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EFICÁCIA DO DIREITO CONSTITUCIONAL DE GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO

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BRUNO DE CASTRO ROSA

EFICÁCIA DO DIREITO CONSTITUCIONAL DE GREVE NO

SERVIÇO PÚBLICO

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BRUNO DE CASTRO ROSA

EFICÁCIA DO DIREITO CONSTITUCIONAL DE GREVE NO

SERVIÇO PÚBLICO

Monografia apresentada como exigência parcial para a obtenção de grau de bacharel em Direito, sob a orientação do professor William Paiva Marques Júnior.

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(4)

AGRADECIMENTOS

A Deus, por conceder a oportunidade de lutar pelos meus sonhos.

À minha família, pelo amor incondicional e pelos valores de humildade, honestidade e trabalho.

Aos colegas de faculdade, protagonistas de uma frutuosa e inesquecível época, pelo divertimento, incentivo e mútuo aprendizado.

(5)

RESUMO

Esta obra irá abordar o tema da “Eficácia do direito constitucional de greve no serviço público”, analisando os dispositivos constitucionais e infraconstitucionais que conferem esse direito aos trabalhadores da iniciativa privada e os da Administração Pública. No que diz respeito à greve dos servidores públicos, o artigo 37, inciso VII, da Constituição Federal, estatui que o mesmo terá termos e limites fixados por lei específica, que até então não foi elaborada. Devido a essa omissão legislativa, alguns defendem que o dispositivo só será aplicável quando sobrevier a lei regulamentadora, isto porque esta última fixará o real conteúdo do direito. Todavia, para grande parcela da doutrina e da jurisprudência, a greve no serviço público é perfeitamente aplicável, mesmo enquanto não sobrevier a lei específica. Nesse interregno, os defensores desta corrente afirmam que a Lei n° 7.783/89 pode ser aplicada, no que for cabível. Portanto, este trabalho pretende, sobretudo, averiguar se a aplicação do direito constitucional de greve dos servidores públicos, a despeito da inexistência de lei regulamentadora, estaria a ferir os princípios continuidade do serviço público e da supremacia do interesse público, além de outras relevantes garantias formais conferidas pela própria Carta Magna.

Palavras-chave: Greve. Lei 7.783/89. Administração Pública. Lei específica.

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ABSTRACT

This work will go to approach the subject of the "Effectiveness of the constitucionalist right of strike in the public service", analyzing the constitutionalist dispositive that confer this right to the workers of the private initiative and of the Public Administration. Based on what strike of the public servers says respect, the article 37, interpolated proposition VII, of the Federal Constitution, decrees that the same will have terms and limits settled for specific law, that until then was not elaborated. According to this legislative omission, some defend that the dispositive alone will be applicable when the specific law comes, because it will fix the real content of the right. However, for great parcel of the doctrine and the jurisprudence, the strike in the public service is perfectly applicable, exactly while a specific law doesn´t happen. In this interregnum, the defenders of this opinion affirm that the Law n° 7,783/89 can be applied, in that will be appropriate. Therefore, this work intends, over all, to inquire if the application of the constitucionalist law of strike of the public servers, despite of the inexistence of regulatory law, would harm the principles of continuity of the public service and of supremacy of the public interest, beyond other important formal warranties of title conferred by the it self Great Letter.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 08

1 DO DIREITO DE GREVE ... 11

1.1 Conceito ... 11

1.2 Fundamentos e Natureza Jurídica da Greve ... 13

1.3 Evolução histórica ... 16

1.4 Greve nas Constituições brasileiras ... 18

2 GREVE E INICIATIVA PRIVADA ... 21

2.1 Greve no ordenamento jurídico de alguns países ... 21

2.1.1 Alemanha ... 21

2.1.2 Argentina ... 21

2.1.3 Espanha ... 22

2.1.4 Estados Unidos ... 22

2.1.5 França ... 23

2.1.6 Inglaterra ... 23

2.1.7 Itália ... 23

2.1.8 México ... 23

2.1.9 Portugal ... 24

2.1.10 Uruguai ... 24

2.2 Lei de Greve ... 24

2.2.1 Procedimento de greve ... 25

2.3 Negociação coletiva no setor privado ... 29

2.4 Negociação coletiva no setor público ... 30

(8)

