos tempos, enquanto diagnóstico, podia ser apropriada por forças políticas e ideológicas associadas à defesa do livre mercado. Segundo Bresser, esse não era o ponto de vista oficial na década de 1990. Em oposição à ideia de que, sob as novas circunstâncias, o Estado cumpria funções minimalistas (daí a expressão “Estado mínimo), a pauta da reestruturação do setor público partia do pressuposto de que ele tinha uma função central a desempenhar.

Aos poucos foi se tornando claro que o objetivo da intervenção deixara de ser a proteção contra a concorrência, para se transformar na política deliberada de estimular e preparar as empresas e o país para a competição generalizada. Estado e mercado não mais podiam ser vistos como alternativas polares para se transformarem em fatores complementares de coordenação econômica (Bresser-Pereira, 1997, 11).

Assim, a proposta compreendia reformas voltadas às duas instituições básicas das sociedades modernas – o mercado e o Estado. Ambos pressupunham um ajuste às novas condições do capitalismo mundial. Em relação ao mercado, os métodos de produção tinham de se modernizar diante de uma crescente concorrência internacional. Ao Estado era imposta a redefinição de sua forma de atuação, de modo que, estabelecendo complementaridades com o

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mercado, pudesse induzir a uma maior eficiência na provisão de bens e serviços.

Sob o novo modelo de regulação social que se insinuava, pode-se perceber novas formas pelas quais o discurso oficial transformava perspectivas singulares em síntese do interesse coletivo. Tratava-se, agora, não mais de praticar uma simbiose entre interesse industrial e nacional, justificando o funcionamento de instrumentos de intervenção estatal, especialmente os planos, que pudessem direcionar o mercado para a industrialização, identificando-a com a modernização nacional.

Ao contrário, as mudanças em curso envolviam mobilizar o imaginário social da modernização, mas agora o preenchendo com outro índice valorativo. Modernizar-se passava a corresponder a um projeto político cuja meta era superar o atraso contido no Estado e que se expressava ao menos de três formas: a institucionalização de interesses personalistas, associados a segmentos dotados de maior capacidade de se articular aos agentes estatais; a intervenção excessiva do Estado na vida econômica e social, que significou elevação do gasto público e da carga tributária, a subtração de recursos do setor privado e o endividamento estatal, gerando uma crise fiscal que lhe retirara a capacidade de investimento e gerou inflação; por fim, a burocratização em função da provisão de bens e serviços públicos pelo Estado, baseada em controles administrativos e procedimentos legais ineficientes.

Diante dos pontos acima elencados, Bresser-Pereira conceberia o novo Estado como constituído a partir de quatro componentes: (a) delimitação de seu papel, por processos como a privatização, a publicização18 e a terceirização, que transfeririam competências do Estado a entidades não-estatais e ao mercado; (b) a desregulação, diminuindo a interferência estatal no mercado; (c) o aumento da governança, com uma administração mais ágil, dotada de menos controles legais, flexibilizados para o alcance de resultados; e (d) ampliação da governabilidade, compreendida como poder político necessário aos governos democráticos.

Em nossa interpretação, a reforma do Estado seria a tradução para a administração pública de uma visão de Brasil estruturada pelo dualismo entre modernidade e atraso. A construção desse braço operativo se vale de uma periodização de formas de Estado capitalista. Primeiro, o Estado social liberal, caracterizado por pouca intervenção na economia. O livre jogo das

18 Publicização é a transferência da responsabilidade pela provisão de bens e serviços públicos a organizações não-

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forças de mercado teria levado à crise de 1929, cuja manifestação no Brasil foi a superprodução de café (que não era causada apenas pelos problemas do mercado externo, mas também pelos estímulos à produção interna).

