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3 A PROMOÇÃO DA COMPETÊNCIA SIMBÓLICA (CS) – BASE TEÓRICA

3.3 Quatro princípios para promover a competência simbólica

3.3.1 Reframing

Frames são modelos cognitivos situacionais baseados na experiência. Eles são

estruturas tipicamente inconscientes por meio das quais nós pensamos. Nossa capacidade de abstração e todo nosso conhecimento depende do uso de modelos cognitivos, os quais estruturam nossos espaços mentais (LAKOFF, 1987). Um espaço mental é qualquer estado de coisas, qualquer situação, fixa ou em andamento, na maneira como a conceitualizamos (LAKOFF, 1987). Os frames, também denominados de scenarios ou scripts, consistem em um tipo de modelo cognitivo e, portanto, também estruturam nossos espaços mentais. Uma palavra é definida em relação aos frames que ela ativa no cérebro. Eles são estruturas operadas fisicamente nos circuitos neurais. Tais estruturas podem ser papéis semânticos, relações entre esses papéis e relações entre frames (LAKOFF, 2010). Eles se relacionam com outros de acordo com as práticas sociais, culturalmente estabelecidas, que os indivíduos experimentam em sua rotina. O meio cultural estabelece valências entre frames e, por isso, é possível pensarmos em sistemas de frames.

De acordo com Lakoff (2010), uma palavra comumente não aciona somente o frame em que ela figura, mas também o sistema de frames em que seu frame se encontra. Lakoff (2010) também salienta que os circuitos neurais dos frames têm ligação forte com as regiões emocionais do cérebro. Por isso que certas palavras podem ativar emoções. E as emoções têm papel preponderante na tomada de decisões (LAKOFF, 2010).

Além de se organizar em sistemas, segundo Fillmore (1982), cada frame é um sistema de conceitos que estão relacionados entre si de forma que, para compreender um desses conceitos em um texto, é necessário compreender todo o sistema (frame) do qual esse conceito faz parte. A noção de frames provém de uma semântica empirista, não de uma semântica formal, e aponta para as categorias de experiência que uma comunidade de fala codifica ao utilizar determinadas formas. A semântica de frames esforça-se para compreender "que razão uma comunidade de fala deve ter encontrado para criar a categoria representada pela palavra, e explicar o significado da palavra por meio da apresentação e clarificação dessa razão" (FILLMORE, 1982, p. 112)35. O autor assevera que as “palavras representam categorizações de experiência, e cada uma dessas categorias é fundamentada por uma situação motivadora que

35 "[…] what reason a speech community might have found for creating the category represented by the word, and to explain the word's meaning by presenting and clarifying that reason” (FILLMORE, 1982, p. 112).

ocorre em relação a um background de conhecimento e experiência” (FILLMORE, 1982, p. 112)36.

Na perspectiva dos frames, interpretar um texto é descobrir em que atividade as pessoas estavam engajadas ao usar as formas linguísticas em um determinado arranjo. Por isso, é possível afirmar que a compreensão do significado das palavras demanda que os sujeitos compreendam também o que está socialmente instituído, isto é, nas palavras de Fillmore (1982), as estruturas de experiência, as quais entendemos que compõem o contexto histórico e sociocultural.

Os frames organizam, estruturam os significados das palavras, e estas, por sua vez, evocam aqueles. É possível distinguir dois tipos gerais de frames: os cognitivos, que nos permitem compreender o mundo, e os interacionais, que nos permitem compreender e organizar a própria interação, conceitualizando o que está acontecendo entre os coenunciadores (cf. FILLMORE, 1982).

Imagem 1 - Cartaz publicitário37

Fonte: <http://www.onextrapixel.com/2009/12/08/60-humorous-print-advertisements-to-tickle-your-bones/>. Acesso em: 27 jul. 2014.

Por exemplo, ao lermos a expressão anti-aging (anti-envelhecimento), na Figura 01 (acima), atribuímos uma interpretação conotativa ao termo “anti-aging”, a de retardar rugas,

36 “[...] words represent categorizations of experience, and each of these categories is underlain by a motivating situation occurring against a background of knowledge and experience” (FILLMORE, 1982, p. 112).

que tem função de hidratante, e não uma interpretação mais literal, denotativa de impedir o envelhecimento do indivíduo de maneira geral, ainda que tal interpretação literal seja sugerida pelas imagens do cartaz.