3.1 Noção sobre Administração Pública ... 33

3.2 Princípios da Administração Pública e Direito de Greve ... 34

3.2.1 Princípio da supremacia do interesse público ... 34

3.2.2 Princípio da continuidade dos serviços públicos essenciais ... 36

3.3 Conceito de servidor público ... 38

3.3.1 Servidores militares ... 41

3.3.2 Servidores de empresas públicas e de sociedades de economia mista ... 43

4 DIREITO DE GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO ... 45

4.1 Teoria da Eficácia da norma constitucional ... 45

4.1.1 Normas de eficácia plena ... 46

4.1.2 Normas de eficácia contida ... 46

4.1.3 Normas de eficácia limitada ... 47

4.2 Aplicabilidade da Norma Constitucional ... 48

4.3 Posicionamento da jurisprudência ... 50

4.4 Competência para a regulamentação do direito de greve dos servidores públicos civis ... 54

4.5 Projetos de lei em tramitação ... 56

4.6 Críticas aos projetos ... 59

CONCLUSÃO ... 61

(9)

INTRODUÇÃO

Em toda história da humanidade, a greve pode ser considerada como uma das mais importantes formas de manifestação coletiva e um dos recursos mais eficazes, à disposição dos trabalhadores ou da população em geral, para pressionar empregadores e governos. Origina-se, normalmente, do conflito de interesses das partes contratantes envolvidas nas relações de trabalho, mas também pode ter como fatos geradores o descontentamento com as diretrizes políticas ou econômicas governamentais.

No Brasil, o direito de greve dos trabalhadores em geral está assegurado na Constituição Federal de 1988 e tem os seus delineamentos fornecidos pela Lei 7.783 de 1989. Este último instrumento normativo estabelece que a greve é a paralisação coletiva dos serviços pelos trabalhadores, sendo proibida a paralisação dos empregadores (lockout).

No que se refere a greve dos servidores públicos, o artigo 37, inciso VII, da Carta Magna, estabelece que uma lei específica definirá os termos e limites para o exercício de tal direito. Todavia, tal dispositivo ainda não foi elaborado, causando muita discussão acerca da viabilidade de movimentos paredistas na Administração Pública.

A despeito disso, durante os últimos meses, os brasileiros têm observado a eclosão de diversos movimentos de greve por todo o país. A peculiaridade de tais manifestações reside no fato de que os trabalhadores envolvidos são servidores públicos, tais como controladores de vôo, médicos da rede pública, policiais civis, dentre outros.

(10)

Contudo, enquanto não for estabelecida a lei a que se refere o inciso VII, do artigo 37, da Lei Maior, o problema ainda não estará solucionado e as cizânias doutrinárias e jurisprudenciais continuarão a existir.

A despeito do que foi exposto, persistem algumas interrogações: o direito de greve deve ser auto-aplicável no serviço público? E se o for, a Lei 7.783 de 1989 deve ser aplicada de forma subsidiária? A justificativa para este trabalho é que as questões relativas à greve no serviço público têm sido objeto de divergências e discussões, apesar do posicionamento do Pretório Excelso.

Por tudo o que foi dito, a análise do direito de greve dos servidores públicos mostra-se de fundamental importância diante do debate sobre a efetividade das normas constitucionais e sobre as conseqüências jurídicas e sociais da deflagração cotidiana de movimentos grevistas. Se por um lado o exercício ilimitado da greve atenta contra princípios da Administração Pública, por outro a sua vedação vai de encontro a um direito alçado a garantia de fundamental pela Constituição brasileira.

Para desenvolver pormenorizadamente o assunto em pauta, utilizou-se do método descritivo e documental com pesquisa bibliográfica, abrangendo, além de obras doutrinárias, artigos de periódicos científicos e excertos jurisprudenciais. Quanto aos objetivos, a pesquisa é exploratória, estabelecendo metas e buscando maiores informações sobre o tema em questão; e descritiva, descrevendo fatos, natureza, características, causas e relações com outros fatos.

Assim, no primeiro capítulo, a abordagem inicia-se pela delimitação conceitual, fundamentos e natureza jurídica do instituto, considerações sobre a origem da palavra greve e seus antecedentes históricos no Brasil.

(11)

No terceiro capítulo, faz-se breve explanação sobre Administração Pública e sobre as possíveis limitações que os servidores devem enfrentar quando do exercício concreto do direito de greve, no que tange os princípios da supremacia do interesse público e da continuidade dos serviços essenciais. Além disso, destaca-se a conceituação de servidor público, a proibição do movimento paredista dos militares e a peculiaridade quanto aos servidores de empresas públicas e de sociedades de economia mista.

