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SAÚDE ESCOLAR: UM PROCESSO DE PROMOÇÃO DE ESTILOS DE VIDA SAUDÁVEIS NAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES

PARTE I Enquadramento teórico

Capítulo 2 Promover Comunidades Saudáveis

4. SAÚDE ESCOLAR: UM PROCESSO DE PROMOÇÃO DE ESTILOS DE VIDA SAUDÁVEIS NAS CRIANÇAS E ADOLESCENTES

É assumido um reconhecimento geral da influência que os sistemas de saúde e educação exercem sobre o desenvolvimento de hábitos, rotinas e comportamentos favoráveis à saúde e bem-estar por parte das crianças e jovens.

Apesar do consenso acerca da importância dos programas de educação para a saúde, tendo em vista a adopção de estilos de vida saudáveis e a prevenção de comportamentos de risco, existem divergências sobre as formas como estes são conduzidos (Rodrigues, Pereira & Barroso, 2005).

A promoção de EVS e a eliminação de comportamentos de risco nas fases mais precoces do desenvolvimento das pessoas passou a ser um aspecto essencial de intervenção na EPS (Andrade, 1995; Balaguer, 2002; Matos, Simões, Canha & Fonseca, 2000). Assim sendo, a escola constitui um local de excelência na implementação de acções que visem orientar as atitudes e comportamentos ao longo do percurso escolar dos alunos (Faria, 1997, 2002; Rocha, 1994; Smith, Goffney & Nairn, 2004; Viana, 2001).

Existe uma inter-relação entre a saúde e a educação, na medida em que a saúde influencia a aprendizagem e a educação influencia a saúde (WHO, 1996a). Evidência crescente mostra que os programas de saúde escolar, para além de oferecem rácios de alto custo/benefício, providenciam informação crescente que aponta estratégias que as escolas podem usar para implementarem de forma efectiva os programas (Ibidem).

Os comportamentos e opções das crianças em relação à saúde são influenciados pela assimilação que fazem das vivências que testemunham e experienciam de uma variedade de indivíduos e situações ao longo das suas vidas (McBride, Midford & CoWron, 1999). Deste modo, a escola assume um papel vital na formação dos comportamentos e atitudes da população escolarizada (Faria & Carvalho, 2004; Leger, 1999, 2004).

McBride e col. (1999, p.18) apresentam vários factores que contribuem para que as escolas sejam consideradas como espaços apropriados para a promoção da saúde:

 O facto de possuírem uma infra-estrutura que incorpora oportunidades educacionais, pessoal treinado para a educação, serviços, várias estruturas e suportes que podem reforçar mensagens direccionadas para a saúde;

 Constituem um elo de ligação com vários elementos que podem influenciar a saúde das crianças (famílias, pares e a comunidade local), o que a coloca numa posição ideal no estabelecimento de interacções positivas com estes

 Têm acesso a um grande número de crianças e interagem com elas durante um longo período das suas vidas, uma vez que estas passam muitos dos seus anos de desenvolvimento neste local, numa fase em que as suas capacidades de aprendizagem são exponenciais;

 Estão, geralmente, vinculadas a um Ministério que fornece orientações em relação à educação das crianças nas áreas relacionadas com a saúde (políticas de educação e políticas de saúde).

A estes factores Smith e col. (1992) cit. por Hagquist & Starring (1997) acrescentam a possibilidade de uma grande parte dos hábitos dos adultos serem desencadeados durante os seus anos de desenvolvimento.

Além disso, Alexander (1994) alerta para o facto de ser melhor e, provavelmente, mais fácil, tentar prevenir comportamentos prejudiciais para a saúde numa idade inicial do que ser forçado posteriormente a tentar mudar um hábito já estabelecido (cit. por Hagquist & Starring, 1997).

A escola, enquanto espaço educativo inserido numa sociedade em constante transformação, tem vindo a ser estimulada a libertar-se da prática tradicional, preocupada unicamente com a aquisição de conhecimentos (Andrade, 1995). Procura agora debruçar-se sobre uma educação mais globalizante, que dê prioridade a uma formação da pessoa mais consciente, crítica, reflexiva, activa e feliz, assumindo, desta forma, o seu papel de promotora de saúde (Leger, 1999). Quer isto dizer que a escola terá de ser, não apenas o reflexo dessa sociedade mutável mas também, e especialmente, o seu projecto.

