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Relação entre o Movimento da Reforma Sanitária Brasileira e Partidos Políticos nos anos 70: pontos de vista dos agentes

5 3 Projeto Andrômeda: uma das redes de articulação para a RSB

N: Não eram os articuladores e muito menos se reuniam para combinar como

6. RELAÇÕES ENTRE O MOVIMENTO PELA RSB E OS PARTIDOS POLÍTICOS NOS ANOS 70-

6.1 Relação entre o Movimento da Reforma Sanitária Brasileira e Partidos Políticos nos anos 70: pontos de vista dos agentes

Em que medida a iniciativa das ações das entidades protagonistas da RSB como CEBES e ABRASCO eram mediadas por discussão partidária? Em outras palavras, procurou-se saber se os agentes da RSB discutiam, no partido ao qual pertenciam, como deveriam participar do movimento, temas a serem discutidos e propostas a serem apresentadas, antes de levar essas propostas para as entidades mais vinculadas à RSB, como o CEBES e, posteriormente, a ABRASCO, à luz de suas trajetórias. Vários dos nossos entrevistados confirmaram a existência de uma relação, discorrendo sobre sua natureza em diversos momentos da conjuntura. Vejamos o que eles disseram:

A entrevistada 8, cientista social de grande relevância para a RSB e para o CEBES, que era filiada ao PCB, traz diversos elementos que apontam a relação entre o Movimento e o Partido, enfatizando a contribuição que este teria, segundo seu ponto de vista, dado à organização do Movimento. A pergunta que gerou a reflexão da entrevistada sobre esta questão era relativa a gostos culturais comuns entre os militantes da RSB, interrogando-se até que ponto isso contribuía para reuni-los, em termos de convivência, ou se era a própria questão política da RSB que preponderava como “elo de ligação” entre eles.

120Ou mesmo decorre da conjuntura repressiva onde não era possível falar em partidos e as organizações de

massa eram as “correias de transmissão” das ideias dos partidos em uma visão crítica da atuação dos partidos, como vimos na dicotomia direção consciente x espontaneismo.

Eu penso que era política, grande coisa que nos unia era a política. A gente saia do CEBES, a reunião do CEBES era no centro da cidade no sindicato dos médicos e depois disso, a gente ia, todo mundo, para o “Amarelinho”121. Então, todas as reuniões terminavam com grande confraternização, era uma coisa muito legal isso. Depois, quando o Arouca encheu o saco, ele já ia direto para o “Amarelinho” então, ia mais para a reunião, ele encontrava a gente só depois, ele não deixava de ir, diretamente para lá. Era assim, muito forte essa ligação que nós tínhamos. As pessoas se namoravam umas as outras, tinha grandes identidades ali. O grupo era muito próximo, muito afetivo, havia muita solidariedade entre essas pessoas também. Eu acho que a experiência, a ligação dessa reforma com o partido

comunista, eu faço muita questão de sobressaltar por que acho que é pouco ressaltada e eu penso que a experiência de solidariedade, de organicidade do partido, ela foi fundamental. Sem isso, esse negócio não tinha dado certo por que

tinha que saber fazer política e o partido sabia fazer. Então, acho que isso foi fundamental, acho que foi fundamental, por exemplo, o papel de liderança do

Arouca para nos congregar e a experiência do partido para dar organicidade

a tudo isso (Entrevistada 8).

Percebemos que a entrevistada destaca não apenas a liderança de Antônio Sérgio Arouca, mas sua experiência no partido, no caso o PCB, como fundamental para fornecer organicidade ao movimento, organicidade esta construída em torno da identidade política, mas que se mesclava com a construção de laços de amizade e comprometimento afetivo entre os membros do grupo. Ela ressalta a relação com o partido comunista, chamando a atenção para um aspecto, a solidariedade entre os militantes, que talvez tenha a ver inclusive, com o fato de atuarem na clandestinidade, situação em que tratavam de se proteger, uns aos outros, em função dos riscos que corriam diante da ação dos aparatos repressivos do Estado. A política, a adesão ao projeto da RSB, o companheirismo e solidariedade, eram os articuladores dessa união de forças, entretanto o “saber fazer política”, contribuição específica da atuação no partido, é destacado pela entrevistada, e é uma das formas que os partidos, e em especial o PCB, teriam contribuído para a RSB.