Por fim, no quarto capítulo, passou-se a analisar a teoria acerca da aplicabilidade das normas constitucionais, elaborada por José Afonso da Silva, e verificar em qual das suas classificações deveria ser enquadrado o dispositivo da greve de servidores públicos. Ainda neste capítulo, expõe-se o posicionamento da jurisprudência sobre o tema, discorre-se sobre os projetos de lei específica regulamentadora da greve no serviço público e analisa-se de quem seria competência para a edição de tal lei.

(12)

1

DO DIREITO DE GREVE

1.1

Conceito

Antes de qualquer consideração que se faça sobre determinado assunto, é imperioso que se estabeleça um conceito daquilo que será explanado no decorrer de um trabalho. No que tange ao direito de greve, a sua definição é ainda mais importante, já que do próprio conceito são estabelecidos limites e fixados parâmetros para os movimentos paredistas.

A importância da determinação dos aspectos constitutivos da greve transcende a esfera de simples exercício exegético-analítico, para se refletir diretamente no direito mesmo, porque só pode ter respaldo constitucional de direito fundamental o conflito

que se conforma com os parâmetros estabelecidos pela referida definição.1

Cabe à lei estabelecer um conceito ou no mínimo as diretrizes relacionadas ao instituto, pois, a partir daí, o intérprete poderá identificar se uma greve é legal, abusiva ou se trata de outro tipo de manifestação.

A Constituição Federal de 1988 institui, em seu Título II, dos Direitos e Garantias Fundamentais, que:

Art. 9º É assegurado o direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender.

Constata-se facilmente que a Carta Magna não definiu greve, todavia garantiu o seu exercício aos obreiros, já que reconheceu a sua existência. Por outro lado, ao situar topologicamente esse mandamento em seu Título II, alçou o direito de greve à categoria de direito social fundamental.

(13)

O artigo 2o, da Lei 7.783 de 1989, estabelece que "se considera legítimo exercício do direito de greve a suspensão coletiva, temporária e pacífica total ou parcial, de prestação

pessoal de serviços ao empregador". A Lei de Greve passou a admitir, dessa forma, somente a modalidade de suspensão coletiva, relegando a existência de outras inúmeras espécies pacíficas de greve, das quais os empregados poderiam utilizar-se, causando menos prejuízos aos empregadores e sociedade. Para exemplificar, podemos citar a greve de rendimento, que consiste em imprimir ritmo lento à atividade trabalhista; a greve das funções, em que os empregados deixam de realizar alguns serviços; dentre outras. Além disso, também proibiu expressamente a greve dos empregadores, mais conhecida por locaute (lockout). De acordo com o artigo 17 da Lei de Greve (Lei 7.783-89), fica "vedada a paralisação das atividades

por iniciativa do empregador, com o objetivo de frustrar negociação ou dificultar o

atendimento de reivindicações dos respectivos empregados”.

Por outro lado, o professor Maurício Godinho Delgado leciona que a greve é toda "paralisação coletiva provisória, parcial ou total, das atividades dos trabalhadores em face de seus empregadores ou tomadores de serviços, com o objetivo de exercer-lhes pressão, visando a defesa ou conquista de interesses coletivos, ou com objetivos sociais mais amplos”. 2

Alexandre de Moraes assevera de forma concisa que “a greve pode ser definida como um direito de autodefesa que consiste na abstenção coletiva e simultânea do trabalho, organizadamente, pelos trabalhadores de um ou vários departamentos ou estabelecimentos, com o fim de defender interesses determinados”. 3

Rinaldo Guedes Rapassi conceitua a greve como:

Recusa, total ou parcial, pacífica, temporária, voluntária e coletiva de cumprir obrigações decorrentes do contrato de trabalho, decidida por empregados e pré-declarada por seu sindicato ou por assembléia geral visando à não-depreciação, à melhoria das próprias condições de trabalho ou, ainda, ao mero cumprimento, em seu próprio favor, das disposições legais ou convencionais já em vigor.4

Arnaldo Süssekind vaticina que greve:

2 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5ª- edição. São Paulo: LTr, 2.006, pág. 1412.

