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TEMA: Ensino Tradicional: análise da divisão de trabalho

No documento POR UMA OUTRA GEOGRAFIA ESCOLAR (páginas 183-187)

Capítulo 2: Fundamentação Teórica

4.5. TEMA: Ensino Tradicional: análise da divisão de trabalho

trabalho

Para compreender as bases do ensino tradicional é necessária a observação da divisão de trabalho que ocorre na sala de aula, para que se possa identificar, em grande parte, a concepção de ensino-aprendizagem que perpassa essa organização da atividade. Quando o protagonismo da aula está, predominantemente, nas mãos do professor prevalece a transmissão de conhecimento, estratégia baseada no modelo comportamentalista, revelando o sentido atribuído ao papel do professor na atividade, ou seja:

• O professor é quem faz tudo.

Essa categoria de interpretação vista sob a ótica da TASHC permite entender, conjuntamente, o papel definido para os alunos, responsável por um processo de ensino-aprendizagem contraproducente, na medida em que espera-se deles, uma atitude passiva e submissa em relação aos professores, como será analisado a seguir.

4.5.1. O professor é quem faz tudo

QUADRO 4.12. Protagonismo do professor

TEMA Ensino Tradicional

CONTEÚDO

TEMÁTICO Divisão de trabalho

SENTIDOS O professor é quem faz tudo

EXEMPLOS Mô31B-Nessa divisão de trabalho que é estabelecida, a quem fica o

protagonismo da aula na maioria das vezes. Para o professor ou para os alunos?

Dilma24B- O que você viu hoje é não uma realidade. Os alunos

aprendendo com seus pares, uma coisa rara, raramente a gente consegue fazer isso.

Dilma se reporta à aula observada por mim naquele dia, como “uma coisa rara”, como algo que não faz parte do cotidiano escolar afirmando o que foi visto “hoje é não uma realidade”. A despeito de seu relato indicar uma contradição em relação ao material prescrito e às suas próprias convicções pedagógicas expressas no questionário, no qual ela diz que “Minhas bases teóricas estão calcadas no sócio-interacionismo, teoria

que baliza meu trabalho. Creio que não haja outro caminho para a construção do conhecimento”.

O próximo excerto revela que o seu contexto de ação não permite que ela conduza as aulas, o tempo todo, sob essa premissa teórico-metodológica. Ou seja, a aprendizagem baseada na interação, na valorização da presença do outro e com protagonismo dos alunos é uma prática episódica, eventual. Não faz parte de uma estratégia intencional fundamentada em uma teoria sobre como o aluno aprende.

QUADRO 4.13. Divisão de trabalho

TEMA Ensino Tradicional

CONTEÚDO

TEMÁTICO Divisão de trabalho SENTIDOS O professor é quem faz tudo

EXEMPLOS Dilma16A - Lá a gente consegue trabalhar outros tipos de

conteúdos...aqui não há muito tempo, quase sempre o trabalho aqui está na minha mão, lá eu consigo deixar o menino sendo sujeito do desenvolvimento dele durante muito

mais tempo porque as propostas de trabalho lá, levam o

menino a trabalhar muito lá de maneira autônoma. Aqui a aula fica muito tempo na minha mão. Lá as atividades todas ficam muito mais tempo na mão deles.

Como foi destacado no excerto, o uso repetido dos advérbios de lugar “aqui e lá”, dos advérbios de intensidade “muito e mais” e dos pronomes possessivos ‘minha e deles”, evidenciam o quanto a prática pedagógica dos professores é determinada pelo contexto de ação. A despeito das escolas estarem sob a orientação dos PCN, as regras e a cultura da comunidade influenciam decisivamente as escolhas dos professores. A “maneira autônoma” de trabalhar dos alunos depende da autonomia que a instituição atribui ao professor, da convicção sobre uma determinada teoria de ensino-aprendizagem e, principalmente, do respaldo oferecido pela equipe diretiva para que novas propostas sejam aplicadas.

Como os espaços de reflexão sobre a ação são raros no cotidiano escolar, como não há suficiente clareza sobre o quanto uma determinada divisão de trabalho está relacionada a uma concepção de ensino-aprendizagem, não é dada muita atenção a esse elemento da atividade, mesmo porque, qualquer mudança nos paradigmas educacionais, baseada na mediação do professor e na interação entre os sujeitos, encontra barreiras na historicidade e na cultura da atividade escolar, que se mantém alicerçada no protagonismo do professor, no verbalismo e na reprodução dos conteúdos dos materiais didáticos.

Existe a necessidade de rever a divisão de trabalho da sala de aula, como forma de conceber a aprendizagem sob a perspectiva da construção de conhecimento, superando a atual visão individualista e descontextualizada, além de ultrapassar o modelo de ensino baseado na descrição e prescrição de caráter comportamentalista (Pontecorvo, 2005). Porém, para que o professor perceba a importância de rever a divisão de trabalho, é fundamental estabelecer uma reflexão crítica sobre a natureza social e histórica das relações dos agentes do processo educacional e realizar uma investigação sobre o que se pensa e o que faz visando compreender e transformar a prática pedagógica (Magalhães, 2007).

Para tanto, não se pode prescindir da presença do outro, da interação com colegas, coordenadores, pesquisadores como forma de provocar uma tomada de consciência sobre o real da atividade, como se pode ver no próximo excerto.

QUADRO 4.14. Predominância do trabalho do professor

TEMA Ensino Tradicional

CONTEÚDO

TEMÁTICO Divisão de trabalho SENTIDOS O professor é quem faz tudo

EXEMPLOS Mô32B- E aí fica a grande questão: Será que eles estão aprendendo

não no sentido de apreensão da informação. Os próprios resultados estão demonstrando isso. Mas a apreensão do espaço, (...), a reflexão crítica sobre os processos que resultaram daquela realidade, se a gente não dá o protagonismo pra eles, a gente consegue realmente que ele mude de patamar?

Dilma25B- O meu trabalho, se eu tenho que falar pra você, o que não

está bom para o meu trabalho, não está bom porque em muitos momentos ele está nas minhas mãos,

Em quase todos, ele está em minhas mãos, aí a gente fica tocando as nossas análises goela abaixo para os meninos.

Retomando a reflexão sobre a divisão de trabalho através da avaliação de seus efeitos no processo de ensino-aprendizagem, Dilma resgata, de maneira indireta, o princípio central do sócio-interacionismo vygotskyano, quando diz: “o meu trabalho, não está bom porque em muitos

momentos ele está nas minhas mãos”, assim como se remete ao dialogismo bakhtiniano ao declarar: “a gente fica tocando as nossas análises goela abaixo

para os meninos”.

A tomada de consciência da professora, provocada pelo questionamento sobre o objeto da atividade de ensino-aprendizagem da Geografia, acontece, na medida em que ela identifica que a prática pedagógica, na maioria das vezes, não se constitui como um evento comunicativo produtivo, marcado por interações entre professores e alunos que potencializem a reflexão crítica e o desenvolvimento das funções psicológicas superiores.

Pressionados pelo sistema, os professores se mostram responsáveis pelo futuro dos alunos, atribuindo a eles um papel secundário no processo de aprendizagem. O professor identifica a participação, a criticidade e a cidadania como valores a serem desenvolvidos com o auxílio da Geografia Crítica, mas, quando perguntamos sobre os temas que são trabalhados com os alunos, os professores apresentam sempre a justificativa da necessidade de manter o foco no cumprimento do conteúdo, como será evidenciado a seguir.

4.6. TEMA: Novamente o foco no conteúdo com o sentido

No documento POR UMA OUTRA GEOGRAFIA ESCOLAR (páginas 183-187)