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SERVIÇO SOCIAL E INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA NO MINISTÉRIO PÚBLICO

No documento LÍLIAN MARIA OLIVEIRA VIEIRA (páginas 92-130)

4 SERVIÇO SOCIAL NOS MINISTÉRIOS PÚBLICOS DO NORDESTE: A

4.2 SERVIÇO SOCIAL E INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA NO MINISTÉRIO PÚBLICO

POSSIBILIDADES

Com o intuito de apreender se as requisições feitas aos assistentes sociais inseridos no Ministério Público do Rio Grande do Norte, condizem com aquelas feitas aos assistentes sociais dos outros Ministérios Públicos, questionamos inicialmente quais as demandas existentes no trabalho com infância e adolescência. Sobre isso, é possível perceber pelas falas das entrevistadas44 que as demandas se apresentam de duas formas: individuais e coletivas. Para ilustrar, vejamos a fala da entrevistada 1.

A demanda individual é essa demanda de violação de direitos, é violência sexual, é violência física, e violência psicológica, é negligência, é maus-tratos [...], e a demanda coletiva, que se vincula muito mais à Política de Assistência e à Política de Atendimento Socioeducativo.

Percebemos que a atuação na demanda individual referida pela entrevistada está relacionada a situações de violências vividas pelas crianças e adolescentes. Embora a fala tenha se limitado a pontuar a atuação do assistente social em demandas individuais e coletivas é possível notar que tratam-se de demandas diretamente relacionadas aos direitos humanos desses sujeitos, que, por sua vez, exigem preparo das profissionais de Serviço Social para lidar com elas, assim como uma articulação com a rede, visando a resolutividade das situações trazidas.

Já a atuação no coletivo destina-se a realização de inspeções nas unidades e serviços ofertados às crianças e adolescentes como as Unidades de Acolhimento e as Unidades destinadas ao cumprimento de medidas socioeducativas, com o intuito de avaliar a prestação e a qualidade dos serviços ofertados para esse público, seguindo as normativas vigentes.

No que se refere a maior demanda recebida atualmente no MPRN, verificamos nos depoimentos das entrevistadas 1 e 3, que atualmente os assistentes

44 Todas as pessoas entrevistadas foram do gênero feminino e por isto, utilizamos o artigo feminino quando nos referimos as profissionais de Serviço Social entrevistadas.

sociais da instituição atuam mais com a demanda individual, diferente da tendência nacional de atuação no coletivo, conforme pode ser visto nas falas abaixo:

Hoje tem sido a demanda individual, agora, antes... Porque, assim, a dinâmica do meu trabalho depende muito da dinâmica do promotor, né, então, assim... Hoje a gente tem uma demanda mais individual, em termos quantitativos processuais, mas os promotores também têm atuado muito coletivamente. (Entrevistada 1).

Uma das principais demandas hoje é a violência sexual, abuso sexual, né? Então essa é a maior demanda do CAOP45 hoje nos casos individuais, né... Aí chega também, após abuso, acho que a segunda maior é negligência, né, casos de negligência mais graves... É... maus-tratos... São esses os principais. (Entrevistada 3).

A prevalência da atuação na demanda individual demonstra a manutenção das características que denotam o início da inserção dos assistentes sociais no sociojurídico, assumindo o papel de perito. Ao atuar com esta demanda, deve-se atentar para não cair na cilada de culpabilizar o indivíduo pela situação de vulnerabilidade social e/ou risco em que se encontra, descontextualizando a problematização do aspecto macro das relações sociais, na perspectiva de totalidade. Para isso, deve-se trabalhar a demanda individual de modo a garantir o direito violado e proporcionar a proteção necessária à criança e ao adolescente.

