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Aplicabilidade directa do Direito Comunitário no direito interno

2. Abordagem do Direito Comparado

2.1. República Federal da Alemanha

Na Alemanha, a aplicação legislativa do Direito Comunitário está particularmente desenvolvida em virtude das exigências constitucionais sublinhadas pelo Tribunal Constitucional que recusou reconhecer ao Governo um poder regulamentar autónomo. Prevê- se o recurso a delegações, de acordo com o artigo 80.º da Lei Fundamental, o Governo só pode intervir segundo modalidades estritas que limitam o objecto, o conteúdo e o alcance dos textos adoptados sob delegação e comportam o exercício de um controle exercido essencialmente pelo Bundestag (o Bundesrat intervém de forma consultiva, na maior parte dos casos) que aprova ou rejeita os decretos.

Os Länder participam na aplicação legislativa federal do Direito Comunitário por intermédio do Bundesrat com base nas disposições gerais relativas à repartição das competências entre a Federação e os Länder. A aplicação administrativa das regras comunitárias é normalmente exercida pelas autoridades dos Länder, excepto nos domínios onde existe uma administração federal (por exemplo em matéria de concorrência ou de alfândegas).

2.2. França

Em França, a determinação da autoridade chamada a assegurar a aplicação normativa do Direito Comunitário está, em princípio, ligada à partilha das matérias operada pelos artigos 34.º e 37.º da Constituição francesa. As medidas normativas de aplicação dos textos comunitários devem ser tomadas pelo poder legislativo nas matérias do artigo 34.º, sob reserva de lei de habilitação tomadas com base no artigo 38.º ou de utilização de habilitações anteriores pelo Governo, nas matérias do artigo 37.º. A aplicação das directivas nas matérias do artigo 34.º é assegurada pelo Parlamento ou pelo Governo em função de delegações e nas matérias do artigo 37.º 355.

O preceito do Decreto francês, de 14 de Março de 1953, exceptua a necessidade de publicação dos compromissos internacionais: “os regulamentos procedentes de uma organização internacional quando estes regulamentos se publiquem integralmente no jornal

355 Ver: RIDEAU, Joel - L' Europe dans les Constitutions des États Membres de L' Union Européenne. In MIRANDA, Jorge (org.) - “Perspectivas Constitucionais - Nos 20 anos da Constituição de 1976”. 1ª ed..

oficial da organização, oferecido ao público, e quando esta publicação seja suficiente, em virtude das disposições expressas de uma convenção que obrigue a França, para estes regulamentos serem oponíveis aos particulares.” 356.

Em França, a falta de poderes normativos das Regiões exclui a sua intervenção na aplicação normativa do Direito Comunitário. O respeito por aquele Direito impõe-se-lhes no exercício das suas diversas competências, como se impõe às outras comunidades locais e ao conjunto dos poderes públicos, de acordo com a jurisprudência do Conselho Constitucional (Conselho Constitucional decisão n.º 82-137, de 25 de Fevereiro de 1982) relativa ao artigo 55.º, sobre o controle do juiz administrativo. A existência de certas situações jurídicas particulares (Estatuto da Córsega e Estatutos dos territórios ultramarinos) pode, entretanto, criar problemas quanto a aplicação normativa, como testemunha a condenação da França, pelo Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias, pela falta de transposição de directivas comunitárias por parte das assembleias dos territórios da Nova Caledónia e da Polinésia francesa (T.J.C.E., sentença de 12 de Dezembro de 1990, Comissão/França, C-263/88)357. Há, todavia, que constatar que em qualquer hipótese o Estado tem meios de impor às colectividades em falta o respeito das suas obrigações comunitárias358.

2.3. Itália

Em Itália, a Lei La Pergola nos artigos 2.º e 3.º prevê o princípio da adopção pelo Parlamento italiano de uma lei comunitária anual destinada a assegurar a adequação da ordem jurídica italiana à ordem jurídica comunitária. Um exame da conformidade da ordem interna com a ordem comunitária deve ser efectuado pelo Ministro para a coordenação das políticas comunitárias em consonância com o Ministro dos Assuntos Estrangeiros e outros ministros interessados, e um projecto de lei apresentado até 31 de Janeiro ao Conselho de Ministros com a exposição dos factos e fazendo o ponto da situação da jurisprudência comunitária. Este projecto deve ser apresentado às Câmaras parlamentares até Março seguinte (artigo 2.º). A lei prevista deve proceder à modificação ou à abrogação dos textos nacionais contrários às obrigações comunitárias, e adoptar as disposições necessárias ao funcionamento do Direito

356 Ver: RODRÍGUEZ CARRIÓN, Alejandro J. - Lecciones de Derecho Internacional Público. 4.ª

ed.. Madrid: Editorial Tecnos, S.A., 1998, p. 301.

