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2.4 O MUNICÍPIO DE VILA PAVÃO

2.4.2 O SETOR DE EXTRAÇÃO DE ROCHAS EM VILA PAVÃO

Em conversa informal com o Engenheiro de Minas10 responsável pela execução dos trabalhos em uma das pedreiras visitadas, foi relatado que a mentalidade da classe patronal vem mudando, em relação às formas de organização da exploração das jazidas e das relações de trabalho. O Engenheiro afirma que as empresas têm procurado se enquadrarem nas normas estipuladas pelos órgãos competentes, como forma de evitar problemas com o Ministério Público, a Polícia Federal, a Polícia Rodoviária Federal, o Ministério do Trabalho e Emprego e o Ministério do Meio Ambiente.

Esta mudança foi motivada, segundo ele, principalmente, pelas fiscalizações que estavam sendo realizadas nos serviços de extração mineral do município e região. Essa alteração pode ser percebida na análise realizada por Borsoi (2007), referente à visão da classe empresarial em relação ao desenvolvimento da atividade extrativa.

Apesar das queixas do IEMA, há um reconhecimento por parte da categoria empresarial da melhoria da qualidade do serviço e atendimento prestado pela agência ambiental ao minerador. Em conseqüência da maior eficiência do órgão, o empresariado estaria mais consciente dos problemas ambientais causados pela extração. Primeiramente pelo aumento da fiscalização e maior cobrança do IEMA, em segundo lugar, pela forma como têm sido feitas as intervenções, priorizando uma abordagem de conscientização com menos multas e represálias, como ocorria no passado (BORSOI, 2007, p. 40).

Entretanto, os dados contidos no DATAUFES (2004) apontam para o sentido contrário. De acordo com o documento:

A falta de fiscalização, bem como controle e planejamento de políticas públicas são apontados pela população como fontes facilitadoras de empresas irregulares e clandestinas. Fator que contribui para a perda de receita, deterioração ambiental e diminuição da qualidade de vida de trabalhadores e residentes do entorno (DATAUFES, 2004, p. 31).

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Esta conversa ocorreu durante o trabalho de campo realizado em 2008, junto a equipe de pesquisadores que participaram do estudo realizado por NESTH (2008).

Barsoi (2007) segue caminho semelhante ao traçado no citado diagnostico, quando realiza análise dos dados coletados em sua pesquisa. Ela afirma que:

Com efeito, a omissão do Estado frente à atuação da atividade contribui para o crescimento acelerado e desordenado do setor de pedras na região. Além da falta de fiscalização, outro fator que parece favorecer a informalidade esta relacionado à excessiva burocratização dos processos de legalização dos empreendimentos minerais (BORSOI, 2007, p. 9).

Entretanto, verificamos que, no momento em que eram desenvolvidas atividades ligadas ao projeto desenvolvido pelo NESTH (2008) na cidade pesquisada, 16 das 26 empresas vistoriadas na região norte/noroeste do Espírito Santo foram interditadas pelo Ministério Público do Trabalho e Emprego, Ministério das Minas e Energias e Polícia Rodoviária Federal. A operação, que acarretou nestas interdições, ocorreu nos três principais estados produtores de mármore e granito no país, Espírito Santo, Minas Gerais e Bahia.

A fiscalização abrangeu 65 mineradoras nos três Estados, resultando em 52 interdições que beneficiaram 840 trabalhadores que se encontravam em condições degradantes. No Espírito Santo, foram vistoriadas 26 empresas nos municípios de Nova Venécia, Vila Pavão, Baixo Guandu, Itaguaçu e Barra de São Francisco. Uma lavra fiscalizada, fica na cidade mineira de Mantena, na divisa com o Espírito Santo e foi incluída na lista das empresas capixabas. Do total das 26 empresas vistoriadas, 16 foram interditadas e dez estão com a documentação solicitada em análise para averiguar se sofrerão interdição (GAZETA ONLINE, Rede Brasileira de Informação dos Arranjos Produtivos Locais de Base Mineral, acesso 14/03/2009).

Conforme Borsoi (2007), os procedimentos adotados nestes casos são a notificação e interdição das empresas, estipulando-se um prazo para o cumprimento das exigências. Caso o previsto na notificação não seja cumprido no prazo determinado pelos órgãos competentes, é aplicada uma multa aos infratores e mantida a interdição até que se cumpram as exigências. Quando realizada a regularização dos problemas detectados, a empresa recebe a liberação para retomada dos trabalhos.

Um dos problemas enfrentados pela fiscalização foi exposto no jornal Gazeta Online. A matéria publicada informa sobre a elaboração de uma lista, realizada a partir da denúncia feita pelo Sindicato dos Trabalhadores. Esta lista relaciona as empresas que

deveriam ser fiscalizadas e foi elaborada através do cruzamento de informações do Ministério do Trabalho e emprego (MTE) e do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM).