Sobre como se dá a atuação do assistente social frente a essas demandas, percebe-se a diferença da sistemática de trabalho a partir da lotação do profissional, conforme pode ser verificado nas falas abaixo:

- Quando essa demanda chega pra mim, o promotor faz um despacho dentro do procedimento, [...]. Então, a primeira coisa quando chega aquele procedimento: eu vou analisar pra ver se ele é um procedimento urgente ou não. Caso ele seja urgente, a gente vai dar uma prioridade a ele, caso não, ele entra na pilha por data de entrada... Feito isso, a gente analisa o procedimento e começa a proceder, começa a fazer nossas atividades, que qualquer outro profissional faz dependendo do campo em que atua que é o quê? Análise, planejamento da atividade, se vai fazer visita, se vai fazer atendimento, se é uma visita, se são várias visitas, se é visita domiciliar, se é visita institucional, o que é que eu preciso saber junto do assessor, junto do promotor, o que vai ser importante para minha

45 Os Centros de Apoio Operacional as Promotorias (CAOP’s) são órgãos auxiliares que articulam e orientam as promotorias relacionadas às demandas específicas.

atuação dentro do processo, né... Feito tudo isso, vou à campo, realizo, depois faço relatório... aí esse relatório também, muitas vezes, eu defino depois que eu utilizar todos os instrumentos iniciais, que é a visita, aí eu vejo se o caso cabe em relatório informativo, em relatório psicossocial (se tiver o profissional de Psicologia), se é só um relatório simples, ou se vai ser só um parecer... Então, assim, diante da minha demanda, eu também tenho muita autonomia de decidir o que é que eu vou utilizar como instrumental pra dar resposta àquela demanda que me chega. (Entrevistada 1).

- E aqui, quando chega o estudo, a gente recebe o estudo, distribui entre as profissionais e aí eu vou ler o procedimento, vou analisar a solicitação e vou ver, assim, se tem alguma coisa a mais, ali, que me chama atenção diante do que tá narrado, para além daquilo que aquele promotor pede, né? E aí quando a gente vai pra realidade, a gente confirma ou não aquela hipótese que a gente colocou pra aquele caso. Aí feito isso a gente elabora um relatório, em seguida o parecer, onde a gente, além de falar todo o contexto da família, a gente também faz alguns apontamentos... E aí, assim, algumas coisas eu pontuo, assim, que nem sempre, numa questão de negligência, é uma negligência, assim, por parte da família, assim... É uma questão mais estrutural do que propriamente da família. Então tem alguns casos que a gente, mesmo sendo caso individual, a gente consegue apontar alguma coisa mais macro e fazer algum encaminhamento nesse sentido. (Entrevistada 2).

A partir dos relatos, percebemos uma autonomia relativa do profissional de Serviço Social na condução do trabalho. Apesar do Promotor de Justiça na solicitação já apontar o que ele entende necessário (estudo social, estudo psicossocial, inspeção, entre outros), o assistente social tem autonomia para conduzir o trabalho e escolher os instrumentos a serem utilizados, construindo os seus próprios caminhos, podendo alterar inclusive o que foi proposto inicialmente pelo Promotor.

O instrumental teórico-prático, ético-político e técnico-metodológico são fundamentais para construir uma prática em consonância com os direitos fundamentais dos usuários a quem atende. Assim, a profissional de Serviço Social é capaz de ver a negligência e/ou violência estrutural em situações nas quais outros profissionais poderiam simplesmente culpabilizar a família de crianças e adolescentes, por exemplo.

Parte-se do pressuposto de que o exercício profissional do assistente social recebendo as determinações históricas, estruturais e conjunturais da sociedade burguesa e respondendo a elas, consiste em uma totalidade de diversas dimensões que se auto-implicam, se auto-explicam e se determinam entre si. Tais dimensões, em razão da diversidade que as caracteriza, constituem-se como “síntese de múltiplas determinações”, ou seja, caracterizam-se como unidade de elementos diversos, que conforma a riqueza e amplitude que caracteriza historicamente o modo de ser da profissão, que se realiza no cotidiano.

Com o intuito de analisar os entraves e possibilidades da atuação profissional no Ministério Público, a entrevista procurou saber os desafios e as potencialidades detectadas pelas assistentes sociais em seu fazer cotidiano. Sobre os desafios, as assistentes sociais apontaram a insuficiência de profissionais para atender as demandas postas, visto que não houve mais concurso público para provimento do cargo de Analista – Serviço Social, o fato do promotor acatar ou não as sugestões e encaminhamentos propostos pelas profissionais, a burocracia e a rigidez hierárquica, além de ter sido citada a dificuldade em efetivar os encaminhamentos propostos, modificando a situação de risco detectada inicialmente. Conforme pode ser verificado nas falas abaixo:

Eu acho que, assim, internamente, dentro do Ministério Público, a gente ainda tem um número de profissionais muito reduzido. [...] eu acho que eu diria que uma das maiores dificuldades hoje ainda é essa equipe reduzida, né [...] Mas, de forma externa, eu acho que o que dificulta o nosso trabalho é a rede, né, assim, é o suporte dessa rede, porque a gente faz o nosso trabalho, verifica se há violação, se não há violação, se há necessidade de acolhimento, se não há necessidade de acolhimento... Se não há necessidade de acolhimento, quais as necessidades e as demandas que essas famílias necessitam pra que a violação de direito possa ser diminuída ou sanada? E aí a gente esbarra em uma série de questões de fragilidade da Rede... (Entrevistada 1).

