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Teoria da Eficácia da norma constitucional

4 DIREITO DE GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO

4.1 Teoria da Eficácia da norma constitucional

Reexaminando o dispositivo constitucional que garante aos servidores públicos o direito de greve, ou seja, artigo 37, inciso VII. In verbis:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

VII - o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica;

Surge então um primeiro questionamento. A referida norma pode ser aplicada de pronto ou necessita de lei específica para que possa ser empregada no caso concreto?

O Supremo Tribunal Federal examinou a matéria e classificou o artigo 37, inciso VII, como “norma de eficácia meramente limitada, desprovida, em conseqüência, de auto- aplicabilidade, razão pela qual, para atuar plenamente, depende da edição de lei complementar exigida pelo próprio texto da Constituição”.40 Dessa forma, em todos os julgamentos subseqüentes, o Supremo Tribunal proferiu acórdãos similares, invalidando o direito de greve dos servidores públicos, por não haver sido editada lei regulamentadora.

Ao contrário do que se poderia imaginar, no país inteiro, eclodiram movimentos grevistas de servidores públicos. E por mais estranho que pareça, na maioria das vezes, o Poder Executivo não tem postulado pela sua ilegalidade, além de não instaurar processos disciplinares contra esses grevistas. Isso demonstra que, apesar de juridicamente inválido, o direito de greve no serviço público faz parte do contexto sócio-cultural da nossa democracia.

40 MI 20-4/DF, Relator Ministro Celso de Mello, Órgão Julgador: Plenário, DJ: 19/05/1994, DJU de 22/11/1996,

Recentemente, como visto anteriormente, o STF modificou o seu entendimento e passou a reconhecer o disposto no artigo 37, inciso VII, como norma de eficácia contida, ordenando que se aplique a Lei de Greve da iniciativa privada de forma subsidiária, no que couber. A partir de agora, devemos observar quais os efeitos práticos dessa decisão.

Por outro lado, necessário se faz compreender a teoria da gradação da eficácia das normas constitucionais, que, no Brasil, foi originalmente elaborada pelo constitucionalista José Afonso da Silva, o qual, em sua tese de doutorado intitulada “Aplicabilidade das normas constitucionais”, vislumbrou, nos dispositivos constitucionais, três ordens de eficácia: plena (de aplicabilidade direta, imediata e integral), limitada (de aplicabilidade direta e imediata, mas possivelmente não integral) e contida (subdivididas em normas de princípio institutivo ou organizativo e em normas de princípio programático).

4.1.1 Normas de eficácia plena

Normas constitucionais de eficácia plena são aquelas que, produzem, ou têm possibilidade de produzir, todos os efeitos essenciais, desde quando a constituição passa a vigorar no ordenamento jurídico. Dessa forma, tais regras têm aplicação imediata e integral, sem necessidade de legislação posterior para regulamentá-las. Os direitos originários dessas normas são aptos, direta e imediatamente, a serem usufruídos, pois originados de comandos certos e definidos. São normas de eficácia plena os artigos 1°, 2º, 7º, incisos III, XIII e XVII, sendo que desde quando a Constituição Federal de 1988 entrou em vigor, eles passaram a ser aplicados de forma direta, imediata e integral.

4.1.2 Normas de eficácia contida

Diz-se de eficácia contida aquelas normas que passam a incidir imediatamente após a entrada em vigor da Constituição, mas podem ter o seu alcance reduzido por legislação infraconstitucional, sempre de acordo com o comando constitucional. Assim, podemos considerar que tais normas têm aplicabilidade direta, imediata, mas não integral, já que são dependentes de regulamentação de legislação infraconstitucional ou sujeitam-se a restrições nelas previstas.

Para exemplificar, podemos citar o artigo 5º, inciso XIII da CF/88:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;

Dessa maneira, conforme o exemplo, se não fosse editada lei regulamentadora, ainda assim a norma teria a sua eficácia e o exercício de qualquer trabalho seria pleno.

Vale ressaltar, também, que se houver incompatibilidade entre uma norma de eficácia contida e a norma infraconstitucional reguladora, esta última torna-se inválida automaticamente.

4.1.3 Normas de eficácia limitada

Por fim, normas constitucionais de eficácia limitada são aquelas que apresentam aplicabilidade indireta, mediata e reduzida, necessitando de normatividade futura para alcançar a sua plena eficácia. Assim, a aptidão para a execução dos efeitos constitucionalmente desejados só será conferida através de legislação infraconstitucional.

No entanto, como qualquer norma constitucional, possuem uma eficácia mínima, tendo a capacidade de invalidar normas posteriores incompatíveis ou de não recepcionar as anteriores que lhes sejam contrárias. Nos dizeres de Maurício Godinho Delgado:

Esse efeito esterilizante negativo sobre a normatividade antagônica ou incompatível traduz-se, portanto, na mínima eficácia de que se reveste qualquer preceito constitucional vigorante.41

Como mencionado, as normas de eficácia limitada subdividem-se em normas de

princípio institutivo ou organizativo e em normas de princípio programático. Em

primeiro lugar, de princípio institutivo são as normas dependentes de regras

infraconstitucionais que viabilizem instituições ou órgãos previstos na Carta Magna. Como exemplo desse tipo de norma, podemos citar o artigo 18 da Constituição Federal, in verbis:

Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.

Já as normas de princípio programático são aquelas que traçam metas e estabelecem diretrizes constitucionais a serem desenvolvidas pela legislação infraconstitucional. O artigo 205 da Constituição brasileira é um exemplo perfeito desse tipo de norma, in verbis:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

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