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1. INTRODUÇÃO

2.3. Determinantes de inadimplência e de recuperação de crédito

2.3.1. Características individuais

2.3.1.3. Setor de atividade

A análise do setor em que uma empresa atua é aspecto essencial na previsão de inadimplência ou de recuperação de crédito de empréstimos bancários. Conforme destacam Gartner, Moreira e Galves (2009), muitas crises financeiras foram agravadas em razão da excessiva exposição de instituições financeiras a setores específicos da economia, que, sucumbindo à crise, tornaram insustentável a manutenção da empresa, gerando uma “massa de créditos incobráveis”.

Há setores econômicos que possuem maior instabilidade, sendo mais vulneráveis aos choques externos. Outros são caracterizados por maior disputa concorrencial. Existem ainda setores que possuem produtos e serviços de menor elasticidade. Além disso, é importante ter conhecimento do comportamento dos diversos setores da economia, uma vez que um pode estar diretamente relacionado a outro e, com isso, sofrer sua influência. O reconhecimento dessas correlações pode resultar em um processo de diversificação de risco mais adequado (SILVA, 2006).

Jorion (2003, p. 285) destaca que

[...] a falta de diversificação de risco de crédito tem sido a causa principal de falências bancárias. O dilema é que bancos possuem uma vantagem comparativa em outorgar empréstimos a entidades com as quais já possuem relacionamento, criando assim concentrações excessivas em determinados setores geográficos ou industriais.

Resultados de pesquisa de avaliação da taxa de sobrevivência das empresas no Brasil desenvolvida pelo Sebrae (2013) demonstram que as maiores taxas de sobrevivência são do setor industrial (79,9%), seguindo-se o setor de comércio (77,7%) e o setor de serviços (72,2%).62 O setor industrial, de forma geral, possui maiores barreiras à entrada, em razão dos

62 A análise por segmento de atividade mostra grande variação dentro dos próprios setores industrial, de

comércio e de serviços. No setor Industrial, a taxa de sobrevivência varia entre 59% (Fabricação de bebidas) e 86% (Fabricação de equipamentos de informática, produtos eletrônicos e ópticos). No setor de Comércio, há variação entre 44% (Representantes comerciais e agentes do comércio de produtos alimentícios, bebidas e fumo) e segmento 89% (Comércio varejista especializado de instrumentos musicais e acessórios). No setor de Serviços, tem-se a variação da taxa de sobrevivência entre 44% (Seleção, agenciamento e locação de mão de obra) e 81%

maiores requisitos de capital, de tecnologia e de conhecimentos técnicos exigidos para ingresso, reduzindo a concorrência e atuando como forma de proteção às empresas já estabelecidas, o que pode explicar a menor taxa de mortalidade (SEBRAE, 2013).

Em sentido diverso, Camargos et al. (2010) verificaram estatisticamente que empresas do setor industrial apresentam chances superiores às do setor comercial de ser inadimplentes, não obtendo resultados significativos para o setor de serviços. Os autores sugeriram como potenciais razões para a diferença observada a maior complexidade e os maiores custos envolvidos no setor, assim como a tendência à limitação de escopo de atuação, sujeitando-se mais às sazonalidades.

A condição do setor econômico da corporação quando da inadimplência é também reconhecidamente um fator determinante de recuperação de crédito. Khieu, Mullineaux e Yi (2012) sustentam que setores em recessão possuem uma relação negativa com taxa de recuperação de crédito. Afinal, caso seja necessário, os ativos das empresas em default serão vendidos a um valor mais baixo, devido ao fato de os principais compradores destes ativos serem, em geral, empresas do mesmo setor econômico, que, possivelmente, também estarão sofrendo dificuldades econômicas.

