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Revisão das pesquisas

No documento O ASSÉDIO MORAL ORGANIZACIONAL (páginas 79-84)

Capítulo II O assédio moral organizacional

1.1. Revisão das pesquisas

A primeira pesquisa noticiada pela literatura foi elaborada por Heinz Leymann, em 1992, que observou o assédio moral em cerca de 3,5% da população ativa sueca no ano de 1990 e relacionou-o com 10 a 20% dos suicídios146. As vítimas se subdividem em 55% do sexo feminino e 45% do sexo masculino. Cerca de um terço dos assédios foi cometido por uma única pessoa e 40% de duas a quatro pessoas147. Seu estudo despertou o mundo do trabalho para a gravidade do problema, multiplicando as pesquisas em todo globo.

No início de 2000, a Fundação de Dublin realizou uma enquete entre os assalariados de 15 Estados-membros europeus e verificou a ocorrência de intimidação no local de trabalho em 9% deles (aproximadamente 13 milhões de pessoas), dos quais 2% se declararam vítimas de assédio sexual e 2% de violência psíquica. Na França, a associação “Mots pour maux au travail”, em conjunto com os médicos do trabalho da Alsácia, detectou, nos meses de fevereiro e março de 2000, a presença de assédio no local de trabalho de 9,6% dos entrevistados.

146 LEYMANN, Heinz. Mobbing its course over time. Disponível em <http://www.leymann.se/English/frame.html>. Acesso em 13.3.2006.

147 LEYMANN, Heinz. Epidemiological Findings. Disponível em

Com intuito de detalhar especificamente no assédio moral, os psicólogos, Jean-Luc Viaud e Jean-Luc Bernaud, da Universidade de Rouen, dirigiram um questionário às pessoas registradas na Associação Nacional de Vítimas de Assédio Psicológico no Trabalho (Association nationalie e victimes de harcèlement psychologique au travail), as quais constataram a presença majoritária (mais de 70%) de mulheres com mais de 40 anos e formação superior entre as vítimas. Outro dado expressivo é a presença de mais de um agressor, em 80% dos casos, sendo 44% deles praticado por um grupo de quatro pessoas. Os agressores individuais são na maioria homens (74,5%), enquanto as mulheres se apresentam como sujeito ativo na maioria dos assédios realizado por grupos de mais de quatro pessoas (56,8%). Quase a totalidade dos assédios foram praticados por superiores hierárquicos das vítimas (90%). Em 87,5% dos casos há mais de uma vítima e em 45% deles o número de vítimas supera quatro148.

A Confederação Cristã de Sindicatos de Luxemburgo (LCGB) apurou, a partir de 1999, que a maior parte das vítimas foi assediada por pessoas do mesmo sexo: 70% dos homens e 30% das mulheres foram agredidos por homens, 40% das mulheres e 3% dos homens, por mulheres e 30% das mulheres e 21% dos homens, por agressores de ambos os sexos. Desse total, 44% dos agressores estavam no mesmo nível hierárquico das vítimas e 37% em nível superior.149

No Brasil, a médica do trabalho Margarida Barreto estima a ocorrência de assédio moral em 36% da população ativa. Na pesquisa que realizou junto à indústria química, plástica, farmacêutica, de cosméticos e similares de São Paulo, em 1997, o percentual encontrado alcançou 42% dos trabalhadores, o qual estava dividido na

148 DEBOUT, Michel. Le harcèlement moral au travail. Paris: Conseil économique et social, 2001, p. 25/27.

proporção de 51% para mulheres e 49% para homens. A faixa etária variava em média entre 30 e 50 anos e quase a metade dos trabalhadores sequer completaram o primeiro grau.150

A diferença dos percentuais de incidência da questão se deve claramente aos locais das pesquisas, ramos de atividades (quando específicos) e critérios como a periodicidade e a conceituação da conduta abusiva. Os dados da Suécia são menores em face do caráter restrito do conceito de Heinz Leymann (somente há o mobbing se a vítima desenvolve doenças psíquicas e físicas, cuja agressão se repita uma vez por semana pelo período mínimo de 6 meses). Esse autor desconsidera as atitudes mais sutis do agressor, as quais se manifestam no momento antecedente ao início da agressão ou degeneração do conflito. A inclusão de atitudes sutis eleva o percentual de vítimas para algo entre 9 e 10%151, como se verificou na França. A pesquisa francesa da Alsácia, por sua vez, adotou como critério a prática, ao menos uma vez, de uma das condutas identificadas como abusivas, elevando também o percentual para 9,6% dos trabalhadores. A pesquisa da Confederação de Luxemburgo incluiu na definição de assédio moral o assédio sexual. No Brasil, o critério utilizado foi a descrição pela vítima de uma situação humilhante durante consultas médicas no sindicato.152

Interessa destacar a influência do nível de conscientização e de debate do problema nos resultados divulgados, como apurou a Fundação de Dublin, ao verificar a superioridade do percentual de vítimas na Finlândia, no Reino Unido e nos Países Baixos, 149 Disponível em < http://www.eiro.eurofound.eu.int/2001/05/inbrief/lu0105166n.html>. Acesso em

01.03.2005. 150

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151 HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho: redefinindo o assédio moral. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002, p. 117.

