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Situação-problema para os alunos

No documento Matemática na Alimentação e nos Impostos (páginas 133-136)

Vamos tomar como exemplo a seguinte nota fiscal, emitida no Brasil, de compra de equipamentos domésticos:

Em muitos países os turistas têm direito à devolução dos impostos pagos, bastando apresentar as notas fiscais em locais pré-determinados. Isso baseia-se na idéia de que os impostos são pagos pelos cidadãos do país e devem reverter em benefícios para eles. Embora os turistas usufruam de alguns desses benefícios (como cidades limpas, transportes organizados etc), isso ocorre por pouco tempo e os governos desses países consideram que os turistas não têm que pagar por isso. Na verdade, gastando nesses países, os turistas já contribuem para seu desenvolvimento.

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Leve cópias da nota para seus alunos, que devem estar distribuídos em grupos, e peça que resolvam as questões a), b) e c) que serão propostas. Percorra os grupos, observe as idéias e estratégias que criam. Se algo sair errado e eles não perceberem, não diga que está errado. Faça uma pergunta que os leve a repensarem o que foi feito. a) Na nota fiscal vemos que sobre a quantia de R$1.180,91 será pago um valor de R$141,71 de ICMS, ou seja, Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços. Deter-mine a porcentagem de imposto cobrado.

b) Vemos também que, sobre a mesma quantia, foi pago um valor de R$118,09 de IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados). Qual a porcentagem cobrada de IPI?

c) O valor total da nota corresponde a uma compra com desconto de R$669,09. Qual seria o valor do imposto a pagar sem o desconto? Você pode concluir que quando se dá um desconto, paga-se também menos imposto?

Para responderem às questões a, b e c, os alunos devem ter tempo para pensar, tentar, errar, levantar hipóteses, criar estratégias, argumentar, representar seus procedi-mentos na forma oral, manipulativa e escrita.

Você deve estar reparando que, mais do que dar ênfase à apresentação da

matemá-tica pelo professor, estamos dando ênfase ao fazer matemático do aluno. Mas, o que

seria isso? Leia o quadro.

O “fazer matemático” no espaço escolar deve ter um significado bem mais amplo do que o simples decorar definições e regras de procedimentos (as regrinhas mágicas). O fazer matemático do aluno, visto no contexto de resolução de situações com significado, tem que incluir uma ação efetiva do aluno na busca de soluções de reais desafios. Esse fazer deve significar o lançar-se em uma grande aventura de tentativas, de erros, de levantamento de hipóteses, de criação de estratégias, de argumentação, de capacidade de representação oral, manipulativa e escrita de seus procedimentos.

As formas de agir dos alunos, também chamadas “esquemas de ação”, traduzidas por procedimentos, são parte essencial do seu fazer matemático na escola. O profes-sor não deveria apressar-se em mostrar “como faz” ou “como deveria fazer”, pois é importante no ensino da matemática a capacidade do professor em observar e fazer revelar os procedimentos mais espontâneos apresentados pelos alunos na resolução da situação. Aí revela-se a parte mais importante e rica do fazer matemático na escola, parte que por vezes é excluída do processo em função da pressa que temos em chegar em certos resultados, de modo único.

Isso nos lembra Piaget em seu livro Epistemologia Genética*, quando fala da epistemologia da matemática** ao afirmar que grande parte da produção cognitiva da criança no processo de resolução de problema tem fortes semelhanças com o traba-lho do matemático. Cabe-nos refletir sobre o que a escola tem feito com esse potenci-al. Nesse mesmo sentido, temos a afirmação da pesquisadora francesa Stella Baruk: “toda criança que nasce é um ser matemático. Se, quando cresce, vem a não saber ou não gostar de matemática é porque não soubemos trabalhar esse ser”.

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* Epistemologia Genética

O termo aparece com fre-qüência nos discursos e textos da área das ciênci-as humanciênci-as, em especial na educação, sendo rele-vante para o profissional que tem a aprendizagem como objeto de trabalho. Epistemologia refere-se ao conhecimento e aos processos pelos quais ele

é produzido. Genética

re-fere-se à gênese ou às ori-gens, aos processos mais embrionários e evolutivos, tendo a ver com os aspec-tos históricos de um de-terminado fenômeno.

Assim, o termo ‘’epis-temologia genética” refe-re-se aos processos evo-lutivos pelos quais são constituídos os conheci-mentos. É um termo mui-to utilizado por Jean Pia-get em seus trabalhos, sen-do título de uma impor-tante obra que trata de uma discussão teórica so-bre a construção do co-nhecimento, em especial, do conhecimento mate-mático. No campo da epistemologia genética, Piaget estudou o desen-volvimento das estruturas mentais das crianças, bus-cando compreender os processos da inteligência humana. Seus estudos ti-veram na aprendizagem de conceitos matemáticos, tais como número, noção de espaço, tempo e cau-salidade, o centro de suas investigações científicas.

** Epistemologia da Matemática

A epistemologia da matemática diz respeito aos pro-cessos pelos quais se constitui o conhecimento ma-temático. Podemos conceber duas perspectivas di-ferentes para a epistemologia da matemática e das demais ciências: a evolução desse conhecimento na humanidade e no indivíduo.

Na primeira perspectiva, chamada

epistemolo-gia filogenética (filo refere-se à espécie), busca-se compreender como a humanidade, ao longo de sua evolução cultural, vem construindo e recons-truindo o conhecimento matemático. Estuda-se como o homem, buscando resolver situações-problema, construiu ferramentas que foram agregadas às suas estruturas mentais, tais como as idéias de número, medida, proporção, simetria etc. A epistemologia das ciências tem mostrado como grandes impasses e dificuldades encontradas pelo homem ao longo da história têm servido para promover o avanço do conhecimento.

Na segunda perspectiva, chamada

epistemolo-gia ontogenética (onto refere-se ao ser individual), busca-se compreender como se desenvolvem os processos cognitivos (ligados à inteligência) desde a fase de bebê até a terceira idade. Piaget, que estu-dava esses processos, considerava-se um “episte-mólogo”. Trabalhar com a aprendizagem requer essa compreensão da forma como se estrutura o pensa-mento do indivíduo, desde a infância até a idade adulta, e, portanto, o professor precisa questionar e refletir sobre a relação mútua entre a aprendizagem e o desenvolvimento humano.

Nesse campo, a escola tem um duplo papel: favorecer a aprendizagem e o desenvolvimento dos alunos, respeitando e fomentando os processos de estruturação da inteligência, e também dar acesso aos alunos aos processos históricos pelos quais o homem, nos diferentes contextos de tempo e cultu-ra, construiu o seu conhecimento.

Articular o desenvolvimento do aluno com o desenvolvimento do homem ao longo da história da civilização é uma possibilidade na educação ma-temática. Assim, epistemologicamente falando, po-demos associar as primeiras formas de contar ou operar utilizadas por uma criança com as formas primitivas de quantificações usadas na pré-história.

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