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Devido à similaridade com a goma arábica, a goma de algaroba obtida das vagens (frutos) é descrito como um agente encapsulante de óleos essenciais e corantes naturais (BERISTAIN; GARCÍA; VERNON-CARTER, 1999; BERISTAIN; VERNON-CARTER, 1994; GOYCOOLEA et al., 1997; KHANNA et al., 1997; MURUGESAN; ORSAT, 2012; VERNON- CARTER et al., 2001) e apresenta potencial de uso como agente emulsificante para

emulsões do tipo óleo em água (CARTER; SHERMAN, 1980; VERNON-CARTER et al., 1996; VERNON-CARTER; PEDROZA-ISLAS; BERISTAIN, 1998).

Acedo-Carrillo e colaboradores (2006) investigaram a influência de diferentes óleos na estabilidade e comportamento eletrocinético de emulsões do tipo O/A estabilizadas pela goma da algaroba. Os autores realizaram um estudo de estabilidade a longo prazo e observaram emulsões com óleo de laranja estáveis na faixa de concentração de 9 a 22% de goma de algaroba, propondo ainda um mecanismo de estabilização eletrostática, semelhante ao da goma arábica.

A indústria farmacêutica e cosmética tem à disposição grande número de excipientes de origem vegetal, principalmente devido à segurança, economia e abundância na natureza, dentre eles, a P. juliflora apresenta estudo de uso como agente aglutinante e sua mucilagem está presente em comprimidos de diclofenaco sódico (PRAJAPATI et al., 2013; SENTHIL SELVI et al., 2010). Outros estudos de utilização da P. juliflora na área farmacêutica, mostram a obtenção de sistemas de liberação modificada contendo combinações da goma da algaroba, quitosana e goma xantana (NOGUEIRA et al., 2003), produção de hidrogéis (REIS et al., 2003) bem como na obtenção de gomas semelhantes à amostras comerciais com potencial uso como em sistemas de liberação modificado do tipo targeting e aplicações em formulações alimentares (VILARÓ et al., 2018).

Além das aplicações relacionadas a medicamentos e cosméticos, a algaroba apresenta diversos outros potenciais na área da biotecnologia, conforme resumidos na Tabela 3.

Tabela 3 - Potenciais aplicações biotecnológicas da Prosopis juliflora.

(Continua)

Parte da planta Aplicação Referência

Biomassa das

sementes Obtenção de bio óleos;

(MASIMALAI;

KUPPUSAMY, 2015) Caule e Raízes Solução verde para descontaminar solos com

metais pesados tais como o Cu e Cd

(SENTHILKUMAR et al., 2005)

Folhas Remoção de produtos químicos tóxicos presentes no efluente de curtume

(SHARMILA;

REBECCA JEYANTHI; SADUZZAMAN, 2013) Folhas Potencial inseticida contra a mosca branca

(CAVALCANTE; MOREIRA; VASCONCELOS, 2006)

Folhas Potencial uso como agente biocida no combate aos cupins (Macrotermes spp)

(BEZUNEH et al., 2019)

Folhas Potencial uso como inibidor de corrosão em metais e concretos

(FOUDA; AWADY; BEHAIRY, 2018; PALANISAMY et al., 2016)

Tabela 3 – Potenciais aplicações biotecnológicas da Prosopis juliflora.

(Conclusão)

Folhas

Desenvolvimento de quantum dots de carbono para a identificação fluorescente de mercúrio e ácido dimercaptossuccínico

(POURREZA; GHOMI, 2019)

Núcleo das

árvores Bioindicador de acúmulo de metais pesados

(BERAMENDI-

OROSCO et al., 2013) Sementes Síntese de poliuretano de origem natural (TATHE; JAGTAP,

2013) Sementes Potencial uso como coagulantes para o tratamento

de água

(SALEEM;

BACHMANN, 2019) Sementes

Produção de biodiesel com potencial de

substituição do diesel comum sem modificações nos motores

(ASOKAN et al., 2019)

Vagens Produção de etanol (SILVA et al., 2011)

