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CAPÍTULO 2. ATRAVESSAMENTOS COMUNICACIONAIS E POLÍTICOS DA

2.6 REVISTAS PORNOGRÁFICAS

Gostaríamos desta forma de analisar a imagem pornográfica a partir deste contexto de hipervisibilidade, em que o prazer desempenha um papel central para a cultura de consumo.

começa a ter curiosidade de saber como que é relação sexual, a gente entende que, que, que a gente nasce de um ato sexual mas a gente acho que até não ver a gente não sabe como que é né, e o conteúdo pornográfico já vem mesmo de filme de fita própria disso. Acho que né, a gente imaginou que aquilo não era pra ééé.. uma relação de uma relação né, mas mesmo, o ato sexual mesmo.

Entrevistada 12:

MJ: você se lembra qual foi seu primeiro contato?

E: sim, foi um dvd pornô que achei do meu pai, tinha sei lá, uns 11 anos, tava eu e minha irmã em casa, ai a gente querendo ser rebelde, falamos vamos olhar as coisas deles, vamos ver se tem alguma coisa, dinheiro pra comprar pão de queijo, uma coisa bem bosta assim, aí achamos um vídeo pornô e falamos vamos botar, aí a gente foi assistindo, foi assistindo, quando a gente foi ver, a gente assistia quase diariamente, assistia, não batia uma, assim, criança assistindo mesmo por curiosidade, ai escondíamos no mesmo lugar o dvd, pro nosso pai não desconfiar e mudar de lugar e aí no dia seguinte, a gente pegava e assistia de novo, era a puta de blair o nome, nunca vou esquecer, ridículo, patético, lixo

Entrevistada 13:

MJ: você lembra qual foi seu primeiro contato com pornografia?

E: provavelmente por razão do meu pai, porque ele tinha muita revista em casa, meu pai era, ele sempre foi muito pansexual, sempre traiu muito minha mãe, a gente conhecia as amantes dele, então uma relação muito complicada, no início até com sexo pra mim, que demorou muito pra eu entender que o que ele tinha, não quer dizer que se eu for uma pessoa mais liberta sexualmente, eu não estaria indo pro caminho dele, então demorei muito pra descobrir minha sexualidade, porque talvez através dele, acabei tendo contato com sexo muito cedo.

Entrevistada 4:

MJ: você se lembra quando foi o seu primeiro contato com material pornográfico?

E: eu lembro que eu estava no nono ano e pra mim era muito errado isso, porque sempre teve tabu de garotas não podem e ai eu conversei com uma amiga e um amigo, a gente tava junto conversando sobre o assunto e eu descobri que ela via direto, essa minha amiga que falou bota, pesquisa, assiste que tá tudo bem, tá tudo certo, então foi nos meus 14 anos foi meu primeiro contato, que me falaram, vai tenta, e ai eu vi por Instagram, uma conta de Instagram, era tudo escrito na verdade, não era exatamente pornografia, mas falava sobre o assunto e foi assim, ai daí fui pra um vídeo e ai beleza, começou, ai peguei mais Tumblr até a hora que acabou

Entrevista 9:

MJ: você se lembra qual foi seu primeiro contato com esse material pornográfico?

E: lembro, eu achei uma revista numa gaveta do meu avô, no closet dele e eu fiquei assim, era uma revista bem tipo de caminhoneiro, aquela coisa com closes diferentes, eu pelo menos sou de 86, todo mundo da minha geração sabe o que é uma playboy e era playboy em casa, porque segundo falava, as reportagens eram ótimas, mas era um nude quase que artístico, principalmente no começo dos anos 90, quando eu vi essa revista que era um close mesmo dá vagina, aquela coisa bem exposta, eu fiquei muito curiosa, ai abri e fechei a gaveta, no dia seguinte voltei lá , abri a gaveta e folheei as

primeiras, aí fiquei naquela, será que alguém vai chegar? e fechei a gaveta, fiquei arquitetando uma semana, voltei lá, levei para minha casa, essa é uma situação muito engraçada, porque eu guardei na minha gaveta de gibi e um tempo depois, aí várias vezes depois eu ia lá ler e ficava com aquela coisa nossa, eu tinha uns 8 pra 9 anos, até que foram organizar ou mexer na minha gaveta e acharam o negócio, aí entregou, meu pai que achou, entregou pra minha mãe que veio me perguntar de onde era, aí fiquei com a maior vergonha de falar que era do meu avô, ai falei que roubei na banquinha do lado, então assim, foi uma história que rendeu para todo mundo, pra minha mãe que teve que conversar comigo, meu pai que achou o negócio e acho que meu avô em algum momento percebeu que não tava lá.

Entrevistada 11:

MJ: Você se lembra qual foi seu primeiro contato com pornografia?