Entretanto, nem todas as empresas listadas foram fiscalizadas. Em várias delas, os responsáveis pelo gerenciamento das lavras foram avisados da presença, na região, dos integrantes da Força Tarefa e as atividades foram suspensas como forma de impedir a entrada da fiscalização no local das atividades (GAZETA ONLINE, Rede Brasileira de Informação dos Arranjos Produtivos Locais de Base Mineral, acesso 14/03/2009).

Em relação a essa realidade, verificamos, na mesma matéria, que nas pedreiras onde foi possível realizar fiscalização, apuraram-se os itens presentes no documento gerado pelo sindicato. Nas empresas onde se constatou a veracidade das irregularidades, ocorreram a interdição de suas atividades. Conforme a publicação as principais irregularidades encontradas são:

E xt r a çã o d e bl o c os s em aut or i zação; l a vr a r egi s t r ad a em n om e d e u ma e mpr es a e e x pl o r ad a p or ou t r a e mpr e s a s e m a d e vi d a d ocu men t aç ã o d e ar r end ame nt o; At r as o no pa game nt o d o s s al ár i os ; t r ans p or t e d e t r a bal h ad or e s em ca mi nh õ e s i nadequ ad os ; t r a b al h ad or e s s em r e gi s t r o; ambi en t e de t r ab al h o e m c on di çõe s pr ecár i a s s e m s ani t ár i os e r e fei t ó r i os pró xi mo s ; t rab al h ad or e s s em equ i pa men t o d e se g ur anç a; Nã o f or n eci men t o de águ a pot á vel ao s t r a bal h ad or e s ; al oj ament o s i nadequ ad os ( GA ZE TA ON L INE , R ed e B r as i l ei r a d e In f or ma çã o d os Ar r an j os Pr odu t i vo s L ocai s d e B as e M i ner al , ac es s o 14 / 03 / 20 09 ) .

As informações presentes no documento publicado no jornal Gazeta Online tendem a confirmar as afirmações encontradas no estudo realizado pela UFES e pela pesquisadora Borsoi. Conforme relatório da UFES, os pontos negativos evidenciados pela pesquisa foram: depredação ambiental 75%, periculosidade, insalubridade, perigo de acidentes na atividade de extração 41,1%, motivos de depredação do patrimônio público e êxodo rural 39,3%, exploração da mão de obra, ausência de segurança e treinamento 3,6% busca incessante pelos altos lucros possíveis no setor 16,1%, falta de fiscalização, controle e planejamento 5,4%, barulho e poluição sonora 10,7%, e produção de resíduos e lixo 1,8%. A falta de chuva causada pela atividade extrativa não foi apontada por nenhum participante da pesquisa (DATAUFES, 2004, p. 45).

Os efeitos negativos da exploração de pedras são reportados também sobre a dimensão e organização social do trabalho. Com 48,5% na opinião dos entrevistados a qualidade das condições no meio ambiente de trabalho dos operários são apontados como insalubres, perigosas e com alto risco de mortes. A falta de segurança e de capacitação figuram como aspectos negativos que corroboram para os acidentes de trabalho e, refletem 10,0% na opinião da comunidade. (DATAUFES, 2004, p. 45).

No entender de BORSOI (2007, p.45):

(...) as ações trabalhistas mais comuns são: por lesão por esforço repetitivo (LER), silicose pela superexposição ao pó de minério (sílica), perda auditiva em decorrência de ruído, problemas na coluna. Além disso, há os acidentes típicos, como queimadura por explosivos, rompimento de ligamento no joelho, tornozelo e na mão. A falta de capacitação, a não utilização ou uso incorreto de equipamento de proteção e o desvio de função são apontados pelo sindicato como principais fatores responsáveis pelos acidentes.

De acordo com o DATAUFES (2004), a preparação para o trabalho nas pedreiras seria a forma mais eficaz de se tentar evitar e/ou diminuir os adoecimentos, incidentes e acidentes nos locais de extração, desdobramento e polimento das pedras no município de Vila Pavão e região. Entretanto, este dado, parece não ter causado o efeito esperado nos que administram as frentes extratoras de pedras no município e regiões adjacentes.

As informações apresentadas nos levam a crer que, muitas empresas, além de colocarem operários em riscos iminentes - a sua saúde e segurança física -, praticam outras irregularidades quanto ao desenvolvimento da atividade extrativa. Por exemplo, operários cuja carteira de trabalho está assinada em uma função, e na prática exercem outras... (DATAUFES, 2004, p. 54).

Segundo o mesmo estudo, apenas 11,9% dos operários recebem formação para a realização de seu trabalho. Por outro lado, o número é expressivo entre os que afirmaram não receberem formalmente qualquer tipo de preparação formal para o trabalho, 88,1%. Entre aqueles que foram formalmente preparados para o trabalho, o diagnóstico informa que 25,0% receberem curso de blaster, 10,7% foram capacitados para manuseio e utilização dos equipamentos de segurança (CIPAMIN), 3,6% em braça de fogo, 3,6% em usar martelo, 3,6% para serem operadores de máquinas de fio diamantado, 3,6% para desempenhar a função de serrador, e, por último, a expressiva

fração de 50% de trabalhadores que não sabem para qual função receberam formação (DATAUFES, 2004, p. 54).

