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PARTE III – A REPERCUSSÃO GERAL

6. Repercussão geral

6.9. Repercussão geral e ativismo judicial

Até que ponto a expansão do poder do Judiciário, por meio de atos de controle sobre os demais poderes da República, cingem-se ao campo jurídico e a partir de que instante esse controle ultrapassa conteúdos de deliberação eminentemente política e sobre relações sociais complexas?

O tema já vem sendo abordado desde a década de 1960, quando Bernard Schwartz dissertou acerca da capacidade do Judiciário interferir da maneira mais incisiva na vida política, a legitimar o grau de importância que a população deposita nas instituições democráticas, ou, mais precisamente, a credibilidade que esta instituição tem perante o público. Para Schwartz a base de sustentação da Corte Suprema americana são a Constituição e a opinião pública.326

Lawrence Baum327 na obra em que analisa a Suprema Corte Americana demonstra que os sistemas político-jurídicos atuais não são capazes de evitar choques entre os poderes e muito menos de evitar repercussões indesejadas. Principalmente, nos países que adotam o sistema presidencialista de governo em razão da tendência natural de hipertrofia do Poder Executivo.

Em um mundo globalizado como o que vivemos seria desnecessário, em princípio, um estudo comparado dos sistemas jurídicos, dadas as múltiplas influências entre eles. Porém, ao tratar do tema ativismo judicial perceberemos que o estudo comparado é importante porque “na avaliação do modo de exercício da função jurisdicional, o fenômeno será percebido diferentemente de acordo com o papel institucional que se atribua em cada sistema ao Poder Judiciário”.328

326

SCHWARTZ, Bernard. Direito Constitucional Americano. Rio de Janeiro: Forense, 1966. No mesmo sentido, cf. SCHUBERT, Glendon A. Constitutional politics: the Political Behavior of Supreme Court

Justices and the Constitutional Policies that they make. New York: Holt, Rinehart and Winston, 1960.

327

BAUM, Lawrence. A Suprema Corte Americana: uma análise da mais notória e respeitada instituição judiciária do mundo contemporâneo. Rio de Janeiro: Forense, 1987.

328

Por essa razão, passaremos à análise do ativismo judicial começando pela experiência norte-americana, pelas peculiaridades do sistema jurídico adotado.

6.9.1. O ativismo judicial na experiência norte-americana

Nos sistemas de common law, como é o caso dos direito na Inglaterra e nos Estados Unidos — ainda que no caso estadunidense haja uma Constituição dotada de supremacia formal e em ambos os países tenha crescido a importância das leis —, a jurisprudência continua a ocupar destaque como principal fonte.

René David afirma que:

Países de direito romano-germânico e países de common law tiveram uns com os outros, no decorrer dos séculos, numerosos contatos. Em ambos os casos, o direito sofreu a influência da moral cristã e as doutrinas filosóficas em voga puseram em primeiro plano, desde a época da Renascença, o individualismo, o liberalismo e a noção de direitos subjetivos. A common law conserva hoje a sua estrutura, muito diferente da dos direitos romano-germânicos, mas o papel desempenhado pela lei foi aí aumentando e os métodos usados nos dois sistemas tendem a aproximar-se; sobretudo a regra de direito tende, cada vez mais, a ser concebida nos países de common law como o é nos países de família romano- germânica. Quanto à substância, soluções muito próximas, inspiradas por uma mesma ideia de justiça, são muitas vezes dadas às questões de direito nas duas famílias de direito.329

A decisão no sistema common law tem dupla função: define a controvérsia, e isso implica em as partes não poderem mais renovar o debate sobre as questões decididas; e a decisão judicial tem valor de precedente330, devido à doutrina do stare

decisis.331

329

DAVID, René. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. 23. ed. Tradução de Hermínio A. Carvalho. São Paulo: Martins Fontes, 1993, p. 20.

