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II. REVISÃO DE LITERATURA

5. A certificação no processo de decisão de compra de AO’s

5.1 Regulamentação, processos, certificação e auditoria de AO’s

Uma base regulamentar para a monotorização e a certificação de produtos ali- mentares orgânicos ao longo de toda a cadeia de valor exerce um papel fundamental tanto na criação como no desenvolvimento deste mercado. A regulamentação e as nor- mas existem hoje em todas as áreas de atividades humanas e, no caso da indústria ali- mentar, traduzem-se em logomarcas ou selos de conformidade impressos nas embala-

gens, cuja qualidade comunicada é assegurada por fiscalização e certificação. Neste contexto, a regulamentação traduz-se numa ação governamental com o objetivo de pro- teger o mercado e todos os seus intervenientes de práticas fraudulentas, ações oportunis- tas, concorrência desleal e uso indevido do termo “certificação”.

Os sistemas de certificação são normalmente apoiados em normas de referência, padrões e estruturas de acreditação, certificação e auditoria. As normas de referência são normas que estabelecem os requisitos mínimos para a certificação de processos ou pro- dutos. Os padrões são valores de referência que servem de base para avaliações. A acre- ditação é a avaliação e o reconhecimento de órgãos certificadores. A certificação é o procedimento pelo qual os órgãos certificadores avaliam e emitem certificados, com- provando que os requisitos mínimos exigidos por normas de referência e requisitos legais foram atendidos. Por último, a auditoria é o procedimento para a verificação in

loco, através de evidências objetivas, de que os sistemas de produção e de valor aten-

dem aos requisitos mínimos exigidos por normas de referência e requisitos legais. Apoiada nos critérios definidos e nos padrões estabelecidos, seja pela IFOAM15, pelo Codex Alimentarius16, pela regulamentação europeia ou regional, são feitas as ins- peções com a finalidade de verificar fraudes e desenvolver ações legais cabíveis. A cer- tificação, em termos gerais, é uma declaração afirmativa sustentada em procedimentos de verificação e de confirmação do produto e, principalmente, dos seus processos em relação aos padrões estabelecidos. No caso dos produtos orgânicos, a certificação cen- tra-se essencialmente em verificar a correspondência dos processos de produção (e não tanto dos produtos) com os padrões estabelecidos. Os produtos orgânicos devem, por- tanto, estar de acordo com os princípios orgânicos que se referem ao processo de produ- ção e não ao produto final (Jahn et al., 2005), uma vez que a qualidade orgânica não pode ser testada tendo como base as caraterísticas presentes no produto final, mas deve ser verificada nas áreas de produção e de transformação. Efetivamente, conforme referi-

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A Federação Internacional do Movimento da Agricultura Orgânica é uma ONG sediada em Bonn, no ano de 1972, na Alemanha. Fundada com a missão de dirigir um movimento internacional que congrega pessoas e organizações de diferentes setores da sociedade envolvidos com a produção, transformação, transporte, comercialização e consumo dos produtos orgânicos. É considerado o mais importante organismo mundial de movimentos de certificação. Elabora as normas básicas para a agricultura orgânica, a serem seguidas por todas as associações filiadas mundialmente.

16 A Comissão do Codex Alimentarius foi estabelecida em 1962 para executar o programa conjunto da Organização

das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação – FAO e a Organização Mundial de Saúde – OMS sobre normas alimentares, em que os objetivos são elaborar as normas, as recomendações e as diretrizes destinadas a servir de modelo para legislação de alimentos nos Estados Membros do Codex. As suas finalidades centram-se na proteção da saúde dos consumidores, em facilitar o comércio internacional e assegurar práticas equitativas no comércio de ali- mentos, bem como promover a coordenação internacional de todos os padrões para os alimentos.

do por Neves (2005), os testes, no produto final, servem apenas para identificar produ- tos que não são orgânicos, que contenham substâncias não permitidas.

