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José Afonso da Silva entende que os direitos sociais prescritos na Constituição seriam normas constitucionais de princípio programático, cuja eficácia é limitada e aplicabilidade é imediata, em contraposição aos direitos individuais que para o autor teriam aplicabilidade direta e imediata261.

As normas programáticas, segundo o autor, seriam de três tipos (aquelas vinculadas ao princípio da legalidade; aquelas referidas aos Poderes Públicos, vinculando só um ou mais de um ente estatal; aquelas dirigidas à ordem econômico-social)262 e teriam as seguintes características:

260 BURGO, Vitor. O controle judicial das políticas públicas. (no prelo).

261 Observe que José Afonso da Silva identifica os direitos sociais aos direitos coletivos, o que já foi por

nós refutado no Capítulo 2. SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 7. ed., 2. tir. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 40.

262 SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 7. ed., 2. tir. São Paulo:

I – São normas que têm por objeto a disciplina dos interesses econômico-sociais [...].

II – São normas que não tiveram força suficiente para se desenvolver integralmente, sendo acolhidas, em princípio, como programa a ser realizado pelo Estado [...].

III - São normas de eficácia reduzida, não sendo operantes relativamente aos interesses que lhe constituem objeto específico e essencial [...]263.

Dizer que as normas programáticas têm aplicabilidade imediata, no entanto, não significa para o autor, afirmar que tais normas sempre são capazes de gerar direitos subjetivos, porque a sua eficácia é limitada, pois dependem de norma futura que lhes outorgue eficácia plena.

Nessa ordem, Silva sustenta que as normas programáticas terão eficácia imediata em alguns casos, pois: a) vinculam o legislador, que deverá observá-las ao editar novas normas jurídicas; b) vinculam a atuação do Judiciário que deverá utilizá-las como parâmetro interpretativo integrativo do ordenamento jurídico; c) condicionam a atividade do administrador que, por sua vez, deve observá-las na sua atuação discricionária264.

O problema maior no que tange às normas programáticas é quanto à admissão ou não, de que seriam capazes de estipular direitos subjetivos.

Para José Afonso da Silva, as normas programáticas são hábeis a criar, embora com algumas restrições, situações jurídicas subjetivas.

Com efeito, algumas normas programáticas, como o direito à educação, são prescritas pela própria Constituição como direitos subjetivos públicos, podendo, nesse caso, servir para proteger situações jurídicas individuais. No entanto, nos demais casos, as normas programáticas só produziriam direitos subjetivos em seu aspecto negativo265, porquanto

263 SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 7. ed., 2. tir. São Paulo:

Malheiros, 2008. p. 150-151.

264 SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 7. ed., 2. tir. São Paulo:

Malheiros, 2008. p. 164.

265 Regina Nery traça observações similares às de José Afonso da Silva ao admitir a plena eficácia das

normas programáticas no que pertine à proteção de direitos subjetivos públicos negativos e reconhece que tais normas podem determinar um princípio, uma tarefa ou um fim, sujeitos, quanto aos meios, à realização discricionária. FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Normas constitucionais

o indivíduo poderia exigir a observância de tal norma, pelo Poder Público, mediante o controle concreto de constitucionalidade266.

Nota-se que, segundo o entendimento exposto, as normas programáticas teriam pouca efetividade no sentido de outorgar direitos subjetivos aos seus titulares.

Entendemos que tal posição não se coaduna com o Estado Democrático Constitucional, no qual os poderes investidos têm o dever de garantir a máxima efetividade aos direitos fundamentais, compreendendo que a Constituição Federal possui força normativa.

Regina Nery reconhece que nem sempre será possível extrair um direito subjetivo positivo das normas programáticas, eis que algumas delas estabeleceriam meros programas a serem cumpridos pelo Estado. Contudo, a autora afirma que em casos contrários (quando se identifica o titular do Direito e o dever em prestá-lo), a norma programática mostra-se justiciável267.

Posição interessante é a de Barroso, para quem a necessidade de lei integradora não torna programática uma norma268. Segundo esse autor, as normas constitucionais se dividiriam entre aquelas que se referem à própria organização do Estado; aquelas que definem direitos e às normas programáticas. Os direitos sociais, nesse passo, estariam incluídos na segunda espécie sendo “puramente ideológica, e não científica a resistência que ainda hoje se opõe à efetivação, por via coercitiva, dos chamados direitos sociais”269.

programáticas: normatividade, operatividade e efetividade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 219.

266 SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 7. ed., 2. tir. São Paulo:

Malheiros, 2008. p. 177-178.

267 Regina Nery inclui as normas programáticas do artigo 170, CF como normas programáticas que

estabelecem apenas finalidades públicas. FERRARI, Regina Maria Macedo Nery. Normas constitucionais programáticas: normatividade, operatividade e efetividade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 230-231. Quanto à justiciabilidade das normas programáticas vide página 240.

268 BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas: limites e

possibilidades da Constituição Brasileira. 7. ed., atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 122.

269 BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas: limites e

As normas programáticas, nesse caminhar, seriam apenas aquelas que definem fins sociais a serem alcançados, como as dos artigos 170, inciso III; 193 e 215, todos da CF, não podendo se confundir com as normas constitucionais definidoras de direitos.

Obviamente que por estarem na forma de princípios, na sua maioria das vezes, os direitos fundamentais terão certas dificuldades práticas de serem aplicados e entendidos como situações jurídicas complexas (vide Capítulo 2), mormente se for inexistente qualquer política pública para a sua efetivação.

Essa dificuldade será tanto maior quanto menor for a normatização sobre o direito social a ser aplicado. Nesse passo, se não houver lei alguma estipulando os meios de efetivação do direito social, o Judiciário terá muito mais dificuldade em densificar o conteúdo do direito fundamental do que se existente lei e regulamento próprios sobre a matéria270.

O Judiciário, todavia, não pode se quedar inerte, devendo atuar ativamente para impedir que a Constituição Federal se torne uma carta de promessas vazias frente à apatia do legislador e do administrador.

A reserva de lei, portanto, não pode ser óbice para a implementação dos direitos fundamentais, uma vez que se o legislador não agiu, cumprindo seus deveres constitucionais, deve o Judiciário fazê-lo, forjando conteúdo no caso concreto, ao direito fundamental invocado271.

270 Sobre o assunto, cf. SOUZA, Jorge Munhós de. A tutela jurisdicional coletiva dos direitos

fundamentais sociais prestacionais: contribuições para a construção de uma teoria da efetividade constitucional. Monografia de Conclusão de Curso. Vitória. Universidade Federal do Estado do Espírito Santo, 2008. (Orientador: Marcelo Abelha Rodrigues).

271 No âmbito das omissões legislativas, o STF vem conferindo nova roupagem ao Mandado de Injunção,

ao determinar a utilização de legislação análoga, aos casos de omissões legislativas inconstitucionais. Como exemplos, vide os seguintes julgados: MI 670, MI 708 e MI 712, definindo a aplicação subsidiária da Lei 7.783/1989 (Lei de Greve da iniciativa privada) para os servidores públicos, bem como os MI 795, MI 670, MI 708, MI 712 e MI 715 (estabelecendo o direito à aposentadoria especial para os servidores públicos, nos termos da Lei 8.213/1991).

No documento Direitos Sociais e Processo Judicial (páginas 95-99)