Vagens e casca Produção de carbono ativado

(KAILAPPAN; GOTHANDAPANI; VISWANATHAN, 2000)

2.1.6 Toxicologia

Apesar da P. juliflora ser utilizada na alimentação de animais e para consumo humano, intoxicação de animais tem sido historicamente relatada nos Estados Unidos (DOLLAHITE, 1957; 1964), Peru (BACA; VALLENAS; NOVOA, 1967) e Brasil (FIGUEIREDO et al., 1995; LIMA et al., 2004; SILVA et al., 2006; TABOSA et al., 2006), sobretudo em bovinos e caprinos. Estudo realizado no estado de Pernambuco, 50 produtores e 11 veterinários foram entrevistados, seis deles relataram ter observado surtos associados com o consumo de vagens de algaroba em lugares onde ela é uma parte importante da alimentação animal com livre acesso a esta fonte de alimento, especialmente na estação seca (ASSIS et al., 2009).

Os efeitos tóxicos são bem descritos em animais que tem a P. juliflora como fonte de alimento (CÂMARA et al., 2009), levando a uma disfunção muscular e popularmente caracterizado no Brasil como "cara-torta" (FIGUEIREDO et al., 1995). Falta de coordenação dos movimentos da mastigação, apreensão difícil de alimentos, salivação excessiva, disfagia e atrofia do músculo masseter localizado na cabeça do gado (TABOSA et al., 2006; TABOSA et al., 2000b), associado a atonia ruminal, anemia, edema submandibular e perda de peso progressiva (KINGSBURY, 1964), são os principais sinais clínicos associados à intoxicação. Esses sinais clínicos são caracterizados por emaciação neuromuscular, lesões histológicas como espongiose, gliose, perda de substância Nissl, vacuolação do pericário dos neurônios dos núcleos motores do trigêmeo (SILVA et al., 2007), finalmente, degeneração e desaparecimento de neurônios motores do núcleo trigêmeo (TABOSA et al., 2006).

Nesse contexto, os primeiros estudos foram desenvolvidos com o objetivo de isolar, purificar e identificar compostos presentes na algaroba, relacionados aos casos de toxicidade (TABOSA et al., 2000a; TABOSA et al., 2000b). Os autores identificaram principalmente os alcaloides piperidinicos juliprosopina, juliprosina e juliprosineno, responsáveis pela atividade tóxica da espécie.

Silva e colaboradores (2007) utilizando culturas de astrócitos de ratos tratados com uma fração enriquecida em alcaloides de algaroba, relataram uma ação direta nas células gliais, induzindo ou ativando citotoxicidade, estimulando a produção de óxido nítrico, podendo estar relacionado aos efeitos tóxicos da espécie em animais. Posteriormente, o mesmo grupo complementou o estudo com testes de citotoxicidade dos alcaloides piperidinicos, juliprosopina e juliprosina em culturas de neurônios da ratos, atribuindo a este compostos os efeitos tóxicos observados nos animais (SILVA et al., 2013).

Por fim, outro estudo evidenciou o efeito da juliprosopina em mitocôndrias de ratos, observando alterações no potencial de membrana, bem como redução da produção de ATP, morte celular e disfunção de neurônios envolvidos na neurotoxicidade da planta (MAIOLI et al., 2012).

No entanto, de acordo com Silva e colaboradores (2017), o envolvimento dessas alterações celulares já relatadas na literatura e o mecanismo de morte celular induzido pelos alcaloides de P. juliflora ainda não havia sido esclarecido totalmente. Dessa forma, os autores avaliaram o envolvimento do dano mitocondrial e da autofagia no mecanismo de morte celular induzido por uma fração total de alcaloides (30μg/mL) e por uma fração de alcaloides composta pelos alcaloides juliprosopina e juliprosina (7,5μg/mL), em um modelo de co-cultura de neurônios e células da glia (SILVA et al., 2017). Os autores observaram que a autofagia é o principal mecanismo de proteção contra morte celular neural, associado com morte celular programada em resposta ao dano mitocondrial, em resposta a indução gerada pelos alcaloides piperidínicos de P. juliflora nas concentrações testadas.