A interpretação da crise das primeiras décadas do século XX como sendo originada de certo déficit de intervenção estatal para regulação do mercado induziu à formação de um Estado forte, ao qual Bresser dá o nome de social-burocrático. Nos países em desenvolvimento, a partir de 1930, esse Estado ganharia a forma de indutor da industrialização e da questão social, estruturando-se de forma a ditar seus rumos, regulando segmentos econômicos e sociais que se associariam ao projeto de industrialização. Este, por seu turno, seria o novo índice do interesse coletivo, configurando uma identidade entre setores da indústria nacional, Estado e bem-estar.

O Estado social-burocrático teria nascido também como resposta aos interesses particularistas que dominavam as sociedades pré-modernas. Aquelas nas quais o espaço público e o privado ainda não se distinguiam. De modo que, por exemplo, os cargos públicos não eram distribuídos de acordo com princípios meritocráticos, mas baseados em concessões do poder político, valendo-se de critérios personalistas.

O Estado social-burocrático construiria princípios impessoais para a administração pública. Processo que ganhara impulso com a ascensão de Getúlio Vargas ao poder. A criação do DASP foi a expressão mais evidente desse processo. Até ali, os cargos públicos eram preenchidos por apadrinhamento, por relações pessoais que explicavam o acesso diferencial a postos públicos. O DASP procurou organizar processos seletivos de funcionários públicos, bem como cursos de aperfeiçoamento, disseminando conhecimento na administração pública, incorporando princípios técnicos e procedimentos universais ao trabalho dentro do Estado. Era parte do projeto varguista de criar uma nova cultura para a administração, conduzida por funcionários especializados em técnicas que racionalizariam a atividade estatal mediante a aplicação de normas e procedimentos universais.

Enfim, tratar-se-ia da introdução no Brasil de uma burocracia inspirada nos termos descritos por Weber, em que ela se posiciona como instrumento para a dominação racional- legal.

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A criação do DASP tem sido apontada como a implantação de uma burocracia de tipo weberiana no Brasil. Weber finalmente chegaria ao Brasil através do DASP. A implantação de uma burocracia racional, moderna, justificava-se dentro do espírito revolucionário de conduzir o país a um nível de desenvolvimento até então nunca empreendido (Pinho, 1998, 60).

No entanto, conforme Lafer (1975), em 1958, estimava-se que, na melhor das hipóteses, apenas 12% do funcionalismo público teriam entrado no serviço público pela via do mérito. O que mostrava a persistência das práticas patrimoniais, ainda que já houvesse duas décadas de implantação de dispositivos burocráticos no interior do Estado brasileiro. Desse modo, a avaliação era que o Estado social-burocrático internalizara controles administrativos visando à legalidade e à impessoalidade de procedimentos estatais, mas o Estado brasileiro se configurava como um híbrido, composto de traços burocráticos ou racionais-legais e patrimonialistas.

Híbrido que jamais dera aos governos a capacidade de implementar seus planos e estratégias. De modo que, ao longo do século XX, os governos se valeram do expediente de criar na estrutura do Estado novas instituições, arranjos paralelos que jamais afrontavam a velha lógica. É desse modo que os governos de Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek fundaram organizações como bancos, empresas e grupos executivos, coexistindo com a estrutura administrativa então existente.

Do mesmo modo, os militares editariam o Decreto-Lei 200/1967, que organizava a administração indireta, dotada de mecanismos mais ágeis e flexíveis para a implementação de políticas. Era uma estratégia de criar uma administração mais moderna, convivendo, todavia, com a burocracia tradicional. Por um lado, havia fundações, autarquias e empresas com menos controles administrativos e maior poder de decisão e cujos funcionários – de perfil quase empresarial – eram mais bem qualificados e remunerados. O advento do Decreto-Lei 200 aprofundaria as distinções entre a burocracia convencional e setores modernos do Estado, marcando uma tensão entre as duas esferas, justapostas na estrutura de Estado.

