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P ROCESSO DE C ARGA E D ESCARGA DE N AVIOS P ORTA C ONTENTORES

3.3. L IMITES O PERACIONAIS E DE S EGURANÇA

3.3.2. P ROCESSO DE C ARGA E D ESCARGA DE N AVIOS P ORTA C ONTENTORES

Interessa agora dar especial enfoque ao processo de carga e descarga dos navios porta-contentores propriamente dito. Apesar de ocasionalmente poderem surgir no porto navios com paus-de-carga (self geared), que em tempos eram até predominantes, ou seja, navios equipados com gruas, também chamadas shiptainers, e capazes de se auto-carregar e descarregar, a grande maioria das operações são conduzidas exclusivamente a partir de terra. Atualmente a classe de gruas-pórtico de cais sob carris, Figura 3-39, é a dominante no equipamento portuário e é usada em quase todos os terminais de contentores de relevo, sobretudo devido à sua elevada produtividade (PIANC, 2012). Este tipo de gruas é então responsável pela transferência dos contentores entre o navio e cais, derivando daí a designação alternativa de ship-to-shore cranes (gruas navio-cais em tradução livre) ou de portainers (por oposição às já referidas shiptainers). São classificadas de acordo com a sua capacidade de carga SWL (safe working load), numa gama que pode ir das 40 às 100 toneladas; capacidade de movimentação, que se refere ao número de contentores movimentados simultaneamente e à forma como são movimentadas, com os tipos: singular (single), duplo (double hoist), twin-lift, tandem e múltiplo; alcance da lança móvel, cuja classificação está relacionada com a dimensão do maior navio que estas gruas têm capacidade de descarregar, mais precisamente no que se refere à distância entre costados, tendo as classificações correspondência onomástica direta com as dos navios, sendo assim Panamax, Pós-Panamax ou Super Pós- Panamax. Este tipo de grua consiste numa estrutura metálica reticulada, formada por dois planos de pórticos ligados por traveses e contraventados diagonalmente com quatro pilares e que é atravessada por duas vigas geralmente treliçadas ou de perfil laminado. As vigas apresentam dois vãos apoiados por um esquema de tirantes: um do lado do terrapleno, a chamada contra-lança, e outro que se encontra já sobre a água e sobre os navios acostados e a que se dá o nome de lança. Ao longo da lança e da contra-lança, e através de um carril, corre o trolley (ou carro) que tem incorporado um grupo de roldanas ou carretos nas quais passam os cabos que suspendem o spreader. Solidária ao carro encontra-se a cabine do operador, permitindo-lhe assim que se encontre aproximadamente com a mesma posição relativamente aos diversos elementos, tenha contacto visual facilitado e melhor ergonomia em geral na operação da grua. O pórtico tem capacidade de se deslocar longitudinalmente ao cais, sob carris, com recurso aos carros laterais (bogie) que cumprem a função adicional de transferir a carga para o terrapleno.

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Figura 3-39 - Modelo de grua de cais KONECRANES (adaptado de http://www.konecranes.pt/)

O spreader é o equipamento que engata no topo dos contentores e permite movimentá-los. Fica conectado a um headblock, que está suspenso por cabos a partir do trolley e é responsável por providenciar ao spreader energia elétrica e comandos, mas também a força motriz necessária para elevar/depositar contentores e para pequenos ajustes de posição. O spreader tem a capacidade de se ajustar aos diferentes tamanhos de contentores com as suas duas abas ajustáveis. Nas extremidades das mesmas encontram-se as twist-locks que ligam aos corner-castings permitindo assim acoplar os contentores ao spreader da forma que foi explicada anteriormente. Também usualmente junto às extremidades das abas do spreader estão presentes os flippers. Estes componentes, semelhantes a barbatanas, tem a função de facilitar o contacto com o contentor e de guiar o spreader ao longo do mesmo, mantendo as twist-locks alinhadas com os corner castings. Os flippers são fundamentais para pegar em contentores que estejam no convés do navio, no terrapleno ou num veículo de porto. No caso de os contentores estarem no interior do navio, o processo sai algo facilitado. Num navio especializado, os contentores são armazenados no convés através de twist-locks ou no porão do navio, em células próprias (container holds). As células cumprem essencialmente 3 objetivos: otimizar a ocupação de espaço de porão, estabilizar as pilhas de contentores e facilitar a estiva. Ao longo das células encontram-se guias metálicas (cell guides) pelos quais os contentores deslizam e que garantem que os mesmos são empilhados perfeitamente alinhados, Figura 3-40. O trabalho do operador de grua sai facilitado e agilizado pois são-lhe poupadas as manobras minuciosas de alinhamento das twist-locks com os corner castings. Em contrapartida são necessários movimentos adicionais para retirar as tampas de escotilha que separam o convés do porão. Nalguns casos, não existem tampas de escotilha e a pilha de contentores desenvolve-se desde o porão, atravessando o convés.

85 Figura 3-40 – Armazenamento dos contentores em células no porão. No lado esquerdo são visíveis em

maior detalhe as guias (cell guides) e a forma como os contentores deslizam por elas (Imagem: Ebbe Holsting).

