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Sobre a importância do brincar

No documento Cidade amiga da criança (páginas 45-54)

2 INFÂNCIA, CRIANÇA E CIDADE: CONCEITOS INICIAIS

2.2 O DIREITO DAS CRIANÇAS AO JOGO E À BRINCADEIRA

2.2.1 Sobre a importância do brincar

Figura 13 - É melhor com os avós

“Nós não paramos de brincar porque envelhecemos. Mas envelhecemos porque paramos de brincar.”

(GEORGE BERNARD SHAW)

Quando se fala em jogo e brincadeira, lembra-se da infância e da criança,

especialmente quando se entende que o jogo e a brincadeira são meios significativos de interação da criança com a realidade. Por isso, compreender a relação entre o jogo, a brincadeira e a criança torna-se essencial para que se entenda a criança e seu jeito particular de ver o mundo.

Pretende-se abordar o jogo e a brincadeira em uma perspectiva da reprodução social, cultural e histórica, além de conhecer a importância da brincadeira como forma privilegiada de as crianças conhecerem, compreenderem e se expressarem no mundo, pois brincar é uma das formas mais clássicas que a criança tem de se expressar; quando brincam elas se desenvolvem de forma integral. Logo, conhecer e atribuir a importância do brincar para a infância faz-se necessário.

Nesse cenário, é importante que se identifique como ocorriam os jogos e as brincadeiras em outros tempos históricos. Ao longo de diferentes processos civilizatórios, o jogo sempre se fez presente como eixo central nas relações humanas, sob a forma de rituais, mitos, trabalho, festividades ou divertimentos. Julga-se, portanto, fundamental expor, brevemente, como os jogos e as brincadeiras foram percebidos, explicados e apresentados na história.

Ver-se-á, a seguir, uma das obras mais antigas que relatam os jogos e as brincadeiras. Esta obra, que tem por título Jogos Infantis, datada do ano de 1560, é do artista Pieter Brueghel. A mesma evidencia 84 brincadeiras, algumas delas não existem mais, foram apagadas da memória. Outras existem até hoje, com inúmeras variações. Porém, há algo muito diferente nesta obra. Crianças anônimas, nenhuma delas ri. Assemelham-se a pequenos adultos tristes, que apenas se ocupam de uma atividade.

Figura 14 - Jogos Infantis, Pieter Brueghel, 1560

Fonte: Pesquisa realizada no Google, 2013.

Se bem observada, percebem-se, na imagem, crianças vestidas como adultos, ou adultos brincando como crianças, ou adultos e crianças brincando juntos. Esse dualismo entre a infância e a idade adulta é evidenciado pelo pintor, pois como esclarece Ariès (1981):

Adultos, jovens e crianças se misturavam em toda atividade social, ou seja, nos divertimentos, no exercício das profissões e tarefas diárias, no domínio das armas, nas festas, cultos e rituais. O cerimonial dessas celebrações não fazia muita questão em distinguir claramente as crianças dos jovens e estes dos adultos. Até porque esses grupos sociais estavam pouco claros em suas diferenciações. (ARIÈS, 1981, p. 21). Como atividades associadas à infância, os jogos e as brincadeiras requerem sempre uma atenção especial e precisam ser investigadas em seus múltiplos aspectos. Estudar o jogo é também estudar por que e como esse termo é empregado. É evidenciar estratégias linguísticas. Dizer a uma criança para ir brincar não é algo neutro; é situar esse comportamento em uma lógica social, em que cada atividade tem um sentido preciso. Essa lógica não é puramente linguística, mas remete à organização da sociedade, das atividades produtivas e não produtivas (BROUGÈRE, 2003, p. 30).

Os brinquedos podem descrever uma linha de tempo contando o avanço do homem desde os primórdios até a atualidade social, cultural e até política. Brougère (1998) e Wajskop (2005) vão além ao considerarem que o brinquedo é um objeto cultural que, como muitos objetos construídos pelos homens, tem significados e representações. Em outras palavras, a interpretação do brinquedo sempre se faz no contexto específico de uma cultura. (BROUGÈRE, 1998, p. 43). Resgatando a história, obter-se-ão elementos capazes de contar os costumes das civilizações.