330

No tocante o precedente Guido Soares nos ensina que “precedent é a única ou várias decisões de appellate

court, órgão coletivo de segundo grau, que obriga sempre o mesmo tribunal ou os juízes que lhe são

Elival da Silva Ramos esclarece que:

Diante de um precedente, os órgãos incumbidos do exercício da função jurisdicional se comportam como o fazem os magistrados nos sistemas romano- germânicos diante da Constituição ou da lei: primeiro verificam a pertinência do julgado diante do caso que lhes é trazido a julgamento, pois podem entender que a norma dele inferida não é aplicável à controvérsia atual, em razão de diferenças relevantes no respectivo material fático (a técnica do distinguishing); em segundo lugar, procede-se ao refinamento da interpretação do texto da decisão precedente, do que poderá resultar a restrição ou ampliação dos efeitos da norma a ele acoplada ou até mesmo o reconhecimento da revogação, total ou parcial, do precedente (a técnica do overruling); finalmente na hipótese de se assentar a imprestabilidade do precedente para o caso sub judice, o juiz ou o tribunal produzirão a norma de decisão com base nos princípios gerais do

common law, no raciocínio analógico ou na equidade, de forma similar ao

procedimento de integração de lacunas nos sistemas de civil law, mas com a relevante diferença de que essa decisão inovadora, se adotada por tribunal de apelação ou superior, passará a constituir um precedente vinculativo.332

Se levarmos em consideração que o ativismo judicial, em termos preliminares, vem a ser considerado uma disfunção no exercício da função jurisdicional, em detrimento da função legislativa, perceberemos a dificuldade em identificar no sistema do common law, diferentemente do que ocorre no sistema da família romano-germânica, a caracterização do que seria uma atuação ativista da magistratura, em contraposição a uma atuação mais ousada, porém ainda dentro dos limites do juridicamente permitido.

Há uma proximidade bem maior entre a atuação do juiz e a do legislador no que tange à produção de normas jurídicas na família originária do direito anglo-saxônico, como é o caso de Inglaterra e Estados Unidos.

A capacidade de estabelecer atos disciplinares de condutas futuras (e não apenas nos limites do caso a decidir, em desdobramento de textos legais ou judiciais previamente estipulados) conferida aos tribunais ingleses e estadunidenses se

(SOARES, Guido Fernando Silva. Common law: introdução ao direito dos Estados Unidos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 40.).

331

Sobre o tema ver a obra: SOARES, Guido Fernando Silva. Common law..., 1999.

332

soma à possibilidade, que detêm, de dar ensejo ao exercício dessa função normativa, mediante a revogação de precedentes que, em tese, constituiriam um parâmetro a ser observado. Afinal, é disso que se trata quando, com grande margem de discricionariedade, um tribunal de apelação ou superior declara

overruled um precedente emanado dele próprio e passa a agregar ao

ordenamento um novo ato normativo vinculante. [...] De outra parte, a própria adaptação de um precedente aos contornos fáticos diferenciados de um novo caso por meio de interpretação com efeitos restritivos ou ampliativos pode importar em decisão vinculante no âmbito de uma determinada estrutura judiciária. [...] Por último, há que se ter presente que o espírito do common law, de um direito criado a partir de casos julgados, interfere na maneira dos juízes e tribunais considerarem o direito legislado.333

Assim, afirma René David, na Inglaterra e nos Estados Unidos, cuja regulação continua sendo essencialmente judiciária, “as leis são plenamente integradas no direito apenas quando o seu alcance foi determinado por decisões judiciárias”.334

Essa força normativa dos precedentes levou Mauro Cappelletti a afirmar que nos Países do common law “o direito legislativo é visto em certo sentido como fonte excepcional do direito”.335

Ao analisar o ativismo judicial Lawrence Baum afirma que a Suprema Corte Americana intervém mais direta e nitidamente no processo de elaboração de políticas através do uso da revisão judicial, apesar de reconhecer que a revisão judicial não é a única base para as políticas ativistas, já que a Corte pode entrar em conflito com as políticas de outros poderes do Governo através de suas interpretações de leis.336

O uso mais conhecido da revisão judicial é sobre leis federais. Esta forma de revisão judicial também representa notável afirmação de poder pela Corte. Quando a Corte revoga uma lei federal sob fundamentos constitucionais, implicitamente impõe seu julgamento àquele dos outros poderes do Governo Federal.337

333

RAMOS, Elival da Silva. Ativismo judicial..., p. 108-109.

