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2. INTRODUÇÃO

6.4 TÉCNICAS E INSTRUMENTOS DE COLETA DE DADOS

A técnica utilizada para a coleta de dados foi a entrevista individual, face a face, empregando um roteiro de perguntas semiestruturadas ou semidirigidas. A entrevista semidirigida combina perguntas fechadas (estruturadas) e abertas (não estruturadas), permitindo que o informante discorra livre e espontaneamente sobre o tema proposto.69

O objetivo principal da entrevista semiestruturada é esclarecer as percepções que os sujeitos de pesquisa têm sobre o fenômeno estudado, sem impor-lhes a visão ou a problemática do pesquisador.65 O investigador deve permitir a expressão livre do respondente, mas, quando notar desvio do assunto original, deve redirecionar o sujeito para o foco do estudo.70

Na pesquisa qualitativa, a entrevista semidirigida é uma técnica importante para obter informações subjetivas, pois a comunicação verbal pode revelar valores, opiniões, atitudes de grupos específicos, num dado contexto histórico, cultural, social e econômico.69 A entrevista permite ao entrevistador esclarecer o significado das perguntas, observar o nível de cooperação do entrevistado, a expressão corporal, o tom de voz e a ênfase dada pelo entrevistado às suas respostas.61

O instrumento foi previamente elaborado por mim contendo duas partes. A primeira possuía um formulário com questões descritivas, com o objetivo de caracterizar os sujeitos do estudo e traçar o perfil das amostras estudadas. Esta parte continha alguns dados sociodemográficos e clínicos, como: nome, idade, sexo, estado civil, se tinha filhos, escolaridade, profissão/ocupação, religião/crença religiosa, se praticava tal religião (frequência), renda familiar, grau de parentesco e diagnóstico do paciente internado.

A segunda parte do instrumento serviu para orientar a entrevista semidirigida e empregou um roteiro com questões norteadoras, que visavam apreender a percepção de pacientes e familiares sobre o tema pesquisado. O roteiro continha pergunta sobre o ponto de vista de pacientes e familiares acerca do cuidado em saúde na unidade psiquiátrica e sobre o que eles percebiam como importante e necessário para o cuidado recebido neste serviço, além de outras questões.

Havia um instrumento para os pacientes (Apêndice 3) e outro para os familiares (Apêndice 4). Ambos continham perguntas básicas, que visavam atender os propósitos da pesquisa, e estavam apoiados em teorias. O roteiro funcionou como um guia que buscou colocar o informante dentro do foco da pesquisa. É uma ferramenta que pode ampliar e aprofundar o material produzido durante a entrevista.69-70

Depois de elaborado, o roteiro foi avaliado criticamente por pares com experiência e conhecimento no tema do estudo e na abordagem qualitativa de pesquisa.62 Esta avaliação ocorreu durante o exame de qualificação do projeto deste estudo e nas reuniões com os membros do grupo de pesquisa NUPEQS.

Este processo de análise do roteiro de entrevista é fundamental para: verificar a pertinência das questões e determinar uma ordem lógica para sua execução (mas sempre considerando sua flexibilidade de realização, dependendo da situação de entrevista); para detectar a clareza dos enunciados e a ausência de tendenciosidade nas perguntas; verificar se as respostas obtidas fornecem as informações necessárias para atingir os objetivos da pesquisa; estimar o tempo aproximado de duração da entrevista; preparar o entrevistador para realizar as entrevistas e identificar outros problemas no instrumento.65

Previamente à coleta de dados, foram aplicadas duas entrevistas preliminares do novo instrumento, sendo uma com um paciente e outra com um familiar, que não pertenciam à mesma família. Porém, ambos correspondiam às amostras de respondentes, semelhantes às populações-alvo, a fim de avaliar se as perguntas estavam compreensíveis e adequadas.61

Estas entrevistas preliminares foram feitas no local de estudo e seus participantes não entraram na amostra final, nem suas entrevistas foram consideradas para a análise dos dados. Apesar da amostra restrita, formada por apenas dois respondentes, ela foi suficiente para testar o instrumento, auxiliando no rearranjo das questões, como a inversão da ordem de duas perguntas e a exclusão de outra.

Entretanto, o pré-teste não permitiu notar as consequências da pergunta sobre a relação dos participantes com a equipe de enfermagem. Um dos objetivos específicos do projeto inicial desta pesquisa era destacar a percepção sobre o cuidado recebido na UPHG, principalmente da equipe de enfermagem.

Contudo, no decorrer da coleta de dados, com a realização de cada entrevista e das observações, ficou claro que os participantes também traziam em suas narrativas a percepção do cuidado recebido por outros profissionais que não eram da enfermagem. As observações também revelaram relações importantes estabelecidas com outros membros da equipe de saúde – e estas relações significativas foram corroboradas durante as entrevistas.

Notei que a pergunta específica sobre a relação com a equipe de enfermagem gerava, inicialmente, respostas com elogios exacerbados e, geralmente, eram falas curtas, o que levava a duas situações. A primeira era que eu precisava refazer a pergunta e, inevitavelmente, tentava abranger a percepção dos participantes sobre a relação com a equipe de saúde, para permitir que os sujeitos falassem espontaneamente sobre qualquer membro que viesse a sua mente. Se havia dificuldades ou respostas “tímidas”, devido a certo medo de fazer críticas, eu tentava abordar sobre a equipe de enfermagem, depois a equipe médica e outros profissionais que eles conheciam e que contassem alguns momentos vivenciados com eles.

