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Fluido de saturação

3.2 Resultados de ensaios

Esta seção apresenta resultados típicos de ensaios de cone e piezocone, com o objetivo de demonstrar a forma convencional de apresentação de resultados e familiarizar o leitor quanto à interpretação das informações obtidas no ensaio.

No caso do CPT, as grandezas medidas são a resistência de ponta (qc) e o atrito lateral (fs), sendo a razão de atrito (Rf) (= fs/qc) o primeiro parâmetro derivado do ensaio, utilizado para a classificação dos solos.

Conforme destacado anteriormente, um aspecto importante do piezocone é a falta de consenso com relação à localização do elemento filtrante para registro das poropressões durante a cravação, e a escolha de uma posição em particular – ponta (u1), base (u2) ou luva (u3) do cone – dependerá da aplicação dada às poropressões registradas no ensaio. Sabe-se, porém, que as medidas de resistência à penetração são influenciadas pelo efeito de poropressões atuando em

áreas desiguais da geometria do cone (Fig. 3.13), necessitando-se conhecer as pressões neutras medidas na base do cone, u2, para calcular a resistência real mobilizada no ensaio, qt (Campanella; Gillespie; Robertson, 1982; Jamiolkowski et al., 1985):

onde a = AN/AT. O coeficiente a é facilmente determinado por meio de calibração, conforme ilustrado na Fig. 3.13.

FIG. 3.13 Correções impostas às medidas de ensaios de piezocone

De modo análogo à correção de qc, o atrito lateral pode ser corrigido segundo a expressão:

onde ft é o atrito lateral corrigido; Asb e Ast são as áreas da base e topo da luva de atrito, respectivamente; e Al é a área lateral da luva de atrito.

É fundamental corrigir a resistência de ponta em todos os ensaios em que há monitoramento das pressões durante a cravação, especialmente para a determinação de propriedades em argilas moles (ver seção 3.2). Segundo a experiência dos autores, a correção do atrito lateral não é utilizada na prática de engenharia, até porque u3 raramente é medido.

Valores de medidas contínuas de qc, fs e Rf são plotados ao longo da profundidade na Fig. 3.14, na qual apresenta-se o resultado típico de um ensaio CPT. O ensaio foi realizado na costa de Florianópolis, SC (nearshore), para a construção do aterro hidráulico da Via Expressa Sul, para determinar a estratigrafia do depósito de forma a (a) orientar o projeto quanto à cubagem de areia disponível para dragagem e (b) localizar depósitos argilosos de intensa vida marítima, evitando sua prospecção. Identifica-se no perfil uma estratigrafia bastante variável, composta de estratos de

areia, argila e silte argiloso. Note-se que as camadas de areia são identificadas por valores de qc relativamente elevados (10 a 20 MPa), combinados a valores de Rf da ordem de 1%. As camadas de argilas caracterizam-se por um padrão oposto, com baixos valores de qc e razões de atrito acima de 5%.

FIG. 3.14 Ensaio CPT típico em solo estratificado

A classificação do tipo de solo pode ser obtida por procedimentos gráficos que relacionam diretamente qc × Rf (Begemann; 1965; Sanglerat, 1972; Schmertmann, 1978; Douglas; Olsen, 1981), por ábacos ou por planilhas eletrônicas (Jefferies; Davies, 1993; Robertson; Wride, 1998), conforme descrito abaixo.

No caso do piezocone, as informações qualitativas do CPT são complementadas por meio de medidas de poropressões geradas durante o processo de cravação. Nesse caso, utiliza-se um novo parâmetro de classificação de solos, Bq:

onde u0 são as pressões hidrostáticas; e σvo é a tensão vertical in situ.

As medidas contínuas de resistência ao longo da profundidade, associadas à extrema sensibilidade observada no monitoramento das poropressões, possibilitam a identificação precisa de camadas de solos. Pode-se, por exemplo, detectar camadas drenantes delgadas de poucos centímetros de espessura.

O exemplo típico de um perfil de piezocone é apresentado na Fig. 3.15, na qual as medidas contínuas de qt, Rf, u0, u e Bq são plotadas ao longo da profundidade. Identifica-se, com clareza, a existência de uma camada de argilas moles de aproximadamente 15 m de espessura, caracterizada por baixos valores de qt e geração significativa de excesso de poropressões (u ~ qt e Bq ~ 1). A ocorrência de uma lente de areia de pequena espessura à profundidade de 5,5 m é detectada pelo aumento pontual de qt e ∆U = 0.