Podemos dizer que o frame interacional influencia também em nossa compreensão e lida com os significados dos enunciados. Em português, é comum utilizarmos a interrogação “Como vai?”, ao cumprimentarmos alguém, apenas com função fática, sem necessariamente estarmos interessados em saber da situação real em que o interlocutor se encontra. Não compreender bem a situação de diálogo corriqueiro pode levar uma pessoa a relatar que tem passado por adversidades sérias, sem que o indivíduo que lhe perguntou “Como vai?” esteja realmente interessado em ouvir um relato pessoal detalhado.

Apoiados na discussão sobre frames, consideramos que o reframing (reenquadramento) seja útil para o desenvolvimento da CS. É válido salientar que Kramsch (2011, 2008) e Kramsch e Whiteside (2008) já contemplavam a noção de reenquadramento (reframing) de eventos, contextos e distribuição de poder como um componente da CS. No entanto, decidimos reaproximar a noção de (re)framing de suas raízes na linguística cognitiva e conferir a ela um papel mais central na abordagem de ensino-aprendizagem de ILE que propomos com base na promoção da CS. Para o referido viés pedagógico, o princípio de reframing é habilidade de sair de determinado frame (um modelo situacional baseado na experiência) de modo a perceber algo de forma diferente. Isso porque o reframing consiste em evocar ou ativar outros frames em uma determinada situação, de forma que seja possível enquadrar de modo diferente algum assunto, eventos, pessoas, incluindo os próprios coenunciadores e a relação entre eles, ou mesmo a natureza da própria situação de comunicação. Operar um reframing é, portanto, reenquadrar e, com isso, até mesmo recategorizar situações, pessoas e eventos por meio do apelo a outros

frames ou pela mudança de ênfase em certos elementos de um frame. Por exemplo, em uma

situação em que um aluno é flagrado consultando um colega em uma atividade avaliativa em que não deveria haver consulta, o professor pode solicitar que tal aluno responda outro modelo de prova. Em resposta, o aluno poderia pedir evidências de que consultou algum colega, reenquadrando a relação professor-aluno como uma relação entre cidadãos com distribuição de poder mais equilibrada, ou como uma situação em que o professor seria um promotor, e o aluno, um suspeito de infração. Neste caso, o professor poderia destacar que o aluno é quem deveria provar que não consultou colegas e uma das garantias disso seria submeter-se a outra avaliação como atestação de que domina o conteúdo. Neste último caso, o professor estaria reenquadrando a relação docente-discente como uma relação em que há desequilíbrio no balanço de poder, na qual o professor é a autoridade acadêmica, e o aluno não é suspeito, mas

deve seguir suas instruções. No exemplo, tanto o aluno quanto o professor propuseram uma espécie de reframing ao passo em que também negociavam suas relações de poder.

Ora, sendo o frame “um sistema de categorias estruturadas de acordo com um contexto motivador”38 (FILLMORE, 1982, p. 119) e posto que nem sempre concordamos com essa categorização, mas negá-la pode não ser suficiente para deslegitimá-la, é possível recorrer ao

reframing. Portanto, nas interações em que o jogo de poder é travado e pode-se chegar a

resultados injustos, temos no reframing uma possibilidade de reinterpretar textos, situações, eventos e pessoas ao mesmo tempo em que se constrói para si uma posição de maior legitimidade.

Tomemos como exemplo o episódio “White ISIS”, do programa de humor político Daily

Show. O apresentador e o correspondente político referem-se ao então candidato a presidente

dos Estados Unidos, o atual presidente Donald Trump, como sendo o White ISIS ou WISIS, ou seja, o Estado Islâmico Branco. Os realizadores do programa, em que se incluem o apresentador e seu correspondente, não estão, denotativamente, acusando Trump de terrorismo, mas recategorizando-o: em vez de um prototípico político conservador, WISIS sugere que Trump seja um candidato extremista; em vez de democrático, déspota.

Essa recategorização é fortalecida por recortes de enunciados de diversos políticos do partido de Trump nos quais eles o criticam. Ou seja, uma das motivações do reframing da imagem de Trump é convencer os eleitores conservadores de que ele não pode representar os interesses de uma nação democrática. Mais que isso, o reframing de Trump como extremista déspota intentou categorizá-lo como inimigo do próprio país, associando-o a toda uma história mais ampla do que o TV show ou sua campanha (cf. FILLMORE, 1982), que é o terrorismo na dimensão simbólica dos norte-americanos.