334

DAVID, René. Os grandes sistemas contemporâneos, p. 347.

335

CAPPELLETTI, Mauro. Juízes Legisladores? Tradução de Carlos Alberto Álvaro de Oliveira. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1993, p. 123.

336

BAUM, Lawrence. A Suprema Corte Americana, p. 260.

337

Ressaltando que a Corte declarou inconstitucional pela primeira vez uma lei do Congresso em 1803, no famoso caso Marbury versus Madison, ele chama a atenção para o fato de que até 1983 a Corte havia revogado no todo ou em parte 114 leis federais, número considerado expressivo se levar em consideração que ela fez uso de seu poder de revisão uma vez a cada dois anos em média, porém se comparada com a quantidade de leis criadas pelo Congresso, mais de 60 mil, isso representaria uma fração bastante pequena.

Uma questão é a importância das disposições que a Corte tem anulado. A Corte revogou algumas leis de grande significação. Entre elas estiveram o Acordo de Missouri de 1820, concernente à escravidão nos territórios e que a Corte declarou inconstitucional no caso Dred Scott, em 1857; as leis sobre trabalho do menor que a Corte revogou em 1918 e 1922; e a legislação do New Deal que a Corte revogou em 1935 e 1936. Mas muitas das decisões da Corte que declaram inconstitucionais certas medidas, talvez a maioria, foram bem sem importância para os objetivos do Congresso e do Presidente do País quanto a políticas. Algumas das leis envolvidas eram de pouca significação. Em outros casos, a Corte revogou disposições relativamente sem importâncias de leis ou declarou- as inconstitucionais somente quando aplicadas a determinadas circunstâncias.338

Para Lawrence Baum uma questão que deve ser levada em consideração na abordagem da revisão judicial da Corte é a época de seu uso.

Em grande parte do tempo, a Corte tem revogado legislação muitos anos depois de sua promulgação. Até 1982, 61 por cento de todas as decisões que anularam legislação vieram mais de quatro anos depois da promulgação e 28 por cento estava em vigor há vários anos. Quando a legislação já estava em vigor há vários anos, antes de a Corte revogá-la, é improvável que a revogação suscita [sic] muita indignação congressional. Isto é particularmente verdadeiro quando a maioria que apoiava a política em questão já desapareceu com o passar do tempo.339

Por essas razões, afirma ele, o uso mais ou menos freqüente pela Corte de seu poder de rever leis congressuais é um pouco enganador.

338

BAUM, Lawrence. A Suprema Corte Americana, p. 261.

339

Qualquer decisão que revogue uma lei federal pode parecer envolver importante conflito entre a Corte e o Congresso, mas tais decisões, na verdade, podem atrair pouca atenção congressional ou pública. Falando de um modo geral, a revogação pela Corte de leis do Congresso é mais significativa quando as próprias leis são importantes e são revogadas com relativa rapidez. Somente uma minoria de casos entra nesta categoria.340

Outra questão a ser destacada que diz respeito à época do uso da revisão judicial são os padrões históricos, pois a Corte Americana não revogou leis a um ritmo regular, pelo contrário, revogou apenas duas leis antes de 1865, nos oito anos seguintes revogou oito leis e no meio século a seguir atacou leis do Congresso a uma taxa de mais de uma a cada dois anos. E apenas durante o período de 1918 a 1936, em que revogou duas leis sobre o trabalho do menor e uma lei de salário-mínimo, a Corte realmente esteve em conflito importante com o Congresso como legislador.341

Quanto à revisão judicial de decisões presidenciais, Baum explica que elas podem ser impugnadas sob o fundamento de que conflitam com leis, com a Constituição ou com ambas. Ao decidir sobre tais impugnações, a Corte pode revogar políticas presidenciais do mesmo modo como poder revogar políticas congressionais. A Corte, uma vez ou outra, tem invalidado ato presidenciais importantes. A exemplo, temos: No ex parte Milligan (1866), a Corte decidiu que ao Presidente Lincoln faltara poder para suspender a ordem de habeas corpus para presos militares. No caso Youngstown Sheet and Tube Co.

