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4.3 Estratégias de alocação de riscos do projeto de concessão

4.3.1 Risco político

Conforme foi apresentado no capítulo 2, o risco político ou risco soberano corresponde, principalmente, à possibilidade de expropriação ou nacionalização dos ativos, sem que haja a devida indenização por parte do país anfitrião. Também se refere ao risco de que as condições preestabelecidas em contrato sejam desrespeitadas, o que costuma ocorrer principalmente quando da transição de governos, causando prejuízos aos contratados. Viu-se também que se trata de um risco a ser mitigado pelos países que pretendem atrair investimentos em infra- estrutura, através de instituições políticas e jurídicas estáveis que garantam os direitos de propriedade e o respeito a relações contratuais já pactuadas.

A Lei nº 8.987/1995 (Lei das Concessões) descreve diversos motivos que podem acarretar a extinção da concessão, os quais também são aplicados nos projetos de parcerias e estão presentes no Contrato ora analisado. Entre esses motivos deve ser destacado a encampação que segundo art. 37 da referida Lei trata-se da “retomada do serviço pelo poder concedente durante o prazo da

concessão, por motivo de interesse público, mediante lei autorizativa específica e após prévio pagamento da indenização, na forma do artigo anterior” (grifo nosso).

De acordo com Alexandrino e Paulo (2002, p. 408):

A Lei restringiu muitíssimo a possibilidade de encampação do serviço em relação à disciplina anterior ao instituto. Atualmente, compete ao Poder Legislativo determinar a existência de interesse público superveniente e não mais ao Poder Executivo.

Contudo, a experiência brasileira com as concessões comuns mostra que ainda há um forte componente de risco político no que diz respeito ao relacionamento entre as Concessionárias e o Poder Concedente. Segundo Andrade (2005, p. 261), os principais problemas ocorreram nos Estados de Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Rio de Janeiro e Paraná. O caso do Paraná é o mais emblemático, conforme mostra o relato da autora:

No Estado do Paraná, o próprio governador Jaime Lerner, que lançou o Programa de Concessões naquele Estado, decidiu, em meados de 1998, reduzir unilateralmente o valor das tarifas de pedágio. As concessionárias obtiveram autorização judicial para, primeiro, reduzir os encargos contratuais e, depois, restabelecer o

valor da tarifa inicialmente fixado (decisões proferidas na Ação Ordinária 98.0017501, da 1ª Vara Federal de Curitiba, confirmadas nos AI 1998.04.01.056815-6, 2000.04.01.005894-1 e 200.04.01.005917-9, interpostos perante o TRF da 4ª Região).

Essas decisões judiciais levaram à celebração de acordo entre as concessionárias e o Governo do Estado do Paraná, no ano 2000, voltando-se ao desenvolvimento normal das relações entre eles, até a eleição do atual governador Roberto Requião, que em sua

campanha prometia que “ou o pedágio abaixa, ou acaba”. Uma

vez eleito, o atual Governador do Paraná empreendeu várias medidas contrárias às concessionárias.

(...) o Governador encaminhou à Assembléia Legislativa projetos de

lei para autorização de encampação das concessões. Esses

projetos de lei foram aprovados e sancionados em julho de 2003. (...)

Logo após a edição das leis de encampação, o Governador constituiu uma Comissão Especial de Auditoria e Avaliação, que tinha a finalidade declarada de estimar valores das indenizações

para eventual encampação, mas que buscava também elementos que pudessem autorizar a decretação de caducidade dos contratos. As concessionárias ingressaram na Justiça com

ações em que apontavam irregularidades na composição e atividade da referida Comissão, que vinha conduzindo o processo de auditoria e avaliação sem a participação das concessionárias. O TRF da 4ª Região, no julgamento do AI 2003.04.01.049096-7, acabou confirmando decisão proferida pelo Juízo da 7ª Vara de Justiça Federal de Curitiba, nos Autos 2003.70.00.039554-0, no sentido de garantir a participação das concessionárias no processo de auditoria e avaliação e determinar ao Governo do Paraná algumas medidas a fim de sanar irregularidades que vinham sendo cometidas pela Comissão.

Outra medida adotada pelo Governo do Paraná foi a decretação da utilidade pública das ações votantes das concessionárias, para fins de desapropriação. A eficácia desses decretos expropriatórios para as concessionárias de rodovias federais foi suspensa por força das decisões proferidas pelo TRF da 1ª Região

nos AI 2004.01.00.003820 e 2004.01.00.007713-5 (...).

Nesse mesmo ano os reajustes das tarifas foram negados pelo DER/PR mas concedidos pela Justiça, definitivamente, por meio de decisões proferidas pela Corte Especial do STJ, nas quais se

reconheceu que a negativa dos reajustes comprometia a preservação do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos.