E: Multishow, meia noite e um, quarenta e dois, eu comecei a [inaudível] eu lembro quando eu descobri a multishow vendo clipe, ai eu achava que era isso o dia inteiro, ai lembro que um dia de madrugada eu fui colocar e era pornografia, e eu fiquei gente, ai depois eu descobri o telecine, ai depois eu vi a band, ai depois eu fiquei gente não é nada disso, eu também achava tudo, tudo muito, muito fantasioso também néh, eu era virgem, você não sabe como são as coisas mas meu primeiro contato foi pela TV.

A história da pornografia se entrelaça com a história dos meios de comunicação em massa e das tecnologias de impressão gráfica. Com o advento da fotografia começam a circular as primeiras fotos pornográficas, sendo que as primeiras imagens copiavam a estrutura dos quadros, em seguida as imagens começam a adotar seu próprio estilo e abandonam o estilo de quadros. Entre os primeiros daguerreótipos fotográficos já existiam fotos consideradas pornográficas, tais fotos acompanhavam a tradição da pintura imitando o mise-en-scène dos quadros, como podemos observar nesta foto de 1850 (Leite Júnior 2006, pg 67, 68). 16

16 Para um maior aprofundamento da história das revistas pornográficas no Brasil ver Leite Júnior 2006 e Mira 2001.

Figura 7

Fonte: NAZARIEFF, Serge, Jeux de Dames Cruelles apud Leite Júnior 2006

Leite Júnior (2006) assinala que inicialmente eram prostitutas as modelos que ou posavam para as fotos ou pagavam por sua confecção para poder utilizá-las como cartão de visitas para clientes. As fotos de nus femininos também foram muito difundidas em cartões postais a partir da década de 1870, sendo que as imagens mais exotizadas de mulheres consideradas de povos bárbaros eram mais difundidas por terem um menor policiamento, sob a justificativa de curiosidade antropológica.

As primeiras revistas pornográficas chegam ao Brasil a partir de 1894, sendo chamadas à época de revistas galantes. Sendo as mais conhecidas O Badalo (1893), Sal e Pimenta (1899), O Nabo - Dedicado ao Bello Seixo (1900), O Nu (1901), O ferrão, está bom...deixa (1902), O pau (1905), O empata (1906) e a mais significativa O rio Nu (1898).

Leite Júnior (2006, p. 71-72) afirma que o forte de tais revistas era a reprodução de cartões-postais de mulheres seminuas voltada para o mundo masculino. Apesar do forte apelo sexual das revistas, o autor classifica estas primeiras revistas como “semanários satíricos de humor malicioso”. O comércio de revistas galantes teria perdurado até a ditadura Vargas (1937-45), que através da censura proibiu a sua circulação. A partir deste momento, então, a produção nacional não deixaria de existir mas tornou-se ilegal e, em consequência, diminui. Dentre estas revistas, Leite Júnior, destaca Suely, uma revista de nus de seios e nádegas e os quadrinhos chamados de catecismos que surgem no final dos anos 50 do século passado, com ilustrações gráficas de atos sexuais; esta última revista de quadrinhos teria sido comercializada até o final dos anos 70. A revista pornográfica, no Brasil, como a conhecemos

hoje em dia, teria surgido somente em 1966 com a revista Fairplay, que mesclava fotos de mulheres nuas com textos escritos por grandes nomes da literatura brasileira como Carlos Drummond de Andrade. Essa revista tinha enquanto modelos mulheres famosas como Leila Diniz, tática que também seria muito utilizada mais tarde pela revista Playboy que, no Brasil, sempre tinha alguma celebridade em sua capa. O destino da revista Fairplay seguiu o de suas predecessoras, as revistas galantes, sendo fechada em 1971 devido a censura imposta por mais uma ditadura, a militar (1964-1985) (LEITE JÚNIOR, 2006).

Para Mira (2001) o início dos anos 70 marca um período importante para as revistas no Brasil. O Estado Nação estaria enfraquecido. Logo, desaparecia também a preocupação em construir uma identidade nacional.

Compra-se material estrangeiro, não por falta de condições de produzi-lo aqui – tradição que as grandes revistas já estabeleceram -, mas porque ele pode muito bem servir a certos segmentos de leitores daqui como serve em outros países...Playboy é playboy no mundo inteiro. Cosmopolitan é cosmopolitan no mundo inteiro. Sua expansão aponta para a formação de segmentos de mercado mundializados. (MIRA, 2001, p.97)

Em 1974 a revista Status começou a ser comercializada no Brasil, uma revista pornográfica posicionada para o público masculino que concorria com a Playboy ou revista Homem, título inicial da revista Playboy. A Status circulou até 1987, sendo relançada em 2011 e tendo parado de circular definitivamente em 2015. (PROTTA SADO, 2018)

A revista Playboy começou a ser comercializada no Brasil em 1975 pela editora Abril que veio a publicar 487 edições. Em 2015, quando a revista completou 40 anos de circulação no Brasil, parou de circular pelo selo Abril e, em 2016, foi retomada pela PBB Entertainment, com uma tiragem menor e uma periodicidade maior entre uma edição e outra. Porém, dois anos mais tarde, em 2018, a revista Playboy teve suas atividades encerradas de vez no país.