Ariès (1981) relata que até por volta do século XII, a arte medieval desconhecia a infância, e nem ao menos tentavam representá-la. É difícil imaginar que antigamente as crianças pudessem brincar e até mesmo desenvolver brinquedos, exercer o seu papel como deveriam, isto é, elas entravam no mundo dos adultos e não se diferenciavam deles.

Os brinquedos, geralmente, eram objetos do mundo dos adultos que as crianças adaptavam conforme suas necessidades. Como explica Ariès (1981, p. 75), “alguns deles nasceram do espírito de emulação das crianças, que as leva a imitar as atitudes dos adultos, reduzindo-as à sua escala: foi o caso do cavalo de pau, numa época em que o cavalo era o principal meio de transporte e de tração.” As crianças viam os adultos trabalhando ou exercendo alguma atividade e, como consequência, queriam imitá-los, tomando certos objetos como se fossem brinquedos, adaptando-os segundo as suas vontades. Fröebel

expõe que o brinquedo tem um valor simbólico que domina a função do objeto, ou seja, o simbólico torna-se a função do próprio objeto. Um cabo de vassoura pode exemplificar esta relação entre função e valor simbólico. A função de um cabo de vassoura pode mudar nas mãos de uma criança que, simbolicamente, o transforma em um cavalo. O mundo do tempo livre das crianças, especialmente de seus jogos, é cheio de sentido e significação, é simbólico, quer dizer, suas manifestações exteriores e suas formas exprimem certos estados e certos graus de desenvolvimento da vida interior do espírito humano, exprimem propriedades e exigências da própria essência do homem (FRÖEBEL apud BROUGÈRE, 2003, p. 69).

Pode-se perceber que todos os brinquedos das crianças tinham significados e representações, podendo ser diferentes de acordo com a cultura, com o contexto e com a época na qual estavam inseridos os objetos. O brinquedo é o produto de uma sociedade e, como objeto lúdico da infância, possui funções sociais.

Conhecendo a história da origem do brinquedo, é possível ressaltar que é preciso compreender o papel do jogo e do brinquedo dentro do projeto de modernidade instalado a partir do século XVIII, com o Iluminismo. Segundo Volpato (2002).

é preciso atentar para as transformações nas relações sociais que interferem e modificam valores, conceitos e atitudes em relação ao jogo e ao brinquedo nas sociedades modernas. Nesse sentido, é importante assinalar que os jogos sempre foram instrumentos importantes nas sociedades como elemento de socialização, inclusive quando o trabalho não tinha a importância que adquiriu na sociedade industrial, quando adultos, crianças e jovens viviam, trabalhavam e jogavam juntos em celebração. (VOLPATO, 2002, p. 39).

Assim, o sentido que se atribui ao brincar e jogar é amplo e as pesquisas realizadas nesse campo pela História, Psicologia, Antropologia, Filosofia e outras áreas do conhecimento são insuficientes devido à complexidade da temática. No entanto, é recente a

preocupação das Ciências Humanas com o brincar enquanto uma particularidade da “infância”. A psicologia infantil, constituindo-se sob suas diversas formas, tendo origem no pensamento romântico e na Biologia ao mesmo tempo, apossou-se do jogo, “[...] construindo uma ciência do jogo que torna totalmente natural esse fenômeno, ocultando sua dimensão social para fazer dele o lugar de uma expressão espontânea da criança” (BROUGÈRE, 1998, p. 98).

Na verdade, é necessário distinguir jogo de brincadeira, mas essa tarefa não é fácil, pois quando se pronuncia essas duas palavras, pode-se entendê-las de modo diferente. Cada contexto constrói uma imagem do jogo ou de brincadeira conforme seus valores e modo de vida. Para Kishimoto (1999, p. 21, grifo do autor),

o brinquedo como o objeto suporte da brincadeira: [...] o brinquedo contém sempre uma referência ao tempo da infância do adulto com representações veiculadas pela memória e imaginação. O vocábulo ‘brinquedo’ não pode ser reduzido à pluralidade de sentidos do jogo, pois coloca a criança e tem uma dimensão material para fazer fluir o imaginário infantil. E a brincadeira? É a ação que a criança desempenha ao concretizar as regras do jogo, ao mergulhar na ação lúdica. Pode-se dizer que é o lúdico em ação. Desta forma, o brinquedo e a brincadeira relacionam-se diretamente com a criança e não se confundem com o jogo.