versus Sawyer (1952), declarou que era ilegal o Presidente Truman ordenar que o Governo

Federal encampasse grandes acearias durante uma greve em tempo de guerra. No caso Train versus Cidade de Nova York (1975), a Corte limitou o poder do Presidente de recusar-se a gastar dinheiro destinado pelo Congresso, prática conhecida como retenção, que já havia sido usada pelo Presidente Nixon para reduzir ou eliminar programas dos quais discordava.342

Em síntese, Baum afirma que o histórico da Corte em geral pode ser visto sob duas perspectivas bem diferentes:

340

BAUM, Lawrence. A Suprema Corte Americana..., p. 262.

341

Id.,ibid., p. 263.

342

Por um lado, os juízes, nitidamente, têm feito significativo uso do poder de revisão judicial como instrumento de elaboração de políticas. Ao revogar decisões do Governo, a Corte Suprema tem desempenhado importante papel em algumas partes do processo de políticas. Ao mesmo tempo, o impacto deste poder é limitado. A grande maioria das políticas públicas, em todos os níveis de governo, tem continuado em funcionamento sem interferência da Corte. [...] Certamente, a Corte não se tem feito o participante dominante do processo de elaboração de políticas através da revisão judicial.343

Keenan Kmiec344 em estudo mais recente demonstra que há na atualidade, em sede doutrinária, na experiência norte-americana, cinco conceituações sobre o ativismo judicial, de uso corrente, elencadas da seguinte maneira:

1) A prática dedicada a desafiar atos de constitucionalidade defensável emanados em outros poderes.

Nessa primeira conceituação o ponto de fragilidade reside em sua potencialidade lesiva ao princípio da separação dos poderes. Posto que o Judiciário poderia assumir duas posições diante das escolhas políticas realizadas pelo legislador nos casos de maior incerteza quanto à correta dicção do texto constitucional: adotar uma postura autolimitativa (self-restraint) e privilegiar a decisão do parlamento em face de questões controversas; ou dizer o direito aplicável às questões politicamente sensíveis, o que caracterizaria o ativismo judicial, a invalidar por inconstitucionalidade escolhas políticas dos outros órgãos estatais.

A dificuldade em identificar o ativismo judicial reside no processo de interpretação constitucional. O parâmetro utilizado para caracterizar uma decisão como ativismo ou não reside numa controvertida posição sobre qual é a correta leitura de um determinado dispositivo constitucional. E não é a mera atividade de controle de constitucionalidade que permite a identificação do ativismo como traço marcante de um órgão jurisdicional, mas a reiteração dessa mesma conduta de desafio aos atos de outro poder, perante casos difíceis.

343

BAUM, Lawrence. A Suprema Corte Americana..., p. 269.

344

KMIEC, Keenan D. The origin and current meanings of judicial review. California Law Review, oct. 2004, p. 1463-1476. Disponível em:< http://www.constitution.org/lrev/kmiec/judicial_activism.htm>. Acesso em: 8 fev. 2011.

2) A estratégia de não-aplicação dos precedentes. Essa conceituação guarda relação com o afastamento, pelo julgador, dos precedentes judiciais. Para melhor compreender o traço identificador da afirmação, vale destacar brevemente a estrutura dos sistemas jurídicos pertencentes ao sistema da common law. A base desses sistemas é a doutrina do stare decisis, na qual as decisões proferidas por órgãos de julgamento superiores devem ser seguidas por entidades judicantes inferiores toda vez que estas estiverem diante de fatos idênticos (verticalização dos precedentes). Ademais, um tribunal não deve ignorar suas próprias decisões anteriores (horizontalização dos precedentes), a menos que haja espaço para o overruling: desconstituição fundamentada do precedente, que não mais guardará o caráter vinculante reconhecido até então. Assim, nessa segunda vertente, o ativismo judicial seria um desrespeito às decisões com força vinculante (vertical ou horizontal) sobre o respectivo órgão judicante.

