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1.2 A hipótese de eficiência dos mercados

1.2.1 Será a eficiência testável?

Segundo Fama (1970, 1991) testar a hipótese de eficiência do mercado consiste em testar se num determinado momento os preços dos títulos reflectem e incorporam toda a informação existente no mercado e se existe ou não a possibilidade de ganhos sistemáticos.

A aplicação de testes à hipótese de eficiência do mercado tem sido alvo de alguma controvérsia, especialmente porque a maioria dos testes à eficiência têm de assumir a existência de um modelo de equilíbrio que defina a taxa de rendibilidade esperada para o título ou mercado em causa (normal- mente, um dos modelos mais usados para o efeito é o modelo CAPM ). Se a hipótese de eficiência for rejeitada, será que se pode afirmar que o mercado é simplesmente não eficiente? Ou será porque o modelo de equilíbrio escolhido não é o mais adequado? Esta noção conjunta leva a que a hipótese de eficiência não possa ser rejeitada facilmente, ou pelo menos, não de forma tão directa.

Em 1991 Fama apresenta uma revisão da literatura sobre a hipótese de eficiência do mercado, assim como os principais resultados obtidos nos testes efectuados por diversos autores. Relati- vamente aos testes de predictabilidade das taxas de rendibilidade, Fama (1991) conclui que os coeficientes de autocorrelação para as taxas de rendibilidade diárias, semanais ou mensais são alvo de alguma controvérsia, pois apesar de serem estatisticamente significativos, a verdade é que o coeficiente de determinação ronda, na maioria dos casos, os 3%, significando que dificilmente se conseguiriam gerar estratégias de ganhos sistemáticos baseadas nesta informação. Em termos de autocorrelação de longo prazo, os resultados não são conclusivos, pois se por uma lado os coefi- cientes da autocorrelação são mais significativos, por outro lado a reduzida dimensão das amostras pode induzir a enviesamentos. Ainda no contexto destes testes, Fama (1991) refere que os testes de predictabilidade das taxas de rendibilidade através de outros factores (dividend yield, price earn- ings ratio, taxa de juro a curto e a longo prazo, consumo per capita, nível de investimento das empresas) poderão ser factores explicativos de uma parte da variação das taxas de rendibilidade, contudo não promovem um nível de predição suficiente que ponha em causa a hipótese de eficiência do mercado. Além disso o comportamento dos preços das acções e respectivas taxas de rendibili- dade face aos factores que caracterizam as empresas e suas condições é considerado como resultado da “sagrada” racionalidade dos investidores. Neste contexto, Fama (1991) refere ainda que certas anomalias (nomeadamente o efeito Janeiro, efeito Segunda-feira, assim como outras sazonalidades) não põem em causa a hipótese de eficiência dos mercados, pois o desvio destes eventos face ao que seria considerado “normal” é geralmente inferior ao spread bid-ask da média das acções, além de que é necessário ter em conta a existência de custos de transacção. Relativamente aos event studies, Fama (1991) afirma que são estes testes que promovem a evidência mais clara sobre a eficiência do mercado, especialmente em amostras que integram taxas de rendibilidade diárias. Os resultados destes testes indicam que em média os preços das acções se ajustam rapidamente à informação pública, nomeadamente decisões de investimento das empresas, mudanças no que toca aos dividen- dos e mudanças na estrutura de capitais. No que toca aos testes à informação privada, Fama (1991) admite que os corporate insiders têm acesso a informação privilegiada, que poderá gerar ganhos anormais. Os principais testes recaem sobre a avaliação da performance dos gestores de fundos de investimento e fundos de pensões e os resultados apontam maioritariamente para uma não rejeição da hipótese de eficiência dos mercados.

Os testes à hipótese de eficiência envolvem as seguintes hipóteses conjuntas [ver Cuthbertson (2000)]:

(2) Todos os agentes usam o mesmo modelo de equilíbrio geral para determinar o preço da acção.