Por isso, confere-se, a seguir, o que alguns autores, como Bomtempo e colaboradores (1986), Friedmann (1996), Kishimoto (1999), Alves (2001) e outros afirmam a respeito desses dois conceitos.

Inicia-se este estudo, primeiramente, observando a origem da palavra brincar, que vem do latim, vinculum, que quer dizer laço, algema, e é derivada do verbo vincire, que significa prender, seduzir, encantar. Vinculum virou brinco e originou o verbo brincar. Dessa forma, brincar constitui-se uma atividade de ligação ou vínculo. (FERREIRA, 1999).

No Dicionário de Língua Portuguesa Aurélio (FERREIRA, 2001, p. 286), jogar, do latim jocare, tem o sentido de “entregar-se ao; tomar parte no jogo de; executar as diversas combinações de um jogo; aventurar-se ou arriscar-se ao jogo; perder no jogo; dizer ou fazer brincadeira; harmonizar-se” (p. 439). Brincar, de “brinco+ar”, tem o sentido de “divertir-se infantilmente; entreter-se em jogos de criança; recrear-se; distrair-se; saltar; pular; dançar” (p. 286). Percebe-se que há uma dificuldade em definir os termos “jogar” e “brincar”, pois ambos têm uma fronteira comum, indicando um grau de subjetividade, em que estas atividades estão implícitas.

O Dicionário UNESP do Português Contemporâneo (BORBA, 2004, p. 811) conceitua a palavra jogo como: “atividade recreativa sujeita a regras em que se estabelecem

quem perde e quem ganha, com participantes que disputam uma premiação ou jogam por prazer; atividade espontânea das crianças; brinquedo; brincadeira.”

Kishimoto (1996) assegura que os verbos brincar e jogar, em português, não têm significados tão amplos quanto os seus correspondentes em inglês e francês. A mesma autora aborda que, no cotidiano da língua portuguesa, os verbos brincar e jogar também podem ter outros sentidos, entretanto, seu significado principal está relacionado à atividade lúdica infantil. Ainda, na língua portuguesa, existe uma falta de discriminação na utilização dos termos brincar e jogar. Mesmo estando o vocábulo jogar diferenciado de brincar pelo aparecimento das regras explícitas, a utilização de ambos, muitas vezes, se confunde. Para esclarecer essa quantidade de significados dos termos, Brougère (2003) descreve sobre a necessidade de investigar a utilização dessas palavras no contexto social e cultural no qual se encontram e são empregadas. Para ele, além de o jogo estar associado ao papel social da infância, este aparece “[...] mais como um comportamento social do que como um comportamento natural” (p. 30). Um termo é empregado em um contexto particular, em função de objetivos.

Bomtempo e colaboradores (1986) referem que a brincadeira é uma atividade espontânea e que proporciona para a criança condições saudáveis para o seu desenvolvimento social e biológico. Friedmann (1996) pontua que a brincadeira tem características de uma situação não estruturada. Para Kishimoto (1999), o brincar oportuniza novas combinações de ideias e de comportamentos. Alves (2001) ressalta que a brincadeira é qualquer desafio que é aceito pelo simples prazer do desafio, ou seja, confirma a teoria de que o brincar não possui um objetivo próprio e tem um fim em si mesmo.

Quando se fala em jogos e brincadeira, imaginam-se, logo, objetos que as crianças utilizam para brincar. Mas não se pode esquecer que a brincadeira tem uma ligação cultural e que a mesma possui um caráter lúdico. Porém, tem-se que diferenciá-la do jogo, pois na brincadeira há uma relação mais íntima com a criança e não existem regras explícitas, a situação imaginária é implícita. No entender de Brougère (2001):

A brincadeira humana supõe um contexto social e cultural. É preciso efetivamente romper com o mito da brincadeira natural (para Gilles Brougère, a criança não nasce sabendo brincar, ela aprende a entrar no universo da brincadeira a partir das relações que estabelece com o seu meio). A criança está inserida, desde o seu nascimento, num contexto social e seus comportamentos estão impregnados por essa imersão inevitável. Não existe na criança uma brincadeira natural. A brincadeira é um processo de relações interindividuais (relação de uma pessoa com a outra), portanto, de cultura. É preciso partir dos elementos que ela vai encontrar em seu ambiente imediato, em parte estruturado por seu meio, para se adaptar às suas capacidades. A brincadeira pressupõe uma aprendizagem social: aprende-se a brincar. A brincadeira

não é inata (no sentido de que a criança já nasce com esse potencial de brincar). A criança pequena é iniciada na brincadeira por pessoas que cuidam dela. (BROUGÈRE, 2001, p. 97-98).

