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O RETROCESSO SOCIAL PRESENTE NA LEI N° 6.370/2015 E SEUS EFEITOS RETROATIVOS PARA POPULAÇÃO

1 A LEI 6.370/2015 DO MUNICÍPIO DE MACEIÓ E SEUS PRINCIPAIS ASPECTOS

2 LIMITES DA AÇÃO ESTATAL NA ALTERAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

2.1 O RETROCESSO SOCIAL PRESENTE NA LEI N° 6.370/2015 E SEUS EFEITOS RETROATIVOS PARA POPULAÇÃO

O princípio da Proibição ou Vedação do Retrocesso Social está inserido de forma implícita na Constituição Federal e decorre de outros princípios como A Dignidade da Pessoa Humana, da Segurança Jurídica, da Confiança e da Construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

A vedação ao retrocesso social se refere à ideia que um direito fundamental oferecido hoje pelo Estado não poderá ser diminuído amanhã de forma a configurar uma proteção menor a anterior. É o processo de ampliação de direito fundamentais, na medida em que eles devem ser sempre maiores do que foram no passado. Visa garantir o núcleo essencial dos direitos fundamentais, como bem explica Sarlet, (2014), que mesmo quando o legislador está constitucionalmente autorizado a editar normas restritivas, ele permanece vinculado à salvaguarda do núcleo essencial dos direitos restringidos.

113 Deste modo o legislador fica vinculado a editar normas com o pensamento voltado à necessidade e a obrigação de ampliar políticas públicas que aumentem o bem-estar da população, evitando assim o retrocesso. O que torna um dever do Estado em não apenas reconhecer a existência de um direito fundamental, mas torná- lo efetivo, respeitando as conquistas das gerações passadas sem prejudicar a futura, logo impede que haja restrições a direitos sociais que já foram efetivados no plano concreto. (SOARES, 2015).

Como nenhum princípio dentro do ordenamento jurídico é absoluto, a vedação do retrocesso social encontra no Princípio da Reserva do Possível uma espécie de barreira na concretização dos direitos sociais. Isto porque deve haver um equilíbrio financeiro e a pretensão desejada deve ser razoável e proporcional, com base no entendimento de que mesmo que o Estado deva conceder mecanismos necessários ao desenvolvimento e bem-estar do povo, não é possível atender a todas as demandas com máxima efetivação devido aos custos a serem financiados pelo governo.

Em contrapartida a reserva do possível, outro princípio de suma importância na efetivação dos direitos sociais é o Mínimo Existencial. Por este princípio o Estado não pode escorar-se na desculpa de não possuir orçamento suficiente quando a violação de um direito fundamental ponha em risco a integralidade física e psíquica de uma pessoa, capaz de comprometer até mesmo sua vida.

A vedação ao retrocesso social junto com o mínimo existencial procura firmar a segurança jurídica estabelecida entre o Estado e seu povo, que determina o grau de confiança das pessoas na estabilidade daquilo que uma vez foi ofertado pelo Poder Público, abrangendo desta forma o limite a retroatividade da lei e dos atos do Poder Público. (SARLET, 2015).

A atuação desses institutos é de medidas assecuratórias da continuidade da proteção ao direito fundamental dentro do ordenamento jurídico. Fazendo um paralelo com a Lei n° 6.370/2015, houve a quebra da confiança e da continuidade do serviço público aos antigos beneficiários pela atitude do governo municipal de não respeitar o princípio da vedação ao retrocesso social e retirar do plano social daquelas pessoas algo que já havia se inserido dentro de seus direitos adquiridos.

O governo de Maceió, ao implementar uma política pública de saúde, não pode deixar de observar os parâmetros constitucionais que limitam sua discricionariedade

114 na determinação dos critérios de acesso deste benefício, especificamente a Lei n° 6.370/2015, pela obediência ao direito à vida, a dignidade humana, a vedação do retrocesso social e a promoção do bem-estar de todos.

Além que uma vez inserida no ordenamento jurídica, uma lei quando trata de regular um preceito constitucional se incorpora dentro da sociedade e na vida pessoal de muitas pessoas, não podendo ser totalmente suprimido.