357 Recueil de la Jurisprudence de la Cour de Justice des Communautés Européennes (RJC), 1988, p. I -

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Comunitário derivado (eventualmente com o recurso a delegações legislativas, que já estavam previstas na lei Fabbri de 1987). A mesma lei é que irá autorizar o Governo a tomar as medidas de aplicação das directivas ou recomendações359.

De acordo com a doutrina italiana está fora de questão que no Direito Comunitário se encontram os caracteres de uma ordem jurídica que tem as suas próprias instituições e os seus procedimentos de criação e aplicação do direito. Esta ordem coexiste com a ordem jurídica italiana assim como com as dos outros Estados-membros e tem com elas um laço estreito, porque inclui entre os seus sujeitos os indivíduos e as entidades que tenham adquirido a personalidade dos direitos nacionais, uma vez que a sua incidência territorial compreende os territórios de todos os Estados-membros. Por outro lado, pressupõe as limitações da soberania que o artigo 11.º da Constituição italiana admite, em situação de igualdade com os outros Estados, como necessárias para uma ordem que se propõe assegurar a paz e a justiça ao nível internacional. Como consequência deve considerar-se legítima, em virtude do artigo 11.º, a substituição parcial do Parlamento nacional pelos órgãos comunitários e também a realização de todos os efeitos próprios das fontes comunitárias na ordem jurídica do Estado-membro.

A prioridade das normas comunitárias sobre as leis internas não conformes foi concebida, desde logo, como um resultado do controle da constitucionalidade das últimas e da aplicação do artigo 11.º da Constituição. Em seguida, a partir da sentença n.º 170, de 8 de Junho de 1984, o Tribunal Constitucional julgou que cabia ao juiz comum não aplicar o direito interno e aplicar no seu lugar o Direito Comunitário. Na sentença n.º 113, de 19 de Abril de 1985, o Tribunal precisou que o Direito Comunitário directamente aplicável incluía, não somente, os tratados institutivos das Comunidades e todo o direito daí decorrente, mas também os resultados das sentenças interpretativas do Tribunal de Justiça das Comunidades. Finalmente, na sentença n.º 168, de 18 de Abril de 1991, o Tribunal Constitucional, alinhando-se pela jurisprudência do T.J.C.E., reconheceu o efeito directo de uma directiva comunitária a partir do decurso do prazo no qual Itália deveria dar exequibilidade às suas normas, e como consequência declarou não aplicáveis, a partir da mesma data, as normas nacionais em contradição com um artigo destas directivas.

No que diz respeito ao funcionamento das fontes comunitárias, é preciso lembrar que a eficácia imediata dos regulamentos resulta dos tratados institutivos das Comunidades e que é

359 Ver: RIDEAU, Joel - L' Europe dans les Constitutions ..., cit., p. 770-772.

preciso ter em conta que só nas hipóteses em que certas disposições dos regulamentos são incompletas é que se justificam normas para as integrar, normas que cada Estado é chamado a produzir.

Resta ver se um controle da constitucionalidade é admissível para os regulamentos comunitários. A resposta, em princípio, só pode ser negativa, uma vez que se considera que os regulamentos têm os seus efeitos num direito diferente do italiano, mesmo se os sujeitos desta ordem jurídica representam uma parte dos seus destinatários. No entanto, o Tribunal Constitucional italiano fez sempre reservas quanto ao julgamento de legitimidade. Estas reservas consideram a hipótese em que os órgãos comunitários violem os princípios fundamentais da Constituição italiana, ou então, na eventualidade de se produzir, graças a ele, um atentado aos direitos inalienáveis da pessoa, que a lei italiana salvaguarde. Estas duas hipóteses foram confirmadas na sentença n.º 168, de 1991360.

