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Capítulo 3- Narrativas autobiográficas mediante entrevistas como instrumento investigativo dos

3.1 Saberes e experiência

É possível depreender que trazemos a perspectiva do (a) docente como foco central nesta investigação e para isso adotamos as Narrativas Autobiográficas por meio de entrevistas como percurso investigativo. Concordamos com Delory-Momberger (2012) que essas narrativas são compostas por saberes vinculados às experiências dos sujeitos. Nessa seção visamos trazer elementos sobre os saberes da experiência a partir de Larrosa (2015), que orientou o olhar interpretativo dos relatos concedidos pelas entrevistas.

3.1.1 Experiência e saber da experiência: sob a perspectiva Larrosiana

O saber da experiência é um ponto de reflexão para Larrosa (2015). Esse autor propõe outra maneira de se pensar a educação e de nos pensarmos como educadores a partir do par experiência/sentido, uma vez que essas discussões têm sido dominadas nas últimas décadas pelos chamados técnicos e pelos reflexivos. Os técnicos atuam com o par ciência e técnica, que “situam o campo educativo a partir da legitimidade da ciência e da

66 planificação técnica” (p.62) e “remetem à perspectiva positiva e reificadora” (p.15). Em seu vocabulário aparecem termos como a avaliação, qualidade, resultados, objetivos etc.

nessa perspectiva as pessoas que trabalham com educação são concebidas como sujeitos técnicos que aplicam com maior ou menor eficácia as diversas tecnologias pedagógicas produzidas pelos cientistas, pelos técnicos, pelos especialistas. (LARROSA, 2015, p. 16) Por outro lado, os reflexivos pensam a partir do par teoria e prática e situam o campo educativo a partir da “legitimidade da crítica” (p.62). Em seu vocabulário aparecem termos como a reflexão sobre a prática ou na prática. Assim, as pessoas que trabalham com educação nessa perspectiva

aparecem como sujeitos críticos, que armados de distintas estratégias reflexivas, se comprometem, com maior ou menor êxito, com práticas educativas concebidas na maioria das vezes sob uma perspectiva política. (LARROSA, 2015, p.16)

O par experiência/sentido de Larrosa (2015) não é apresentado com a intenção de ser melhor ou pior do que os pares anteriormente mencionados. É proposto para buscar uma reflexão sobre a educação desde outro ponto de vista. Para compreender essa outra maneira de se pensar, esse autor busca inicialmente demarcar os sentidos e não sentidos das palavras. A começar pela palavra experiência que é entendida como “aquilo que “nos passa”, ou que nos toca, ou que nos acontece, e, ao nos passar, nos forma e nos transforma” (p. 28). O pronome “nos” nesse fragmento é muito importante na compreensão da experiência Larrosiana, pois o que passa, o que acontece, o que toca não se constitui como experiência. Larrosa (2015) indica que “a cada dia se passam muitas coisas, porém, ao mesmo tempo, quase nada nos acontece” (p. 18). Também afirma que mesmo que duas pessoas enfrentem o mesmo acontecimento não fazem a mesma experiência: “o acontecimento é comum, mas a experiência é para cada qual sua, singular e de alguma maneira impossível de ser repetida” (p.32)

Retomando a proposta de se pensar a educação sobre o par experiência/sentido, o autor diz que é necessário:

Reinvidicar a experiência: no sentido de dar à experiência legitimidade, uma vez

que historicamente tanto a filosofia clássica quanto a ciência a menosprezaram devido suas características, tal como a subjetividade, incerteza, provisoriedade, fugacidade, finitude, singularidade etc.

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Fazer soar de outro modo a palavra experiência: se faz importante o

entendimento da palavra experiência. Para isso Larrosa indica algumas precauções: ✓ a experiência não é posta na conotação de experimento;

✓ a experiência de alguém não é aceita como um dogma, ou seja, essa experiência não pode se impor autoritariamente à experiência do outro; ✓ é importante separar a experiência da prática e ação, uma vez que o sujeito

da experiência é um ser passional à medida que se abre à receptividade, ao tombamento, à abertura àquilo que lhe acontece e lhe toca.

