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Sobre as Álgebras Monádicas do Muito

No documento CAMILA AUGUSTA VAINE (páginas 70-78)

Nesta seção trataremos de alguns resultados que serão essenciais para demonstrarmos a correção e completude da Lógica do Muito. Algumas definições foram introduzidas no Capítulo 4, mas serão retomadas para prosseguirmos sem quaisquer dúvidas.

No Capítulo 4, definimos álgebras monádicas do muito por meio do conceito de ideal monádico e utilizamos o quantificador existencial. Aqui introduziremos o conceito de álgebras monádicas do muito por meio de filtros monádicos e quantificador universal.

Sabemos que uma álgebra monádica do muito

M

= (M, $, G) é uma álgebra monádica Booleana com o quantificador do muito G em

M

.

Como toda álgebra monádica é Booleana, a identificaremos apenas como álgebra monádica. A teoria elementar das álgebras monádicas do muito é semelhante ao de qualquer outro sistema algébrico.

Vimos, no Capítulo 4, que um subconjunto B de uma álgebra monádica do muito

M

determina uma sub-álgebra monádica do muito de

M

se B é uma sub-álgebra monádica de

M

e é uma álgebra monádica do muito com respeito ao quantificador G.

Uma sub-álgebra monádica B de

M

é uma sub-álgebra monádica do muito de

M

se, e somente se, p Î B Þ Gp Î B.

Lembremos que um homomorfismo monádico do muito é uma função f de uma álgebra monádica do muito em outra, tal que f é um homomorfismo monádico e:

f(Gp) = Gf(p), para todo p Î M.

Associado a cada homomorfismo monádico do muito temos o seu núcleo. No Capítulo 4, introduzimos o núcleo por meio do conceito de ideal, bem como utilizamos aquele conceito nos resultados lá apresentados. Neste capítulo, utilizaremos o conceito de filtro e, em decorrência, definiremos o núcleo a partir do conceito de filtro.

Definição 5.2.1: O núcleo de um homomorfismo monádico do muito f é definido por N(f) = {p : f(p) = 1}.

O núcleo de um homomorfismo monádico do muito é um filtro monádico do muito.

Definição 5.2.2: Uma relação de congruência monádica do muito em

M

é uma relação de congruência monádica º em

M

, que preserva todas as operações de

M

e, em particular, se p º q, então Gp º Gq.

A mesma relação existe entre filtros monádicos do muito, ideais monádicos do muito e as relações de congruência que existem entre os seus homólogos Booleanos.

A definição de álgebra quociente monádica do muito segue como usual.

Consideremos que

M

é uma álgebra monádica do muito, U é um ultrafiltro em

M

, e tomemos a álgebra monádica quociente B =

M

/U. Seja f o homomorfismo monádico do muito, tal que f:

M

® B e f leva cada elemento p na sua classe de equivalência [p] módulo U. Existe um caminho natural para fazermos de B uma álgebra monádica do muito de maneira que f seja um homomorfismo monádico do muito sobrejetivo com núcleo U. Assim definimos:

Definição 5.2.3: G[p] =def [Gp], em que Gp Î M e G[p] Î B.

Para mostrarmos que o quantificador do muito está bem definido em B, como acima, suponha que p1, p2 Î

M

e que [p1] = [p2]. Daí temos dois casos: (i) p1, p2 Î U e (ii) p1, p2 Î UC.

Caso (i): Como as classes de p1 ep2 coincidem e p1, p2 Î U, então p1 Ù p2 Î U e, também, G(p1 Ù p2) Î U, posto que U é um ultrafiltro do muito. Como G(p1 Ù p2) £ Gp1, Gp2, segue daí que Gp1, Gp2 Î U, de onde segue [Gp1] = [Gp2], isto é, Gp1 º Gp2.

Caso (ii): Como p1, p2 Î UC

e U é um ultrafiltro, então raciocínio similar garante que Gp1 º Gp2.

Definição 5.2.4: Uma álgebra monádica do muito é simples se {1} é seu único filtro próprio do muito.

Definição 5.2.5: Um quantificador $ numa álgebra monádica do muito é simples se: $0 = 0 e, para todo p ¹ 0, $p = 1.

Analogamente, um quantificador " numa álgebra monádica do muito é simples se: "1 = 1 e, para todo p ¹ 1, "p = 0.

Um quantificador G numa álgebra monádica do muito é simples se: G1 = 1 e, para todo p ¹ 1, Gp = 0.

