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Este objetivo teve por princípio averiguar um dos primeiros traços culturais apontados no MCGB que impactam o processo de liderança: desigualdade de poder.

De acordo com os apontamentos teóricos, este traço se manifesta, sobretudo, na noção da hierarquia como uma força nas relações entre as pessoas, bem como na importância atribuída à autoridade dos superiores e ao status. Os impactos são, de

acordo com o MCGB, estabelecer um processo de liderança centrado no poder, no status, na figura do líder (CHU, 2010).

Os relatos apontam que a noção da hierarquia como uma força e o apego ao poder e ao status não estão presentes na postura de liderança adotada pelos gestores regionais pesquisados, conforme indicam as situações e comportamentos referendados nas seguintes falas:

“ Trato a todos iguais. Sempre com humor. Sempre com leveza. Porque eu acho que o profissional não precisa [...] estabelecer tratamento que imponha a função simplesmente pelo status quo. Porque ganha mais ou tem uma função... isso não é discurso, é prática.” (E1- sic).

“[...] status é uma coisa que não me apetece [...] e o meu compromisso [com a empresa e as pessoas] é eu sendo ou não sendo [gerente regional]” (E2- sic).

“[...] eu sempre procurei desde que estava em outra posição de liderança [tratar igual as pessoas] [...] isso é uma coisa que eu aprendi com o meu pai. É assim, uma coisa de vê-lo entrar e sair nos ambientes e dar o abraço no ascensorista do elevador e dar um abraço depois no presidente” (E5- sic). “[...] eu tenho, graças a Deus, uma aproximação de mais abertura, não é? De menos essa coisa da figura do chefe, do gerente” (E4- sic).

“[...] eu acho que todo mundo nessa empresa, eu acho que tem uma importância e deve ser dada mesmo essa importância [a cada uma das pessoas]” (E6- sic).

A ausência do traço não produz, portanto, um processo de liderança centrado no líder e no poder. O que também pode ser ratificado pelos relatos da questão do “empoderamento” como uma prática de liderança, conforme ressaltado nas seguintes falas:

“Mas eu não hesito, praticamente diariamente, em dar poder. Empoderar gerentes gerais, em especial, para fazer contatos [com níveis hierárquicos maiores]. Eu empodero o gerente e o cara conversa direto e resolve. Sem nenhum estresse. Para eu não tá centralizando e não dar conta” (E1- sic).

“Eu digo – Ó, é… eu digo mesmo ao pessoal: ‘Liga para [cita o nome do empregado] e o que ele resolver, eu assino embaixo’ [...]Então isso é uma forma também de você empoderar as pessoas e quem está na outra ponta diz: `po, eu não preciso falar com o gerente regional para resolver uma taxa ou coisa desse tipo!’” (E7- sic).

“[é importante] dar um valor às pessoas que se imbuem desse empoderamento [...] a pessoa sente que está dando uma contribuição importante” (E5- sic).

Ao mesmo tempo, 06 dos 08 gestores regionais apontaram situações que sugerem a presença de um tratamento diferenciado que recebem por parte dos liderados em razão do cargo que os gestores regionais ocupam. Observe-se, por exemplo, o caso de um dos entrevistados que alerta sobre as sinalizações que recebeu de outros colegas que ocupam posição hierarquicamente inferior sobre o novo comportamento que o entrevistado deveria adotar quando passou a ocupar o cargo de gerente regional:

“Eu recebi até uns toques assim... – ‘Você não tem que pedir, não! Você tem que dizer assim: EU estou precisando de uma planilha’” (E2- sic).

Outro extrato significativo confirma essa questão, na ótica de outro gestor:

“[...] meus subordinados, às vezes, eu sinto uma distância que eles colocam [...] há uma espécie de temor reverencial assim [...] eu sinto ainda um tratamento diferente [...] que traz alguns pudores [por parte dos liderados] em razão do poder [do cargo]” (E3- sic).

Um dos gestores (o de maior nível hierárquico) aponta a existência da desigualdade de tratamento que ele observa existir, no ambiente da instituição, em razão do cargo que ocupa e ressalta que é um traço da educação brasileira (não seria a cultura?!):

“Há diferença sim [de tratamento entre as pessoas pelo fato dele ser gestor regional]... E isso é do comportamento humano. Não somente do comportamento humano profissional. É do comportamento humano. É a forma como, especialmente, a educação nossa do brasileiro aconteceu.” (E8- sic).

E concluiu:

“Agora acho que há uma evolução muito grande, no sentido de reduzir isso esse tipo de situação. Mas acho que isso é inevitável. A gente vai precisar conviver com uma situação como essa durante muito tempo ainda” (E8- sic).

Outro gestor confidencia:

“Quando alguém está abaixo de você no nível hierárquico, entendeu?... Lhe trata de uma forma diferente [...] No mundo corporativo ele faz isso. trata diferente e tal. De cima para baixo eu não noto muita diferença na forma...” (E7- sic)

Dois outros entrevistados afirmam, inicialmente, não perceber tratamento diferenciado, mas respondem:

“Eu sei que o peso do crachá interfere nas relações. Muitas vezes interfere nas relações” (E5- sic)

“Ainda existe um ou outro, tal... é... os mais novos, quem está entrando agora como gerente” (E4- sic).

Um dos respondentes foi lacônico ao dizer que “Não! Não noto diferença!”, mas em seguida complementou:

“[...] logicamente, abolindo as questões de status, de: ‘ah, fulano é mais importante’. Não.” (E6- sic).

Tais relatos estão de acordo com o outro lado do traço desigualdade de poder, de acordo com o sugerido pela teoria: a noção de que indivíduos em posições de menor poder aceitam as desigualdades entre as pessoas e possuem comportamento passivo diante dessa situação (CHU, 2006).

Percebe-se pela análise dos depoimentos pelas entrevistas, que não foi encontrada a presença do traço cultural desigualdade de poder, na postura de liderança dos gestores regionais pesquisados. Sendo assim, não se pode afirmar a presença de um processo de liderança centrado no líder, no poder e no status.

No entanto, considerando as observações feitas nos ambientes em que atuam esses gestores, ao modelarem o comportamento dos liderados, pode-se dizer que esse traço cultural não pode ser desconsiderado, na relação de liderança existente nessa organização.