Conforme compilado por Damasceno; Ferrari e Giordani (2017), no aspecto da toxicidade provocada em animais pela P. juliflora, é possível observar uma evolução nos trabalhos publicados na literatura, partindo de relatos de caso à estudos com alcaloides isolados e mecanismo de ação. No entanto, traçando um paralelo das informações toxicológicas com as propriedades farmacológicas, pode-se observar a ausência de estudos que estabeleçam uma clara relação entre a dosagem tóxica da algaroba e seus alcaloides e o potencial dessas como novas moléculas bioativas para o desenvolvimento de alternativas terapêuticas. Embora haja relatos de toxicidade em animais, há amplo uso

popular medicinal e alimentar de derivados de P. juliflora há muitos anos, o que a credencia para futuras aplicações no âmbito farmacêutico e cosmético.

2.2 CARBOIDRATOS

Os carboidratos são os principais constituintes das espécies vegetais, exibindo uma variedade de funções biológicas tais como função estruturante (celulose), reserva energética (amido), ação defensiva (gomas e mucilagens), metabolismo energético primário e como sinalizador de expressão gênica (THARANATHAN et al., 1987). Embora haja pequenas divergências quanto à classificação, os carboidratos de origem vegetal são classificados em três grandes grupos: mono, oligo e polissacarídeos, os quais podem apresentar uma enorme variedade estrutural refletindo no espectro de atividades desempenhadas (THARANATHAN et al., 1987).

Polissacarídeos oriundos de sementes podem ser classificados em três grupos: o primeiro, formado por compostos presente no endosperma tais como galactomananas; o segundo, compostos de origem da casca das sementes e, o terceiro, formado por compostos da parede celular do endosperma (SOUKOULIS; GAIANI; HOFFMANN, 2018). Estes polissacarídeos constituem uma das principais fontes de hidrocoloides, utilizados em diversas áreas tais como cosmética, farmacêutica e alimentícia, em função de suas características funcionais, promovendo uma demanda crescente por pesquisa e inovação em novas matérias-primas sustentáveis (SOUKOULIS; GAIANI; HOFFMANN, 2018).

Um grande número de excipientes utilizados pela indústria farmacêutica, alimentícia e cosméticas são formados por polímeros naturais, especialmente polissacarídeos como gomas, mucilagens, glucanas e galactomananas, em função de sua segurança, biocompatibilidade e biodegradabilidade, custo e disponibilidade na natureza (PRAJAPATI et al., 2013). Estes polissacarídeos são carboidratos complexos com um ou mais monossacarídeos ligados e uma variedade de substituintes, os quais apresentam elevada quantidade de grupos hidroxilas, podendo levar a retenção de água e, no caso das mucilagens, auxiliar na resistência das espécies vegetais à seca assim como manutenção das condições necessárias para germinação das sementes (CLARKE; ANDERSON; STONE, 1979; PRAJAPATI et al., 2013; THARANATHAN et al., 1987).

Além de aplicações tecnológicas, polissacarídeos de origem vegetal tem sido largamente estudados com importantes atividades biológicas como antioxidante, imunoregulatória, antitumoral antioxidante, neuroproteção, radioproteção, antidiabetes, hepatoproteção, antiosteoporose e antifadiga (JIN et al., 2013) além de ações antiinflamatória e antimicrobiana, em diversos modelos de estudo in vitro (JIAO et al., 2016;

PANDIT; SONG; JEON, 2014). Pesquisas de novos polissacarídeos bioativos tem aumentado nos últimos anos, com destaque às moléculas antioxidantes, que podem agir por diversos mecanismos tais como no combate dos radicais livres, diminuindo a peroxidação lipídica, se mostrando uma potencial fonte de ativos possíveis de serem utilizados na cosmetologia como agentes antienvelhecimento (HUANG; MEI; HU, 2017; LIU; SUN; HUANG, 2018).