Definição 5.2.6: Um filtro monádico do muito é maximal se, ele é um filtro próprio do muito que não é um subconjunto próprio de qualquer outro filtro próprio do muito.

Proposição 5.2.1: Uma álgebra monádica do muito

M

é simples se, e somente se, o seu quantificador G é simples.

Demonstração: (Þ) Se

M

é simples, então {1} é seu único filtro próprio do muito e, portanto, existe um elemento p Î M, tal que p ¹ 1. Se p Î M é qualquer elemento tal que p ¹ 1, definimos o filtro monádico do muito F gerado por {q: Gp £ q}. Uma vez que F é um filtro monádico do muito distinto de {1}, segue que F = M, e, portanto, em particular, que 0 Î F. Isto implica que se p ¹ 1, então Gp = 0. Logo, o quantificador do muito é simples.

(Ü) Como

M

tem, pelo menos, dois elementos, se p ¹ 1, então Gp = 0. Certamente {1} é um filtro próprio do muito de

M

. Agora, se F é um filtro monádico do muito de

M

distinto de {1}, então ele deve conter um elemento p, tal que p ¹ 1. Portanto, Gp Î F, pois F é monádico. Assim, desde que G é simples, então 0 Î F e, portanto, F = M. Logo, o único filtro próprio do muito em

M

é {1}, isto é,

M

é simples. ■

Proposição 5.2.2: O núcleo de um homomorfismo f:

M

1 ®

M

2 é um filtro maximal do muito se, e somente se, a imagem do homomorfismo é uma álgebra simples.

Demonstração: (Þ) A imagem do homomorfismo f, Im(f), é uma álgebra monádica do muito. Logo f :

M

1 ® Im(f) é sobrejetiva. Como cada álgebra de Boole é um anel, então pelo Teorema do Homomorfismo de Anéis, segue que

M

/N(f) @ Im(f). Agora, por hipótese, N(f) = {p: f(p) = 1} é um filtro maximal do muito e, portanto,

M

/N(f) = {0, 1}. Logo, {1} é o único filtro próprio do muito de

M

e, portanto,

M

é simples.

(Ü) Se a imagem Im(f) do homomorfismo é uma álgebra simples, então {1} é o único filtro próprio do muito nela, ou seja, o núcleo N(f) = {p: f(p) = 1} = {1} é um filtro maximal do muito, pois ele é próprio e como é o único filtro próprio do muito na imagem, então não existe outro filtro próprio do muito tal que N(f) seja subconjunto próprio dele. ■

Corolário 5.2.1: Toda sub-álgebra de uma álgebra monádica do muito simples é simples.

Demonstração: Uma vez que uma álgebra monádica do muito é simples se, e somente se, seu quantificador é simples, e uma vez que o quantificador da álgebra monádica funcional OX é simples, então OX é uma álgebra monádica simples, sempre que X é não-vazio. O Corolário 5.2.1 implica que toda sub-álgebra de OX, ou seja, toda álgebra O-valorada funcional (monádica) com um domínio não-vazio é também simples. ■

Proposição 5.2.3: Uma álgebra monádica do muito é simples se, e somente se, é isomorfa a uma álgebra O-valorada monádica funcional com um domínio não-vazio.

Demonstração: (Ü) Já foi mostrado que toda álgebra O-valorada funcional com um domínio não-vazio é simples.

(Þ) Para demonstrarmos o inverso é necessário usar um resultado de grande importância conhecido como Teorema de Stone sobre a representação de álgebras Booleanas (ver (Halmos e Givant, 1998, p. 74)).

Se

M

é uma álgebra monádica do muito simples, então

M

é, em particular, uma álgebra monádica simples e, portanto, uma álgebra Booleana não-trivial, em que o Teorema de Stone (na forma em que se refere a uma álgebra Booleana de funções características) é aplicável. Segue que existe (i) um conjunto não-vazio X; (ii) uma sub-álgebra Booleana B de OX; (iii) um isomorfismo Booleano f de

M

em B. Se B é considerada uma sub-álgebra monádica do muito de OX, então é certamente uma álgebra O-valorada funcional, cujo quantificador é simples. Assim, f deve preservar a quantificação. De fato, f preserva 0 e 1 (é um isomorfismo Booleano) e, o quantificador em ambas

M

e B são simples e, portanto, assume o valor 1 para todos os elementos distintos de zero. Logo, f é um isomorfismo monádico do muito entre as álgebras monádicas do muito

M

e B. ■

Na demonstração anterior, começamos com uma álgebra monádica do muito

M

, vista como uma álgebra monádica, e, em seguida, a olhamos como uma álgebra Booleana, para depois retornarmos à álgebra monádica do muito. Este procedimento pode ser aplicado muitas vezes no estudo de álgebras monádicas do muito.