A história da regulamentação dos produtos alimentares de qualidade iniciou-se em França, no início do século XX (1919), no setor vinícola artesanal, como resposta aos avanços das vinícolas industrializadas, estando portanto a política, nesta primeira fase, voltada para a proteção de micro setores. Mais tarde, na década de 80, a política passa a ter uma visão de desenvolvimento rural, uma saída para a crise agrícola europeia dos anos 80, como por exemplo excedentes agrícolas e alto custo dos subsídios, onde as normas estipuladas nos manuais de qualidade são negociadas entre os diversos envolvi- dos na cadeia produtiva. Em meados da década de 80, a Comunidade Económica Euro- peia iniciou uma política de harmonização das normas contidas no documento “Nouvel- le Approach, 1985” que culminou com a definição de regulamentação, iniciando-se com a agricultura orgânica, em 1991, quando a CE (CEE) adotou a Diretriz n.º 2092/91, para produção orgânica de origem vegetal, e em 1999, a Diretriz n.º 1804/99, relativa à pro- dução orgânica de origem animal (Fonseca, 2001) (ver Regulamentos em Anexo 3). Desde janeiro de 1993, qualquer produto fresco e processado de origem vegetal vendido na UE como “orgânico” (ou biológico/ecológico) deve estar de acordo com os stan-

dards orgânicos estabelecidos pela CEE 2092/91.

Na União Europeia (UE) apenas os produtos conformes com os princípios da produção orgânica podem ser rotulados e vendidos como AO’s [Regulamento (CE) n.º 834/2007]17. No ponto de venda, para que conste a indicação de produto orgânico certificado, são utilizados os logótipos de certificação orgânica nas embalagens dos produtos e, desde julho de 2010, que todos os produtos orgânicos pré-embalados produzidos e vendidos na UE devem ser rotulados com o novo logótipo da UE [Regulamento (UE) n.º 271/2010]. Nada impede que na UE a este logótipo obrigatório se possam associar outros de organizações particulares (por exemplo, Associações de Agricultores). No entanto, sendo que o alvo dos selos/logótipos de certificação orgânica são os consumidores finais (Jahn et al., 2005), nem sempre a sua proliferação é benéfica do ponto de vista da perceção do consumidor. Pese embora, a revisão bibliográfica efetuada para este estudo não evidenciar uma preferência clara dos consumidores por particulares logótipos de certificação orgânica, o facto é que, por um lado, a disposição do consumidor para pagar mais por um produto orgânico que tenha selo de certificação

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é maior e, por outro lado, esta mesma disposição varia significativamente entre diferentes selos de certificação, com clara vantagem para aqueles que são reconhecidos e percebidos como credíveis e rigorosos nos seus sistemas de controlo e certificação no que aos padrões orgânicos diz respeito (Janssen e Hamm, 2011a), e que, segundo Albersmeier et al. (2010), deverão estar alocados a certificadores (privados ou públicos mas credenciados pelas autoridades competentes) independentes da cadeia de valor, na mediada em que o consumidor lhe atribui maior confiança. Segundo Dabbert (2011), são mesmo um contributo viável para resolver o problema da incerteza relacionada com a qualidade dos AO’s. Este facto surge evidente no estudo desenvolvido por Bai et al. (2013) ao aferir que o desejo de consumo de leite rastreado e certificado por parte dos consumidores chineses urbanos está significativamente relacionado com as instituições que emitem os certificados e a credibilidade das mesmas. Na altura do estudo, a preferência dirigiu-se para a certificação que é conferida pelo governo em detrimento da certificação da associação industrial e da certificação de terceiros. Neste sentido, por si só, a existência de um logótipo de certificação, ou a existência de mais um logótipo de terceiros, não acrescenta necessariamente maior credibilidade ao produto, exceto se tal contribuir para a formação da perceção dos consumidores sobre o sistema de certificação por detrás do produto e, que tal permita ao consumidor a identificação e o reconhecimento de que os aspetos que lhe são mais relevantes, por exemplo a saúde, a segurança, o bem-estar animal e a preocupação ambiental, foram salvaguardados. Neste ponto é evidente que o marketing/comunicação ao utilizar eficientemente estes aspetos nas suas mensagens, assume um papel de particular importância e impacto na perceção dos consumidores sobre o que está por detrás de um logótipo de certificação orgânica, contribuindo, este, para esbater o ceticismo em torno dos AO’s e melhorar a relação de valor/custo percecionada por aqueles (Janssen e Hamm, 2011; Pearson e Henryks, 2008; Ottman et al., 2006). Efetivamente, a título de exemplo, conforme o United States

Department of Agriculture (USDA), a garantia dos requisitos e das normas do selo de

certificação orgânica não implicam, por si só, que os AO’s sejam mais saudáveis (Guilabert e Wood, 2012); porém, pode contribuir para essa perceção e esse reconhecimento, por parte do consumidor.

5.2 A materialização da certificação ‒ o logótipo ou selo de certificação de AO’s