Com base na discussão até agora desenvolvida sobre frames e na discussão apresentada posteriormente sobre estratos históricos de significado, podemos antecipar que o apelo a frames diferentes pode resultar em reframing, o qual, por sua vez, suscita diferentes estratos históricos de significado. Enfocar um estrato histórico de significado implica em acionar outros frames, o que pode fortalecer a investida no reframing. Sendo assim, alguém que discorde da categorização de Trump como extremista pode operar discursivamente um reframing em que ele seja categorizado como político patriota e conservador, que coloca os interesses do país acima dos próprios e acima do próprio mercado e das organizações internacionais, fatos que

estão relacionados a outros estratos históricos. Discorreremos, na seguinte subseção, sobre outro princípio da CS, a indexação.

3.3.2 Indexação

Para incluir o princípio da indexação, inspiramo-nos nas pesquisas de Kramsch (2006, 2011) sobre a CS e também em algumas considerações de Ochs (1996) sobre socialização linguística e de Johnstone (2008) sobre os participantes em um discurso. Devido ao fato de que sempre existem variações no modo de conversar e nas ações que os sujeitos realizam com as conversas e também porque há padrões variados de como os sujeitos se ligam socialmente uns aos outros, tais sujeitos necessitam sempre perceber e mostrar que conjunto de alinhamentos sociais é necessário em cada momento de interação e, frequentemente, precisam criar novos conjuntos. Tais estratégias de mostrar, perceber, criar um conjunto de alinhamento social podem ser denominadas indexicalidade (JOHNSTONE, 2008). Segundo a autora,

Uma forma indexical é uma forma ou ação linguística que, além ou em vez de contribuir com o significado denotativo ou “literal”, aponta e, algumas vezes, ajuda a estabelecer significados “sociais”. Formas indexicais podem apontar para significados sociais pré-existentes, mas o uso de um índice também pode criar significados sociais (JOHNSTONE, 2008, p. 133, tradução nossa).39

Dependendo da escolha lexical de um sujeito, poderemos indexar sua filiação a um grupo social ou a uma corrente de pensamento, como por exemplo, podemos perceber se o sujeito é machista ou feminista, se trabalha na área da saúde ou da educação. É possível, ainda, estabelecermos relações de poder imediatas, não apenas nos dirigirmos a alguém, quando nos referimos a tal pessoa como “você” ou “o senhor”. Dessa forma, como assevera Johnstone (2008, p. 133, tradução nossa), “quase qualquer aspecto na interação humana pode funcionar indexicalmente”.40

Para Ochs (1996), a aquisição linguística é parte integrante da socialização humana e vice-versa. Essa integração mútua acontece porque as formas linguísticas constituem as situações sociais, e estas, por sua vez, dão significado às formas linguísticas. Por exemplo, comprar calçados em uma loja no shopping center é constituído, em parte, por enunciados que surgem na interação entre um cliente e um vendedor. A compra/venda dos calçados é

39 “An indexical form is a linguistic form or action which, in addition to or instead of contributing to the denotational or “literal” meaning, points to and sometimes helps establish social meaning. Indexical forms can point to pre-existing social meaning , but the use of and indexical can also create social meaning” (JOHNSTONE, 2008, p. 133).

possibilitada por tais enunciados e dá significado a eles. Desde a mais tenra idade, ao acompanharmos nossos pais ou outra pessoa mais experiente à sapataria, aprendemos os procedimentos convenientes, linguísticos e não linguísticos, para realizar a atividade de comprar calçados em uma sapataria. E entendemos que tais procedimentos são diferentes daqueles necessários para comprar um livro, para iniciar um relacionamento amoroso ou para comprar calçados numa loja virtual. O processo integrado de aquisição linguística e socialização é denominado socialização linguística (OCHS, 1996).