3 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 18ª- edição. São Paulo: Atlas, 2.005, pág. 186.

4 RAPASSI, Rinaldo Guedes. Direito de Greve de Servidores Públicos. 1ª- edição. São Paulo: LTr, 2.005, pág.

(14)

É a que constitui meio de pressão contra os empregadores ou as associações representativas de determinados empresários, para que negociem de boa-fé com os correspondentes sindicatos de trabalhadores, tendo por fim a adoção ou revisão de

condições de trabalho, por meio de convenções, contratos ou acordos coletivos.5

No que tange ao direito de greve dos servidores públicos, o inciso VII do artigo 37 da Carta Magna reconhece a sua existência, condicionando-o à lei específica.

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

(...)

VII - o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica;

No caso ora em comento trata-se de lei ordinária específica. Não é lei complementar, ao contrário do que antes vaticinava a redação do dispositivo constitucional, alterada pela Emenda Constitucional No.: 19/98.

1.2

Fundamentos e Natureza Jurídica da Greve

O primeiro fundamento da greve como direito está no princípio da liberdade de trabalho. De acordo com ele, uma pessoa não pode ser constrangida a trabalharcontra a sua vontade e em desacordo com as suas pretensões ou, do contrário, estaríamos regressando aos tempos da escravidão. Além do mais, o trabalho não se desvincula da pessoa que o presta e está intimamente ligado à personalidade. Assim, o trabalho subordinado é prestado nas sociedades modernas com base no contrato e este deve ter condições justas e razoáveis.

Dessa forma, quando surge um conflito de interesses entre empregador e empregado e não há expectativa de solução satisfatória para ambas as partes, cabe aos empregados autodefender-se. Esta autotutela pode ocorrer de duas formas: a primeira é a revolução, através da qual os empregados tomam os meios de produção. E a segunda, consiste na interrupção do trabalho ou a mera agitação do processo de produção; meios menos drásticos, porém causadores de estragos. A greve, portanto, apresenta-se como instituto para frear as disparidades entre o patronato e o empregado. Entretanto, não se deve olvidar que o movimento paredista abre grandes possibilidades de sacrifício de direitos humanos individuais, tais como o direito à vida, à saúde ou à segurança das pessoas. Deste confronto de

5 SÜSSEKIND, Arnaldo. Curso de Direito do Trabalho

(15)

direitos, tiramos a conclusão de que devem prevalecer os últimos sobre os direitos coletivos e sociais.

Portanto, a principal finalidade do instituto da greve, não é proteger uma parte em detrimento dos direitos legítimos da outra, mas sim, reduzir as disparidades de condições, de modo a garantir o melhor alcance da justiça.

A natureza jurídica do direito de greve é uma matéria que ainda gera muita controvérsia entre doutrinadores de todo o Mundo. No Brasil, prevalece o entendimento de que a natureza jurídica da greve é de um direito. Todavia, ainda há muita discussão sobre que tipo de direito corresponde a greve.

A greve como fato social corresponde ao ideal de que a sua própria natureza impediria a

sua regulação ou restrição pela ordem jurídica vigente. Essa inibição decorreria, principalmente, da incompatibilidade da força coativa da greve com o Estado de direito, detentor dos meios de solução de conflitos. Tal entendimento não levou em conta que cabe ao Direito constatar os fatos que se tornam relevantes para sociedade e reconhecê-los juridicamente.

Além disso, alguns observam a greve como um exercício de liberdade. Essa concepção

nasceu a partir do afastamento dos mecanismos jurídicos do Direito Penal que a tipificava como delito pelo Estado Liberal, na época da Revolução Industrial. De acordo com essa corrente, o movimento paredista seria uma manifestação de liberdade humana e, dessa forma, não poderia ser restringida pelo Direito. Tal argumentação não deve prosperar, já que não há liberdade absoluta na sociedade e, ademais, regulação do instituto é a única forma de torná-lo viável e eficaz.

Alguns autores defendem a tese de que a greve seria um direito potestativo e, como tal,

(16)

limitado por regras ou princípios que a ele se objetam. Nos dizeres de Rinaldo Guedes Rapassi:

Paralelamente, é preciso ter presente a coexistência de outros valores, igualmente protegidos pelo Estado democrático de direito, conforme dispõe o art. 1º da Constituição da República. Como o outro lado da mesma moeda, a noção de responsabilidade contrapõe-se à idéia de direito potestativo. Daí o fundamento para as limitações ao direito de greve.6

Uma parcela da doutrina defende a idéia de que a greve corresponde a um direito de

igualdade, já que o movimento paredista se apresenta como um nivelador dos poderes dos

trabalhadores e dos empresários.

