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4.5 Caso 3: Projeto de Referência – Tipologia Térreo + 03

4.5.1 Relatório da entrevista com a Empresa E

A EMPRESA E é um escritório de arquitetura e existe há aproximadamente 15 anos, quando o titular, arquiteto, separou-se da sociedade de outra empresa da qual fazia parte. O principal nicho de atuação é o mercado imobiliário e possui como corpo técnico: 04 arquitetos, 01 técnica em edificações, 01 estagiário e 01 secretária, sendo portanto, uma empresa de pequeno porte.

Além do projeto de referência Térreo+03 desenvolvido para o programa MCMV (faixa de 0-3 SM) a EMPRESA E já havia realizado um projeto para o PAR, tendo também o SINDUSCON como cliente contratante. Além destas experiências, o entrevistado afirmou ter desenvolvido outros projetos de habitação popular, no sentido de ter a classe C como principal público.

O sócio da EMPRESA E fez diversas críticas ao programa, especialmente no que diz respeito à excessiva burocracia do agente promotor e às questões de projeto exigidas, descontextualizadas ao nordeste brasileiro. Apesar de justificar a padronização dos projetos por conta da excessiva burocracia para o processo de aprovação, o entrevistado admite que do ponto de vista da arquitetura, não é benéfico ter soluções replicáveis e padronizadas.

Mesmo após o lançamento do MCMV 2, tendo como principal novidade o cumprimento das normas de acessibilidade, o arquiteto apresentou uma série de críticas e sugestões envolvendo o projeto. Declarou ainda que concluiu alguns projetos para o MCMV (faixa de 3-6 SM), elogiando a qualidade destes, consequência de maior flexibilidade e liberdade projetual, permitidas pelas construtoras que utilizam recurso próprio e a CEF apenas financia as unidades

habitacionais. Estas preocupações e discussões comprovam a experiência do entrevistado com projetos de HIS.

O diretor da EMPRESA E não possui formação complementar em gestão, não realiza planejamento com metas nem possui nenhuma ferramenta de controle da produção (não há gerenciamento dos projetos, são desenvolvidos tendo apenas a data de entrega como base). Não há nenhuma padronização de qualquer processo interno da empresa. O entrevistado destaca como consequência disto o acúmulo de tarefas e afirma estar sempre sobrecarregado devido à essa falta de gerenciamento interno. Sugere ainda que esta situação poderia melhorar com a contratação de pessoas específicas para as tarefas administrativas.

A empresa é membro da Asbea-Ce, tendo o entrevistado contribuído para a abertura desta seção no estado do Ceará. A EMPRESA E desenvolve seus projetos de maneira tradicional, com a concepção sendo de responsabilidade do sócio diretor e o desenvolvimento sendo realizado pelos outros arquitetos da empresa. O projeto parte de um programa de necessidades definido pelo cliente contratante. O entrevistado afirma que, não há diferenciação em seu processo de projeto no que diz respeito a empreendimentos habitacionais de interesse social.

Apenas quando fazem projetos específicos como o de supermercados, o processo de projeto muda um pouco, pois há a participação mais intensa de profissionais de outras especialidades. O sócio diretor da EMPRESA E diz que os parceiros são diferentes, existe uma interferência maior no seu projeto.

O arquiteto titular inicia o processo de projeto com a fase de criação. Este não utiliza o computador como ferramenta principal de projeto, realizando a fase de concepção através de croquis e desenhos à mão livre. Posteriormente delega a fase de desenvolvimento aos outros arquitetos da empresa, que fazem uso de ferramentas computacionais, e passa a realizar a atividade de acompanhamento. Ao final do processo, o projeto volta ao diretor da empresa, para avaliação final do produto.

Com relação às causas para o não cumprimento de prazos de entrega, o arquiteto assume a responsabilidade e lista: falta de planejamento; falta de organização interna; e falta de profissionalização e comprometimento dos funcionários. Quando perguntado sobre como aumentar a produtividade da equipe o titular da EMPRESA E não acredita ser possível tratar a criação de um projeto como uma linha de produção, com metas, estratégias e controles. Ele afirma que o

profissional arquiteto é um recurso humano, suscetível a altos e baixos, difícil de manter a estabilidade comparável a uma máquina.

Quando perguntado sobre o principal fator de satisfação do cliente o diretor da EMPRESA E afirma que não há uma única resposta que atenda a todas as situações; ele acredita que depende de vários fatores, tais como o tipo de projeto ou a classe social do cliente, citando qualidade, custos e prazos como exemplo.

Com relação aos contratos, a EMPRESA E possui um modelo padrão, bastante simples, que muitas vezes se resume à proposta comercial apresentada ao cliente. Mesmo com as assinaturas de ambas as partes, dificilmente não são reconhecidas em cartório, perdendo assim a sua validade contratual. O titular da empresa citou como exceção os serviços prestados através de licitação ou para grandes empresas, tais como Petrobrás e bancos em geral, que exigem uma contratação mais formal.