Disso resultou um Estado precocemente hipertrofiado e todo multifacetado, cujas diversas camadas constitutivas – superpostas por sedimentação passiva –, acabaram por alimentar a formação de uma macrocefálica bifrontalidade: ligadas aos múltiplos interesses societais por inúmeros e muitas vezes invisíveis fios, duas avantajadas cabeças – uma racional-legal, a outra patrimonialista – iriam se comunicar e se interpenetrar funcionalmente em clima de recíproca competição e

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hostilidade, impedindo a imposição categórica de uma sobre a outra, retirando a coordenação do todo e fragilizando o comando sobre as diversas partes do corpo estatal (Nogueira, 1998, 93).

O paradoxo é que mesmo os setores avançados da administração não ficariam imunes ao patrimonialismo. O avanço do Estado militar como dirigente da industrialização, em condições ditatoriais, criaria novos laços de articulação entre segmentos econômicos e burocratas, combinando de modo inédito interesses públicos e privados. Por uma rede de relações, interesses específicos ligavam-se a frações do Estado, distinguindo-se pela maior capacidade de acesso a setores da burocracia. Na falta de canais de representação democráticos, diante do Estado ditatorial, essas redes constituiriam o modo por excelência de relação entre funcionários públicos e empresários, operando sob a forma de filtros seletivos mais ou menos abertos de acordo com o grau de acesso dos agentes privados ao Estado.

A resposta ao hibridismo estatal se configuraria, na década de 1990, a partir de uma Reforma do Estado. O Estado dos novos tempos deveria, entre outros: dissolver os arranjos voltados a proteger a indústria nacional, diante da ampliação da competição internacional (globalização); realizar um ajuste fiscal, economizando recursos públicos e recuperando sua capacidade de investimento; promover as privatizações, retirando o Estado de setores não- essenciais nos quais o mercado seria mais eficiente; criar instrumentos para ampliar a qualidade dos serviços públicos, reformando seu modo de organização.

Seu sentido predominante era a busca da eficiência, tanto para o Estado como para o mercado. De modo que, estimulando sistematicamente relações sociais e econômicas pautadas em maior produtividade, o Estado pudesse atender aos resultados esperados pela população, convertendo-se em coisa pública. Mas a partir de uma estrutura enxuta e de responsabilidades descentralizadas e delegadas para esferas de poder e entidades privadas e não-estatais. Assim, o Estado não cresceria de forma disfuncional, pressionando a carga tributária e, é claro, a competitividade da economia. Desse modo, a Reforma superaria a “bifrontalidade” burocrática e patrimonialista, assim como ajustaria o Estado às condições impostas pela globalização.

Uma parte da Reforma do Estado se dirigia à reconstrução de seu aparelho. Isto é, envolvia o modo de organização do Estado. Em correspondência com o exposto anteriormente, a Reforma do Aparelho do Estado procuraria fundar uma administração pública que superasse o

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patrimonialismo, mas também os controles dos meios, puramente burocráticos, voltados a garantir a impessoalidade dos atos de Estado. Era preciso dirigir a administração à busca por resultados, ampliando o comprometimento do Estado com controles a posteriori, baseados no desempenho, e não na legalidade de seus atos.

Inspirado por essa ideia, o governo encaminhou ao Congresso Nacional, em 1995, um Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado - PDRAE.

Considerando esta tendência, pretende-se reforçar a governança – a capacidade de governo do Estado – através da transição programada de um tipo de administração pública burocrática, rígida e ineficiente, voltada para si própria e para o controle interno, para uma administração pública gerencial, flexível e eficiente, voltada para o atendimento do cidadão (BRASIL, 1995, 13).

O Plano Diretor procuraria guiar uma reforma gerencial no âmbito do Estado. Na melhor das hipóteses, a forma burocrática de Estado estabeleceria controles legais ou administrativos ao Estado. Seu êxito, portanto, seria instituir a impessoalidade como regra de Estado. Ao controle dos meios, contudo, o Plano oporia o controle de fins ou uma administração por resultados. Essa seria a forma por excelência pela qual o Estado brasileiro daria o salto para tornar-se, não mais um árbitro da sociedade, determinando seus rumos, mas um ente a ela subordinado, perseguindo, transparente e eficientemente, o alcance de resultados.