Por exemplo, existe uma conexão próxima entre filtros Booleanos e filtros monádicos.

Proposição 5.2.4: Para todo filtro Booleano F de

M

, se F* é o conjunto de todos aqueles p Î

M

para os quais "p Î F, então F*

Demonstração: De fato, se p e q estão em F*, então "p e "q estão em F e como F é um filtro, então "p Ù "q Î F. Da lei distributiva do operador ", segue que "(pÙq) Î F e, assim, pÙq Î F*. Se p Î

M

e q Î F*, então "q Î F, e, portanto p Ú "q Î F. A partir da lei modular segue que "(pÚ"q) Î F e, portanto, "(pÚq) Î F. Logo, pÚq Î F*. Se p Î F*

, então "p Î F. A lei da idempotência implica que ""p Î F. Assim, "p está em F*

. Com isto, segue que F* é um filtro monádico.■

Se a correspondência que leva cada filtro F para F* deixa F invariante, ou seja, se F = F*, então F é um filtro monádico. O inverso é trivial, pois se filtros monádicos são fixados sob a correspondência, então a partir da definição de F* observa-se que a correspondência preserva a inclusão: se F Í J, então F* Í J*

.

Proposição 5.2.5: Se F é um filtro maximal Booleano em

M

, então F* é um filtro maximal monádico de

M

.

Demonstração: Suponhamos que J é um filtro monádico que estende propriamente F*. Então, existe um elemento p em J que não está em F*. Como J é um filtro monádico, ele contém o elemento "p. O elemento "p não está em F, pois do contrário, p estaria em F*

. Agora, uma vez que F é um filtro maximal, então o elemento ~"p tem que estar em F. Mas, isto significa que "~"p está em F e, portanto, ~"p está em F* e, por conseguinte, também está em J. Desde que J contém tanto um elemento como o seu complementar, então J não é próprio. ■

Dessa forma, a correspondência que leva cada filtro Booleano Fpara F* mapeia o conjunto dos filtros Boolenos de

M

no conjunto de filtros monádicos de

M

, preservando a inclusão, e leva filtro maximal em filtro maximal. Os filtros deixados invariantes pela correspondência são precisamente os filtros monádicos.

O teorema do filtro maximal para álgebras Booleanas pode ser generalizado para as álgebras monádicas, que segue do teorema Booleano com a ajuda das observações precedentes.

Teorema 5.2.1 (Teorema do filtro maximal para álgebra monádica): Todo filtro monádico próprio em

M

está incluso em um filtro monádico maximal em

M

.

Demonstração: Seja F0 um filtro monádico próprio de uma álgebra monádica

M.

Então F0 é um filtro Booleano próprio e, portanto, pode ser estendido a um filtro Booleano maximal F. Pelas observações precedentes, o conjunto F* é um filtro monádico maximal tal que F0 Í F*. Logo, F* é um filtro monádico maximal que estende F0. ■

Definição 5.2.7: Uma cadeia de filtros monádicos do muito é uma sequência (F1, F2, F3, ...) de filtros monádicos do muito, tal que F1 Í F2 Í F3 Í ... .

Proposição 5.2.6: Seja

M

uma álgebra monádica do muito e (F1, F2, F3, ...) uma cadeia de filtros monádicos próprios do muito de

M

. A união ∪Fn é um filtro monádico próprio do muito.

Demonstração: Seja F = ∪Fn. Se p Î F e q Î M, com p £ q. Uma vez que F = ∪Fn, então existe n Î ℕ, tal que p Î Fn e, como Fn é um filtro, então q Î Fn. Logo, q Î F = ∪Fn. Agora, sejam p, q Î F = ∪Fn. Como F1 Í F2 Í F3 Í ..., então existe n Î ℕ, tal que que p Ù q Î Fn Í F. Também, para algum n Î ℕ, tal que p, q Î Fn , como Fn é filtro monádico do muito, então "p, "q, Gp, Gq Î Fn. Logo, "p, "q, Gp, Gq Î F = ∪Fn. Assim, F é um filtro monádico do muito. Uma vez que para cada n Î ℕ, temos que Fn é filtro monádico próprio do muito, então 0 Ï Fn, para todo n Î ℕ e, desse modo, 0 Ï F. Finalmente, F é um filtro monádico próprio do muito. ■

Proposição 5.2.7: Todo filtro monádico próprio do muito em

M

está contido em um filtro monádico maximal do muito.