Procura-se, desta forma, através da Saúde Escolar (SE) estimular o desenvolvimento de acções locais, com base nas necessidades da comunidade, motivando a participação de todos os seus elementos na definição de prioridades e estratégias, na busca de soluções e encaminhamentos para uma vida mais saudável (DGS, 2006a).

Promover a saúde das crianças é um objectivo importante da OMS, UNICEF, UNESCO e outras agências internacionais desde os anos 50. A partir dos anos 80, o investimento da OMS na saúde escolar através da definição de iniciativas e programas tem aumentado gradualmente. Deste modo, a OMS tem vindo a desenvolver uma

Iniciativa de Saúde Escolar Global que foi designada para melhorar a saúde dos alunos,

dos funcionários, das escolas, das famílias e de outros elementos da comunidade através da escola (WHO, 1996b), tendo como principal objectivo intensificar o número de escolas que são “Escolas Promotoras de Saúde”.

Com efeito, a própria OMS reconhece e salienta a importância da Saúde Escolar a nível mundial, pelo que tem dinamizado esforços no sentido de desenvolver directrizes que orientem para uma Saúde Escolar Global, à qual todos, ou pelo menos o maior número possível de países, tenham acesso.

Pretende-se proporcionar às escolas o uso de todo o seu potencial para melhorar e aperfeiçoar a saúde, estimulando a troca de saberes e experiências, com vista a ajudar as escolas a tornarem-se instituições para a saúde, assim como para a educação.

Em Portugal, a promoção da saúde em contexto escolar tem vindo a ser desenvolvida desde 1971 (Rocha, 1994), sendo actualmente gerida pela Divisão de Saúde Escolar e operacionalizada através dos Centros de Saúde.

À Saúde Escolar compete desenvolver acções, em parceria com a escola, que actuem simultaneamente sobre o indivíduo, a comunidade educativa e o ambiente, através das quais contribuam para a redução de riscos e de vulnerabilidade perante a doença, para alteração dos padrões de morbi-mortalidade e para a promoção da saúde (Ministério da Saúde, 1996, cit. por Viana, 2001, p.17).

Para que os programas e actividades de Educação para a Saúde sejam eficazes, torna-se necessário que, antes de serem implementados, se efectue um levantamento exaustivo das condições e necessidades inerentes à comunidade sobre a qual se vai intervir.

Em relação à escola, a intervenção nesta comunidade exige uma acção concertada entre toda a equipa multidisciplinar, da qual devem fazer parte os docentes, auxiliares de acção educativa, alunos, enfermeiro responsável pela saúde escolar, médico de família, psicólogo, assistente social, associação de pais, representante da autarquia e, sempre que possível, envolver também as associações governamentais cujo contributo poderá trazer grandes benefícios para o cumprimento dos objectivos preconizados (WHO, 1996b).

No entanto, e de acordo com um estudo efectuado por Viana (2001), que analisou os projectos de Saúde Escolar implementados por treze Centros de Saúde da Sub-Região de Saúde de Viana do Castelo, foi possível constatar que existe uma insuficiente e inexpressiva participação da comunidade educativa na realização dos projectos implementados, bem como o desconhecimento da correcta aplicação dos conceitos de EPS e PS no âmbito da Saúde Escolar pelos profissionais de saúde.

A Promoção da Saúde em contexto escolar implica um trabalho de parceria eficaz entre todos os seus agentes, de forma a garantir a equidade no acesso das crianças a ambientes promotores de saúde (DGS, 2006a), nomeadamente:

salas de aula, aquecimento, ventilação, recreios seguros e vigiados, entre outros;

 Acesso à educação – no qual todas as crianças devem ter acesso a um lugar na escola e a programas de ensino adaptados às suas características individuais, nomeadamente as crianças que possuem Necessidades Educativas Especiais, Necessidades de Saúde Especiais (NSE) e dificuldades de aprendizagem;

 Encaminhamento e acompanhamento por parte do Serviço Social das crianças e famílias com carências a nível económico, de cuidados e/ou afectividade familiar, dependências na família (álcool, drogas), violência, abuso, etc.;

 Acesso a acompanhamento por profissionais de saúde especializados – nomeadamente a nível da terapia da fala e de psicologia naquelas crianças que possuem dificuldades de aprendizagem relacionadas com problemas de dicção e/ou a nível afectivo e do desenvolvimento cognitivo;

 Acompanhamento de saúde adequado – implica vigilância e acompanhamento periódico da situação de saúde de todas as crianças por parte da equipa de saúde;

 Existência de programas de promoção de saúde e bem-estar adaptadas às necessidades e especificidades da população alvo, baseados na metodologia de projecto.