✓ evitar fazer da experiência um conceito. A experiência escapa a qualquer conceituação que queira determiná-la, pois é por si mesma um excesso, um transbordamento.

✓ não converter a experiência em um fetiche e em um imperativo, ou seja, implantar a experiência de modo que se mande que todos devam “começar a procurá-la, a reconhecê-la e a elaborá-la” (p.44)

✓ tornar afiada a palavra experiência, buscando nem a normatizar, nem a trivializar, nem a tornar uma moda, fetiche ou imperativo.

Após demarcar esses aspectos e tratar sobre a experiência segundo Larrosa (2015), traremos para a reflexão o saber da experiência. Segundo esse autor esse saber é “o que se adquire no modo como alguém vai respondendo ao que lhe vai acontecendo ao longo da vida e no modo como vamos dando sentido ao acontecer do que nos acontece” (p.32). Esse saber se relaciona com o que Larrosa (2018) destaca como “elaboração do sentido ou do sem-sentido” (p.32) frente ao que nos acontece, conectado à existência de um indivíduo ou de uma comunidade humana particular. Com isso, “trata-se de um saber que revela ao homem concreto e singular, entendido individual ou coletivamente, o sentido ou o sem-sentido de sua própria existência, de sua própria finitude.” (p.32)

Ainda sobre o saber da experiência, esse autor também destaca que

não está como o conhecimento científico, fora de nós, mas somente tem sentido no modo como configura uma personalidade, um caráter, uma sensibilidade ou, em definitivo, uma forma humana singular de estar no mundo, que é por sua vez uma ética (modo de conduzir-se) e uma estética (um estilo) (p. 32)

Dessa forma, o sujeito que se constrói nesse saber, ou seja, o sujeito da experiência, se caracteriza por alguém aberto à sua própria transformação, logo, “se

68 define não pela sua atividade, mas por sua passividade, por sua receptividade, por sua disponibilidade, por sua abertura” (LARROSA, 2015, p. 25 e 26). Logo, considera o sujeito da experiência numa perspectiva passional da passividade ou da passividade passional, pois

o sujeito da experiência é um sujeito ex-posto. Do ponto de vista da experiência, o importante não é nem a posição (nossa maneira de pormos), nem a o-posição (nossa maneira de opormos), nem a im-posição (nossa maneira de impormos), nem a pro-im-posição (nossa maneira de propormos), mas a ex-posição, nossa maneira de ex-pormos, como tudo o que isso tem de vulnerabilidade e de risco. Por isso é incapaz de experiência aquele que se põe, ou se opõe, ou se impõe, ou se propõe, mas não se ex-põe. É incapaz de experiência aquele a quem nada lhe passa, a quem nada lhe acontece, a quem nada lhe sucede, a quem nada o toca, nada lhe chega, nada o afeta, a quem nada o ameaça, a quem nada ocorre. (LARROSA, 2015, p. 26)

Ainda assim Larrosa indica que é importante entender que

definir o sujeito da experiência como sujeito passional não significa pensá-lo como incapaz de conhecimento, de compromisso ou ação. [...] O sujeito passional também tem sua própria força, e essa força se expressa produtivamente em forma de saber e em forma de práxis. (p. 30)

Com base nos elementos expostos acerca do saber da experiência de Larrosa (2015), visamos por meio desta investigação voltar nosso olhar interpretativo para os relatos das entrevistas narrativas, buscando compreendê-las como experiência no sentido Larrosiano, a fim de captar os sentidos atribuídos pelos sujeitos da pesquisa nos atravessamentos de suas histórias de vida com seu percurso formativo, e na repercussão para inserção e enraizamento da EA do Ensino Básico do DF. Desse modo, intentamos perceber o que em sua subjetividade foi marcante e a relação disso com sua formação.

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