Para os que acreditam na tese de direito instrumental, a greve seria um mecanismo

utilizado pelos trabalhadores para a consecução de suas reivindicações perante os donos dos meios de produção. Não se pode negar o caráter instrumental da greve, porém a sua natureza jurídica não pode ser reduzida a esse aspecto.

A idéia de superdireito assevera que a greve além de ser um meio coercitivo de pressão

e fazer-se prevalecer sobre direitos diversos, também é um movimento social que, em determinados momentos, pode modificar o ordenamento jurídico vigente. Todavia, como já foi exposto, foram estabelecidas várias limitações ao direito de greve, ideal antagonicamente oposto à tese de superdireito.

Para Arion Sayão Romita a greve é interpretada como sendo um direito fundamental de solidariedade e trata-se de um direito de luta e instrumental na busca de mais justas posições econômicas e sociais:

A licitude da greve não depende da existência de um interesse direto dos trabalhadores que a promovem. A greve é meio de luta e portanto, o direito de greve é instrumental. A greve é um meio para um fim: a superação das desigualdades materiais ou a remoção dos obstáculos que impedem a igualdade substancial (não meramente formal) dos indivíduos e dos grupos a que pertencem. O direito de greve é protegido não como instrumento para a conquista do poder político, porém para a conquista de mais justas posições econômicas e sociais. O interesse dos trabalhadores não precisa ser, portanto, diretamente ligado à reivindicação que motivou a greve. Interesse direto ou mediato sempre existirá, pois a violação do direito de um grupo diz respeito a outro, que dele poderá beneficiar-se no futuro. É falsa, portanto, a noção de que só interesse direto deve ser considerado, ante o

6 RAPASSI, Rinaldo Guedes. Direito de Greve de Servidores Públicos. 1ª- edição. São Paulo: LTr, 2.005, pág.

(17)

princípio de solidariedade que historicamente une os trabalhadores. 7

Por último, a idéia que prevalece entre a doutrina é a de direito fundamental de

caráter coletivo. Tal corrente de pensamento parte do pressuposto de que o direito de greve é

o resultado da liberdade de trabalho, das liberdades de associação e sindical e da autonomia dos sindicatos. Mauricio Godinho Delgado vaticina que:

Todos esses fundamentos, que agregam no fenômeno grevista, embora preservando suas particularidades, conferem a esse direito um status de essencialidade nas ordens

jurídicas contemporâneas. Por isso é direito fundamental nas democracias. 8

Neste jaez, preleciona Alice Monteiro de Barros: “A natureza jurídica da greve é a de

um direito coletivo, sendo, no passado, reconhecida como um direito individual, de exercício

coletivo”.9

1.3

Evolução histórica

Com o intuito de compreender o sentido e a extensão do direito de greve, nos dias de hoje, torna-se fundamental a pesquisa de como esse instituto vem se apresentando para a Humanidade, no transcorrer do tempo. Utilizando-se da interpretação histórica, podemos perquirir o sentido de uma lei mediante a análise do seu conteúdo original, levando-se em conta os aspectos histórico, econômico, social e político que envolveram o processo legislativo.

O termo “greve”, de acordo com Rinaldo Guedes Rapassi, vem do latim grava, que significa praia de areia. Ao final do século XIX, na famosa praça parisiense, Place de Grève, reuniam-se desempregados e trabalhadores que paralisavam as suas atividades para reivindicar direitos e melhores condições de trabalho. Tal praça, na verdade, era um areal às margens do rio Sena, local onde hoje se localiza a Prefeitura de Paris.

7 ROMITA, Arion Sayão.

Direitos Fundamentais nas Relações de Trabalho. 2ª- edição. São Paulo: LTR,

2.007, pág. 357.

8 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 5ª- edição. São Paulo: LTr, 2.006, pág. 1434.

9 BARROS, Alice Monteiro de.

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Todavia, para a maior parte da doutrina, a origem do termo greve deve-se ao fato de que como a praça supramencionada ficava próxima ao rio Sena, e lá se acumulavam gravetos (de onde surgiu o nome Grève), trazidos pelas enchentes.