Na sequência, a entrevistada fala de como a experiência no partido criou condições para a elaboração de estratégias de ação voltados ao enfrentamento das adversidades do tempo da ditadura, agregando elementos que corroboram a importância dos laços de solidariedade entre os militantes. O trecho a seguir evidencia uma das estratégias utilizadas para garantir a permanência no Brasil, de militantes que eventualmente perderam seus empregos ou estavam impossibilitados, por questões políticas, a trabalhar em organizações

121 Bar situado no centro do Rio de Janeiro, ponto de encontro de intelectuais, artistas e pessoas ligadas aos

estatais, principal empregadora de sanitaristas no período, pela própria natureza de seu perfil profissional.

Ah... As primeiras reuniões do chamado partido sanitário, você tinha o CEBES que era uma coisa, você tinha o próprio partido comunista, que era outra coisa, tinha os lugares que nós trabalhávamos, o PESES e tudo mais, mas, além disso, tinha o movimento, o partido sanitário que, tem toda aquele, conjunto de reuniões que atravessou essas décadas todas e, por exemplo, a primeira reunião, que foi na casa do Arouca, no dia seguinte foi na minha casa, por que não podia ter dois dias na mesma. Vai que a policia e ainda por cima as pessoas entravam de quinze em quinze minutos assim, para não chegar nos horários, demorava horas para começar a reunião, que não podia chegar todo mundo junto. Essa primeira reunião, foi convocada pelo Arouca com o propósito de discutir o que quê nós íamos fazer por que a ditadura estava apertando e, com aquele negócio de exigir que você tivesse ficha limpa no DOPS. [Assim] os sanitaristas não teriam emprego, eles tinham que trabalhar no Estado e o Estado era um Estado da ditadura e o que nós íamos fazer? E ai está, vieram as pessoas que já tinham algum nível de poder, que estavam, por exemplo, na OPAS, na universidade, ou tinha um projeto com financiamento externo. (...) E a gente traçou uma estratégia de que essas pessoas que perdessem os empregos, a gente ia mantê-las no Brasil com consultorias e nós mantivemos muita gente assim. Quer dizer, essa experiência não é uma experiência que vem da academia, ela vem do partido. (...) se não fosse isso, não tinha essa capacidade mesmo e não teve exilado na área de saúde coletiva (Entrevistada 8).

Estas ações exemplificam estratégias de resistência à repressão política e ajudam a entender a força que o Movimento adquiriu, pela coesão interna de seus militantes122, os quais atuavam em vários espaços simultaneamente ou alternadamente, seja no “campo militante”, no “campo político” e no “campo burocrático”, enquanto sanitaristas que encontravam no Estado, o espaço de inserção profissional. O PCB, partido de muitas das lideranças da RSB, havia optado por participar dos espaços legais, não apostando na luta armada contra a ditadura militar. Outros partidos de esquerda que haviam optado pela luta armada também apostaram, naquela conjuntura, em desenvolver um trabalho político junto aos movimentos sociais. Assim, esses partidos investiram no recrutamento de militantes dos movimentos sociais, entre os quais estavam os movimentos que compuseram o MRSB, a saber: o movimento estudantil, o movimento de Renovação Médica, os movimentos populares em saúde de bairros e o próprio CEBES. A entrevistada 8 reforça essa ideia de “transversalidade” da ação política, chamando a atenção para que, apesar das diferenças, havia um elemento comum, a militância política contra a ditadura, que contribui para a formação de laços de solidariedade e compromisso. Em suas palavras:

122 Nem todos eram militantes de partido. Carlyle era um dirigente que a OPAS apoiou e não era vinculado a

Aqui não teve exílio123, nós passamos toda a ditadura militando aqui, formando quadros e tudo mais então, essa experiência é muito interessante, muito forte, eu acho que isso era a nossa identidade. A gente podia ter diferenças enormes, eu tinha diferenças muito mais diferenças de caráter, pessoas que eu continuo não gostando até hoje, mas, isso tudo era relevado em função de estarmos juntos, acho que isso foi muito importante. É claro que tem transversalidades e diferenças. (...). Mas, eu acho que o grande articulador era a política mesmo, essa ideia de estar juntos e de ser companheiros, essa coisa é muito legal (Entrevistada 8).

