• Nenhum resultado encontrado

SNs sem determinante no PE; leitura genérica/ leitura existencial e quantificação não determinada

3. Sintagmas nominais sem determinante no Português Europeu

3.3. SNs sem determinante no PE; leitura genérica/ leitura existencial e quantificação não determinada

Nos contextos anteriormente descritos em que ocorrem sintagmas nominais com nomes comuns sem determinante, todos os sintagmas são estrutural e semanticamente sintagmas nominais quantificados (SQ), embora possuam núcleo quantificador vazio, se se adoptar a hipótese defendida em Longobardi (1994), segundo a qual os quantificadores nulos são núcleos funcionais independentes que equivalem uma quantidade ou uma parte de uma substância não especificada

No entanto, parece não haver um tratamento uniforme para estes constituintes, sobretudo quando eles se encontram na posição de sujeito argumentai, em que podem admitir duas interpretações concorrentes: a genérica e a existencial.

Voltando aos exemplos em (61), dir-se-ia que o caso dos exemplos do tipo de

"Peixe alimenta-nos"; "Vinho branco tira nódoas" pode ser minimamente aceite

porque as frases nele contidas assumem um valor de "verdade científica", (61. a, b) e, por outro lado, um valor existencial, como em "Elefantes invadiram ontem as

margens do Zambeze" (61.c,d,e). Exemplos do primeiro tipo ocorrem normalmente

em enunciados genéricos, como nos títulos jornalísticos, provérbios, fraseologias e ditados populares.

Por outras palavras, as frases do primeiro tipo de (61a,b) são interpretadas pelos equivalentes todo o peixe ou o peixe em geral alimenta-nos (valor genérico); enquanto as frases do segundo tipo (61c,d,e) equivalem a certos / alguns elefantes

invadiram as margens do Zambeze (valor existencial). As mesmas frases seriam

agramaticais se os seus significados fossem apresentados com uma leitura específica como em * peixe está por cima da mesa, * elefante invadiu a margem do Zambeze.

Em Português Europeu, são mais aceites os sintagmas nominais antepostos aos verbos em posição de sujeito, se forem acompanhados por modificadores, exemplificados em (61. b, d), branco e como estes, ou então se forem nomes coordenados, pessoas e animais, em (61. e).

Em exemplos como (64)-(67), as interpretações apresentadas pelas construções nominais descritas representam uma possibilidade que oferecem os sintagmas nominais sem determinantes. Pode então dizer-se que a ausência de determinantes em sintagmas nominais com nomes contáveis em posição de argumento

como os anteriores equivale à interpretação existencial de uma expressão quantificada de forma não específica.

Garrido (1996:291), citando Alonso (1993), observa que a ausência de determinantes consiste em não indicar a conexão directa entre as noções quantitativas e o conjunto do contexto descrito, e o nome sem artigo assume um carácter predicativo, o que dá conta de um certo sentido geral e abstracto. Entende-se com isto que os elementos responsáveis pela actualização dos nomes e pelo estabelecimento de qualquer vinculação entre as propriedades expressas e os indivíduos são os determinantes. Os determinantes permitem a constituição de expressões referenciais a partir das noções predicativas; dão acesso a um tipo de individualização que ajuda a distinguir a denotação de uma classe de objectos de referência de um ou de vários indivíduos. Em última instância, os determinantes são os responsáveis pela identificação da natureza semântica das entidades veiculadas pelos sintagmas nominais.

Por outro lado, os sintagmas nominais sem determinante como complementos verbais ocorrem mais facilmente com nomes plurais contáveis: em PE nenhum verbo selecciona um nome singular contável com artigo nulo (* vi gato, *li livro), o que contrasta com a ocorrência de nomes complementos verbais sem determinante no plural, como no exemplo em (57), alguns dos quais repetidos em (70):

70. a) Registam emissões espontâneas de fumos e gases. b) Haverá casas para todos.

c) Vi gatos no jardim. d) Li livros nas férias.

Repare-se que alguns dos exemplos correspondentes a (70) com nomes contáveis no singular são possíveis em certos contextos:

71. a) ? Regista emissão espontânea de fumos e gases. b) ? Haverá casa para todos.

Com base na contigência e ou na agramaticalidade de exemplos como * Vi

gato, * Li livro, Duarte et ai. (1999:486), verifica que relativamente à distribuição dos

determinante no singular em posição de subcategorização, salvo na sua forma plural, onde recebem a leitura existencial.

Longobardi (1994) para o Italiano conclui que a interpretação existencial de uma expressão nominal em posição de sujeito está restringida aos nomes massivos e aos nomes contáveis no plural. Nestes contextos, o determinante nulo representa uma espécie de operador existencial e impõe restrições, tais como a interpretação contável/massivo ao núcleo nominal que quantifica.

Todo este parágrafo sobre a ausência de determinantes no PE mostra que o PE admite expressões nominais sem determinante, sob certas condições, em todas as posições argumentais. Mas enquanto a possibilidade de expressões nominais sem determinante na posição de sujeito é altamente restringida, ela é frequente como complemento de um verbo ou complemento de uma preposição.

Neste capítulo, adoptou-se a ideia de que uma expressão nominal referencial é descrita pela categoria SDET ou pela categoria SQ.

Progovac (1998: 165) defende que o Serbo-Croata, uma língua sem artigos, projecta um SDET, no topo dos sintagmas nominais em posição argumentai. No entender da autora, as propriedades morfológicas das línguas sem artigos, como é o caso do Serbo-Croata, suportam a existência de mais do que uma projecção funcional, nas quais os nomes, em sintagmas nominais sem artigo, se movem até se fixarem no DET. Este posicionamento de Progovac, que é igual ao de Longobardi (1994) e Carstens (1996), baseia-se em Abney (1987) e outros, segundo o qual os nomes são núcleos lexicais da construção referencial, sendo os artigos núcleos funcionas da projecção SDET que selecciona os sintagmas nominais.

Nesta perspectiva, o conceito de determinante estende-se a um número diversificado de funções, cobrindo artigos, demonstrativos, possessivos e quantificadores.

A importância dos elementos periféricos ao nome num sintagma nominal é a de trazerem a especificação do referente, a marcação do número e, através das diversas operações de determinação, a definição clara do tipo de entidades semânticas e o seu valor referencial evocados pelos nomes, a partir das formas não marcadas.

Sintacticamente, alguns sintagmas nominais em Português Europeu, Espanhol, e Italiano ocorrem sem determinante, mas está realizada a projecção SDET nestes

sintagmas, em que o DET é especificado pela concordância, licenciando e identificando um sintagma nominal.

A realização de sintagmas nominais sem determinante no Português Europeu é uma realidade na posição de complementos directos de verbos transitivos, sendo altamente restringida na posição de sujeito. Os sintagmas nominais sem determinante em posição de argumento associam-se em geral às interpretações de expressões indefinidas ou um sintagma nominal quantificado existencialmente. Os sintagmas nominais sem determinante nesse tipo de contexto são no fundo muito semelhantes aos SNs com artigos partitivos das línguas que os têm, como o Francês.