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1.2 O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA FEMININA NO BRASIL

1.2.6 Regime Democrático (1988 em diante): Cidadania Plena para Todos?

Em 1988, foi promulgada a nova Constituição Federal que, marcou o restabelecimento do Estado democrático, apresentando assim uma ruptura com o passado excludente. Desde então, todos os homens, mulheres, brancos, negros, crianças, idosos, deficientes físicos, entre outros se tornaram cidadãos plenos de direitos.

Esta Constituição passou a garantir e ampliar os direitos políticos, civis e sociais. Em relação aos direitos civis, foram amplamente assegurados pelo artigo 5º, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se... a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade...” (Capítulo 1, artigo 5º da CF-88). Quanto aos direitos políticos, “a soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos...” , agora jovens de 16 anos, facultativamente, podem votar e analfabetos (Capítulo IV, artigo 14º da CF-88). E, no que se refere aos direitos sociais, houve a garantia do que já existia e ampliação com o surgimento de novos direitos, garantindo em lei: “a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados” (Capítulo II, artigo 6º, da CF-88).

A ampliação dos direitos para todos, se deu independente do vínculo empregatício, todavia o trabalho ainda continuou sendo o fundamento importante para a cidadania. Isto não mudou. Pois, mesmo a seguridade social – saúde, seguridade social e assistência social – tendo sido estendida a todos os cidadãos, independente do vínculo empregatício, a contribuição desse sistema permaneceu, só que agora por outras vias. A saída que se teve para que esse sistema ampliasse seu atendimento, foi a partir da diversificação das fontes de financiamento. As contribuições passaram a ser feita sobre a folha de salários (de empregados, empregadores, autônomos), sobre o lucro líquido das empresas, pelo COFINS (Contribuição para o Financiamento da Seguridade), PIS/Pasep, entre outros.

Mas cabe colocar que a garantia desses direitos em lei é uma conquista, mas sua efetivação na prática é outra coisa. E fatores têm contribuído para a não concretização das conquistas da Constituição em vigência: uma delas é que o Brasil por ser marcado por ampla desigualdade social, por muitos séculos, continua a existir a desigualdade e discriminação de diversos setores populares no que se refere ao acesso aos direitos previdenciários, acesso à justiça e eqüidade social, à moradia, à educação e à saúde de qualidade.

Por outro lado, o contexto que se configurou nos anos 90 foi de reestruturação do processo produtivo e globalização, que estimulou a abertura das economias nacionais para competição global, mundialização do capital financeira, reduziu o poder de barganha e o controle das instituições nacionais. Sendo assim, conforme Luca:

“As determinações constitucionais, que caminhavam na direção de uma noção ampliada de cidadania, logo passaram a ser alvo de críticas pelos defensores da livre atuação do mercado. Os limites à entrada de investimentos estrangeiros e a proteção ao trabalhador foram vistos como

limitações à integração da economia nacional ao mercado de trabalho” (2003, p.489).

A implantação do sistema neoliberal no país teve conseqüências profundas nas relações trabalhistas e processo produtivo. Acontecendo em ritmo acelerado a precarização o aumento do desemprego, da vulnerabilização das relações de trabalho, contratação do trabalhador em tempo parcial, temporário ou subcontratato. Como também, flexibilizou a mão-de-obra, a terceirização e o crescimento da economia informal romperam com a relação salário-produtividade. Como conseqüência imediata o aumento da pobreza e da desigualdade social tornou-se comum para amplos de segmentos da sociedade brasileira e neste quadro as mulheres se encontram mais dentro deste contexto de pobreza e de desamparo social. E, o que tem acontecido com os direitos cidadãos femininos diante desse quadro de precarização do trabalho? E as recentes conquistas garantidas pela Constituição Federal de 1988?

Neste final de século, mesmo diante de todos os direitos que as mulheres conquistaram em lei, em especial no que se refere ao trabalho, elas se inserem no mercado de trabalho nas piores condições. Pois, são as principais a responder a essa nova demanda de mercado reestruturado e globalizado. As trabalhadoras estão em sua grande maioria inseridas em maior número nos setores informais, precários, estão propícias ao desemprego, recebem salários inferiores aos homens entre outros fatores que estabelecem uma precária inserção no mercado de trabalho.

As conquistas na área trabalhista, garantidos pela Constituição Federal, foram amplas, como: a proibição do trabalho noturno, perigoso e insalubre; licença à gestante, sem prejuízos do emprego e do salário, com a duração de cento e vinte dias, a maternidade foi reconhecida como função social e teve o tempo de licença estendido; com a licença paternidade, as mulheres passam a serem contempladas também; assistência gratuita aos filhos e dependentes desde o nascimento até seis anos de idade em creches e pré-escolas; a proibição de diferença de salários, de exercício de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado civil, acerca do trabalho feminino; a proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos temos da lei.

Todavia, se a cidadania social é ter um conjunto de direitos que possibilita a igualdade em relação aos homens e a eliminação da discriminação, infelizmente, estes não têm sido efetivados na prática. Ainda são grandes as diferenças e disparidades entre as mulheres e homens no que se refere ao acesso ao trabalho, ao recurso econômico e cultural que poderiam lhes proporcionar oportunidades e trajetórias diversas. E, isto ainda é resultado das

particularidades de sua própria história que determina o favorecimento diferenciado em relação aos homens. Mas, será que se pode afirmar que as mulheres são cidadãs plenas? Quais os dispositivos legais de proteção social que garantem a cidadania feminina? Como garantir cidadania plena para mulheres que se encontram afastadas da riqueza social?

Eis aqui questionamentos que são latentes nos estudos de mulheres e feministas em relação à cidadania feminina. Apesar do Brasil viver um momento de “democracia” política as mulheres ainda não possuem direitos plenos de cidadania garantidos. Apesar da criação de um amplo sistema de proteção social, que apresenta limitações, novos caminhos estão sendo criados pelas mulheres diante da desvalorização do trabalho feminino. Assim, reconhecer as mulheres brasileiras enquanto cidadãs em lei é um grande avanço, mas para que estes se concretizem de fato ainda existe um longo caminho a percorrer.

Desta forma, observa-se que a construção da cidadania feminina brasileira se deu num contexto sócio, político e econômico muito fragilizado. Ainda são precários os sistemas e medidas que acompanhem e proteja os direitos de cidadania feminina. Muitos são os questionamentos e indefinições que existem em relação à esta. Verifica-se que ganhos significativos ocorreram, tanto para homens quanto para as mulheres, mas a construção de uma igualdade de gênero ainda é um processo “árduo e complexo” que se tem de lutar, acompanhar e proteger.

Contudo, como não se pretende esgotar nesse primeiro momento a discussão sobre a cidadania feminina. A seguir será apresentada uma discussão sobre a participação do movimento feminista na luta pela ampliação de direitos cidadãos, bem como acerca da inserção das mulheres da Região Metropolitana do Rio de Janeiro no mercado de trabalho, visando conhecer e analisar aos fatores que foram de suma importância para a o aumento da consciência de gênero, reivindicação e luta para conquista dos direitos da cidadania feminina brasileira.

CAPÍTULO II