Do mesmo modo, Leger e Nutbeam (1999) acrescentam que as intervenções de Saúde Escolar serão mais efectivas se:

 Se orientarem, não só para os comportamentos mas também para o meio envolvente;

 Os programas tiverem uma abordagem holística e envolverem a escola e agências relacionadas com a saúde;

 Se basearem num programa organizado para ser desenvolvido ao longo dos anos e seja relevante para o desenvolvimento cognitivo e social dos estudantes;

 Se der formação específica aos docentes e recursos suficientes (cit. por Leger, 2004).

Assim sendo, na sua intervenção junto da comunidade escolar, os responsáveis pela SE devem aperceber-se das características dessa mesma comunidade, de forma a conhecer as crianças e os contextos em que elas se inserem, adequando deste modo o

EPS à realidade com que se deparam. Na verdade, segundo Tones (1998, 2000), uma das razões que conduz ao fracasso da EPS é o facto de não se ter em conta as circunstâncias do indivíduo ou da comunidade com os quais se desenvolve o programa. Ou seja, na sua intervenção junto do indivíduo e/ou comunidade, o profissional responsável pela saúde escolar necessita, não só de um programa de Educação para a Saúde mas também de um programa de Promoção para a Saúde (Ibidem).

A iniciativa da criação de “Escolas Promotoras de Saúde” reconhece a necessidade de se incluir a educação para a saúde (EPS) na formação para a vida. Esta não se deve restringir a um currículo próprio de disciplinas específicas, mas sim fazer parte de um programa global da escola.

Pestana (1995) enfatiza o papel da EPS nas escolas, referindo que esta vai muito além da inclusão nos currículos das diferentes áreas e disciplinas. Procura incorporar-se nas relações e interacções que se estabelecem no interior e exterior das escolas e procura criar condições e meios que permitam que toda a comunidade escolar possa controlar e melhorar a sua saúde física e emocional (cit. por Rodrigues, Pereira & Barroso, 2005).

Os supracitados autores apontam duas linhas orientadoras que devem nortear o processo de avaliação da eficácia dos programas das escolas promotoras de saúde:

a) Observar as dimensões curricular, psicossocial, ecológica e comunitária que, sendo essenciais, estão interligadas.

b) Observar em que medida os diversos projectos de educação para a saúde constituem instrumentos e oportunidades para transformar determinado contexto, contribuindo para a alteração de situações identificadas e resolução de problemas.

Conhecer as atitudes e comportamentos dos adolescentes e as circunstâncias em que estes se desenvolvem constitui um importante ponto de partida para a definição de políticas de intervenção ajustadas às reais carências destes adolescentes. Do mesmo modo, é essencial auscultar junto dos alunos quais as suas ideias sobre questões de saúde, quais as necessidades sentidas e manifestadas, envolvendo-os no processo (Smith et al., 2004; Sousa, 1995).

O Programa Tipo de Saúde Escolar (1995), que tinha como principal objectivo a elevação do nível educacional e de saúde da comunidade escolar, sofreu uma actualização em 2006, passando a denominar-se Programa Nacional de Saúde Escolar (PNSE). Inclui no seu foco de acção o desenvolvimento de competências promotoras de autonomia que sustentem as aprendizagens ao longo da vida, através do envolvimento

dos alunos na participação cívica, da promoção da saúde e educação para os valores, para além das anteriormente preconizadas (DGS, 2006).

Pretende-se, deste modo, que a escola constitua um espaço privilegiado para a aquisição destas competências. Para tal, deverá ser um espaço seguro e saudável, com uma filosofia que facilite a adopção de estilos de vida saudáveis, tornando-se numa referência, não só para a comunidade escolar mas também para a comunidade envolvente.

O PNSE passa então a ser o referencial técnico-normativo do sistema de saúde para a área da saúde escolar, implicando, a nível local, o trabalho em parceria com a Escola/Centro de Saúde, assente numa metodologia de projecto e numa abordagem salutogénica da promoção da saúde (Ibidem).

Capítulo 3