Como foi já referido, num mercado competitivo como é o do transporte contentorizado e no qual o tempo de permanência dos navios em porto tem custos elevados tanto, para as transportadoras, como para a operadora, as questões da produtividade tomam bastante relevo. A produtividade é medida de duas formas: em função do número de TEU carregados ou descarregados ou em função do número total de movimentos executados, que podem ser um movimento de carga, movimento de descarga ou uma movimentação “secundária”, por exemplo, das tampas de escotilha ou de um ou mais contentores, que por vezes é necessária para aceder aos contentores pretendidos. Assim, a produtividade pode ser apresentada com a expressão,

𝑃 = 𝑛º 𝑇𝐸𝑈

𝑡𝑒𝑚𝑝𝑜 𝑑𝑒 𝑜𝑝𝑒𝑟𝑎çã𝑜 [𝑇𝐸𝑈 ℎ𝑜𝑟𝑎]⁄ (3.49)

ou alternativamente,

𝑃= 𝑡𝑒𝑚𝑝𝑜 𝑑𝑒 𝑜𝑝𝑒𝑟𝑎çã𝑜𝑛º 𝑚𝑜𝑣𝑖𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜𝑠 [𝑚𝑜𝑣𝑖𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜𝑠 ℎ𝑜𝑟𝑎]⁄ (3.50) Um valor típico da produtividade de pico de uma grua de cais situa-se entre os 30 e os 40 movimentos por hora, incluindo no tempo de operação o manuseamento das tampas de escotilha (PIANC, 2012).

São vários os aspetos influenciadores da produtividade da grua: as especificações do próprio equipamento, relação do tamanho da grua com o tamanho do navio, localização dos contentores dentro do navio, habilidade e experiência do operador, condições de iluminação, condições meteorológicas, e movimentos do navio acostado, com este último a merecer uma reflexão de maior profundidade mais adiante neste texto por estar ligado à temática da amarração de navios. As especificações da grua afetam o seu tempo de ciclo de pico e o nº de TEU que transporta por ciclo. Os componentes móveis da grua são o trolley, o carreto e o próprio pórtico. O trolley tem velocidades típicas de 240 𝑚/𝑚𝑖𝑛 e o carreto apresenta velocidades de elevação na ordem de 180 𝑚/𝑚𝑖𝑛 sem carga e de 90 𝑚/𝑚𝑖𝑛 à carga máxima. A velocidade do pórtico sob os carris é de 45 𝑚/𝑚𝑖𝑛, (PIANC, 2012), sendo que por segurança apenas se move quando não tem carga. A relação do tamanho da grua com o tamanho do navio pode implicar maior ou menor facilidade no acesso às diferentes zonas do navio, especialmente no que toca ao acesso a contentores no porão ou aos contentores do costado exterior. Assim, a localização dos contentores dentro do navio tem um efeito relevante na produtividade da grua ao poder colocar constrangimentos físicos

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no seu acesso que aumentam o tempo de ciclo ou por porventura tornarem necessárias movimentações suplementares de outros contentores de forma a aceder aos que se pretendem estivar. Neste último caso, o problema de produtividade não advém diretamente de uma limitação ou condicionamento à operação da máquina, mas de uma questão de planeamento. A habilidade e experiência do operador são de muita importância para a produtividade, especialmente quando o navio amarrado apresenta movimento oscilatório. As apertadas tolerâncias para a colocação dos contentores nas células e para o encaixe do mecanismo de twist-lock nos corners castings fazem desta operação um trabalho de elevada precisão e exigem da parte do operador muita concentração e habilidade, com a agravante de este se encontrar a alguma distância do spreader e em alguns momentos com a visão sobre o cenário de estiva diminuída. Se a isto se juntarem os movimentos do navio ou a atuação do vento sobre os contentores suspensos, o operador deve ser capaz de rapidamente manobrar o spreader com finura, dentro dos ajustes que lhe são permitidos pelo equipamento, e levar a cabo a operação. A experiência toma também um papel fundamental, por exemplo, na decisão de ajustar rapidamente o spreader correndo o risco de o fazer sem sucesso e perder tempo de operação, ou ao invés esperar pela mitigação do movimento do navio ou das condições desfavoráveis que surgiram, ou também, na capacidade de interpretar as indicações da equipa que se encontra no navio a auxiliar a estiva. Assim, um bom operador pode executar a estiva com maior velocidade e menos movimentos desnecessários, diminuindo o tempo de ciclo da operação.

As condições de iluminação podem ser relevantes ao coordenar com outras condicionantes já referidas que dificultam o trabalho do operador e por inerência a produtividade da grua. Assim, a duração do dia, entenda-se aqui dia por período de tempo em que há iluminação direta do Sol, é importante na medida em que estabelece o período de tempo em que o operador trabalha sobre condições de visibilidade mais favoráveis, pese embora a existência de equipamentos de iluminação artificial no porto que minoram o transtorno e permitem continuar a atividade após o ocaso. É assim de esperar, em relação a este fator, uma redução da produtividade das operações durante a noite, ou no Verão face ao Inverno, por conta do aumento do período noturno. As condições meteorológicas têm efeitos diretos e indiretos na produtividade. Os efeitos indiretos estão relacionados essencialmente com os movimentos induzidos aos navios, que terão discussão própria, ficando aqui apenas a menção à relação existente. Os efeitos diretos decorrem sobretudo da atuação do vento sobre a superfície do conjunto headblock e spreader e, com mais importância, sobre a superfície dos contentores, por terem a maior área de contacto. A incidência do vento sobre estes elementos provoca movimento e inicia uma oscilação pendular que impede o estacionamento do spreader e dificulta o alinhamento com as guias ou com as twist-locks, e que, em casos de maior intensidade dos ventos pode obrigar a interromper as operações, para salvaguarda das condições de segurança. Apesar disso, no que se refere ao balançar do spreader, este é minorado com recurso à tecnologia de anti-sway que amortece o movimento oscilatório, do qual o vento não é, aliás, o único responsável, pois também é gerado durante os movimentos do trolley e devido à inércia do conjunto headblock+spreader+contentor.