Eu acho, assim, porque... A gente lida com muitas realidades e, às vezes, o que eu estou propondo, assim, eu vou dizer uma coisa bem pessoal... Pode ser até ser senso comum o que eu vou dizer... Mas, as vezes, o que eu proponho, eu não sei se tá em conformidade com o aspecto jurídico, assim, por exemplo, às vezes eu proponho uma mediação, mas será que aquele caso seria realmente só de mediação ou seria mais uma audiência, né? E o desafio, assim, de você acertar naquilo que você vai fazer... Será que a mediação não seria mais interessante porque tem um diálogo mais amplo? Dura mais, assim, em geral, é mais tempo, é uma assistente social, é um

técnico que faz... Ou será que surtiria mais efeito uma audiência? Porque tem o caráter de aplicação das medidas... então, assim, às vezes eu me sinto desafiada nisso, o que propor pra garantir de forma mais rápida, digamos assim, viabilizar de maneira mais rápida, aquele direito, né? (Entrevistada 2).

É uma instituição muito burocrática, é... A questão da hierarquia é muito forte, então, assim, tem várias limitações nesse sentido, né, de que depende muito – no CAOP, no caso – de quem está à frente, né? Se o coordenador ele tem uma conduta, uma postura, mais flexível, mais aberta, de interação com a equipe, de ouvir, né, ótimo, mas, caso não... Então isso compromete totalmente o nosso trabalho. O nosso trabalho é muito amarrado, né, muito focado no promotor... A gente não tem autonomia, embora a autonomia sempre seja relativa, mas, aqui no Ministério Público, isso ainda é muito... Precisa de uma construção muito grande. Acho que ainda é muito... É uma instituição muito engessada, em vários aspectos. (Entrevistada 3).

Eu acho que não é nem um desafio interno, assim, tanto... É mais externo, da gente conseguir, né, colocar em prática ou conseguir garantir algum direito daquela criança ou daquela família... De conseguir que os encaminhamentos sejam efetivados e que a situação se modifique... Eu acho que o principal desafio é essa, é essa questão do depois, né, dos encaminhamentos. (Entrevistada 4).

Épossível perceber a diversidade de desafios apontados pelas entrevistadas. Cada uma delas pontuou algo diferente e que se apresenta como entrave no desenvolvimento de trabalho do Serviço Social na instituição, demandando, para tanto, a formulação de estratégias que visam superar ou desviar os desafios encontrados no cotidiano de trabalho. Estratégias essas que envolvem, sempre que possível, diálogo com os Promotores de Justiça e articulação com assistentes sociais no órgão, visando o fortalecimento da categoria no interior do MPRN, como por exemplo, através da formação de um Grupo de Trabalho que tem a finalidade de discutir a atuação psicossocial na instituição.

Quanto as potencialidades encontradas, os profissionais citaram o reconhecimento da profissão em nível institucional e a relativa autonomia que possuem para conduzir e escolher os instrumentais utilizados no atendimento às demandas.

Eu acho assim, eu vou falar do aspecto interno [...] O que facilita é o meu reconhecimento aqui na instituição enquanto profissional de Serviço Social, assim, eu vejo que eu sou muito bem reconhecida na minha atuação dentro das promotorias, tanto pelos nossos colegas

servidores, como pelos promotores... O que eu disponho, né, o meu arsenal de... condições de trabalho mesmo, a questão de... apesar de ter tido um problema com veículo, mas, independentemente disso, a gente tem veículo, a gente tem computador, a gente tem impressora, a gente tem ao nosso dispor toda uma tecnologia, todo um amparo estrutural positivo, né, diferentemente de outros locais de trabalho. Essa questão do reconhecimento e também do meu próprio esforço de buscar conhecimento sempre, de não parar, né, a gente tá ali sempre lendo, sempre buscando fazer da melhor forma possível o nosso trabalho, eu acho que isso também facilita o atendimento as nossas demandas. (Entrevistada 1).