Quando falamos em preparação formal, estamos nos referindo a capacitação profissional realizada por pessoal “especializado” em questões ligadas a saúde e segurança neste tipo de trabalho, conforme prevê a NR22. Ainda segundo DATAUFES (2004), na maioria dos casos, os novos operários das pedreiras são preparados pelos colegas mais experientes e através da observação que os mesmos fazem no campo da execução do trabalho.

De acordo o DATAUFES (2004) dos trabalhadores que declararam terem recebido capacitação para o uso dos EPIs: 52,7% foram treinados em cursos de 4,31 horas para o uso de máscara; 47,2% para o uso de protetor auditivo durante 4,66 horas; 45,2% para utilização de cinto de segurança com carga horária de 2,88 horas; 41,8% para uso de óculos de proteção com 4,09 horas; 40,2% para uso de capacetes com carga horária de 3,45 horas; 39,8% para uso de luvas com carga horária 3,94 horas; e 36,5% para uso de calçado com carga horária de 4,03 horas (DATAUFES, 2004, p. 55).

Além da qualificação profissional dos trabalhadores, outro elemento importante que se deve verificar nas pedreiras, é o cumprimento da lei que proíbe a extração do mármore e granito através do método de perfuração a seco. De acordo com o técnico de segurança do trabalho, localizado na pesquisa realizada pelo NESTH, este método libera grande quantidade de silicose em sua poeira. Atualmente, a lei determina que a extração, serragem e polimento de pedras ornamentais sejam realizados com o auxílio de água, reduzindo assim a quantidade de pó suspenso no ar, e, conseqüentemente, inalado por parte dos trabalhadores. O relatório do NESTH informa que em Vila Pavão 84,4% das pedreiras utilizam, desde 2008, o método de perfuração a úmido e que 15,6% utilizavam, na época de finalização do estudo, a perfuração a seco.

Conforme os resultados publicados pelo NESTH (2008), além dos elementos expostos acima, 16,7% dos trabalhadores do município de Vila Pavão acreditam que o trabalho poderia se melhor executado caso se diminuísse a quantidade de horas trabalhadas, pois isso envolveria menos desgaste físico, aumentaria o número de trabalhadores, etc. 19,3% dos mineiros creditam e apontam que esta possibilidade às ações sindicais, 38,6% afirmam ser necessário a qualificação profissional dos operários, 54,4% defendem que o trabalho melhoraria a partir do aumento salarial, 19,3% afirmam

ser necessário a ampliação da fiscalização via Ministério do Trabalho e Emprego, 2,6% acreditam que a regularização das pedreiras pode influenciar positivamente suas atividades de trabalho, 48,2% defendem a recuperação das áreas degradadas pela mineração, e, por fim, 32,7% afirmaram que nada precisa ser mudado na atividade no município.

O fato de se trabalhar nove horas diárias pode parecer estranho, ou, talvez, em um primeiro momento, algo que contrarie a lei. Entretanto, no ano de 2008, foi firmada pelo Sindicato da Indústria de Rochas Ornamentais, Cal e Calcários do Estado do Espírito Santo (SINDIROCHAS) e o Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias do Mármore, Granito e Calcário do Estado do Espírito Santo (SIDIMÁRMORE), a Convenção Coletiva de Trabalho Data Base 2008, que regulamenta que “A jornada de

trabalho será de 44 (quarenta e quatro) horas semanais, podendo ser prorrogada procedendo-se a sua compensação ou mediante o pagamento das horas extras com o respectivo adicional, dentro dos limites legais” (Convenção Coletiva de Trabalho11, 2008, p. 4).

Em um quadro geral, os trabalhadores cumprem uma carga de trabalho de 9 horas diárias (alguns têm por prática extrapolarem as 9 horas para receberem hora extra) de segunda a sexta-feira. Este número de horas trabalhadas garante os sábados e domingos de folga, e uma hora de almoço durante a jornada de trabalho diária. Estes trabalhadores iniciam suas atividades às 7:00 horas da manhã e terminam às 17:00 horas.

Por fim, vale ressaltar que o município de Vila Pavão não se configura como cidade de grande porte de extração de granito, quando posto no conjunto das maiores cidades produtoras do Brasil. Nesse caso, os “(...) principais municípios produtores de

granito são: Nova Venécia, Barra de São Francisco e São Gabriel (ES), Rui Barbosa e Medeiros Neto (BA), Formiga e Itapecerica (MG)" (SPÍMOLA, VERA GUERREIRO,

2004, p. 13). Entretanto, este dado não explica as contradições expostas acima. Na continuidade do trabalho, procuraremos aprofundar e discutir as contradições tendo como objetivo explicitar as relações e condições de trabalho existentes no município de Vila Pavão.

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2.4.3 O PERFIL DO TRABALHADOR DA EXTRAÇÃO DE