Demonstração: Segue da Proposição 5.2.6 e do Lema de Zorn. ■

O Teorema da existência para álgebras monádicas do muito segue a partir do teorema do filtro maximal do muito, assim como para álgebras Booleanas.

Teorema 5.2.2 (Teorema da existência para álgebras monádicas do muito): Para todo elemento p0, tal que p0 ¹ 1, de toda álgebra monádica do muito

M

, existe um homomorfismo f de

M

numa álgebra monádica do muito simples, tal que f(p0) ¹ 1.

Demonstração: Devido a relação entre filtros maximais do muito e álgebras monádicas simples (Proposição 5.2.2), o teorema da existência pode ser reformulado como segue: existe um filtro monádico maximal do muito F em

M

tal que p0 Ï F. Para obtermos um, aplicamos o teorema do filtro maximal do muito para o filtro F0 de todos aqueles elementos p de

M

para os quais ~"p0 £ p. Se p0 Î F, então o elemento p0Ù~"p0 Î F e, portanto, também "(p0Ù~"p0) Î F, uma vez que F é fechado sob a quantificação. Mas o último elemento coincide com "p0Ù~"p0. Logo, F contém 0 e, portanto, não é próprio. Logo, p0 Ï F. ■

Em quais condições é verdade sobre uma álgebra monádica do muito

M

que sempre que um elemento p Î

M

é atribuído o valor 1 para todo homomorfismo de

M

em uma álgebra monádica do muito simples, então p = 1? Por causa da correspondência entre homomorfismos com imagens simples e filtros maximais do muito, a questão pode ser colocada desta forma: em que condições sobre uma álgebra monádica do muito

M

é verdade que sempre que um elemento p de

M

pertence a todos filtros maximais do muito, então p = 1? Em analogia com outra parte da álgebra, temos a definição abaixo.

Definição 5.2.8: Uma álgebra monádica do muito é semissimples se a intersecção de todos os filtros maximais do muito em

M

é {1}.

Teorema 5.2.3 (Teorema da Semissimplicidade): Toda álgebra monádica do muito é semissimples.

Demonstração: Devemos mostrar que se

M

é uma álgebra monádica do muito e se p0 ¹ 1 é um elemento de

M

, então existe um filtro monádico maximal do muito F em

M

tal que p0 Ï F. Segue a partir da versão Booleana do conhecido Teorema do Ultrafiltro que existe um filtro maximal Booleano (ultrafiltro) F0 em

M

tal que p0 Ï F0. Seja F o conjunto de todos os elementos p Î M tais que "p Î F0. Então F é um filtro monádico do muito e p0 Ï F. A demonstração da semisimplicidade é completada mostrando-se que F é maximal. Suponha que J é um filtro monádico do muito que inclui propriamente F. Assim, deve haver um elemento p Î J, tal que "p Ï F0, pois do contrário p pertenceria a F. Como J é um filtro monádico do muito, então "p Î J. Agora, como "p Ï F0 e F0 é um filtro Booleano maximal, então ~"p Î F0. Daí, "~"p = ~"p. Logo, ~"p Î F Ì J. Mas, então "p Ù ~"p = 0 Î J e, portanto, J = M. A prova está completa. ■

Devemos observar que o teorema não é uma verdade para todos os sistemas algébricos. Existem exemplos de grupos e exemplos de álgebras Booleanas com operadores (generalizações de álgebras monádicas) que não são semissimples.

Uma vez que álgebras monádicas do muito constituem uma especialização de álgebras monádicas, que, por conseguinte, são especializações de álgebras Booleanas, o teorema acima afirma, em particular, que toda álgebra Booleana é semissimples. Esta consequência do teorema é uma consequência imediata do Teorema de Stone e a partir do qual é mostrado que a função f é bijetiva.

Na seção seguinte demonstraremos a correção e completude para a Lógica do Muito e, para isto, utilizaremos alguns resultados desta seção.

No documento CAMILA AUGUSTA VAINE (páginas 70-78)

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