Ochs (1996) propõe que a socialização linguística depende, em grande parte, de três princípios, que estão interligados, a saber, o princípio da indexicalidade, o princípio da cultura universal e o princípio da cultura local. Segundo o primeiro princípio, o significado das formas culturais é uma função que surge de como os sujeitos engajam-se nessas formas em sua conduta social. As formas linguísticas também são tipos de formas culturais. Os sujeitos usam as formas culturais de acordo com a concepção que têm da situação social que estão experimentando. Para participar de uma situação social, os sujeitos, enquanto membros de uma comunidade, acionam seu conhecimento das dimensões socioculturais de cada situação (dimensões situacionais).

Podemos apontar sete dimensões situacionais que interagem entre si na constituição das situações sociais: espaço, tempo, identidade social, ato social, atividade, postura afetiva e postura epistêmica. Vale esclarecer que identidade social engloba, dentre outros, papéis (enunciador, coenunciador, bisbilhoteiro, professor, médico, aluno), relacionamentos (parentesco, ocupacional, amizade), identidade de grupos (gênero, geração, etnia, classe social, pertencimento a comunidade acadêmica), ranque (coordenador, autoridade eclesiástica etc.). Ato social é um comportamento socialmente reconhecido direcionado a um objetivo (por exemplo, uma solicitação, uma pergunta, um elogio, uma ameaça). Atividade é uma sequência de dois ou mais atos sociais (contar uma história, entrevistar, aconselhar, barganhar). Postura afetiva diz respeito ao “humor, atitude, sentimento e disposição, bem como gradações de intensidade emocional vis-à-vis algum foco de interesse”41 (OCHS, 1996, p. 410). Postura epistêmica refere-se ao conhecimento ou à crença em relação a algum foco de interesse, em que se incluem gradações de certeza quanto ao conhecimento sobre determinado tópico, graus de comprometimento com a veracidade de alguma proposição, fontes de conhecimento e outras qualidades epistêmicas (OCHS, 1996).

Tendo em mente os esclarecimentos acima, podemos afirmar que o princípio da indexicalidade depende de atribuir significados situacionais (espaço, tempo, identidade, ato,

41 “mood, attitude, feeling, and disposition, as well as degrees of emotional intensity vis-à-vis some focus of concern” (OCHS, 1996, p. 410).

atividade, postura afetiva, postura epistêmica) a formas culturais, dentre elas, as formas linguísticas (léxico, entonação crescente, diminutivos, formas interrogativas, formas exclamativas etc.). É por isso que a socialização linguística, tanto de crianças em sua comunidade nativa – como é o caso do interesse de pesquisa de Ochs (1996), como no caso de aprendizes de línguas estrangeiras, depende muito, embora não exclusivamente, da habilidade de indexar. Um índice linguístico pode ser definido como “uma estrutura [...] que é usada variavelmente de uma situação para outra e se torna convencionalmente associada a dimensões situacionais particulares de forma que, quando aquela estrutura é usada, a forma invoca estas dimensões situacionais”42 (OCHS, 1996, p. 411).

O status de membro de uma comunidade é adquirido quando um iniciante (criança ou aprendiz de língua estrangeira) consegue lidar e mover-se bem em situações configuradas linguisticamente. Para tanto, o sujeito precisa indexar, ou seja, estabelecer relações entre formas linguísticas e as dimensões situacionais supracitadas. Vale salientar, contudo, que não são nada incomuns os casos em que um sujeito utiliza determinada estrutura para indexar uma situação dimensional e outros sujeitos envolvidos não lhe atribuem o mesmo significado, ou seja, não fazem a mesma indexação (OCHS, 1996).

Segundo Ochs (1996), mais do que a falta de entendimento entre coenunciadores, modos diferentes de indexar podem ocasionar interações malsucedidas quando a interação ocorre em língua estrangeira. A autora também considera que o conhecimento indexical é central para a competência linguística e a competência cultural, já que é o local de interface entre aquisição linguística e socialização (OCHS, 1996). Não considerarmos que um adolescente ou adulto aprendiz de língua estrangeira esteja sendo socializado na comunidade e na cultura-alvo da mesma forma que uma criança em sua cultura e língua nativa, mas que tal aprendiz tende a apreender a cultura e a língua-alvo muitas vezes na relação com sua própria língua e cultura. Nesse caso, é possível pensar que a indexação aconteça variadas vezes, para o aprendiz, entre formas linguísticas da língua-alvo e as dimensões situacionais da comunidade de origem do aprendiz. Entram em jogo aqui os princípios da cultura universal e da cultura local.