Percebemos que a relativa autonomia foi apontada como uma potencialidade, de acordo com as entrevistadas, o reconhecimento interno da profissão, permite que a assistente social desenvolva sua função com mais autonomia, tendo a liberdade de escolher os instrumentos que vai usar na condução do seu trabalho e os caminhos que vai seguir. Isso demonstra que o lugar do Serviço Social vem crescendo gradativamente nesse campo.

Questionamos ainda aos profissionais, se havia alguma atividade cuja execução era considerada incompatível com a profissão. E embora o conjunto CFESS/CRESS tenha emitido diversos documentos sobre a incompatibilidade das competências e atribuições profissionais com algumas atuações no sociojurídico, como por exemplo, a realização de escutas especializadas por assistentes sociais. Apenas uma profissional entrevistada indicou que considera essa atividade incompatível com os princípios da sua profissão. As demais, embora realizem a escuta especializada no âmbito do Ministério Público, não citaram a prática como algo conflitante com os fazeres profissional. Conforme podemos perceber nos depoimentos abaixo:

- É... veja... É... É um pouco delicado, né? Eu, assim, eu não... Toda a minha atividade eu acho que é compatível com a minha função, o meu cargo. Agora já tiveram algumas situações isoladas, que, assim, situações isoladas, realmente, que isso não me agrada muito, mas que eu ainda não consegui dizer não, né... Que é a minha participação em... Em elaboração de despacho e de recomendação, que seriam atribuições, em tese, do assessor jurídico, né, então assim, isso é de forma bem isolada, né, não é de forma corriqueira... - Ah, faça um despacho’, ‘ah, faça uma recomendação’... (Entrevistada 1).

- Olhe, de acordo com a nossa profissão, sim eu acho que tem uma atividade que a gente faz que a gente não deveria fazer... Que seria a escuta, né, especializada de crianças e adolescentes, mas eu não tenho embasamento pra discutir. (Entrevistada 2).

- Não, existe não... Não que eu esteja recordando agora. Acho que tudo é pertinente. (Entrevistada 3).

- Não... Atualmente, eu não consigo, assim, visualizar, não, aqui no CAOP, não, eu acho que isso é bem mais tranquilo. Em outros setores eu já observei muito essa questão de realizar, assistente social, atividade administrativa, de técnico mesmo, isso aí eu já observei em outros campos que eu já atuei dentro do MP, da gente também ter que cumprir um pouco dessa parte administrativa, aí realmente saí fora um pouco. (Entrevistada 4).

- Não, eu acho que tudo que fazemos é compatível com o preconizado pela nossa profissão como atribuição do Assistente Social. (Entrevistada 5)

É preciso refletir o significado desses profissionais não reconhecerem essa prática como ferindo os princípios éticos da profissão e mesmo os direitos das crianças e adolescentes por eles atendidos ou negarem essa prática como parte do seu cotidiano. Ficam os questionamentos: isso remete a uma atitude conformista e mesmo submissa no âmbito do sistema de justiça? Ou será que pode estar havendo um reconhecimento dessa prática como legítima? Ou ainda um distanciamento do que vem sendo discutido na profissão? Tudo isso exigiria pensar qual o sentido da garantia de direitos da infância e adolescência e dos limites do Estado nesse processo, bem como o senso crítico dos profissionais que atuam com essa demanda.

Importa esclarecer que a Lei nº 13.431, de 4 de abril de 2017, que estabelece o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência e altera a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), normatiza e organiza o sistema de garantia de direitos da criança e do adolescente vítima ou testemunha de violência, cria mecanismos para prevenir e coibir a violência, e estabelece medidas de assistência e proteção à criança e ao adolescente em situação de violência. Contudo, percebemos que essa lei se refere, principalmente, a institucionalização jurídico-normativa da “escuta especializada” e "depoimento especial", anteriormente designado Depoimento sem Dano (DSD).