Em Itália, a incidência crescente do Direito Comunitário nas competências regionais conduziu o legislador a procurar soluções tentando conciliar as necessidades de uma aplicação conforme ao Direito Comunitário e o respeito das competências regionais. A Lei La Pergola definiu, em 1989, as modalidades de intervenção das Regiões na aplicação do Direito Comunitário e consagrou o poder de substituição pelo Estado que já tinha sido reconhecido pela jurisprudência constitucional361. Diz Francesco Capotorti que, no início, a maioria dos autores achava que pertencia apenas às autoridades do Estado executar no seu território as obrigações contraídas nas relações internacionais com outros Estados. Esta orientação foi partilhada pelo Tribunal Constitucional na sentença n.º 46, de 11 de Julho de 1961, e parecia concordar mais com a norma constitucional sobre a adaptação automática aos costumes internacionais (artigo 10.º) do que com a prática da lei ordinária de execução dos tratados. Isto é, julgava-se que em matéria de assuntos estrangeiros pertencia ao Estado aplicar tanto as normas de origem internacional como as comunitárias. Previa-se somente a possibilidade do Estado delegar às Regiões o direito de participar na aplicação dos actos comunitários, o Tribunal Constitucional pronunciou-se nesse sentido na sentença n.º 142, de 24 de Julho de 1972.

360 Ver: CAPOTORTI, Francesco - Cours Général de Droit International Public. In Recueil des Cours

de l’Académie de Droit International de La Haye. Dordrecht/Boston/London: Martinus Nijhoff Publishers. Tome 248 - IV: (1994), p. 9-344, especialmente p. 234-237.

Quinze anos depois, o Tribunal mostrou ter adoptado um princípio diferente, a sentença n.º 304, de 30 de Setembro de 1987, reconheceu às Regiões o poder autónomo de aplicar o Direito Comunitário nos limites das suas competências constitucionais. Pouco tempo depois, a lei de 9 de Março de 1989, reconheceu que as Regiões tendo um estatuto especial podiam aplicar imediatamente, nas matérias da sua competência exclusiva, as directivas comunitárias e a mesma coisa podia ser feita por outras Regiões quanto às matérias compreendidas na sua competência concorrente. Em todo o caso, o limite do respeito das obrigações internacionais e comunitárias subsiste e abrange toda a competência regional como o declarou o Tribunal Constitucional em muitas das suas sentenças362.

2.4. Bélgica

O problema da aplicação imediata, sem qualquer formalidade de recepção, do direito derivado das Comunidades Europeias, e mais genericamente das organizações internacionais, não é muito tratado pela doutrina belga e nem sempre claramente. Assim, J. Masquelin363 seguia o princípio segundo o qual os actos de direito derivado de uma organização internacional deviam ser aprovados pelas Câmaras cada vez que estas estivessem de acordo com os critérios definidos no antigo artigo 68.º, alínea 2, da Constituição. J. Verhoeven364 entende que a aprovação dada a um tratado institutivo de uma organização internacional implica a presunção da aprovação antecipada dos actos que esta está habilitada para adoptar. Outros autores fundam a aplicabilidade directa de tais actos no artigo 34.º - antigo artigo 25 bis - da Constituição, nos termos do qual “O exercício de poderes determinados pode ser atribuído por um tratado ou por uma lei a instituições de Direito Internacional público”. As condições de aplicabilidade interna do Direito Comunitário derivado são reguladas pelos próprios tratados. As jurisdições belgas não põem em causa a jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades tendente a afirmar o princípio geral de aplicabilidade directa do direito derivado, generalizando, assim, o artigo 249.º do T.C.E. que prevê, expressamente, a aplicabilidade directa dos seus regulamentos. Convém, ainda, dizer uma palavra sobre as directivas que se dirigem aos Estados. Segundo K. Lenaerts, as directivas não se tornam

362 Ver: CAPOTORTI, Francesco - Cours Général ..., cit., p. 238.

363 Citado por: BRIBOSIA, Hervé - Applicabilité Directe et Primauté des Traités Internationaux et du

Droit Communautaire. In Revue Belge de Droit International. Bruxelles: Bruylant. Vol. XXIX: (1996 - 1), p. 33- 89, especialmente pé-de-página n.º 39 da p. 42.

aplicáveis na ordem jurídica interna antes da sua incorporação formal na mesma365. Pode-se, todavia, duvidar que esta seja a posição actual do Tribunal de Justiça mesmo sendo verdade que a sua jurisprudência relativa à execução das directivas é livre de ambiguidades.

