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Taxa e preço público

No documento MESTRADO EM DIREITO TRIBUTÁRIO (páginas 114-117)

6.1. Critérios para a definição do conceito de tributo

6.3.1. Taxa e preço público

A Súmula 545 do STF, datada de 1969, prescreve que “preços de serviços públicos e taxas não se confundem, porque estas, diferentemente daqueles, são compulsórias e têm sua cobrança condicionada à prévia autorização orçamentária em relação à lei que as instituiu”. A questão do princípio da anualidade não mais é consagrado pela Constituição Federal de 1988. Já o ponto da compulsoriedade, como visto, depende de instituição por lei para caracterizar um tributo.

Eduardo Domingos Bottallo e José Eduardo Soares de Melo217 são diretos:

A doutrina tradicional aponta dois elementos identificadores do preço público e da taxa, quando postos em confronto. Um desses elementos tem natureza político- jurídica: as taxas são “coativas” e os preços, não; o outro é de índole econômica: as taxas são receitas derivadas (provém do patrimônio dos particulares) e os preços, receitas originárias (sua fonte é o próprio setor público).

216

Cf. Onofre Batista Júnior, Transações administrativas, p. 319-323.

217

Eduardo Domingos Bottallo; José Eduardo Soares de Melo, Comentários às súmulas tributárias do STF e do STJ, p. 85.

Como nos restringimos à diferenciação entre a natureza jurídico-tributária e a econômica (ou jurídico-financeira), a questão de serem receitas derivadas ou não nos é indiferente. É claro, não negamos que a diferença exista, o que contestamos é a relevância do tributo ser caracterizado por este critério. Tácio Lacerda Gama218 inclusive anota tal critério, quando diz que a caracterização da taxa está na “exigência constitucional de previsão legal de vinculação entre a materialidade do antecedente normativo e uma atividade estatal referida ao contribuinte” e “exigência constitucional de previsão legal de destinação específica para o produto da arrecadação”.

Um critério do Direito Administrativo costuma ser levado em consideração: a

atividade pública. Geraldo Ataliba219 é enfático ao afirmar que “se se tratar de atividade

pública (art. 175) o correspectivo será taxa (art. 145, II); se se tratar de exploração de atividade econômica (art. 173) a remuneração far-se-á por preço”. Esta solução também é dada por Aires Barreto,220 ao afirmar que “o serviço público só pode dar ensejo a taxa, e aquela atuação que der nascimento a preço (tarifa) não será serviço público, mas atividade desenvolvida em regime idêntico ao dos particulares e, pois, não qualificáveis como serviço público em termos jurídicos”. A interpretação que traz o critério atividade pública, outras vezes levada como “serviço público essencial ao interesse público”, busca limitar a farta possibilidade da instituição de preço, ao invés de taxa, pelo Poder Público.

Nem o destino do produto da arrecadação, nem a essencialidade do serviço (público) podem ser discrímen de taxas e preços. Enquanto o destino da arrecadação é de âmbito financeiro, a questão de o serviço ser público apenas posterga o problema: ao invés de definirmos o conceito de taxa, passamos a fazê-lo com o serviço público. A identificação da taxa pela análise do regime jurídico adotado também não deve ser utilizada: seria cair na falácia da consequência pela causa, ou seja, assumir como premissa a conclusão a que se quer chegar (circulus in demonstrando).

Para Luiz Alberto Pereira Filho221 a diferença da origem do veículo introdutor da norma (lei ou contrato) é o critério a ser adotado para diferenciar as taxas dos preços. Sacha

218

Tácio Lacerda Gama, Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico, p. 116.

219

Geraldo Ataliba, Hipótese de incidência tributária, p. 170.

220

Aires Fernandino Barreto, Comentários ao Código Tributário Nacional, vol.1, p. 549.

221

Luiz Alberto Pereira Filho, As taxas e os preços no ordenamento jurídico brasileiro, Curso de especialização em direito tributário: estudos analíticos em homenagem a Paulo de Barros Carvalho, p. 92.

Calmon Navarro Coelho222 também ressalta tal diferença quando preceitua que “ao jurista, cujo objeto primordial é o direito posto, cabe distinguir a taxa do preço exatamente pelo regime jurídico de cada qual. O preço é contratualmente acordado. A taxa é unilateralmente imposta pela lei”.223 Cremos que o discrímen “compulsória ex lege” é melhor alternativa e ainda põe a questão mais clara: a diferença não é entre taxas e preços, mas entre tributos e preços (obrigações contratuais). A compulsoriedade legal é a principal diferenciação entre taxas e preços.

Mesmo em outros países de forte tradição tributária, como a Espanha ou a Argentina, o problema persiste. Uma breve incursão por doutrinadores destes países mostra inclusive questionamentos equivalentes aos nossos:

Héctor Villégas224 se preocupa com a voluntariedade real das taxas, que contrasta com a imposição legal da utilização de serviços e também com a falta de liberdade efetiva para decidir a utilização ou não de um serviço porque é essencial para um nível elementar de vida, ou ainda porque o serviço está monopolizado. César García Novoa225 abarca todos os tipos de coatividade como taxas, inclusive os monopólios estatais “de fato ou de direito”. José Juan Ferreiro Lapatza,226 invocando Giannini, concorda com a diferenciação ex lege versus ex

contractu, e que é inútil dizer que “para „tais‟ serviços (inerentes ao Estado, indispensáveis,

econômicos, obrigatórios etc.) se deve estabelecer uma taxa e que para tais outros um preço... se a Constituição ou outra norma superior nada diz a respeito daquilo que deve ou não fazer, neste campo, aquele que discipline o funcionamento de um determinado serviço público”. No Brasil, Roque Antonio Carrazza tem ideias relevantes sobre o assunto. Dentre elas, a impossibilidade de cobrança de taxas sem uso efetivo por parte do contribuinte e também por utilização de bens do domínio público.227

Tais pontos servem melhor como uma introdução ao tema, pois a diferenciação entre taxas e preços exige um trabalho autônomo. Como diz Roque Carrazza, “A taxa é o tipo de tributo que seguramente mais divergências suscita entre os estudiosos. Tanto isto procede que

222

Sacha Calmon Navarro Coêlho, Curso de direito tributário, p. 462.

223

Fazemos a ressalva de que a imposição por lei ou por contrato é pressuposto, e não regime jurídico.

224

Curso de finanzas, derecho financiero y tributario, p. 186. 225

El concepto de tributo, p. 317. 226

Direito tributário: teoria geral do tributo, p. 176-177.

227

não há consenso quanto à sua definição, nem seu exato enquadramento entre as espécies tributárias”.228

No documento MESTRADO EM DIREITO TRIBUTÁRIO (páginas 114-117)