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SEMIÓTICA DE INSPIRAÇÃO EUROPEIA: PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

4 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA

4.1 SEMIÓTICA DE INSPIRAÇÃO EUROPEIA: PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

Ferdinand de Saussure foi quem primeiro concebeu uma ciência, por ele denominada de Semiologia, destinada ao estudo de outros sistemas de signos, para além dos verbais. A relevância da obra saussureana reside não somente em suas proposições a respeito da linguagem, mas também na influência desses princípios de caráter estrutural no desenvolvimento das Ciências Humanas como um todo. Seu trabalho, conhecido somente três anos após sua morte (1913), chegou ao mundo científico através de escritos compilados por alunos que assistiram ao Curso de Linguística Geral, por ele ministrado na Universidade de Genebra, curso esse que acabou por denominar a obra contendo suas propostas para essa ciência.

Segundo Saussure (2006), a Linguística faria parte de uma ciência mais ampla, a Semiologia, que se preocuparia com o estudo dos signos em geral e com seus usos no contexto social, ciência essa que, por sua vez, faria parte da Psicologia Social. Uma das motivações que o levaram a essa formulação foi o fato de que os estudos linguísticos realizados até então, destinavam-se apenas ao acompanhamento da evolução e à comparação entre línguas, e, não, à observação de seus usos sociais. A teoria saussureana desenvolve-se a partir de uma concepção dicotômica, que inicia com a distinção entre língua e fala:

O estudo da linguagem comporta, portanto, duas partes: uma, essencial, tem por objeto a língua, que é social em sua essência e independente do indivíduo; esse estudo é unicamente psíquico; outra, secundária, tem por objeto a parte individual a linguagem, vale dizer, a fala, inclusive a fonação, e é psico-física (SAUSSURE, 2006, p. 27).

A essa dicotomia, Saussure acrescenta outras, tais como diacronia vs sincronia, sintagma vs paradigma, significante vs significado, entre outras.

Anos depois, o linguista dinamarquês Louis Hjelmslev, recuperando e alargando as noções saussureanas, propõe que essa ciência, preocupada com o estudo dos processos de significação e sentidos, independentemente da linguagem em que se manifestem, denomine-se Semiótica12. O objetivo da Semiótica seria o exame dos diferentes sistemas de significação; seu objeto empírico de estudo, o texto, independentemente das linguagens em que ele se manifeste.

Segundo Hjelmslev, todo texto, assim como o signo, comporta dois planos ou funtivos que contraem entre si uma relação de interdependência: expressão e conteúdo. A essa relação, Hjelmslev denomina função semiótica. Trata-se de uma relação necessária, não arbitrária como acreditava Saussure, pois não pode haver função semiótica:

(...) sem a presença simultânea desses dois funtivos, do mesmo modo como nem uma expressão e seu conteúdo e nem um conteúdo e sua expressão poderão existir sem a função semiótica que os une (HJELMSLEV, 1975, p.54).

O plano do conteúdo e o plano da expressão, por sua vez, comportam, segundo o mestre dinamarquês (1975), a relação entre dois funtivos: forma e substância. Há, assim, uma forma e uma substância de expressão, e uma forma e uma substância de conteúdo. A substância não passa de uma massa amorfa se, sobre ela, não se projetar uma forma que a estruture. A relação entre a substância e a forma, que a ordena e articula, segundo as diferentes culturas e linguagens, é responsável pela construção do sentido. Desse modo, o plano de conteúdo, e, igualmente, o da expressão, contêm sempre uma substância e uma forma que a estrutura. Como lembra Fabbri (1999, p. 46), “la comunicación es un retazo

formal de la materia (de la expresión y el contenido) que, como decía Hjelmslev, produce una sustancia (de la expresión y el contenido)”.

Mas o texto, objeto de estudo da semiótica, não possui, segundo Hjelmslev, significação, se considerado isoladamente, pois:

Toda significação nasce de um contexto, quer entendamos por isso um contexto de situação ou um contexto explícito, o que vem a dar no mesmo; com efeito, num texto ilimitado ou produtivo, um contexto situacional pode ser sempre tornado explícito (HJELMSLEV, 1975, p. 50).

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A referência à inexistência de significação isolada do contexto é reforçada pelo fato de toda a significação, mesmo em nível de signo, depender de sua relação com os demais signos. Não há significação e sentido se se tomarem termos isolados, pois o que configura um signo ou um texto é a sua relação com os demais.

Hjelmslev prevê, assim, dois tipos de relações intertextuais, as de caráter sintagmático (e...e) e as de caráter paradigmático (ou...ou). As primeiras dariam conta das relações que um texto contrai com aqueles que o precedem e/ou sucedem na cadeia sintagmática; as segundas, das relações que um texto contrai com aqueles que fazem parte de seu paradigma e pelos quais poderia ser substituído.

Hjelmslev (1975) denomina de semiótica denotativa àquela resultante da relação entre expressão e conteúdo, mas prevê que esse tipo de semiótica (denotação) possa ser o ponto de partida para o desenvolvimento de novas semióticas. Acredita, dessa forma, que as semióticas podem imbricar-se. Nessa perspectiva, uma semiótica conotativa seria aquela cujo plano da expressão é uma semiótica denotativa. Em suas palavras:

Uma semiótica conotativa é portando uma semiótica que não é uma língua e cujo plano da expressão é constituído pelos planos do conteúdo e da expressão de uma semiótica denotativa. É portanto uma semiótica da qual um dos planos, o da expressão, é uma semiótica (HJELMSLEV, 1975, p. 125),

Por outro lado, Hjelmslev prevê que uma semiótica (denotação) possa se tornar o plano do conteúdo de uma nova semiótica. A essa inter-relação, denomina de metassemiótica.