O princípio da cultura universal consiste no fato de que coenunciadores humanos utilizam meios linguísticos semelhantes para alcançar fins sociais semelhantes, em várias comunidades do mundo. Em todas as sociedades, os sujeitos utilizam formas linguísticas para indexar dimensões situacionais. Existem categorias de postura (afetiva e epistêmica)

42 “a structure [...] that is used variably from one situation to another and becomes conventionally associated with particular situational dimensions such as that when that structure is used, the form invokes those situational dimensions” (OCHS, 1996, p. 411).

comparáveis em várias comunidades do planeta, assim como um grande número de comunidades utiliza determinadas formas linguísticas para indexar posturas e atos sociais comparáveis (por exemplo, a incerteza é amplamente indexada por entonação crescente, estruturas interrogativas e modalizadores discursivos) (cf. OCHS, 1996). No entanto, o princípio da cultura universal é limitado, pois i- não se aplica a todas as práticas indexicais; ii- porque algumas práticas indexicais são comuns a várias, mas não a todas as comunidades e iii- porque as práticas indexicais podem resultar em consequências imprevisíveis (OCHS, 1996).

Para compreendermos o princípio da cultura local, é necessário termos a noção, também proposta por Ochs (1996), de valência indexical. A ideia é a de que, em todas as comunidades, os sujeitos têm uma compreensão tácita sobre normas, preferências e expectativas de como as dimensões situacionais ligam-se umas às outras. Tais ligações, ou valências, são socioculturalmente construídas. Portanto, uma cultura local é, em grande parte, mas não totalmente, influenciada pelas valências localmente específicas que ligam as dimensões situacionais. Por exemplo, a identidade social de pastor protestante indexa, em muitas comunidades presbiterianas, a atividade social de impetrar a bênção final dos cultos. E, em se tratando das Igrejas Presbiterianas do Brasil, tal bênção é finalizada com uma canção, o Tríplice Amém. Portanto, a ligação entre a identidade de pastor e a referida atividade social (impetrar a bênção e conduzir a congregação na entoação do Tríplice Amém) é uma valência indexical socioculturalmente construída. Portanto, mesmo que uma pessoa que frequenta essa denominação religiosa visite uma congregação diferente da sua, antes de ser apresentado, poderá saber que aquele que impetrou a bênção e cantou o Tríplice Amém na sequência é um pastor.

Considerando que, além das práticas indexicais comuns a várias comunidades, existem outras localmente específicas, seria impossível abordar amplamente os mais variados exemplos de indexicalidade na sala de aula de língua estrangeira. A ideia de incluir a indexação como ferramenta para promover CS não consiste, portanto, em trabalhar exaustivamente com listas de práticas indexicais condensadas ou diluídas no currículo. Sugerimos que o desenvolvimento da CS pode ser promovido pela sensibilização à indexação, possibilitada por atividades que considerem a lide com significados estabelecidos indiretamente. Destacamos que, neste trabalho, referimo-nos por “indexicalidade” o fenômeno linguístico abordado por Ochs (1996). Por “indexação”, estamos nos referindo ao princípio que propomos para promover a CS e à utilização índices no discurso.

Tomemos como exemplo de indexação dois trechos de um poema humorístico abordado em sala de aula junto com os estudantes participantes desta pesquisa (cf. seção 5.3):

I've fallen in love- I don't know why I've fallen in love with a girl with one eye. [...]

She'll not leave me waiting, not left in the lurch If she looks slightly sideways she'll see me in church.43

Fonte: < http://www.familyfriendpoems.com/poem/my-oneeyed-love>. Acesso em: 24 jan. 2016.

O fato de termos, na cultura ocidental, a metáfora de que o amor é cego aponta para a dificuldade de se explicar como o amor acontece, começa ou exatamente por que alguém se apaixona por uma pessoa e não por outra. Há quem diga que não é fácil distinguir quando apenas se gosta de alguém ou se ama alguém de fato. Mas é possível dizer que, apesar da metáfora, a atração física está presente nos relacionamentos amorosos. Existe uma relação entre beleza e atração, assim como a beleza parece estar relacionada, em parte, à simetria física e a um padrão culturalmente estabelecido, a que nem sempre obedecemos. O fato de o eu-lírico se apaixonar