FIG. 3.15 Resultado de um ensaio de piezocone na BR-101, em Santa Catarina

Uma das maiores críticas ao ensaio de cone refere-se à ausência de coleta de amostras para a identificação e a classificação das distintas camadas que compõem o subsolo. Para contornar esse problema, diversos autores apresentaram propostas de classificação de solos na forma de ábacos, que podem ser facilmente implementadas em programas computacionais de processamento e pós- processamento (p. ex., Schmertmann, 1978; Robertson; Campanella, 1983b; Robertson et al., 1986; Olson; Mitchell, 1995; Schneider; Lehane; Schnaid, 2008). Esses métodos utilizam as grandezas fundamentais medidas nos ensaios de cone ou piezocone (qc ou qt, fs e u2) e permitem definir o tipo de solo pelas medidas obtidas durante a cravação da sonda, em vez da determinação direta de suas características granulométricas. Trata-se de procedimento indireto de classificação, estabelecido com base em padrões de comportamento e definido pela sigla SBT (Soil Behaviour

Type Classification Chart).

Robertson e Campanella (1983b) apresentam um ábaco simplificado de classificação dos solos, no qual os valores de qc e Rf são usados para delimitar cinco regiões, cada uma delas associada a um tipo diferente de comportamento. Posteriormente, o método foi expandido com a inclusão do parâmetro de poropressão normalizado, Bq (Robertson et al., 1986), com os resultados plotados em dois ábacos, Qt × Fr(%) e Qt × Bq, para a identificação de 12 zonas de comportamento. Como esses procedimentos de classificação não levam em conta o aumento dos valores de qt e fs com o aumento da profundidade de ensaio, Robertson (1990) apresenta uma evolução do método estruturado na normalização de três grandezas fundamentais do ensaio, considerando o nível de tensões, como segue:

Nessa proposta de Robertson (1990), os resultados são plotados também em dois ábacos (Qt – Fr e Qt – Bq), identificando-se nove zonas destinadas a agregar materiais de diferentes tipos de comportamento (Fig. 3.16; Quadro 3.3).

Jefferies e Davies (1993) modificaram a proposta de classificação de Robertson (1990) introduzindo uma nova variável, baseada nos valores de qt e u2 (Qt · (1–Bq)), cujos resultados são expressos em um único ábaco válido para Bq < 1 (Fig. 3.17). Esse ábaco caracteriza regiões definidas por arcos concêntricos de círculos, cujo centro é dado por log(Qt) = 3 e log(Fr) = –1,5. Para permitir a implementação em planinhas de cálculo e facilitar o tratamento dos dados, Jefferies e Davies (1993) definiram o índice de classificação do material (Ic = material

classification index):

A metodologia baseada no valor de Ic permite também a identificação rápida das condições de drenagem para solicitações correntes em obras de engenharia. Podem-se considerar como drenados os solos com valores de Ic < 1,8 e não drenados os solos com valores de Ic > 2,76.

FIG. 3.16 Ábaco de identificação do comportamento típico de solos

Uma versão simplificada do método de Jefferies e Davies (1993) foi proposta por Robertson e Wride (1998), na qual o índice de classificação do material (IcRW) é determinado conforme a equação:

As zonas referentes aos tipos de solos são definidas na Tab. 3.2, segundo suas faixas de comportamento. Nessa proposta, o valor da resistência normalizada da ponta do cone é redefinido pela Eq. 3.11 (Robertson, 2004):

onde σatm = 1 atmosfera (≈ 1 bar = 100 kPa) e o expoente n = 1 para argilas (IcRW > 2,95); n = 0,75 para solos siltosos; e n = 0,5 para areias (IcRW < 2,05). Pode-se utilizar um procedimento iterativo para a determinação de n para solos intermediários, definido pelo próprio valor de IcRW e para o nível de tensão efetiva normalizada:

QUADRO 3.3 Classificação de solos por tipo de comportamento

Zona Tipos de solos

1 solo fino sensível 2 solo orgânico e turfas 3 argilas – argilas siltosas 4 argila siltosa – silte argiloso 5 siltes arenosos – areias siltosas 6 areias limpas – areias siltosas 7 areias com pedregulhos – areias 8 areias – areias limpas

9 areias finas rígidas Fonte: Robertson (1990).

Existem, ainda, abordagens baseadas em métodos probabilísticos, processo fuzzy e redes neurais que procuram classificar os solos em faixas de ocorrência, bem como inferir as porcentagens de areia, silte e argila contidas em determinada camada (p. ex., Zhang; Tumay, 1999; Tumay; Abu-Farsakh; Zhang, 2008).

FIG. 3.17 Classificação de solos por tipos de comportamento Fonte: Jefferies e Davies (1993).