A segunda situação gerada pela pergunta específica sobre a equipe de enfermagem foi que, de algum modo, ela pareceu “quebrar o gelo” ou reduzir o

medo dos participantes de falarem sobre a equipe em geral. O resultado foi que os relatos que se sucederam a esta pergunta desencadearam uma série de narrativas sobre o cuidado recebido por vários profissionais da equipe de saúde – e não somente da equipe de enfermagem.

Portanto, esta situação obrigou-me a refletir sobre manter o foco da pesquisa na percepção do cuidado recebido pela equipe de enfermagem ou não. Compreendi que a riqueza dos relatos envolvendo diferentes membros da equipe de saúde, independentemente de serem negativos ou positivos, era muito relevante para ser descartada devido a minha confusão de ser uma pesquisadora-enfermeira. Por isso, às vezes, sentia-me parte desta categoria profissional e ambicionava dar destaque à área de enfermagem.

Por outro lado, entendi que a minha função primordial no estudo era de pesquisadora, independentemente da minha formação profissional; portanto, o interesse principal da pesquisa era mostrar a percepção dos participantes e se a visão deles sobre o cuidado não se restringia a uma única categoria profissional, não parecia honesto descartar tais dados para atender minha curiosidade como enfermeira, em detrimento da minha ambição de pesquisadora, a fim de contribuir para o avanço do conhecimento na área da saúde e, se possível, na de enfermagem.

Deste modo, ficou evidente a necessidade de readequar a pergunta, excluindo sua especificidade sobre a enfermagem, passando a contemplar a percepção dos sujeitos sobre a relação com a equipe de saúde.

Outra técnica de coleta de dados utilizada neste estudo foi a observação participante, na qual o pesquisador entra em contato direto, face a face, com o fenômeno observado.71 A observação foi “não estruturada”, na qual houve pouca restrição aos dados coletados, mas com uma estruturação mínima dos aspectos mais relevantes que se pretendia observar.65

A observação visa acompanhar as pessoas e os eventos, de forma sistemática, para observar os comportamentos, as falas e os relacionamentos cotidianos in situ, com a mínima interferência possível do pesquisador. No entanto, esta técnica possibilita que o investigador tanto modifique como seja modificado pelo contexto,49 ou seja, a presença de um observador pode estimular mudanças nos

comportamentos ou nas ações dos sujeitos observados, embora esta alteração possa diminuir com o tempo de permanência no local.62

A importância da observação é que ela permite captar vários fenômenos que não podem ser obtidos por meio das entrevistas.71 Nesta pesquisa, a observação tornou-se adequada para: estudar como o serviço funcionava; visualizar a interação entre equipe e pacientes/familiares; e também entre pacientes e familiares. Tratou-se de mais uma técnica de coleta de dados que buscou complementar a compreensão de como e por que os pacientes e os familiares eram atendidos de determinada maneira no serviço escolhido para o estudo.

Sabendo que uma das desvantagens da observação é o risco de o interesse pessoal do observador levá-lo a ver apenas o que deseja,65 foi elaborado um roteiro de observação (Apêndice 5) para organizar os principais pontos a serem observados.

A princípio, planejei um roteiro amplo para coletar as informações no campo de pesquisa, porém, após ingresso no local de estudo, o instrumento não se mostrou aplicável, precisando ser reestruturado de modo mais pragmático. Este instrumento permitiu, na primeira parte, um registro escrito da observação e continha alguns aspectos a serem observados que considerei relevantes, como anotações sobre o ambiente, as atividades ou eventos-chave, a organização destas atividades e sobre os participantes. Também foi possível anotar informações sobre as relações interpessoais entre equipe, pacientes e familiares durante a ocorrência dos eventos- chave.65

As anotações de campo para registrar as observações das atividades, citações e impressões foram redigidas logo após o período de observação, geralmente no mesmo dia, de modo a originar registros completos,65 com relatos detalhados, concretos e bastante descritivos sobre o que foi observado, considerando a cronologia dos eventos, a descrição das pessoas envolvidas, conversas e comportamentos.

O estabelecimento dessas estratégias foi necessário para tentar facilitar a seleção dos dados e reduzir, sistematicamente, os fenômenos ou a realidade em suas características mais relevantes. Porém, isto também exige do pesquisador certo domínio teórico sobre o que se pretende estudar.72

Na segunda parte do roteiro de observação, foi realizado um diário de pesquisa ou de campo, que são anotações pessoais e têm caráter mais reflexivo, no qual foram documentados impressões, sentimentos e reações pessoais ante as observações feitas.62 Já a terceira parte deste roteiro foi composta por anotações teóricas para iniciar a interpretação e a atribuição de significados do que foi observado,65 para posteriormente subsidiar a discussão dos dados obtidos pelas entrevistas semidirigidas.

Ainda como técnica para a coleta de dados, também foi realizada a coleta intencional nos prontuários dos pacientes, por meio de um formulário (Apêndice 6), para obter informações referentes às questões clínicas e assistenciais do paciente, como: data de nascimento, diagnóstico do paciente, número de internações no serviço, naturalidade, procedência, tempo da doença mental, duração da atual internação, quantas vezes foi internado e em que tipos de serviços, se fazia acompanhamento em outro local e se possuía antecedente familiar com doença psiquiátrica.

O objetivo da coleta em prontuário foi complementar, ratificar e validar as informações obtidas por outras técnicas de coleta, como a entrevista, o questionário de caracterização da amostra e a observação.72 Também evitei realizar perguntas diretas ao paciente sobre sua doença e sua história clínica, pois seria uma estratégia desnecessária, já que estes dados poderiam ser facilmente obtidos do prontuário e, além disso, era uma situação que poderia gerar constrangimento, mobilizar traumas, comprometer o vínculo e a confiança do paciente – o que poderia dificultar a realização posterior da entrevista.

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