Por outro lado, se a origem do vocábulo é relativamente recente, o fenômeno grevista não o é. Os primórdios do direito de greve ocorreram na Idade Antiga, já que há registros de paralisações coletivas de escravos, na Babilônia, no antigo Egito e em Roma. No Egito, durante o Reinado de Ramsés III, trabalhadores pararam as obras na tumba do faraó, para protestar contra irregularidades na remuneração e contra o tratamento recebido por eles no ambiente de trabalho. Tais piquetes não poderiam ser considerados como greves, já que, na maior parte das vezes, eram manifestações de escravos.

Durante a Idade Média, com o feudalismo, não se admitia o instituto da greve, já que os trabalhadores (servos) não eram muito mais livres do que os escravos. Dessa forma, quando algum camponês se insurgia e paralisava suas atividades, imediatamente sofria represálias físicas e até mesmo a morte, por imposição do senhor feudal.

Ao final da Idade Média, os trabalhadores livres começaram a se organizar em corporações de ofício. Tais associações, que podem ser consideradas espécies de sindicatos primitivos, reuniam comerciantes, artesãos e outros operários. Estas agremiações eram estruturas socialmente fechadas e compostas por um mestre, seus companheiros e aprendizes. Os mestres eram responsáveis pela admissão de novos aprendizes, pelo controle e representação da corporação. Tal fato gerava descontentamento por parte dos companheiros, que passaram a se reunir em grupos (compagnonnages), para reivindicar perante os mestres.

(19)

Quanto a Revolução Industrial, vale ressaltar diversos fatores que desencadearam tal movimento, senão vejamos: as cidades tornaram-se áreas livres de impostos e do controle dos senhores feudais. Além disso, vivenciava-se uma expansão tecnológica, quanto aos meios de produção. E, por último, o crescimento vegetativo da população em níveis jamais vistos, aliava-se à migração de antigos servos que abandonavam o campo e formavam um grande exército de mão-de-obra industrial, nas cidades.

Dessa forma, apesar de os detentores dos meios de produção obterem lucros extraordinários com as indústrias, as condições de trabalho e de vida dos operários eram as piores possíveis, já que a jornada de trabalho tomava a maior parte do dia, os salários eram baixíssimos e as fábricas não forneciam as mínimas condições de segurança para os obreiros, sendo normalmente ambientes insalubres. A junção desses fatores fez surgir diversos movimentos trabalhistas, dentre os quais a greve apresentava-se como o mais freqüente.

1.4

Greve nas Constituições brasileiras

No Brasil, a greve remonta aos últimos anos do século XIX e está vinculada ao processo de transformação de nossa economia, antes baseada no setor agrícola. Dentre os fatores que desencadearam essa mudança, podemos enumerar: a substituição do trabalho escravo pelo trabalho assalariado; transferência do lucro do café para a indústria; e a perda do poder político dos cafeicultores.

Com o desenvolvimento industrial, os trabalhadores livres (operários e rurícolas) passaram a se unir e reivindicar direitos junto aos seus empregadores, tendo como primeiras formas de organização: as sociedades de socorro e ajuda mútua e as uniões operárias, que com o advento da indústria passaram a se organizar por ramo de atividade dando origem aos sindicatos.

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A Carta Imperial de 1824, não se manifestou quanto ao direito de greve, todavia já deu os primeiros sinais de amparo aos trabalhadores, na medida em que estabelecia o aviso prévio, a indenização na rescisão injusta, salário de três meses nos acidentes sem culpa. Além disso, previa a segurança e a saúde dos operários em seu ambiente de trabalho e aboliu as corporações de ofício.

O Código Penal de 1890 (Decreto nº 847) instituiu como ilícito criminal a greve, assim como todos os atos relacionados a ela, punindo-os com reclusão de um a três meses. Contudo, ainda em 1890, houve a sua descriminalização, mantendo-se apenas a criminalização dos atos de ameaça, constrangimento e violência praticados no ínterim de movimento paredista.

A Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 1891, a exemplo da carta de 1824, também garantia o direito de associação e de reunião a todos os cidadãos. Durante a vigência desta Carta Constitucional foram editadas algumas leis, dentre as quais o Código Civil de 1916 que definiu trabalho como locação de serviços, a Lei nº 979 de 1903, que dispôs sobre a sindicalização dos empregados da indústria e os da agricultura. Ressalte-se que, em 1930, criou-se o Ministério do Trabalho.