Deste modo a inconstitucionalidade refere-se ao fato de estar diante de uma afronta legislativa ao conteúdo do direito fundamental social concretizado pelo legislador e inserido ao patrimônio social do indivíduo. (SARLET, 2015)

A Lei 6.370/2015 teve efeitos retroativos ao estabelecer que os destinatários da norma anterior revogada deviam obedecer aos novos requisitos impostos pela nova lei. O objeto da discussão é saber se essa previsão é constitucional, pois a análise da lei permite concluir que ela impôs requisitos mais difíceis e abrangeu uma menor quantidade de pessoas. Ao passo em que ela modificou de modo a restringir o acesso a um direito fundamental, o questionamento que se faz é sobre sua incidência e se encontra posicionamento constitucional a favor de sua aplicação, mesmo diante de suas peculiaridades.

Em primeiro lugar se faz necessário esclarecer a importância da Lei 6.370/2015 do Município de Maceió em relação à efetivação do direito social à saúde pública, visto que a norma funciona como um meio de concretização desse direito. Partindo da ideia que os direitos fundamentais devem estar em constante progresso sem sofrer restrições que retirem a proteção do seu núcleo essencial, logo os meios de efetivação dos direitos fundamentais também devem ser apresentados em crescimento, de forma que exista uma ampliação nos mecanismos oferecidos pelo Estado. (STF. ACO 1.472 AgR-segundo, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Julgado em. 01-09-2017, DJe de 18-9-2017.).

A Lei 6.370/2015 de Maceió restringiu em certos pontos seu alcance e seus destinatários, deixando de contemplar certas deficiências físicas e alguns problemas de saúde que anteriormente eram embarcados pela legislação anterior, a Lei n° 4.635, de 13 de agosto de 1997.

A discussão sobre a constitucionalidade da nova lei responsável por regulamentar o transporte gratuito dentro do município leva em consideração não só a literalidade do texto da Constituição Federal de 1988, mas também sobre o sentido

115 que as normas constitucionais repassam ao deixar claro que o final deve ser a garantia do direito à vida e à saúde como pontos primordiais a qualidade de vida dentro de uma sociedade.

Deste modo, caso a nova lei prejudique direitos subjetivos a ponto de comprometer a integridade física e a saúde da população, ela é inconstitucional, pois o núcleo essencial do direito fundamental à saúde ficou desprotegido, fazendo com que houvesse um retrocesso em sua oferta pelo Poder Público, que ocasionou em um déficit no bem-estar social dentro do Município de Maceió.

Caso a nova lei ao restringir o grupo de acesso de seus destinatários não prejudique a saúde da população ligada a esse tipo de política pública e não haja um desequilíbrio no Sistema Único de Saúde, que tenha relação com a positivação da norma, a lei então seria constitucional, já que continuaria a proteger o núcleo essencial do direito fundamental à saúde, sem prejudicar direitos subjetivos e sem ocasionar a baixa no bem-estar físico e mental da população.

Além do âmbito de proteção do direito à saúde, consagrado constitucionalmente nos artigos 6° e 196° da Constituição Federal de 1988, o inciso XXXVI do art. 5° da CRFB/88 protege o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, chamado de irretroatividade da lei.

Este artigo da Constituição impede que uma nova lei prejudique terceiros que tenham sido beneficiados com garantias disponibilizadas pelo Estado, como consequência pode se extrair a ideia de que a Lei n° 6.370/2015 de Maceió ao retirar o direito do transporte gratuito a alguns usuários é inconstitucional por prejudicar o direito adquirido por elas anteriormente, já que foram conquistados pelo cumprimento dos requisitos da legislação anterior.

Este aspecto permite a atuação do Poder Judiciário intervir na esfera do Poder Executivo, já que a própria Constituição Federal protege a lesão ou ameaça ao direito, como dispõe a redação do artigo 5°, inciso XXXV que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, ou seja, é possível reivindicar normas através do judiciário.

Essa possibilidade da intervenção do Poder Judiciário em determinar a atuação do Poder Executivo nas políticas públicas de saúde será estudada no próximo capítulo, analisando como se manifesta, inclusive o Ministério Público do Estado de Alagoas.

116 3 INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO NA EXECUÇÃO DA NORMA