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Parte I – Problema de investigação

7. Reestruturação Global dos finais do século 20

2.1.1. O “regime de acumulação” Fordista

O fordismo iniciou como forma de organização do trabalho em 1914 com o estabelecimento do 5 dólar, oito horas dia por Henri Ford numa fábrica de Michigan. Ford baseou na obra de Frederick W. Taylor de 1912 “princípios da gestão científica”, onde defendia a forma “como a produtividade do

trabalho podia ser radicalmente aumentada através da decomposição de cada processo de trabalho em movimentos de componentes e organizar tarefas de trabalho fragmentadas de acordo com standards rigorosos de estudo de tempo e movimento” (Harvey, 1989:125).

A inovação de Ford consistiu na defensa da produção e consumo de massa e uma nova forma de exercício do poder corporativo.

“O que era especial em Ford, (e em ultima análise separa Fordismo de Taylorismo), era a sua visão, seu reconhecimento explícito que produção de massa significava consumo de massa, um novo sistema de reprodução do poder laboral, uma nova política de controlo e gestão, uma nova estética e psicologia, em resumo, um novo tipo de sociedade democrática racionalizada, modernista e populista” (Harvey, 1989:125-6).

Em relação ao exercício do poder corporativo, Ford entendia que o mesmo era fundamental na regulação da economia. Em várias tentativas procurou desenvolver práticas neste sentido (v.g. defesa do 5 dólar e oito horas por dia para assegurar compromisso do trabalhador com a linha de montagem, rendimento e tempo de lazer suficiente para consumo da produção de massa que a

corporação empreendia; envio de assistentes sociais aos domicílios dos seus trabalhadores para constatar a sua aptidão para gastar corretamente o dinheiro). A regulação da economia através do poder corporativo como defendia era contudo ineficiente. Apesar da constituição como modelo de organização laboral desde 1914, o Fordismo apenas constitui como regime estável de acumulação depois da segunda guerra mundial.

Duas razões são apontadas por Harvey como os principais obstáculos à expansão do Fordismo no período entre as guerras. A primeira relaciona-se com a luta dos trabalhadores contra métodos de trabalho rotinizado na linha de montagem.

“Para começar, o estado das relações de classe em todo o mundo capitalista dificilmente era propício à fácil aceitação de um sistema de produção que se apoiava tão fortemente na socialização do trabalhador para longas horas de trabalho puramente rotinizado exigindo pouco de habilidades manuais tradicionais e concedendo um controlo insignificante ao trabalhador sobre o desenho, ritmo e organização do processo produtivo” (Harvey, 1989:128).

Neste campo destacam-se as lutas intensas da classe de trabalhadores com o grande poder corporativo. Nos EUA a lei Wagner de 1933 havia atribuído poderes consideráveis a movimentos de trabalhadores nas relações de trabalho. Contudo anos de luta com os capitalistas corporativos levaram à criação da Lei Taft-Hartley em 1952 e a derrota dos movimentos radicais dos trabalhadores.

A segunda refere-se aos modos e mecanismos da intervenção do estado.

Uma nova forma de regulação tinha de ser concebido para corresponder aos requisitos da produção Fordista e foi preciso o choque da depressão selvagem e quase-colapso do capitalismo nos anos 30 para empurrar as sociedades capitalistas para uma nova concepção de como o poder do estado devia ser concebido e implantado” (Harvey, 1989:129).

Várias tentativas em muitas nações procuraram encontrar, face à crise de 1929, um modelo de arranjo institucional, político e social que conseguisse lidar com “ (…) a crónica incapacidade do

capitalismo para regular as condições essenciais para a sua própria reprodução”. O New Deal de

Roosevelt para enfrentar a crise nos EUA e o trabalho de Keynes sobre o papel do estado foram os principais contributos. Segundo Keynes sendo a referida crise resultado de falta de procura efetiva a intervenção do Estado, tanto a nível de fortes investimentos públicos (fomentou a reconstrução pós- guerra) como através de políticas monetárias e fiscais, poderia colmatar este défice.

“Na medida em que produção de massa, que exigia fortes investimentos em capital fixo, que requeria condições de procura relativamente estáveis para ser lucrativos, o Estado se esforçou para controlar ciclos económicos através de um mix apropriado de políticas fiscais e monetárias no período pós- guerra. Tais políticas foram direcionadas para áreas do investimento público – em sectores como transportes, serviços públicos, etc.. - que eram vitais para o crescimento da produção e consumo de massa, e que podia também garantir relativo pleno emprego. Governos igualmente agiram para

providenciar um forte alicerce para o salário social através de gastos cobrindo segurança social, saúde, educação, habitação etc. Além disso, o poder do estado era exercido, tanto directa como indirectamente, sobre acordos salariais e direitos dos trabalhadores na produção (Harvey, 1989:135).

A seguir à segunda guerra mundial, um binário Fordismo-Keynesianismo conceptualizando a forma de organização da atividade produtiva (regime de acumulação) e a intervenção do estado (papel regulação de forma a facilitar e fomentar a procura efectiva tornando viável o regime de acumulação Fordista foi responsável pelos 30 anos de glória (1945-1973).

“O tenso mas mesmo assim firme equilíbrio de poder que prevaleceu entre o trabalho organizado, o grande capital corporativo, e o estado nação, e que formou a base do poder para o boom pós-guerra (…) (Harvey, 1989:133) dependeu de uma serie de “compromissos” e “reposicionamentos” dos vários

actores que compõe o processo de desenvolvimento capitalista.

O grande poder corporativo e a intervenção do Estado obtiveram acordos com sindicatos de trabalhadores no sentido de colaboração em métodos de aumento de produtividade em troca de prémios de produtividade (aumentos salariais). O grande poder corporativo aceitou, por este facto, a contragosto, algumas exigências do poder de sindicatos, beneficiando de maior lucro. O Estado Providencia beneficiou também de um volume grande de receitas. Assim garantia aos que não foram incluídos nos benefícios do fordismo forte apoio a salários assim como um grande volume de serviços sociais.

“Estado tinha que tentar e garantir algum tipo de salário social adequado para todos, ou se engajar em políticas redistributivas ou acções legais que iriam activamente corrigir as desigualdades, enfrentar o empobrecimento relativo e falta de inclusão das minorias. Cada vez mais, a legitimação do poder do Estado dependia da capacidade de difundir os benefícios do fordismo para todos e para encontrar maneiras de oferecer cuidados de saúde adequados, habitação e serviços educacionais em grande escala, mas de uma forma humana e solidária. Falhas qualitativas neste campo foram alvo de inúmeras críticas, mas no final foi provavelmente a falha quantitativa que provocaram os mais sérios dilemas. A capacidade de fornecer bens colectivos dependia de contínua aceleração da produtividade do trabalho no sector corporativo. Só assim poderia o estatismo de bem-estar keynesiano ser tornado fiscalmente viável” (Harvey, 1989:139).

Pós-guerra foi considerado como uma “forma total de vida”. Um estilo, uma cultura (produção e consumo de massas). Grande parte do boom no fordismo pós-guerra deveu-se também a uma expansão do comércio mundial e circulação do investimento internacional sob a hegemonia dos EUA. Apenas após 1939 fordismo expandiu para a Europa e Japão incluído no esforço de guerra. Na Europa sobretudo pela Aplicação do Plano Marshal e investimento directo dos EUA.

Apesar das críticas o Fordismo manteve-se com um ambiente relativamente estável para os lucros de grandes corporações, foi possível manter um crescimento elevado com relativo “pleno emprego”, padrões materiais de vida aumentou nos países desenvolvidos capitalistas até à recessão de 1973.