Ao testar empiricamente a hipótese de eficiência do mercado as ideias básicas a ter em conta são:

(i) Os agentes actuam de acordo com modelos de equilíbrio;

(ii) Os agentes processam toda a informação relevante do mesmo modo, com vista a determinar os rendimentos de equilíbrio. Os resíduos, assim como as taxas de rendibilidade são consideradas imprevisíveis a partir da informação disponível no momento em que a tentativa de previsão é realizada;

(iii) Os agentes não podem conseguir ganhos anormais de forma sistemática.

Os testes baseados no segundo ponto têm por base testes aos axiomas das expectativas racionais e estão relacionados com a eficiência da informação. Os testes baseados no terceiro ponto são um pouco diferentes, sendo necessário em primeiro lugar, definir lucro. De acordo com Cuthbertson (2000) o lucro económico deverá ser ajustado ao risco das taxas de rendibilidade relacionado com os respectivos custos.

Os testes utilizados podem ser, geralmente, de três tipos:

(a) Testes à independência de lucros anormais face ao conjunto de informação;

(b) Testes às trading rules e à forma como estas podem ou não gerar lucros anormais, ou acima da média, após ter em conta os custos de transacção e a cobertura do risco sistemático em causa. Estes testes envolvem experiências com um possível grupo de investidores (laboratório);

(c) Testes sobre os preços de mercado são estatisticamente iguais ao seu valor fundamental. Estes tipos de testes utilizam dados históricos e tentam calcular o valor fundamental dos preços. Testa-se se a variação nos preços é consistente com a ditada pela variabilidade nos valores fundamentais (testes à volatilidade).

Os testes descritos em (a) são os chamados testes de eficiência da informação e requerem a assunção explícita de um modelo de equilíbrio utilizado pelos agentes. Os testes descritos em (b) tentam verificar se existem variáveis económicas capazes de influenciar as expectativas individuais dos agentes. Os testes descritos em (c) são testes à volatilidade e baseiam-se no trabalho apresen- tado por Shiller (1981) e por LeRoy e Porter (1981).Tentam verificar se os preços apresentam ou não excessiva volatilidade face à hipótese de eficiência do mercado. Existem autores discordantes

deste tipo de testes, por exemplo Cuthbertson (2000), com o argumento de que o mercado bolsista é excessivamente volátil e por isso não consegue reflectir o seu valor fundamental. O teste do rácio das variâncias só pode ser aplicado a séries estacionárias, sendo necessário proceder à diferenci- ação das séries caso se verifique que estas são não estacionárias. Neste contexto surge também a aplicação da metodologia VAR para testar a hipótese de eficiência do mercado.1

De um modo geral, os coeficientes de autocorrelação das taxas de rendibilidade, os testes basea- dos em regressões (ARMA, por exemplo) e os testes de variâncias dos preços deveriam induzir às mesmas conclusões acerca da validade da hipótese de eficiência do mercado, contudo tal nem sempre acontece. Esta situação deve-se ao facto de que testes baseados em taxas de rendibilidade necessitam de ter na base modelos de equilíbrio, que são muito diferentes dos modelos dos preços e neste sentido as características dos testes diferem largamente. Além disso, Timmermann e Granger (2004) argumentam ainda que devem ser utilizadas técnicas e modelos que assumam a não esta- cionariedade das sucessões cronológicas, como via alternativa de testar a hipótese de eficiência do mercado, uma vez que o comportamento dos investidores pode provocar não estacionariedade nas taxas de rendibilidade dos activos, nomeadamente das acções, através de processos dinâmicos de aprendizagem e efeitos de feedback.

Em Portugal são de realçar os estudos realizados por Soares (1994), Soares (1997), Isidro (1998), Godinho (1999), Gama (2000) e Romacho (2004). Soares (1994) analisou a eficiência do mercado bolsista de acções português, concluindo que não se regista qualquer correlação desfasada signi- ficativa entre o índice da bolsa portuguesa e os dos principais mercados externos e que é possível numa análise global a partir do índice BTA construir políticas activas de transacção que superam o rendimento médio do mercado, constatando que existia nos dados históricos suficiente informação para contrariar a hipótese de eficiência do mercado, ainda que tal não significasse que o mercado era não eficiente. Soares (1997) testou a hipótese de eficiência do mercado de acções português (forma fraca) no período entre 1977-1994 tendo para tal realizado testes de estacionariedade, à distribuição de probabilidade, à hipótese de que as observações são i.i.d., etc. Os resultados obtidos por Soares (1997) indicam que o mercado português, para o período em análise, não poderia ser considerado eficiente na forma fraca.