Nos mesmos moldes das suas antecessoras - as revistas galantes e a Fairplay - a Playboy também tinha reportagens mescladas com fotos de mulheres nuas, sendo a grande maioria de modelos, atrizes de novelas da rede Globo. Podemos inferir que o auge da revista foi no final dos anos 90 e começo dos anos 2000, período no qual as tiragens das celebridades televisivas Joana Prado e Susana Alves, chegaram a vender mais de um milhão de exemplares.

Figura 8: Capa Playboy

Edição de dezembro de 1999 da revista playboy da modelo Joana Prado.

Fonte: Revista Playboy, Editora Abril edição nº293, 1999.

A revista Playboy foi importante para a sedimentação do mercado nacional pornográfico. Algumas das entrevistadas quando indagadas qual foi o seu primeiro contato com pornografia responderam que foi por meio da revista Playboy. Como a entrevistada 10:

E: boa pergunta, não lembro, me lembro de um aniversário meu, de 7 anos, 6, 7 anos, eu fiz aniversário junto com um primo meu, era churrasco e uma hora a gente foi trocar de roupa e os meninos entraram num lugar da casa pra trocar de roupa e acharam umas playboys do caseiro, tipo na casinha do caseiro, os meninos iam trocar lá e as meninas na casa e eles acharam as playboys, eu acho que nem cheguei a ver, mas eu me lembro desse burburinho, acho que é a única coisa que me lembro.

A entrevistada 7 também se lembrou de ter achado as revistas Playboy do pai, a entrevistada conta que achava “irado” as revistas; como mulher bissexual ela começou a procurar também no computador vídeos, os pais através do histórico no computador descobriram e teria sido por isso que ela teve em seguida a conversa sobre sexo e descoberto de onde vem os bebês.

MJ: vocês abriram o computador e digitaram?

E: é pornô, a gente entrou no Xvideos, porque nosso amigo já entrava, colocou o primeiro vídeo que apareceu, página de pesquisa, foi aquele vídeo, daí teve uma menina que enfiou um pepino na querida vagina dela, porque é chato isso, imagina se quebra lá dentro, enfim deixa pra lá, pra outro momento, mas foi isso meu primeiro contato, mentira, meu primeiro contato com pornografia foi quando eu tinha 8 anos, olha isso gente, é verdade, quando eu tinha 8 anos, eu achei todas as revistas playboy do meu pai, isso já começou quando eu tinha uns 7 anos e eu achava isso irado, mas porque não sabia nessa época que era bissexual, então eu achava irado, achava o máximo, meninas lindas e maravilhosas, sexy hot, todas essas coisas, já via as revistas, aí um dia, eu achei um site de vídeo, eu tinha uns 7 anos e foi o primeiro pornô lesbico, mas não sabia o que tava acontecendo, pra mim foda-se assim, tanto que eu tirei, daí eu não tinha nem tido a conversa do sexo ainda com meus pais assim, daí eles descobriram, viram no histórico, daí tive a conversa, por isso tive a conversa, que descobri da onde os bebês viam, foi por causa da revista do meu pai que achei que procurei no Google,

eu não tinha lembrado disso, mas vi muita playboy na minha vida, achava irado, saudades da playboy com nudes

Em ambas as entrevistas e até por meio da história da revista que inicialmente no Brasil se intitulava Homem, percebemos que o público alvo das revistas foi o masculino. A entrevistada 10 que se sentiu como uma outsider do grupo dos meninos ou a 7 encontrando a revista do pai. Mira (2001, p.105) recupera o primeiro editorial da Playboy:

Se você é um homem, se você tem entre 18 e 80 anos, então Playboy é para você. Se você gosta de divertir, se você aprecia um pouco de humor, de refinamento e de pimenta na sua vida, você irá fazer de Playboy sua mais fiel companheira. Que fique claro desde o início: nós não somos uma “revista familiar”. Irmã, esposa ou sogra, se você abriu este periódico por acaso, eu lhe peço, entregue-o ao homem de sua vida e retorne ao seu Ladies Home Companion.

Apesar do forte apelo, as meninas não devolveram as revistas aos homens de suas vidas. Como demonstra Santana:

Primeiramente, ao contrário do que imaginava, alguns números de pesquisas revelaram que as mulheres brasileiras estão no topo das nacionalidades que mais consomem o conteúdo para adultos no mundo inteiro. As estatísticas apresentaram que este público feminino compõe 35% dos acessos a conteúdo pornográfico realizados em território nacional, ou seja, “mais de dez pontos percentuais acima da média mundial - que é de 24%” - e que, em 2014, as mulheres compunham 54% da base de assinaturas dos canais da Playboy Brasil. (SANTANA, 2016, p.13)

A faixa da etária das entrevistadas variou entre 18 e 39 anos. Ainda percebemos uma influência dos meios impressos e televisivos entre as entrevistadas, porém a presença do digital já se demonstra expressiva, especialmente entre as mulheres mais jovens. Por essa razão, a seguir, exploraremos essa ambiência midiática e seu consumo.

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