De fato, Shleifer e Vishny (1992)63, citados por Acharya, Bharath e Srinivasan (2007), destacam que em indústrias mais especializadas problemas envolvendo recuperação de crédito em momentos de crise setorial tendem a se intensificar. Afinal, os ativos das empresas de setores especializados também tendem a ter características únicas, tendo pequena utilização alternativa para outros setores econômicos. Tal característica resulta em menor número de potenciais compradores, principalmente em épocas de crise setorial, em que a liquidez das empresas, mesmo saudáveis, se reduz significativamente.64. Desse modo, o valor dos ativos de uma empresa inadimplente com ativos especializados será impactado pela situação econômica

(Reparação e manutenção de equipamentos de informática e comunicação e de objetos pessoais e domésticos) (SEBRAE, 2013).

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SHLEIFER, A.; VISHNY, R. Liquidation values and debt capacity: a market equilibrium approach. Journal of

Finance 47, 1992.

64 Importante notar que se as dificuldades financeiras de determinada empresa envolverem o pagamento dos

credores mediante a venda de parte dos ativos ou, mesmo, a falência da firma e a consequente liquidação dos ativos, os valores dos bens influenciarão o nível de recuperação dos credores. Além disso, a própria antecipação da possível redução do valor dos ativos pode resultar em importante poder de barganha da empresa em relação a seus credores (ACHARYA, BHARATH e SRINIVASAN, 2007).

das demais empresas de seu setor (concorrentes e possíveis compradores dos bens), em especial o nível de liquidez e o nível de alavancagem financeira.

Acharya, Bharath e Srinivasan (2007) defendem que setores fortemente concentrados – ou seja, com reduzido número de concorrentes – representam um mercado imperfeito para ofertas esperadas em leilões ou venda dos bens de empresas do setor em dificuldades financeiras. Em razão disso, espera-se que a concentração do setor tenda a ser relacionada com menores taxas de recuperação de crédito.

De todo o exposto, importante verificar que a existência de um cenário macroeconômico de recessão por si só não determina os níveis de recuperação de crédito. O ponto crucial está em identificar se o setor de atividade da empresa inadimplente está em crise, uma vez que nele se verifica grande retração da recuperação até mesmo quando a economia geral não está em recessão (ACHARYA, BHARATH e SRINIVASAN, 2007).65

Estudo realizado por Acharya, Bharath e Srinivasan (2007) com base em dados de empresas americanas inadimplentes entre 1982 e 1999 e pesquisa desenvolvida por Khieu, Mullineaux e Yi (2012) utilizando banco de dados de recuperação da Moody’s66 no período de 1987 a 2007 confirmam empiricamente a relação negativa entre setor em recessão e nível de recuperação de crédito. Já Altman e Kishore (1996)67 apud Caouette, Altman e Narayanan (1999) classificaram 696 emissões de títulos inadimplentes com base no código setorial, tendo verificado grande variabilidade entre setores, indicando que estas características de cada empresa são informações relevantes para estratégias de recuperação de crédito. As empresas de serviços públicos e de produtos químicos obtiveram as maiores taxas, em torno de 70%, enquanto a média de recuperação dos demais setores variou entre 30%-40%.

Por fim, destaca-se que o setor de atividade por ser utilizado como fator base para o agrupamento dos objetos de estudo (Cluster Analysis). Além disso, reconhece-se que o nível

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Importante destacar que esta interpretação da separação entre crises macroeconômicas e crises setoriais não exclui a interpretação de que a recuperação de crédito tende a ter níveis mais baixos no caso de retração da economia geral, em decorrência da redução dos preços dos ativos (colaterais) de forma geral, como reconhecido por Khieu, Mullineaux e Yi (2012) e também por Acharya, Bharath e Srinivasan (2007).

66Moody’s Ultimate Recovery Database (URD).

67 ALTMAN, Edward I.; KISHORE, Vellore M. Almost Everything You Wanted to Know about Recoveries on

de análise de um estudo pode ser mais amplo, considerando-se exclusivamente os grandes setores, como Indústria, Comércio, Construção e Serviços, ou pode ser mais restrito, em que se consideram as grandes categorias ou os segmentos (classes) de atividade nos níveis mais detalhados.68