países em que o debate público se iniciou há diversos anos. Heinz Leymann testemunha essa circunstância com a seguinte declaração: “Inúmeras foram as vítimas de assédio que se manifestaram para nos dizer que nossa terminologia lhes ajudou a melhor conhecer e analisar aquilo a que foram submetidas.”153

Ao contrário do que defendem alguns estudiosos, os dados acima, em sua maioria, corroboram a assertiva de que o assédio moral não traduz uma modalidade de discriminação de gênero. Há pessoas de ambos os sexos tanto nos pólos ativos quanto passivos. A predominância de mulheres entre as vítimas em algumas pesquisas decorre da cultura local154 e do fato de elas, majoritariamente, integrarem a força de trabalho mais precária e, por conseguinte, mais sujeita ao estresse155. Além do mais, deve ser levada em conta a dificuldade masculina em se reconhecer na posição de vítima, pois o assediado é identificado como uma pessoa frágil dentro do grupo. Os países escandinavos e germânicos apresentam números muito próximos de homens e mulheres assediados: Estrasburgo: 56,5% de homens e 43,5% de mulheres; Noruega (1996) 55,6% de mulheres e 43,9% de homens. O primeiro levantamento brasileiro, restrito ao estado de São Paulo, 152 O percentual encontrado por Margarida Barreto é próximo ao percentual obtido por uma revista francesa que utilizou o mesmo critério subjetivo (30%). HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho:

redefinindo o assédio moral. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002, p. 117.

153 “nombreuses sont les personnes victimes de mobbing qui se sont manifestées pour nous dire que notre terminologie les a aidées à mieux saisir et analyser ce qu’on leur faisait subir”.(LEYMANN, Heinz. Apud DEBOUT, Michel. Le harcèlement ..., p. 18.

154 “Mas é necessário atribuir tais percentagens ao contexto sociocultural. Os países escandinavos e a Alemanha manifestam um real preocupação com a igualdade de oportunidades entre os dois sexos. Nos países latinos ainda reina uma atmosfera machista. Na Itália, na Espanha e na América Latina, muitos homens consideram que cada mulher que trabalha é culpada por um desempregado entre os homens”. Em nota de rodapé a autora ainda reforça: “ Também se pode considerar que uma outra ponta do nosso estudo estaria ligada ao fato de as mulheres exprimirem sentimentos mais facilmente do que os homens, sobretudo quando o interlocutor é um psiquiatra” (HIRIGOYEN, Marie-France. Mal-estar no trabalho, p. 99).

155 “ [...] B. Considerando que a frequência da violência e do assédio no trabalho, fenómenos entre os quais a Fundação inclui o assédio moral, varia muito entre os Estados-Membros, devido, segundo a Fundação, ao facto de que os casos são pouco declarados em certos países, que a sensibilização é maior noutros e que existem diferenças de sistema jurídico e diferenças culturais; que a insegurança das condições de trabalho é uma razão essencial da frequência crescente da violência e do assédio, [...]2. Chama a atenção para o facto de o crescente aumento dos contratos a termo e da precariedade do emprego, especialmente entre mulheres, proporcionar condições propícias à prática de diferentes formas de assédio; [..]” Trecho extraído do relatório da Fundação Dublin. (Disponível em <http://www.assediomoral.org/site/legisla/I-europeu.php>. Acesso em 12.07.2005).

curiosamente também registrou percentuais muito próximos como vimos acima. A pesquisa nacional, por outro lado, apontou a prevalência de mulheres (65%) entre as vítimas.156

De toda sorte, o que chama atenção nas pesquisas mais detalhadas é a menção da prática conjunta do assédio. No estudo da Confederação Cristã de Sindicatos de Luxemburgo, o mobbing foi praticado por mais de uma pessoa contra 51% dos entrevistados, sendo que, em 44% dos casos, os agressores tinham o mesmo nível hierárquico da vítima. A Universidade de Rouen apurou a atuação coletiva em 80% dos casos, sendo que as vítimas também não estavam isoladas, compondo uma coletividade em 87,5% deles. No Brasil, o estudo nacional da médica Margarida Barreto indica como agressor isolado o chefe, em 90% dos casos; no restante das situações há mais de um agressor envolvido, subdividos em: 6% o chefe e os colegas, 2,5%, os colegas e 1,5% os subordinados. Embora não existam dados específicos em relação às vítimas, a literatura157 e jurisprudência também descrevem predominantemente situações coletivas, como ver-se-á ao se discorrer sobre os critérios de identificação do assédio moral organizacional.

156“Segundo o estudo, realizado pela médica Margarida Barreto, pesquisadora da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), as mulheres são as maiores vítimas -65% das entrevistadas têm histórias de humilhação, contra 29% dos homens.”(apud BURATTO, Luciano Grüdtner. Assédio moral

apressa a demissão. Folha de São Paulo. Disponível em

<http://www1.folha.uol.com.br/fsp/empregos/ce0107200101%2ehtm>. Acesso em 15.07.2005).

157 Margarida Barreto estudou a humilhação dos trabalhadores da indústria química paulista com doenças profissionais ou seqüelas decorrentes de acidente de trabalho. Todos os trabalhadores nessas condições sofriam o assédio. Os relatos indicam normalmente um grupo de vítimas e de agressores.

No documento O ASSÉDIO MORAL ORGANIZACIONAL (páginas 79-84)