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Valor total dos bens da empresa e dos avalistas (patrimônio)

1. INTRODUÇÃO

2.3. Determinantes de inadimplência e de recuperação de crédito

2.3.1. Características individuais

2.3.1.7. Valor total dos bens da empresa e dos avalistas (patrimônio)

Quando da análise de concessão de crédito, é fator relevante para a definição da possibilidade de concessão e dos limites do empréstimo o valor do patrimônio da empresa e dos avalistas ou fiadores da operação de crédito.

A assimetria informacional presente nos mercados de crédito é reduzida quando os pretendentes mutuários indicam sua situação patrimonial, fornecendo às instituições financeiras mais informações que permitam evitar o risco de seleção adversa78 (VARIAN, 2006). Afinal, demandantes de crédito com uma situação patrimonial mais positiva tendem a reduzir o conflito de interesses presente na relação entre devedores e credores, assim como protegem mais os bancos de problemas que envolvam risco moral e caráter do devedor.

Neste sentido, afirma Linardi (2008, p. 6):

Com as imperfeições do mercado de crédito presentes e mantendo a demanda total de financiamento constante, o modelo de empréstimos com informação assimétrica implica que o prêmio de financiamento externo varia inversamente com a riqueza líquida dos tomadores de empréstimos. A relação inversa surge porque quanto maior é a riqueza líquida, maior é a capacidade de se auto financiar e de oferecer ativos colaterais e, consequentemente, menor é o conflito de interesses entre os tomadores

77 No caso de instituições financeiras, desde que tenham o acesso autorizado especificamente pelos clientes,

outra importante fonte de informação de crédito é o Sistema de Informações de Crédito do Banco Central do Brasil (SCR), que é um banco de dados sobre operações e títulos com características de crédito e respectivas garantias contratados por pessoas físicas e jurídicas perante todas as instituições financeiras no País (BCB, 2014b). Além disso, há também o Cadastro de Emitentes de Cheques sem Fundos (CCF) que consolida as informações dos emitentes com pendências financeiras relacionadas a cheques sem fundos, representando outra base de dados para avaliação de risco de crédito (BCB, 2015c).

e financiadores externos de fundos. Por outro lado, uma riqueza líquida menor implica em aumento dos custos de agência e, para recompensar os credores, o prêmio deve ser maior.

Importante destacar que a análise do fator patrimônio de forma independente é incompleta, uma vez que não indica a real exposição da instituição financeira aos riscos de seleção adversa, ao perigo moral e ao caráter do devedor, nem à real redução dos conflitos de interesse com o tomador de crédito. Neste sentido, deve-se considerar o valor solicitado (ou o valor a ser financiado) para a adequada avaliação do impacto do patrimônio do sócio para uma maior ou menor probabilidade de inadimplência e de recuperação de crédito. Espera-se que quanto maior a proporção do patrimônio em relação ao valor financiado menor a probabilidade de inadimplência e maior a de recuperação de crédito.

Outros pontos relevantes à análise do impacto do patrimônio da empresa e dos avalistas ou fiadores na inadimplência e na recuperação de crédito referem-se às características deste patrimônio, especialmente em relação ao aspecto da impenhorabilidade de alguns bens e às questões da liquidez e da depreciação dos bens.

A Lei 8.009/90, em seu art. 1º, determina que o imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam (“bem de família legal”), salvo nas hipóteses previstas na própria lei.79 Além disso, os arts. 1.711 a 1.722 do Código Civil disciplinam o “bem de família convencional ou voluntário”, entendido como o patrimônio, limitado a um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, que a entidade familiar destina voluntariamente para criar o “bem de família”, não podendo ser expropriado por dívidas civis, fiscais ou de outra natureza.80 Desse modo, quando da análise da concessão

79

Art. 3º da Lei 8.009/90: “A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal,

previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: “I - em razão dos créditos de trabalhadores da

própria residência e das respectivas contribuições previdenciárias; II - pelo titular do crédito decorrente do financiamento destinado à construção ou à aquisição do imóvel, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato; III - pelo credor de pensão alimentícia; IV - para cobrança de impostos, predial ou territorial, taxas e contribuições devidas em função do imóvel familiar; V - para execução de hipoteca sobre o imóvel oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar; VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens; VII - por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação”.

80 Aplicam-se ao bem de família convencional as mesmas exceções previstas na legislação especial (art. 3º da lei

de crédito o patrimônio impenhorável, em geral dos avalistas, deve ser desconsiderado, já que não pode ser expropriado no caso do não cumprimento da obrigação.

Bens com baixa liquidez, como quotas de outras empresas ou títulos de crédito de grande risco ou de baixa comercialização em mercado secundário, representam menor segurança para as instituições financeiras no caso de inadimplemento, já que no caso de expropriação dos bens pode existir maior dificuldade para venda e posterior retorno monetário da operação. Da mesma maneira, um patrimônio caracterizado por bens que sofrem contínua desvalorização, como maquinário e veículos, tende a ter um efeito menor para mitigar conflitos de interesse entre devedores e credores, já que com o passar do tempo a exposição do patrimônio do devedor pode ficar relativamente menor em relação ao valor financiado e devido.

Khieu, Mullineaux e Yi (2012) afirmam que quanto maior o nível de tangibilidade dos ativos da empresa maior o potencial incremento do valor de recuperação de crédito pelos bancos. Neste sentido, argumentam que a possibilidade de recuperação também depende de até que nível o patrimônio da empresa não está vinculado a alguma outra operação ou uso específico. Assim, desconsiderando-se os ativos já oferecidos como colaterais da operação financeira, espera-se uma influência positiva na recuperação de crédito o maior nível de ativos na empresa, em especial tangíveis (cuja valoração é mais clara e menos onerosa).

Resultados encontrados por Camargos et al. (2010) e Camargos, Araújo e Camargos (2012) em pesquisas com base em dados de parte de carteira de crédito de um banco público brasileiro indicaram a relação negativa entre valor do patrimônio dos avalistas e a inadimplência empresarial, sugerindo a utilização deste parâmetro como proteção ao descumprimento das obrigações.

Por fim, destaca-se que no Brasil a maior parte dos empréstimos concedidos a pequenas empresas tem como finalidade atender à necessidade de capital de giro, razão pela qual na maior parte das vezes a concessão de crédito é feita sem a exigência de uma garantia real, mas apenas com garantia pessoal, ao menos, dos sócios. Esta característica do mercado de crédito, especialmente de empresas de menor porte, demonstra a importância do valor do patrimônio para a obtenção do crédito do ponto de vista dos demandantes e para a possível proteção das instituições financeiras no caso de descumprimento das obrigações.