Quando questionado a cerca de tipos de contratos diferenciados, incluindo penalidades ou bonificações, o entrevistado diz nunca ter participado desse tipo de contratação, mas afirma já ter ouvido falar e acrescenta:

Os projetistas são mal pagos porque entram no ciclo de vida da edificação num momento em que o construtor apenas tem muitos custos e despesas. Com os corretores de imóveis, por exemplo, acontece o inverso; eles entram no processo quando o empreendimento já está totalmente viabilizado e os construtores já usufruem dos lucros e rendimentos, sendo este profissional muitas vezes mais valorizado do que os próprios projetistas. Que bom seria se os projetistas pudessem participar dos lucros do empreendimento caso o resultado fosse de sucesso! Dessa forma todos poderiam se envolver muito mais e se sentiriam bem mais motivados para realizar um bom trabalho (ENTREVISTADO DA EMPRESA E)

O sócio da EMPRESA E reconhece uma falha em seu próprio contrato, onde diz que “o escritório de arquitetura se fará presente na obra para dirimir as dúvidas necessárias”. Entretanto, não especifica a quantidade nem o tempo dessas visitas e acabam por não cobrarem um valor adicional pela prestação do serviço de acompanhamento de obra. Ainda nesse quesito, o entrevistado afirma que as construtoras de parcerias mais antigas costumam consultá-lo com mais frequência com relação às dúvidas de projeto. Entretanto, muitas outras procuram resolver alguma pendência de obra por meios próprios, sem o consentimento do projetista.

Com relação ao projeto de referência Térreo+03 desenvolvido para o MCMV (faixa 0-3 SM), o arquiteto explica que o SINDUSCON convidou alguns escritórios de projeto que já prestavam serviço para as construtoras da cidade e

realizou uma concorrência. Convidou mais duas empresas de projeto (estrutural e complementares) para compor a equipe, concorreram e assim conquistaram a oportunidade de realizar este trabalho, através de um pacote de projetos. O sócio da EMPRESA E acredita também que foi convidado por já ter desenvolvido projetos para o PAR. Ele avalia o diálogo entre os outros profissionais como “bom”.

Segundo o titular da EMPRESA E não houve dificuldades com os outros profissionais no decorrer do desenvolvimento deste projeto em questão. Ao contrário, seus parceiros participaram nas tomadas de decisão da arquitetura, ainda que de maneira incipiente, tendo uma maior participação do projetista de cálculo estrutural. A maior interferência citada dos profissionais de projetos complementares foi a localização de shafts e condensadores de ar-condicionado, entre outras questões.

Apesar de eleitos através de um pacote de projetos, não houve a contratação coletiva da equipe como um todo. Cada empresa respondia por um contrato individual com o SINDUSCON, o que dificultou a presença de um profissional coordenador ou líder da equipe. Esse papel foi exercido de maneira pessoal por aqueles profissionais mais vocacionados para tal tarefa, de maneira voluntária, sem qualquer pagamento extra por isto.

Para esclarecer dúvidas ou discutir alguma questão de projeto, os principais contatos eram o telefônico e por email, sendo este último de maior eficácia. Reuniões presenciais representavam a última alternativa para dirimir problemas de projeto, acontecendo quando estritamente necessário. Aconteciam de acordo com a demanda, nada programado em contrato.

Com relação à equipe de projeto, o sócio diretor da EMPRESA E destaca que seus funcionários não possuem muita autonomia de projeto, pois o próprio concentra a maioria das atividades do escritório, inclusive a concepção dos projetos e aponta este fato como uma falha. Afirma ainda que em sua empresa não há uma preocupação consciente em motivar os funcionários.

O entrevistado discursou a cerca da falta de profissionalização do setor de projetos na construção civil e aponta este fato como o motivo para várias falhas internas de sua empresa, dizendo: “se o projeto não é valorizado frente às construtoras, a empresa de projeto não pode valorizar seus funcionários!”. Segundo o sócio da EMPRESA E, este fato justifica a falta de comprometimento das equipes de uma forma geral, assim como a rotatividade destas.

O entrevistado diz ter como principal critério de seleção de seus funcionários a indicação por parte de outros escritórios ou parceiros. A EMPRESA E já trabalhou terceirizando serviços, mas já não procura mais por este tipo de parceria, especialmente pela falta de comprometimento com prazos e qualidade dos projetos desenvolvidos por estes. Com relação à rotatividade da equipe, o diretor da empresa acredita não ser significativa, tem uma equipe relativamente estabilizada, porém não sabe o motivo. Acrescenta que talvez seja pelo próprio perfil dos seus funcionários, relativamente acomodados, acostumados com a rotina e consequentemente satisfeitos com sua realidade de trabalho.

Com relação à entrega dos projetos, é realizada apenas em meio digital e somente é entregue ao cliente contratante as pranchas relativas ao projeto, com especificações mínimas para a orçamentação, sem o caderno de encargos. Quando há a geração de mais algum documento referente ao cliente, este permanece com a empresa.

A empresa utiliza basicamente os softwares convencionais utilizados no mercado, tais como AutoCad®, Corel Draw® e Sketch Up®. Não houve a implementação de nenhum software novo nos últimos anos. A EMPRESA E conhece os benefícios e se interessa pelo uso de plataforma BIM, porém não as utiliza. A equipe toda já passou por treinamento e participa de fóruns de discussão no âmbito das instituições que participam. Entretanto, não conseguiram implementar, e, segundo o entrevistado, foi devido a ausência de uma pessoa específica no escritório para esta finalidade.

Outra questão pertinente apontada pelo arquiteto diz respeito ao modo de projetar com BIM. Ele acredita que a categoria dos projetistas provavelmente será prejudicada, pois aumentará consideravelmente a carga de trabalho e responsabilidade e o pagamento pelos projetos não acompanhará esse incremento. O arquiteto passará a ser bem mais exigido em sua formação, incluindo outras disciplinas e não receberá o retorno proporcional ao seu incremento de responsabilidades. Além disso, destaca o aparecimento da exigência de normas no decorrer dos anos, obrigando o arquiteto a se reciclar periodicamente para acompanhar o mercado.