O Conselho de Estado reconheceu, implicitamente, a aplicação imediata das directivas - pelo menos após a expiração do prazo de transposição - uma vez que ele confere efeito a uma directiva ainda não transposta366.

Já dissemos que o Tribunal de Justiça generalizou, a partir do artigo 249.º do T.C.E. (artigo 189.º do T.C.E.E.), o princípio da aplicabilidade imediata do conjunto do direito derivado obrigatório. Na falta de disposição expressa nos tratados como na maior parte dos actos de direito derivado, o Tribunal de Justiça tende a fixar, eventualmente referindo-se ao artigo pré-citado, uma presunção geral favorável ao carácter directamente aplicável do Direito Comunitário, tanto convencional como derivado.

De uma maneira geral, as jurisdições belgas parecem reconhecer ao Tribunal de Justiça, por intermédio do recurso prejudicial organizado pelo artigo 234.º do T.C.E., o poder último de apreciação do carácter directamente aplicável de uma regra de Direito Comunitário na ordem interna, o que não os impede de aplicar, muitas vezes directamente, uma regra de Direito Comunitário sem recorrer ao dito mecanismo367.

A especificidade comunitária parece residir no reconhecimento pela ordem jurídica belga da competência exclusiva do Tribunal de Justiça para estatuir, como intérprete autêntico dos tratados comunitários, sobre a aplicabilidade imediata do direito derivado e sobre os efeitos directos do Direito Comunitário originário e derivado368.

Na Bélgica, faz-se, em princípio, apelo à intervenção do Parlamento para a aplicação normativa. Há disposições que habilitam o Governo a regular certas matérias de forma geral e disposições que habilitam especificamente o Governo a executar textos comunitários e, em particular, directivas. A constitucionalização do papel das Regiões e das comunidades culturais foi consagrado pela revisão de 1993.

As jurisdições ordinárias têm o poder de fazer prevalecer o direito comunitário sobre as normas regionais. Estes textos são aplicados pelas Regiões e comunidades em conjunto com o Estado, quando se trate de competências partilhadas, com a necessidade de determinar

365 M. Waelbroek entende que a expiração do prazo, imposto pela directiva para a transpor, torna-a

aplicável na ordem interna. Citado pelo mesmo Autor, no pé-de-página n.º 40 da p. 43.

366 Ver: BRIBOSIA, Hervé - Applicabilité Directe ..., cit., p. 42-43. 367

Ver: BRIBOSIA, Hervé - Applicabilité Directe ..., cit., p. 53-54.

um “departamento piloto”, só para as competências exclusivas. A lei especial de Maio de 1993 trouxe um elemento novo, uma vez que ela (artigo 16.º, § 3.º, da lei especial de reformas institucionais de 8 de Agosto de 1980, actualizado em 1993) reconhece às autoridades federais o direito de usar um poder de substituição para preservar o interesse nacional e para garantir o respeito pelas obrigações nacionais ou supranacionais (artigo 169.º da Constituição de 1994)369.

2.5. Luxemburgo

No Luxemburgo, os textos comunitários, e sobretudo as directivas, são normalmente aplicados pelo poder legislativo. Aquelas podem também ser aplicadas pela via regulamentar, quer com base na competência geral do poder executivo, de executar as leis (quando já existe uma lei naquele domínio e não é necessário alterá-la, mas apenas criar medidas de execução), quer com base em delegações legislativas específicas.

2.6. Holanda

Na Holanda, a intervenção do Parlamento é necessária para a aplicação normativa das directivas que tratam de questões novas ou implicam inovações importantes em relação aos textos anteriores, mas o Governo dispõe de amplos poderes regulamentares que podem ser estendidos por delegação.

A importância da autonomia reconhecida às Regiões e às colectividades locais leva-as a terem intervenção no funcionamento de certas directivas comunitárias, como complemento da intervenção das autoridades centrais, e mesmo em certos casos isoladamente. Existe também uma certa descentralização funcional a favor dos sindicatos de produtores e dos sindicatos profissionais que dispõem de competências regulamentares nos domínios do seu interesse370.

369

RIDEAU, Joel - L' Europe dans les Constitutions ..., cit., p. 776-777.

2.7. Dinamarca

Na Dinamarca, o essencial da aplicação normativa é assegurada pelo Parlamento que preserva o seu monopólio, embora consentindo delegações ao Governo371.