3) A conduta que permite aos juízes legislar da sala de sessões. Esse terceiro sentido voltado ao termo ativismo, chama a atenção para os juízes legisladores, e diz respeito à própria concepção que se tem do direito. Para alguns, o papel dos tribunais não é criar, mas revelar o sentido implícito do texto normativo. Uma corte ativista, neste sentido, seria a que ultrapassa os limites dados pelo texto normativo, ao impor sua própria eleição de meios e fins ao tratamento de temas relevantes.

4) O afastamento dos cânones metodológicos de interpretação. Essa definição identifica ativismo ao verificar na prática o afastamento, da corte, dos cânones aceitos de interpretação.

5) O julgamento para alcançar resultado pré-determinado. Esta definição identifica o ativismo na prática jurisdicional cujo objeto seria alcançar finalidades predeterminadas. O ativismo e todos os demais traços percorridos podem constituir-se em técnicas ou instrumentos necessários a essa vontade do julgador. E dificilmente será possível descortinar os motivos subjacentes à decisão judicial, ainda mais de forma a evidenciar que a vontade do julgador tenha sido o principal elemento orientador.

Elival da Silva Ramos chama a atenção para o fato de que apesar de nos sistemas de common law as decisões judiciais assumirem a condição de ato veiculador de

norma jurídica balizadora de conduta e de novos atos de aplicação, que vão além, portanto, da concretização do direito em situações fáticas determinadas,

não há que se equiparar a função exercida pelos juízes e tribunais com aquela desempenhada pelo legislador, já que o móvel principal da atividade do Poder Judiciário é sempre a solução de um litígio, predominando, pois, a dimensão aplicativa ou executória sobre a criativa ou prescritiva. Tanto é assim que, mesmo nos casos em que há amplo espaço para a movimentação do juiz, por inexistir precedente aplicável ou por existir um texto legislativo vazado em linguagem da qual decorram conceitos amplos e indeterminados, não se comportam os órgãos de jurisdição como um autêntico legislador, tanto mais que estão compelidos, ao contrário deste, a justificar suas decisões, o que fazem lançando mão de argumentação técnico-jurídica (escolha de método de interpretação adequado, integração por meio de princípios gerais de direito ou analogia etc.).345

Diante do exposto, fica evidente porque no sistema de common law se adota uma conceituação ampla de ativismo judicial, que contempla desde o uso da interpretação teleológica e integração de lacunas, com atuação irrepreensível do Poder Judiciário, até as situações, ainda que raras no sistema jurisprudencial anglo-saxão, em que os limites impostos pelo legislador são claramente ultrapassados, configurando desvio de função por parte do órgão jurisdicional. Na família anglo-germânica, portanto, afirma Elival da Silva Ramos:

Não, há, pois, necessariamente, um sentido negativo da expressão “ativismo”, com alusão a uma certa prática de jurisdição. Ao contrário, invariavelmente o ativismo é elogiado por proporcionar a adaptação do direito diante de novas exigências sociais e de novas pautas axiológicas, em contraposição ao “passivismo”, que, guiado pelo propósito de respeitar as opções do legislador ou dos precedentes passados, conduziria a estratificação dos padrões de conduta normativamente consagrados. Na medida em que no âmbito do common law se franqueia ao Poder Judiciário uma atuação extremamente ativa no processo de geração do direito, torna-se bem mais complexa a tarefa de buscar, no plano da dogmática jurídica, parâmetros que permitam identificar eventuais abusos da jurisdição em detrimento do Poder Legislativo. Daí por que a discussão, como se constata nos Estados Unidos, tende a se deslocar para o plano da Filosofia política, em que a indagação central não é a consistência jurídica de uma

345

atuação mais ousada do Poder Judiciário e sim a sua legitimidade, tendo em vista a ideologia democrática que permeia o sistema político norte-americano.346

6.9.2. Ativismo judicial em sistema de civil law

O tema do ativismo judicial transcende as fronteiras norte-americanas para alcançar, em maior ou menor intensidade, quase todos os países que tenham optado pelo constitucionalismo no modelo ocidental, graças a alguns aspectos: