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Teoria da criação do conhecimento organizacional

Capítulo 2 Enquadramento teórico: gerir o conhecimento na sociedade do

2.6 Gestão do conhecimento organizacional

2.6.2 Teoria da criação do conhecimento organizacional

A teoria da criação de conhecimento organizacional tem como objetivo principal identificar as condições (organizacionais) para criar conhecimento com vista à inovação e à aprendizagem. Ikurijo Nonaka (1994) começou por criticar a visão tradicional da organização como sendo um sistema que unicamente processa informação e resolve problemas; este autor considera esta visão estática, porque qualquer organização, para além de processar informação e resolver problemas, também cria informação e conhecimento (Nonaka, 1994). Esta consideração levou-o a questionar como as organizações criam conhecimento. Seguindo a lógica de Polanyi (1967), Nonaka et al. (2000) considerou dois tipos de conhecimento: explícito e tácito. Salientou que estes conhecimentos não são distintos, mas complementares. A conversão entre estes dois tipos de conhecimento resulta da interação entre os indivíduos, os grupos e as organizações. Na Figura 2.8 são apresentadas as diversas interações que se desenrolam ao longo das dimensões ontológicas e epistemológica.

Nonaka (1994) e Nonaka et al. (2000) propuseram um modelo do processo de criação de conhecimento composto por três elementos (Figura 2.9):

1º) o processo de conversão de conhecimento (a criação de conhecimento através da conversão sucessiva do conhecimento tácito em explícito e do conhecimento explícito em tácito);

2º) ba, o contexto partilhado para a criação de conhecimento; e

3º) os recursos de conhecimento, que são os inputs, os outputs e os mediadores do processo de conhecimento.

Figura 2.9 - Os três elementos do processo de criação de conhecimento

Fonte: Nonaka et al. (2000)

O processo de conversão de conhecimento (SECI) foi desenvolvido por Nonaka e colegas. De acordo com Nonaka e Takeuchi (1995) o conhecimento é criado dinamicamente, através da interação entre os indivíduos. Este processo social de interação entre estes dois tipos de conhecimento é denominado de conversão do conhecimento, ou processo SECI; e desenrola-se em quatro modos de conversão entre o conhecimento explícito e tácito:

1) Socialização - partilha de conhecimento tácito entre indivíduos através da

2) Exteriorização - do conhecimento tácito para o explícito, como por exemplo

quando se escrevem documentos, procedimentos ou se faz modelização;

3) Combinação - reconfiguração de partes de conhecimento explícito em novas

configurações através da junção, combinação, categorização; e

4) Interiorização - tradução de conhecimento explícito em conhecimento tácito

individual.

Cada um destes quatro modos de conversão é caracterizado pela realização de algumas atividades dentro da organização. Na Tabela 2.12 estão indicadas estes modos de conversão e os ambientes ou ba que criam e suportam o conhecimento a nível organizacional.

Tabela 2.12 - Os quatro modos de conversão do conhecimento (SECI)

Modos de conversão

do conhecimento Tipos de ba

Socialização (de tácito a tácito)

Ba origem - é um lugar onde os indivíduos compartilham

experiências, sentimentos, emoções e modelos mentais; (interações individuais e cara-a-cara).

Exteriorização (de tácito a explícito)

Ba diálogo - é um lugar onde os indivíduos compartilham

modelos mentais e capacidades, convertidos em termos comuns e articulados como conceitos;

(interações coletivas e cara-a-cara).

Combinação (de explícito a explícito)

Ba sistematização - é um lugar que oferece um contexto para a

combinação dos conhecimentos explícitos existentes, que podem ser facilmente transmitidos para um grande número de pessoas na forma escrita;

(interações coletivas e virtuais)

Interiorização (de explícito a tácito)

Ba exercício - é um lugar que oferece um contexto para que as

pessoas possam incorporar o conhecimento explícito que é comunicado por meios virtuais, tais como manuais escritos ou programas de simulação;

(interações individuais e virtuais).

Construído a partir de: Nonaka e Takeuchi (1995) e Nonaka et al. (2000)

Não devemos esquecer que se trata de um modelo que procura ajudar a simplificar a realidade (complexa). Ao considerar que o conhecimento tácito se converte em conhecimento explícito ou vice-versa simplifica-se o que realmente se passa. Na realidade há conversões simultâneas entre os diferentes tipos de conhecimento (Nonaka et al., 2000).