Vejamos o que Entrevistado 13 disse, em um contato complementar, a partir de uma pergunta específica sobre a relação entre o PCB e a RSB, devido à sua militância no PCB desde os tempos de faculdade. Esse entrevistado tem alto capital burocrático, alto capital cientifico, e muito alto capital militante, tendo sido, inclusive, presidente da ABRASCO.

Creio que o PCB, por intermédio de seus militantes, foi fundamental na RSB. Como "único" partido de esquerda, com maior parte do tempo na clandestinidade, seus militantes sanitaristas da área da saúde colocaram todo seu empenho e competência em trabalhar pela RSB, que resultou no SUS. Entendo que a malha existente permitiu a esses militantes nuclearem as atividades que se sucederam para desembocar na 8ª CNS. A presença deles em diferentes instâncias, sejam acadêmicas, sejam de serviços (especialmente municipais) e sua articulação, favoreceu a elaboração de projetos e ações de peso para a RSB e dadas as características de atuação do PCB, souberam de modo inequívoco articular as forças progressistas em direção à RSB. À ilegalidade do PCB obrigou a buscar-se guarida em partidos oficiais e à época restava o MDB, que depois se transformou no PMDB que abrigou os progressistas durante bom tempo (Entrevistado 13).

O depoimento do entrevistado 13 reafirma que o PCB teria tido esse caráter articulador do MRS, muito mais através da ação dos seus militantes. Esses achados são consistentes com os de Daniela Sophia, cujos entrevistados, porém, destacam outros aspectos, principalmente a importância da criação do CEBES, em 1976 (SOPHIA, 2014). De fato, a análise de vários depoimentos colabora para a identificação de CEBES como o núcleo articulador do conjunto de iniciativas que se desenvolveram neste período. Nesse sentido, ao serem questionados sobre a relação entre o Movimento pela RSB e os partidos políticos, vários dos entrevistados referem-se explicitamente ao trabalho desenvolvido no CEBES, e a partir daí é que expõem seu ponto de vista sobre a relação com os partidos políticos, especificamente o PCB.

Espaços do setor saúde, como Faculdades de Medicina, eram locais onde se “recrutavam”, ou se estimulava a adesão a partidos políticos de matriz marxista. Assim foi com o entrevistado 14, médico com influência importante no movimento sanitário. Quando perguntado sobre sua militância política, estudantil, em diretório acadêmico ou partido político, disse:

Quando eu entrei na faculdade, havia um núcleo do PCB na Faculdade de Medicina, que depois se constituiu no núcleo maior dos estudantes do Rio de Janeiro. Tinha cerca de 31. Uma base que tinha 30 alunos. Já no segundo ano de Medicina me filiei a essa base do PCB, embora minha família, minha mãe, fossem católicos, então isso era uma coisa absolutamente escondida que eu fazia e que eu ia para as reuniões de partido ... (Entrevistado 14).

Ou seja, no espaço de formação profissional, também era um espaço de formação da militância, embora isso seja bastante obvio, vale a pena destacar, para confirmar que no setor saúde isso também estava presente. Sendo a relação entre a militância estudantil em saúde, um componente importante da RSB, como apontou Escorel (1998), sua relação com partidos políticos ainda é uma lacuna a ser investigada.

O entrevistado 27, ex-presidente do CEBES, que militou não apenas no PCB, mas antes disso na Ação Popular (AP), apresenta como segue, seu ponto de vista sobre esta relação:

Não era formalmente militante do PCB entre 1976 a 1979, só ingressando nele depois, mas não havia subserviência do CEBES em relação ao PCB, uma vez que a entidade sempre foi independente e entre seus integrantes existiam militantes de diferentes correntes da esquerda. Creio que houve uma intensa troca de ideias, mas como registrou Sophia124 em muitos momentos dos primeiros tempos do CEBES houve certa predominância de dirigentes da entidade que eram membros do PCB. A partir de 1982, com a reorganização partidária legal houve plena liberdade de escolha de filiações que, no entanto, não prejudicaram a continuidade do CEBES (Entrevistado 27).