A referida lei, determina que a criança ou adolescente vítima ou testemunha de violência será ouvida através de “escuta especializada e depoimento especial”, a ser efetuada por especialistas (que, na realidade, são, na maioria dos locais, assistentes sociais e psicólogos que compõem as equipes técnicas), mesmo dispondo que se trata de depoimento “perante autoridade policial ou judiciária” (art. 8º). De acordo com a lei:

Art. 7º - Escuta especializada é o procedimento de entrevista sobre situação de violência com criança ou adolescente perante órgão da rede de proteção, limitado o relato estritamente ao necessário para o cumprimento de sua finalidade.

Art. 8º Depoimento especial é o procedimento de oitiva de criança ou adolescente vítima ou testemunha de violência perante autoridade policial ou judiciária. (BRASIL, 2017).

O artigo 12º, inciso II, assegura “à criança ou adolescente a livre narrativa sobre a situação de violência, podendo o profissional especializado intervir quando necessário, utilizando técnicas que permitam a elucidação dos fatos”. Verifica-se que essa prática colocará a criança como responsável pela produção da prova judicial nos casos em que ela é vítima ou testemunha de crimes, visando à punição do suposto autor da violência, e o profissional como encarregado pela extração “técnica” da “verdade dos fatos”. (BRASIL, 2017).

Ao refletir sobre essa demanda posta ao Serviço Social, Fávero (2018) caracteriza-a como uma requisição conservadora e afirma que essas requisições, no campo sociojurídico, se concretizam por meio de dispositivos legislativos e projetos de lei que representam um retrocesso no campo dos direitos conquistados a partir da Constituição Federal, de 1988.

Sobre isso, Fávero (2018) alerta,

Na análise dessa realidade de trabalho é importante a clareza de que as instituições do sociojurídico impõem pela coerção e pela impositividade da lei a defesa de interesses da classe dominante — que é a que detém o monopólio e o poder político, ideológico e econômico de impor seus interesses (CFESS, 2014), especialmente em momentos de desmobilização político-social. A esse respeito, documento do CFESS sobre o sociojurídico pontua que os assistentes sociais devem ter clareza que o direito positivo, por possuir um caráter de classe, impõe a defesa dos interesses da

classe dominante e, portanto, seja no acesso ao complexo aparelho de justiça burguês, e mesmo nos instrumentos de convencimento de seus operadores, a lógica da defesa da classe dominante se faz presente. Tal fundamento possui relevância determinante na vida das pessoas, uma vez que ao serem “julgadas por algum crime, ou por algum ato ilícito, estarão, no limite, à mercê dessa discricionariedade de classe, ainda que isso se dê com muitas e complexas mediações”. (BORGIANNI, 2012, p. 50 apud FÁVERO, 2018, p. 54). Essas requisições demandam a atuação do assistente social, mas nem sempre estão em concordância com as atribuições e competências expressas no Projeto Ético-Político da profissão, como a solicitação à participação em inquirição de crianças e adolescentes, que viola as prerrogativas profissionais, tal como infrige os direitos de crianças e adolescentes.

Sobre isso, em 2018, o CFESS emitiu uma Nota Técnica apontando questões relacionadas a "escuta especializada" proposta pela Lei 13.431/2017, nela o autor Maurílio Castro de Matos, apresenta críticas e argumentos para defender a posição do Conjunto CFESS/CRESS sobre a realização desse tipo de atendimento por profissionais de Serviço Social.

No documento, Matos (2018) afirma,

[...] O Judiciário vem judicializando políticas e o trabalho daqueles/as que atuam nas políticas sociais, por meio da requisição de serviços. Outra expressão tem sido a judicialização para o acesso ao registro dos/as trabalhadores/as dos sistemas de educação, saúde e assistência social, por exemplo, com as requisições de cópias dos prontuários. Com a Lei 13.431, o Judiciário intenciona acabar com a autonomia. Diga-se de passagem escassa, pois, na assimetria de poder, já vem sendo largamente feita, ainda que não sem questionamentos. Na proposição da Lei 13.431, toda a rede, em nome da importância inegável da responsabilização da violência, trabalha para o poder de justiça e de polícia.

Os autores Digiácomo e Digiácomo (2018) ressaltam, que a aprovação da lei se trata de uma expansão da judicialização:

O dispositivo foi extremamente “tímido” ao tratar das obrigações

No documento LÍLIAN MARIA OLIVEIRA VIEIRA (páginas 92-130)

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