Assim, os modos de conversão não são nem estanques nem sequenciais. A metáfora usada por estes autores de considerar a criação de conhecimento como uma sucessão de espirais parece ser mais elucidativa para compreender não só a dinâmica do processo mas também o enriquecimento cumulativo do mesmo. Nonaka et al. (2000) argumentam que esta espiral desenvolve-se através da síntese de conceitos, que aparentemente estão em antítese, como por exemplo, ordem e caos, micro e macro, parte e todo, mente e corpo, tácito e explícito, eu e o outro, dedução e indução, criatividade e controlo, entre outros pares de conceitos. Consideram ainda que a chave deste processo de criação de conhecimento assenta num pensamento dialético, que transcende e sintetiza estas mesmas contradições (ver Figura 2.10).

Figura 2.10 - Espiral da criação de conhecimento

Fonte: Nonaka et al. (2000)

Em termos práticos há uma necessidade de equilibrar estes fatores a nível organizacional; por exemplo, se existir demasiada ordem o conhecimento pode cristalizar o conhecimento, mas também se o caos estiver a dominar, o conhecimento pode tornar-se difuso. Assim, a criação de conhecimento precisa de um equilíbrio dinâmico entre ordem e caos.

O contexto partilhado para a criação de conhecimento é o ba. Ba é uma palavra japonesa que podemos traduzir aproximadamente por espaço, contexto ou ambiente. O conceito ba é definido como um contexto partilhado, onde o conhecimento é partilhado, criado e usado. Na criação de conhecimento o ba de criação e recriação é a chave, visto que é este ba que fornece a energia, a qualidade e o espaço para que possam ser efetuadas as diversas conversões ao longo da espiral de criação de conhecimento. Nesta abordagem, o

conhecimento não é um conceito abstrato; está ligado às pessoas, às suas interações num tempo e espaço específico (físico ou virtual).

A nível organizacional, são considerados recursos de conhecimento os ativos que são indispensáveis para criar valor, para a organização. Recursos de conhecimento são os inputs, os outputs e os fatores moderadores do processo de criação de conhecimento (Nonaka et al., 2000). Os recursos de conhecimento estão constantemente a evoluir, por exemplo, podemos pensar no recurso confiança que se constrói entre os membros da organização, ou seja é um output do processo de criação de conhecimento.Por outro lado também podemos considerar a confiança como um input, necessário para novos processos de criação de conhecimento organizacional. Devido à sua natureza essencialmente intangível, é difícil avaliar o valor destes recursos do conhecimento.

O processo de criação de conhecimento não pode ser gerido, no sentido tradicional do termo “gestão”, que por vezes aparece relacionado com o controlo do fluxo de informação. Ao abordarmos a criação de conhecimento como um processo, a sua gestão faz apelo ao conceito de liderança. De acordo com Nonaka e colegas o papel da liderança, nesta perspectiva, deve ser o de facilitador no desenrolar do processo de criação de conhecimento organizacional. Durante a revisão de literatura realizada para dar suporte ao presente capítulo foi emergindo a liderança, muitas vezes de modo subtil, como assunto relevante na gestão do conhecimento e mais concretamente na criação de conhecimento organizacional. No ponto seguinte iremos debruçar-nos sobre a liderança da gestão do conhecimento organizacional e mais tarde, aquando da nossa focalização ao contexto académico, este constructo será revisitado, porque o consideramos relevante.

Sumariando, a teoria da criação de conhecimento é relevante para compreender como o conhecimento organizacional é criado (Nonaka et al., 2000). Esta teoria atravessa diversos níveis dentro da organização e oferece um modelo claro para a criação de conhecimento em qualquer organização, apesar de inicialmente ter sido construído a partir de um contexto empresarial. Este modelo defende que uma organização cria conhecimento utilizando conhecimento existente (interno e externo), através de processo SECI (Socialização, Exteriorização, Combinação e Interiorização) que decorre num determinado

contexto ou ba. O conhecimento criado torna-se parte dos recursos de conhecimento organizacional e muitas vezes encerra em si a diferenciação entre uma organização e as outras. Estes processos e ambientes devem ser geridos com um suporte claro da liderança. No ponto seguinte iremos explanar mais detalhadamente o assunto da liderança do conhecimento organizacional.