O entrevistado 4, que passou a integrar o grupo que atuava no CEBES-RJ na segunda metade dos anos 70, ao ser questionado sobre sua filiação partidária, comentou:

Em 1978 entrei no PCB e a partir daí militei na “base do CEBES”. Faziam parte Arouca, Sonia Fleury (...) (Entrevistado 4).

A existência de uma “base do CEBES” revela a importância do CEBES e da RSB para o PCB. Significa que os militantes se reuniam e discutiam as políticas para o CEBES

124Trata-se de Daniela Carvalho Sophia, autora do livro ‘Saúde & Utopia: o CEBES e a Reforma Sanitária

nessa base. O entrevistado, questionado, em seguida, sobre a atuação na “base do CEBES”, agregou informações relevantes acerca da relação da entidade com o PCB, dizendo:

A chamada (sic) “base do CEBES” do PCB no Rio se reunia regularmente e o centro da agenda eram os desafios colocados na conjuntura para fortalecer e expandir a entidade. Na prática institucional no CEBES nossa postura era pluripartidária, sem restrições (Entrevistado 4).

Ao ser perguntado se “As propostas a serem encaminhadas ao CEBES eram discutidas antes no partido? ” o entrevistado respondeu “Na base sim, no partido em sentido amplo não creio.”, e, explica isso, em seu ponto de vista, agregando que:

Em torno do final dos anos 70, início dos 80, o PCB já vivia uma crise política interna por isso não havia discussões e/ou definições fora desse grupo de militantes (Entrevistado 4).

A natureza da relação entre “base” e partido em sentido mais amplo, pode ser melhor compreendida ao examinarmos a fala de outro entrevistado, que, diante da pergunta “Vocês discutiram no partido sobre a participação no CEBES, na ABRASCO, nas conferencias de saúde? Em caso positivo, poderia narrar um pouco de como era essa discussão dentro do partido? ”, respondeu:

Sim. Discutíamos, até onde era possível, as propostas a serem defendidas por essas entidades. No Partidão, durante alguns anos, o Núcleo da Saúde era muito forte e organizado (Entrevistado 5).

Do mesmo modo, quando perguntado sobre propostas encaminhadas ao CEBES e existência de documentos do partido que orientavam a ação nas entidades, o entrevistado 5 disse:

Sim. Em várias ocasiões eram redigidos documentos. Para a 8a Conferência mesmo, o Partidão (já estava) na legalidade, levamos nossas teses impressas sob formato de jornal que foi amplamente distribuído. Infelizmente procurei por aqui e não encontrei nenhum exemplar. Encontrei sim outros materiais, um caderno com artigos meus sobre Saúde na Constituinte; meu discurso de por que PCB (1986) e depois outro, em 1991, de desfiliação. Também alguns materiais de divulgação de eventos promovidos pelo Núcleo do CEBES de Londrina (Entrevistado 5).

Como podemos perceber por esses trechos das entrevistas, a chamada “base do CEBES” do PCB e o núcleo da Saúde no “Partidão” (PCB) não eram necessariamente equivalentes. Os entrevistados se referem às pessoas do setor saúde, filiadas ao PCB que eram membros do núcleo Saúde do partido, porém não necessariamente atuavam no

CEBES. Quando indicam a existência de uma discussão prévia acerca de propostas de ação na área de saúde, geralmente apontam que esta discussão se dava nos núcleos do PCB.

As nossas entrevistas não permitem afirmar a existência de uma discussão no âmbito do partido (PCB), em especial durante os anos 70, que subsidiasse a elaboração de propostas e a atuação política do CEBES. O partido, usando a expressão de Nelson Rodrigues, estava desarticulado na década de 70, em decorrência da ação repressiva dos governos militares. Já nos anos 80, no contexto da abertura, com o fim da censura, a Anistia e a reforma política, o partido voltou à legalidade (em 1985), e, como diz o entrevistado 5, passou a acontecer um processo de produção de documentos que continham mais claramente sua posição. De fato, a ausência de uma perspectiva mais diretiva do PCB, nos anos 70 é confirmada, por exemplo, pelo entrevistado 9. Quando perguntado sobre a contribuição do PCB para a RSB, disse:

