• Nenhum resultado encontrado

1.3 Justificativas para adoção das PPPs – rationale

1.3.2 PPP e ganhos de eficiência

1.3.2.3 Transferência de riscos e incentivos

Segundo Lewis (2001, p.2), PPP é um relacionamento baseado na divisão de riscos que afetam determinados resultados esperados pelo projeto. A noção de compartilhamento de risco implica que ambos os lados devem ter algo a perder se a parceria tiver um mau desempenho (underperform).

Essa definição faz sentido na medida em que PPP é um relacionamento de longo prazo, cujo objetivo público é a aquisição de serviços dentro de padrões de qualidade definidos em contrato. Logo, é comum nos contratos de PPP que o ente privado só comece a receber a partir da efetiva prestação dos serviços contratados. Isso faz com que os custos derivados de atrasos e descontrole do orçamento na fase de construção constituam responsabilidade da SPE (ou, dito de outra forma, risco do construtor-operador). Durante a fase de operação, por sua vez, surgem novos riscos a serem tratados ao longo do relacionamento, entre os quais podemos citar: risco de demanda, riscos financeiros, risco regulatório, etc.

Em contraste, na aquisição pública tradicional, a responsabilidade do ente privado termina com a entrega do ativo, ficando toda a responsabilidade pela prestação do serviço com a administração pública. Mesmo com relação à construção do ativo, tem sido historicamente comum a transferência para o setor público de problemas de aumento de custos (cost overrun) e atrasos na construção. Segundo pesquisa do Tesouro britânico (HM TREASURY, 2003, p. 45-48), 88% dos projetos de PFI foram finalizados dentro do prazo, sendo que nenhum custo extra de construção foi passado ao setor público. Por outro lado, cerca de 70% dos projetos sob forma tradicional foram entregues com atraso e 73% extrapolaram o orçamento, sendo que nesse caso, os custos extras foram repassados, no todo ou em parte, ao setor público. Isso se deve, em parte, ao fato de que, na aquisição tradicional, o setor público é responsável pelo projeto/design de construção, o que o torna também responsável pelos atrasos e inadequação do orçamento durante a construção do ativo.

Através da PPP, caracterizada pelo DBFO, por outro lado, o agente privado é responsável, em grande parte, pelo desenho do projeto, o que o torna principal responsável por ocorrências de problemas na fase de construção. Sua

responsabilidade continua, inclusive, na fase de operação, já que os ativos construídos devem ser adequados às especificações dos serviços contratados pelo parceiro público27.

Isso não significa que em uma PPP todos os riscos são suportados pelo setor privado, pois, segundo definição de Lewis, os dois lados devem ter algo a perder se a parceria não tiver bom desempenho. Nesse contexto, o setor público também deve estar preparado para suportar riscos. Segundo a literatura, a divisão de riscos na PPP está ancorada no princípio de que o risco deve ser alocado à parte mais capacitada a administrá-lo. Note que o setor privado não suporta e administra riscos gratuitamente, seu preço, ou prêmio por risco, estará embutido no custo do serviço a ser pago pelo parceiro público. Logo, apenas um montante eficiente de riscos deverá ser transferido ao setor privado, de modo a não encarecer demasiadamente o custo do projeto, pois, de modo contrário, perde-se VFM (LEWIS, 2001 p. 9).

Sobre esse aspecto, Välilä (2005, p. 106) argumenta que a transferência de riscos melhora a eficiência produtiva, pois quando um parceiro é encarregado de um risco, ele se esforçará para minimizar os impactos que sua ocorrência poderia ter sobre o projeto. Porém, ressalta que a precondição para a administração de riscos é que ele deva ser administrável (manageable), isto é, os riscos devem ser alocados àqueles que estão em melhor posição de afetar a probabilidade de sua ocorrência e que, por isso, são capazes de minimizar seu impacto. Mas, se o risco não é administrável, isto é, está fora de controle de ambas as partes (ex. risco de força maior, podemos chamar de riscos exógenos), poderá ser dividido entre as partes, ou, ser atribuído ao parceiro que possa suportá-lo ao menor custo.

A transferência de risco nas PPPs funciona, portanto, como forma de criar incentivos dos agentes em promover o financiamento e operação do projeto de forma mais eficiente. Note que o bundling está diretamente ligado ao processo de transferência de riscos, na medida em que diminui os riscos endógenos28.

27 Nos contratos de PPP, é comum conter a previsão de penalidade, principalmente em forma de desconto da renda paga ao ente privado, quando do não cumprimento dos padrões de qualidade de prestação de serviço. 28 Na definição de Dewatripont e Legros (2005, p. 121), os riscos endógenos são aqueles influenciados pelo modelo de contrato, por exemplo, se um empreiteiro é pago apenas pela construção de uma ponte, ele poderia usar cimento de baixa qualidade, cujas conseqüências apareceriam muitos anos depois, o que aumentaria os riscos do operador (aumentando seus custos de manutenção, por exemplo), observe que, dessa forma, os riscos são difíceis de serem mensurados e quantificados.

De acordo com a Comissão Européia (2003, p. 54), os objetivos da transferência de riscos incluem a redução dos custos do projeto no longo prazo, pela alocação dos riscos à parte mais capacitada a administrá-lo da forma mais econômica; a criação de incentivos ao contratado para a entrega pontual dos projetos, dentro dos padrões exigidos e dentro do orçamento; melhoraria da qualidade do serviço e aumento das receitas por meio da operação mais eficiente; e projeção de um perfil de despesas mais consistente e previsível.

Observe, por fim, que ainda que o investidor privado cobre prêmio por risco, encarecendo o custo do financiamento privado (em comparação com financiamento público, conforme discutido anteriormente), o resultado seria positivo do ponto de vista do governo, pois se o risco se materializa, o prêmio por risco, terá funcionado, então, como um seguro, evitando-se gastos maiores.

A questão da transferência ou alocação de riscos nas PPPs, objeto de análise do presente trabalho, representa uma importante fonte de VFM e será analisado com maiores detalhes no próximo capítulo.