(ANDRADE, 2005, p. 263-265) (grifo nosso).

Conforme pode ser observado através desse relato, a inexistência de regras claras e estáveis quanto às tarifas de pedágio deixa margem para ações de cunho político por parte da Administração Pública. A autora ressalta que nas esferas em que há programas de concessão de rodovias compostos por mais de duas

concessões, como há na esfera federal, nos Estados do Rio Grande do Sul, Paraná e São Paulo, apenas no Paraná não há agência reguladora. A autora acrescenta ainda que “embora se trate de experiência demasiado recente para permitir uma

avaliação criteriosa, a existência de agências reguladoras parece colaborar para o bom desenvolvimento dos contratos” (ANDRADE, 2005, p. 266).

Sobre esse aspecto, verifica-se que no projeto de parceria da Rodovia MG- 050, não há uma divisão de papéis entre Poder concedente e agência reguladora, ambos são, de certa forma, representados pelo DER/MG. No caso, o DER/MG é uma autarquia vinculada à Secretaria de Estado de Transportes e Obras Públicas, que representa o Estado como Poder concedente da concessão patrocinada, além de exercer suas atividades de regulamentar o setor de estradas de rodagem e ter o poder de atualizar as tarifas de pedágio (conforme se verá adiante). Contudo, o DER/MG não possui as características institucionais de uma agência reguladora.

Por fim, vale comentar que conforme determinado pela Lei das PPPs (Lei 11.079/2004), o contrato ora analisado prevê a prestação de garantias de pagamento da contraprestação pecuniária. A cláusula 38 (Da garantia de pagamento da contraprestação pecuniária) dispõe o seguinte:

38.1 A garantia para o cumprimento das obrigações assumidas pelo DER neste Contrato será prestada pela Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais – CODEMIG (GARANTIDOR)

(...)

38.2 As obrigações do GARANTIDOR incidirão sobre parcela dos direitos à participação nos lucros líquidos decorrentes da venda de produtos derivados do beneficiamento e industrialização de minérios pela Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração – CBMM, emergentes de sociedade em conta de participação (SCP) constituída pelo GARANTIDOR e pela CBMM, nos termos de escritura pública datada de 28 de setembro de 1972, lavrada pelo Cartório do 6º Ofício de Notas de Belo Horizonte, cópia da qual é reproduzida no Anexo XII do Edital.

(...)

38.2.2 Para os fins do item 38.2 e seguintes, o GARANTIDOR abrirá e manterá conta bancária junto ao Banco ...(BANCO), Agência..., aberta especialmente para esta finalidade (CONTA VINCULADA), na qual serão creditadas, mensalmente, até 5º (quinto) dia útil de cada mês, as importâncias pagáveis pela CBMM em decorrência da SCP, durante todo o prazo de vigência do Contrato, observado o limite correspondente ao valor da CP devida por mês pelo DER/MG.

(...)

38.2.5 Na hipótese de não pagamento dos valores referentes à CP devida pelo DER/MG, e como condição para fazer jus ao acionamento das garantias de que trata esta Cláusula, deverá a Concessionária apresentar ao BANCO e ao GARANTIDOR cópia dos documentos indicados no item 35.5.1, acompanhada de declaração escrita, conforme modelo constante no Anexo X do Contrato, de que o DER/MG deixou de efetuar o pagamento da CONTRAPRESTAÇÃO PECUNIÁRIA.

38.2.5.1 Recebidos os documentos de que trata o item 38.2.5, o GARANTIDOR terá o prazo de 5 (cinco) dias úteis para determinar ao BANCO que efetue o pagamento da importância devida à Concessionária.

(...)

38.2.6 O GARANTIDOR assegurará, durante a vigência do Contrato, a existência mensal de recursos na CONTA VINCULADA, até pelo menos, o valor correspondente à CP devida, por mês, para a Concessionária.

38.2.6.1 Sempre que o valor existente na CONTA VINCULADA for inferior ao mínimo previsto no item 38.2.6, o BANCO notificará o fato ao DER/MG, ao GARANTIDOR e à Concessionária.

O Contrato prevê ainda que o DER/MG ou o GARANTIDOR poderão, a qualquer momento, substituir as garantias referidas na cláusula 38, pelas seguintes alternativas:

I – fiança bancária, prestada por banco brasileiro de primeira linha; II – carta de garantia, oferecida por organismo multilateral de crédito com classificação de risco “AAA” ou equivalente;

III – outras formas de garantia pessoal ou real aceitas pela Concessionária.

Tais garantias são importantes para minimizar o risco de inadimplência por parte do parceiro público, que pode se dar tanto por motivos de ordem política como por deficiência do orçamento. No caso do Brasil, a instituição das garantias é pertinente devido ao histórico de mau pagador do Estado (PINTO, 2005, p. 8).