Kishimoto (1999, p. 139) corrobora as ideias de Brougère quando explica que “a brincadeira é uma atividade que a criança começa desde seu nascimento no âmbito familiar” e dá continuidade com os seus coetâneos. Sendo assim, pode-se dizer que brincar é uma atividade social dotada de significados e varia de cultura para cultura.

Para Vygotsky, Luria e Leontiev (1988, p. 120), a brincadeira é resultado de processos sociais. É uma situação imaginária, em que a criança representa papéis sociais desempenhados pelos seus próximos. É a expressão das fantasias mais secretas de transformar-se em herói ou vilão, de voar, de fazer coisas que na realidade não seriam possíveis, é viver o impossível. É expressão e ação do que a imaginação cria, é imagem em ação. A brincadeira é, como salienta Leontiev (1988, p. 59), a atividade principal das crianças e constitui uma das suas mais importantes linguagens. É expressão que traduz o modo como a criança vê o mundo adulto nas mais diferentes situações cotidianas: cozinhando, cuidando dos filhos, dirigindo, trabalhando, etc.

O brincar da criança não é compatível ao jogo para o adulto, pois este, ao brincar/jogar, afasta-se da realidade; já a criança, quando brinca/joga, avança para novas etapas de domínio do mundo que a cerca. É preciso saber que o brincar da criança é a forma que ela tem de experimentar e vivenciar situações novas. Negrine (1994) esclarece que jogar não é apenas uma atividade e sim uma atitude que emana uma vivência de sentimentos e sensações que permitem desvendar significados e tomar decisões. Acrescenta que o vínculo com o objeto não é uma mera questão de apurar os sentidos (ver, ouvir, tocar, etc.), mas o caráter subjetivo que esses sentidos inspiram tem que ser considerado prioritariamente. O autor acrescenta: “O fato, além de nos pôr em relação direta com as coisas, nos oferece neste contato a vivência de nosso próprio existir” (p. 12). Logo, a relação da criança com objetos de seu mundo não pode ser desmerecida ou vista sob um ângulo simplista como mero desenvolvimento dos sentidos, o objeto tem uma relação íntima com a criança.

Por outro lado, Negrine (2000) enfatiza que nem toda atividade que a criança realiza deve ser considerada como jogo, pois, para ele, o jogo pressupõe representação simbólica. Lembra que a criança, em situações espontâneas, também experimenta outras atividades que não se configuram como jogo, dentre essas, atividades rotineiras como ocorrem com qualquer adulto. Com isso, a ideia de que a criança “só brinca”, além de carregada de um conteúdo simplista em relação ao brincar, reflete equivocadamente um

mundo infantil impregnado somente de intencionalidades lúdicas minimalistas, o que não se confirma com a realidade. Como aponta Negrine (2000), além de seu modus vivendi lúdico, a criança também realiza atividades que não se constituem como sistemas lúdicos independentes:

Há atividade que a criança executa como exercício que pode ter diferentes finalidades, como por exemplo: 1) servir como reforço às habilidades já adquiridas; 2) imitar aquilo que o outro realiza; 3) testar suas habilidades ou adquirir novas; 4) atrair os outros para a atividade que realiza (p. 19).

Dessa forma, Negrine (2000) adverte que os jogos e as brincadeiras que as crianças desenvolvem estão diretamente relacionados com a afirmação do seu “eu”. Por conseguinte, fica claro que a criança não vive apenas para brincar. Há quem pense que o brincar ocupa na vida infantil lugar de maior relevância – mas não se pode negar que existam outras intencionalidades subjacentes aos seus atos, que não o lúdico, da mesma maneira como também ocorre com o adulto em relação ao seu trabalho. Para ilustrar bem a ideia de que não é somente a criança que brinca, vale citar um pensamento de Negrine (2000, p. 21): “A concepção de que o brincar está reservado às crianças nada mais é do que a perda da naturalidade humana, imposta pelo homem, já que – a história nos diz – o adulto costumava dedicar muitas horas ao lazer.”