A administração gerencial não era uma ideia originalmente brasileira. Entre tantas ideias importadas dos países desenvolvidos, a reforma gerencial seria mais uma. Suas origens remontam à década de 1980, tendo sido aplicada a países como Inglaterra, Nova Zelândia e Austrália. Embora, por vezes, associada aos dogmas ultraliberais e críticos de qualquer intervenção do Estado, seus defensores salientam que ela não se identifica automaticamente com o que se convencionou chamar de neoliberalismo, posição político-ideológica que nega ao Estado qualquer função ativa no bem-estar social, a não ser na manutenção da ordem e garantia da propriedade.

Podemos ter – e realmente temos – alguns autores que adotam uma visão ultraliberal ao mesmo tempo que apoiam a reforma da gestão pública. Mas são minoria. Os reformadores acreditam na possibilidade da ação eficiente do Estado. Quando certos autores tentam equiparar administração de empresas e administração pública sob o nome de reforma da gestão pública, cometem o erro conservador de não distinguir as diferentes lógicas que, nas organizações, regem as esferas privada e

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pública (Bresser-Pereira, 2009, 360).

Vale sumarizar as posições principais contidas no Plano Diretor. Primeiro, será feita apenas a descrição dos principais conceitos do Plano, para, logo em seguida, apreender seu conteúdo à luz da interpretação do Brasil que põe em funcionamento através das proposições elaboradas. Ou, em outros termos, das visões e índices de valor que inscrevem nas instituições ao guiar a implementação de uma reforma do aparelho do Estado.

O Plano realiza uma distinção do Estado em quatro setores: o estratégico, no qual as decisões estruturais são tomadas, compreendendo os atores governamentais mais elevados na hierarquia; as atividades exclusivas, consistindo dos serviços só prestados pelo Estado, a exemplo do poder de polícia e da fiscalização de impostos; os serviços não-exclusivos, nos quais o Estado atua com o setor privado e organizações não-estatais; e a produção de bens e serviços para o mercado, composto pelas atividades econômicas pelas quais o Estado ainda seja responsável.

A divisão em setores é combinada com o reconhecimento de três formas de propriedade: a estatal, a privada e a pública não-estatal. A articulação das duas categorias – formas de propriedade e setores – constrói uma hierarquia em cujo topo estão os setores estratégicos, ligados exclusivamente à propriedade estatal. São atividades não compartilhadas com o mercado, e seus funcionários, que lidam com decisões estratégicas e formulação de políticas públicas, devem pertencer a carreiras de Estado.

Ainda para as atividades exclusivas, há as agências reguladoras e executivas. As primeiras emergem da concepção de que o Estado não deve intervir diretamente no domínio da produção, mas abri-lo aos mercados e regulá-los por meio de regras transparentes. As agências reguladoras devem contar com autonomia política, necessária para que não sejam formados canais de favor entre reguladores e forças de mercado.

As agências executivas realizam serviços próprios ao Estado como o pagamento de benefícios e a fiscalização e gozam de autonomia administrativa. De modo geral, não nascem como agências executivas, uma vez que originalmente são órgãos que se condicionam às regras burocráticas. A rigor, no Brasil, a conversão de órgãos em agências executivas jamais se consolidou. De todo modo, em 1998, foram estabelecidas, pela Lei 9.649, as condições para que o Poder Executivo qualificasse como agência executiva uma autarquia ou fundação.

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A Lei definia que os requisitos seriam a existência de um plano estratégico de reestruturação e de desenvolvimento institucional e a celebração de um contrato de gestão. Cumpridas essas condições, às agências seria assegurada autonomia de gestão e disponibilidade de recursos para o cumprimento de objetivos e metas do contrato de gestão.

Agências e núcleo estratégico compõem os segmentos da administração voltados a serviços específicos de Estado. Diferenciam-se, contudo, por uma divisão categórica das instituições que formulam, avaliam e gerenciam (núcleo estratégico), por um lado, e aquelas que apenas executam políticas.

Livre das atividades executivas, o núcleo estratégico estará em melhores