2.8. Reino Unido da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte

No Reino-Unido, os parágrafos 2 e 4 da secção 2.ª do European Communities Act, que forma a base jurídica interna da adesão do Reino-Unido, prevêem que podem ser delegados amplos poderes ao executivo e que serão exercidos mediante Orders in Council ou por regulamentos de aplicação (statutory instrument)372.

2.9. Irlanda

A lei relativa à adesão da Irlanda às Comunidades Europeias (European Communities Act) previa uma ratificação pelo Parlamento, num prazo de seis meses, de regulamentos adoptados pelo órgão executivo, mediante delegação, para assegurar a adaptação da legislação nacional ao Direito Comunitário. A modificação adoptada em 1973 (European Communities (Amendment) Act), motivada pela ineficácia desta disposição previa, a possibilidade de anulação dos regulamentos nacionais de aplicação no prazo de um ano, sem prejuízo de todos os actos que tivessem ocorrido anteriormente. A adopção dos regulamentos será acompanhada pela comissão parlamentar mista que pode recomendar a anulação dos actos adoptados, sempre que verifique uma violação das competências. Esta eventualidade nunca ocorreu e o poder do Governo parece ter sido consolidado pela jurisprudência do Tribunal Supremo. Este Tribunal condenou o recurso a circulares para a aplicação do Direito Comunitário, unindo-se assim à jurisprudência comunitária373.

371 Ver: RIDEAU, Joel - L' Europe dans les Constitutions ..., cit., p. 769. 372

Ver: RIDEAU, Joel - L' Europe dans les Constitutions ..., cit., p. 774.

2.10. Grécia

A Grécia recorreu às delegações legislativas com base no artigo 43.º da Constituição para assegurar a adaptação da legislação helénica às suas obrigações comunitárias, na ocasião e a seguir à sua adesão. O artigo 43.º serviu, posteriormente, de base jurídica a novas delegações374.

2.11. Espanha

Em Espanha, a lei n.º 47/85, de 27 de Dezembro de 1985, estabeleceu, em aplicação de disposições constitucionais, as bases da delegação ao Governo de poderes para o funcionamento do Direito Comunitário anterior à adesão. Foram tomadas medidas, em 1990, pelo Governo para acelerar a transposição de normas comunitárias. Diz a doutrina que, no que respeita ao direito espanhol, nenhuma norma constitucional ou de valor inferior considera a recepção dos actos das organizações internacionais com carácter geral. González Campos tem vindo a afirmar “que por analogia com o que dispõe a respeito dos tratados no artigo 96.º, n.º 1, do texto constitucional, poderia chegar-se à conclusão de que o direito espanhol exige a publicação no B.O.E. dos actos das organizações internacionais - à margem das Comunidades - que são directamente obrigatórios para os Estados-membros, em virtude do tratado constitutivo da Organização”. O tempo parece ter-lhe dado plenamente razão: o Conselho de Estado, no parecer de 9 de Setembro de 1993, a propósito da Resolução n.º 827 (1993), de 25 de Maio, do Conselho de Segurança das Nações Unidas, pela qual se criava um Tribunal Internacional para julgar os crimes internacionais perpetrados na antiga Jugoslávia, considerava que “para os efeitos do artigo 96.º, n.º 1, da Constituição, as resoluções das organizações internacionais em que Espanha participe se assemelham aos tratados celebrados por Espanha, pelo que tais resoluções ficam automaticamente incorporadas no nosso direito interno uma vez que se tenham perfeccionado na esfera internacional e tenham sido publicadas no Boletim Oficial do Estado. Bastará, contudo, a publicação no diário oficial da organização de que se trate, quando assim se preveja no tratado constitutivo da organização.”

375

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374

Ver: RIDEAU, Joel - L' Europe dans les Constitutions ..., cit., p. 771.

Assinala também que os actos das organizações internacionais não são completamente alheios ao ordenamento jurídico espanhol, o que é comprovado pela leitura do artigo 10.º, n.º 2, da Constituição. O citado preceito estabelece, como elementos de interpretação dos direitos e liberdades fundamentais proclamados pela Constituição, os tratados sobre a matéria em que Espanha seja parte, assim como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, incorporada numa Resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas e que como tal não tem valor jurídico obrigatório376.

Diz ainda a doutrina que a exigência de publicação oficial, a que se refere o artigo 96.º, n.º 1, da Constituição espanhola para os tratados internacionais, e que é extensível aos