Com o advento do capitalismo, houve uma desqualificação do lazer e, por consequência, do jogo e da brincadeira, ou seja, criou-se a falsa ideia de que o brincar e o lazer não pertencem ao adulto. No entanto, estudos comprovam que ele também necessita de momentos de lazer que respondam às suas vontades mais íntimas, pois a capacidade de simbolizar e de jogar com a realidade por meio da fantasia, da linguagem, dos mitos, religião e ciência permitem ao homem viver numa nova dimensão da realidade que é o universo simbólico. Assim, como revela Kishimoto (1999, p. 24), essa representação/simbolização possibilita a interiorização do mundo social. A existência de regras em todos os jogos é uma característica marcante. Há regras explícitas, como o xadrez ou amarelinha, regras implícitas como na brincadeira de faz de conta, em que a menina se faz passar pela mãe que cuida da filha. São regras internas, ocultas, que ordenam e conduzem a brincadeira.

Sem dúvida, o brincar significa sempre libertação. Rodeadas por um mundo de gigantes, as crianças criam para si, brincando, o pequeno mundo próprio; mas o adulto, que se vê acossado por uma realidade ameaçadora, sem perspectivas de solução, liberta-se dos horrores do mundo através da reprodução miniaturizada. (BENJAMIN, 1984, p. 64). Vale

destacar que, em grande parte das culturas contemporâneas, um dos traços marcantes da infância é o brincar contextualizado pelos elementos típicos de cada cultura. A brincadeira, de um modo geral, permite à criança vivenciar a ludicidade, descobrir a si mesma, apreender a realidade, interagir com seus pares e desenvolver sua criatividade.

Através da brincadeira, cada criança manifesta a forma como está organizando sua realidade, vivencia possibilidades, limitações e conflitos dos quais, muitas vezes, não sabe ou não pode falar. É pelo lúdico que a criança é introduzida de forma gradual, prazerosa e eficiente ao universo sócio-histórico-cultural, além de fornecer o embasamento para todo o processo de aprendizagem, pois favorece o raciocínio, a reflexão, a construção da autonomia e da criatividade.

Entretanto, apesar de estudos comprovarem a importância do brincar para o desenvolvimento da criança, nas últimas décadas, observou-se uma crescente diminuição à possibilidade da criança brincar, principalmente, nas grandes cidades. Devido às intensas transformações da vida urbana, limitou-se o convívio informal das crianças nas ruas, praças e parques. A grande circulação de automóveis e a falta de segurança nesses locais interferem, significativamente, nas brincadeiras das crianças e nos espaços do brincar. Desse modo, é fundamental garantir espaços destinados para a brincadeira. Cabe lembrar, nesse caso, da própria organização das cidades, que deve ter espaços que respeitem a criança como um sujeito de direito, isto é, espaços que garantam a segurança e oportunizem o contato com seus pares e as pessoas que frequentam esses espaços.

Atualmente, esses espaços tornaram-se para a criança lugares de risco, logo elas ficam enclausuradas em suas salas e quartos, em frente às televisões e computadores diminuindo suas interações, ou quando podem brincar, os espaços se restringem aos shoppings e condomínios, sujeitos às regras. E no que se refere às crianças de classes sociais menos favorecidas, a situação torna-se mais grave, pois além de não terem à disposição esses espaços, são obrigadas a assumirem funções domésticas ou são lançadas ao mercado de trabalho precocemente. (SEREDIUK; RAMADAN; GOBBO, 2003, p. 79).

Assegurar o espaço para o exercício do direito de brincar dentro das cidades importa na consolidação de um dever legal de constituição, de um espaço digno e sadio que ofereça às crianças o seu pleno desenvolvimento e a ampliação de conhecimentos. Oferecer condições concretas para a realização do espaço para brincar implica educar com dignidade e contribuir para a garantia dos direitos de todas as crianças, proporcionando a elas avançar “para novas etapas de domínio” (ERICKSON, 1971, p. 204). A realização do direito de brincar passa pela consolidação de políticas públicas que garantam espaços públicos de lazer

como direito de todos. É preciso traçar ações para a infância que representem a possibilidade de tornar as conquistas legais em fato concreto. Que a cidade seja um espaço de cidadania, de cultura e de conhecimento.

2.3 UMA CIDADE AMIGA DA CRIANÇA

No documento Cidade amiga da criança (páginas 45-54)

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