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2.3. OS SERVIÇOS HOSPITALARES NO CONTEXTO DA SOCIEDADE DA

2.3.5. Saúde 2.0

Com o desenvolvimento das TIC, e em especial da internet, e a consequente apropriação destas ferramentas pelos serviços assistenciais, surge o conceito de Saúde 2.0 (VAN DE BELT et al., 2010), o qual pressupõe que os profissionais de saúde necessitam observar a relação custo/benefício das TIC na melhoria da segurança, eficiência e qualidade da atenção à saúde. De acordo com estes autores, a apropriação das ferramentas digitais no gerenciamento dos serviços de saúde permite a melhoria da comunicação entre usuários, profissionais e gestores, possibilitando o compartilhamento de informações e contribuindo positivamente para a melhoria da atenção à saúde, inclusive para incentivar o autocuidado, reduzindo os custos com doenças crônicas (VAN DE BELT et al., 2010).

Iyawa, Herselman e Botha (2016) fazem questão de destacar a distância entre os conceitos de saúde eletrônica (e-saúde ou e-health) e Saúde 2.0. Para esses autores, a saúde eletrônica é definida como um avanço na forma como a atenção é concebida e oferecida pelos prestadores de serviços de saúde mediante uso das TIC para monitorizar e melhorar o bem-estar, a saúde dos pacientes e capacitá-los na gestão de sua saúde (IYAWA, HERSELMAN; BOTHA, 2016). Refere-se fundamentalmente ao uso da internet e de tecnologias Web no planejamento e na prestação dos cuidados de saúde.

Já a Saúde 2.0 (também denominada de Medicina 2.0) se relaciona à integração das ferramentas dialógicas da Web 2.0 para ampliar as redes sociais dos envolvidos na assistência, de forma a permitir e facilitar especificamente a participação, a colaboração e a abertura dentro e entre os grupos de interesse

envolvidos na utilização dos serviços de saúde. Nesse sentido, entende-se que a conectividade móvel e de banda larga facilitam a convergência de diferentes tecnologias digitais em serviços de saúde para que os médicos, enfermeiros, farmacêuticos e demais profissionais de saúde e os gestores permaneçam conectados digitalmente aos pacientes e aos processos de atenção à saúde (IYAWA; HERSELMAN; BOTHA, 2016).

De acordo com Engelen (2011 apud CAMARGO-BORGES; MOSCHETA, 2016), a Saúde 2.0 pode ser entendida para além da evolução da internet, como uma abordagem na qual o cuidado participativo é o principal objetivo, aspirando reformular o sistema em uma relação mais colaborativa e menos dicotômica entre todos os envolvidos.

Inicialmente, conforme observam Camargo-Borges e Moscheta (2016), as práticas em Saúde 2.0 estavam focadas principalmente na criação de novas tecnologias em si, como mecanismos de busca de dados, registros clínicos, etc., no entendimento destas tecnologias como facilitadoras para a troca de informações de saúde entre profissionais e pacientes. No entanto, os autores argumentam sobre a necessidade de inserir tecnologias que acompanhem o andamento dos recursos comunicacionais, com vistas à qualidade da prestação dos serviços, que nesta abordagem está relacionada ao nível de desenvolvimento da capacidade de se relacionar e interagir com as partes interessadas na área da saúde, a fim de criar uma cultura departicipação e colaboração (CAMARGO-BORGES; MOSCHETA, 2016). Ou seja, entende-se que a finalidade dos dispositivos interativos em Saúde 2.0, em última instância, objetivam permitir a construção compartilhada dos saberes e processos assistenciais.

No contexto da Saúde 2.0, médicos, demais profissionais de saúde, gestores e usuários podem interagir para gerar novas possibilidades em serviços de saúde, que sejam operacionalizáveis para todas as partes. O conceito convida a um tipo de interação que é totalmente distinto da abordagem linear orientada por fatos, ainda hegemônica na gestão hospitalar, incentivando processos polifônicos, nos quais as perspectivas de todos os envolvidos são bem-vindas, levantando diferentes opiniões e pontos de vista, trazendo novas luzes e possibilidades para os problemas de saúde

que estão sendo investigados, sejam eles assistenciais ou gerenciais (CAMARGO- BORGES; MOSCHETA, 2016).

Tais recursos relacionais são indispensáveis ao desenvolvimento de tecnologias que auxiliem a capacitar e sustentar o movimento Saúde 2.0. Segundo Camargo-Borges e Moscheta (2016), essa nova forma de lidar com a saúde, mais relacional e participativa, apresenta uma nova possibilidade que pode levar as pessoas a se tornarem seres mais coletivos, capazes de projetar juntos o próprio destino, criando novas formas de equipes de atenção à saúde sensíveis ao contexto local.

Com o advento da internet móvel e as facilidades de acesso e conectividade oferecidas pelos smartphones, hoje é possível que médicos, demais profissionais de saúde e gestores tenham acesso instantâneo a inúmeras informações dos pacientes. Deste modo, conforme Cybis, Betiol e Faust (2010), surge um novo modelo de interação usuário/sistema: a interação móvel, na qual os usuários podem interagir entre si, por meio das plataformas digitais em qualquer lugar, a qualquer tempo.

Naturalmente, dentro da perspectiva da Saúde 2.0, tais processos interativos também vêm sendo incorporados à gestão do cuidado mediante utilização de uma série de sistemas de informação e outras plataformas de comunicação. Com o propósito de otimizar a gestão da informação e da comunicação, descentralizando os processos e agilizando a tomada de decisão, é visível o crescimento da utilização das TIC no âmbito da saúde que se propõem a encurtar distâncias entre usuários, profissionais de saúde e gestores.

Capuano (2008) afirma que, de forma a impulsionar efetivamente a modernização dos serviços públicos e atender aos requisitos de seus usuários e da população em geral, o modelo gerencial deve buscar o fortalecimento do tripé composto por: a) conceitos de arquitetura da informação16; b) experiências de gestão

da informação, apoiada pelo uso intensivo das TIC; e c) gestão de pessoas (ou de capital intelectual), com foco na valorização do aprendizado dos membros de organizações do serviço público. No cenário da Sociedade da Informação e

16 Ribeiro (2012) define Arquitetura da Informação como o conjunto de recursos utilizados não apenas

para dispor o conteúdo de determinado SI da forma mais lógica e acessível possível, mas também para dar suporte a requisitos de segurança, conservação e restauração deste conteúdo.

Comunicação, além de gerar conhecimento e aprendizagem, o uso das TIC pode contribuir para aumentar a participação e a transparência nos cuidados à saúde, tanto na perspectiva individual como na coletiva.

Entretanto, o que se verifica na realidade das organizações públicas brasileiras de uma forma geral, e nas prestadoras de serviços de saúde em particular, é uma ênfase de investimentos em TIC, mas não em conhecimento e capacitação, conservando-se os mesmos processos de trabalho e continuando as práticas, características de um estilo feudal de governança na gestão de dados, informação, conhecimento e uso das TIC, no qual as organizações públicas se apropriam ou se distanciam das TIC em razão de necessidades próprias (AGUIAR; MENDES, 2015). Dessa forma, promove-se o desuso de certas ferramentas e apropriam-se de outras com base em critérios subjetivos. Isso não só compromete o aparato tecnológico proposto pelo Estado para atender às suas finalidades (CAPUANO, 2008) como induz a iniquidade do acesso aos serviços de saúde, inviabilizando a operacionalização dos princípios do SUS.