A contribuição do PCB para a RSB deu-se exclusivamente a partir da ação de seus militantes que estavam envolvidos com a questão da saúde. Não me recordo de uma ação organizada da máquina partidária nem de menções específicas à RSB em documentos ou debates do partido. Mas você deve ter cautela quanto a essa minha afirmativa, posto que em 1978 eu comecei a me afastar do PCB, haja vista ter chegado à conclusão de que este não era mais o melhor instrumento na luta pela redemocratização do país. Na verdade, mesmo antes desse afastamento eu já tinha me filiado ao MDB, como muitos outros militantes do PCB. O MDB era um instrumento político muito mais importante para derrotar a ditadura do que o PCB e a dessa primeira decisão "entrista" (sic) com dupla militância derivou-se um gradual afastamento do PCB e uma aposta maior na frente que era o MDB (Entrevistado 9).

O ponto de vista do entrevistado 9, que se aproxima da visão de entrevistado 4, é reforçado por outros depoimentos que enfatizam a “autonomia” relativa dos militantes da “base do CEBES”, o que pode estar refletindo certa especificidade da atuação do núcleo do PCB do Rio de Janeiro, estado onde atuavam os dois entrevistados. Cabe ressaltar a trajetória dos dois agentes (4 e 9), já que ambos apresentam capital militante elevado (muito alto ealto), capital também elevado (muito alto e alto), e ambos eram filiados ao PCB no período da gênese da RSB, tendo contribuído para a organização do CEBES.

A dupla militância, ou seja, a participação simultânea no PCB e no movimento sanitário aparece também na fala do entrevistado 14, cuja a trajetória apresenta similitudes com a dos dois entrevistados citados acima, na medida em que apresenta capital burocrático muito alto, capital militante alto e vinculação ao PCB. De fato, os pontos de

vista dos entrevistados na maioria das vezes podem ser entendidos pelas suas trajetórias, sendo esse um dos bons exemplos disso.

Com base nestas observações, pode-se considerar que a experiência desses entrevistados não pode ser generalizada para todo o Brasil. É possível pensar que em alguns Estados havia uma articulação do Núcleo Saúde do PCB, e uma discussão prévia nesse Núcleo acerca da atuação no MRS, enquanto em outros isso não acontecia. Na Bahia, por exemplo, a entrevista feita com um médico, participante das articulações do MRSB, revela o seguinte:

ATJ125 – Havia uma discussão sobre participação no CEBES, na ABRASCO, nas conferências de saúde?

Entrevistado 1 – Não.

ATJ – Havia uma discussão dentro do partido sobre o que era o movimento sanitário?

Entrevistado 1 – Aparecia muito raramente, porque o único, dos membros do partido, que tinha uma inserção direta nesse campo mais amplo, era eu. Na base local.

ATJ – Aqui na Bahia.

Entrevistado 1 – E como estávamos num período de clandestinidade até a década de 80 que eu fiquei, éramos clandestinos, nós não podíamos ter contato com ninguém a não ser a própria base. E a base foi reorganizada por mim. Porque teve um período que o partido se dissolveu por segurança, o PCB, então a direção toda do partido teve que sair...

Esse trecho aponta a existência de uma situação que pode vir a ser investigada em outros estudos que tomem como objeto realidades especificas. O grau de discussão no núcleo saúde, aparentemente, depende da composição do PCB local em relação ao setor saúde, e do grau de penetração que tinha no movimento sanitário. Na Bahia, por exemplo, com um grau menor de penetração, não chegava a existir núcleo saúde do partido, enquanto que, em outros estados, como o Rio de Janeiro, existia, e é possível que esta relação fosse mais estreita.

Pelos depoimentos dos nossos entrevistados, nos anos 70, havia situações diferenciadas. Por um lado, aparece em alguns depoimentos a informação de que em função do grau de desagregação interna do Partido, o Movimento pela RSB decorreu mais

da atuação relativamente autônoma dos militantes que se vincularam ao CEBES, ABRASCO, ao Reme, ao movimento estudantil da área de saúde, espaços onde, apesar da predominância de pessoas filiadas ao PCB, o debate sobre as questões de saúde não estava