Num contexto semelhante Gama (2000) concluiu que não existe eficiência na forma fraca no mercado accionista português no período entre 1989 e 1996. A evidência empírica da não eficiência põe em causa a aplicação e eficiência de modelos tradicionais de selecção e gestão de carteiras, como é o caso do modelo da média-variância e do CAPM. Godinho (1999) mostrou que as taxas

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de rendibilidade do índice BVL do mercado accionista português no período entre 1988 e 1998 não seguiam uma distribuição de probabilidade normal e não eram i.i.d., concluindo que os resultados obtidos com os modelos tradicionais de gestão e selecção de carteiras não eram eficientes quando aplicados ao mercado em causa. Godinho (1999) afirma ainda que não se verificando a hipótese de normalidade existe a probabilidade de que as carteiras seleccionadas através do modelo da média- variância não sejam eficientes para todos os investidores.

Isidro (1998) avaliou a eficiência na forma semi-forte do mercado bolsista português, sendo o evento analisado o anúncio de resultados contabilísticos. A autora em questão concluiu que o mercado, de uma maneira geral, não apresentava uma variabilidade anormal nos dias mais próximos ao anúncio de resultados, ou seja, que o mercado não apresentava sinais de não eficiência.

Balbina e Martins (2002) testaram a presença de efeitos anómalos na Bolsa de Valores por- tuguesa no período entre 1988 e 2001. Estes autores encontraram evidência da presença do efeito Segunda-feira, contudo os dados analisados não suportaram a hipótese de existência do efeito Janeiro. Balbina e Martins (2002) concluíram ainda que estes efeitos sazonais tendem a desapare- cer à medida que o mercado se torna mais sofisticado e eficiente.

Romacho (2004) analisou a selectividade e timing na avaliação do desempenho de fundos de investimento mobiliário em Portugal e concluiu que a performance destes não era significativamente superior a uma carteira aleatoriamente seleccionada, concluindo que o mercado era eficiente na forma forte.

Campbell, Lo e MacKinlay (1997), assim como Farmer e Lo (1999a) defendem a noção de eficiência relativa - a eficiência de um mercado face a outro mercado, que pode ser uma alternativa à eficiência tradicional. As vantagens deste novo conceito são facilmente analisadas por analogia. A eficiência dos sistemas físicos é muitas vezes medida face à proporção relativa de energia que convertem em calor ou trabalho.

Toda a controvérsia gerada à volta da hipótese de eficiência dos mercados foi estimulada pelo aparecimento de um conjunto de novas direcções de investigação, apoiados em modelos matemati- camente elaborados que têm a capacidade de melhor representar os dados empíricos. De acordo com Farmer e Lo (1999a) e Farmer e Joshi (1999b) as finanças irão desenvolver-se através de uma perspectiva biológica, mais especificamente através de uma ferramenta evolucionária na qual os mercados, instituições e investidores interagem de forma dinâmica de acordo com a lei da selecção económica. Neste contexto, os agentes competem entre si e adaptam-se às circunstâncias, sem necessariamente atingir o óptimo. Como exemplo das similaridades e analogias existentes entre a economia financeira e a biologia é de salientar o facto de Thomas Malthus e Adam Smith terem sido ambos citados por Darwin no seu estudo da selecção natural das espécies, tendo sido perfeitamente

estabelecidas as analogias existentes entre a biologia e a economia financeira.

Numa perspectiva um pouco diferente, McCauley (2004) critica profundamente os modelos estáticos tradicionais usados na economia, modelos estes baseados essencialmente na eficiência dos mercados. McCauley (2003, 2004) realça o facto de que os mercados são dinâmicos, dotados de elevados níveis de complexidade, onde a informação não é perfeita e a “sagrada” racionalidade dos investidores pode ser posta em causa.