Em 16 de julho de 1934, foi promulgada a nova Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil. Trata-se da primeira Carta Magna a introduzir, em seu bojo, regras para as atividades sindicais e os direitos trabalhistas, reconhecendo a autonomia sindical. Além disso, criou a Justiça do Trabalho, completamente apartada do Poder Judiciário. Contudo, nada dispôs sobre o direito de greve.

A Constituição de 1937, mais conhecida como Polaca, foi outorgada por Getúlio Vargas, no período ditatorial do Estado Novo. Foi inspirada nas Constituições portuguesa (1933), na polonesa (1935), de onde vem o seu apelido. A greve foi declarada instrumento anti-social, prejudicial ao trabalho e ao capital e conflitante com o sistema produtivo nacional. Dessa forma, alguns dispositivos infra-constitucionais passaram a proibir e criminalizar a greve, como, por exemplo, a Lei de Segurança Nacional e o Código Penal de 1940.

(21)

Del Lavoro, italiana e de orientação fascista. Através do Ministério do Trabalho, o Governo interferia diretamente na organização do sindicato e no seu modo de atuação. Quanto à greve, regulou de forma rígida, tornando-a quase que impraticável.

A Constituição Federal de 1946 assegurou o direito de greve, sendo regulamentado por legislação infra-constitucional. Em 15 de março do mesmo ano, o Marechal Dutra estabeleceu o Decreto-lei nº 9.070, que definiu greve e liberou-a nas atividades acessórias.

No início do período da ditadura militar, passou a vigorar a Lei de Greve (Lei nº 4.330 de 1964). Através deste instrumento, condicionava-se o exercício do direito de greve de forma exacerbada e praticamente tornava inviável o procedimento paredista. Por exemplo, para que uma greve fosse considerada ilegal ela bastaria:

a) não observar os prazos e condições estabelecidos na referida lei;

b) ter por objeto reivindicações julgadas improcedentes pela Justiça do Trabalho, em decisão definitiva, há menos de um ano;

c) ser deflagrada por motivos políticos, partidários, religiosos, morais, de solidariedade ou quaisquer outros que não tivessem relação com a própria categoria diretamente interessada;

d) visar a revisão de norma coletiva, salvo se as condições pactuadas tivessem sido substancialmente modificadas (rebus sic stantibus).

A Constituição de 1967 estabeleceu o direito de greve aos trabalhadores, em seu artigo 158, XXI, combinado com o art. 157, § 7º, proibindo-a, todavia, quanto aos serviços públicos e às atividades essenciais, que seriam definidas por lei.

(22)

2

GREVE E INICIATIVA PRIVADA

2.1

Greve no ordenamento jurídico de alguns países

A greve é um instituto que está presente no ordenamento jurídico de grande parte dos países do mundo. Porém, existem muitas diferenças quanto ao modo de aplicação, havendo variações de país para país. Para efeito de comparação, faz-se necessário tecer breves comentários sobre o direito de greve em alguns países da América do Sul, da América do Norte e da Europa.

2.1.1 Alemanha

A Alemanha tem uma folha de pagamento com cerca de cinco milhões de servidores públicos. O ordenamento jurídico estipula todos os detalhes da relação de trabalho, além de permitir que, a qualquer tempo, possa o Legislativo modificá-los, inclusive, restringindo direito dos servidores, ou seja, pode reduzir as remunerações e ampliar a jornada de trabalho.

Quanto ao direito de greve, a Constituição alemã silencia, mas garante o direito de associação. O Estado mantém-se neutro e são os próprios sindicatos que fixam regras específicas sobre o exercício deste direito nas atividades essenciais. Cabe à Justiça Federal do Trabalho definir as condições de licitude da greve, sendo que o movimento paredista só pode ser deflagrado após exauridas todas as tentativas de autocomposição. Naquele país, as greves são acontecimentos raros, já que o seu sistema de trabalho caracteriza-se mais pela colaboração do que pelo conflito. Talvez, por isso, o legislador constitucional tenha se omitido, quanto à greve.

2.1.2 Argentina

(23)

legislação infraconstitucional. O exercício do direito de greve nas chamadas atividades essenciais é limitado e deve-se estipular em convenção coletiva a respeito da prestação de serviços mínimos à comunidade. Além disso, faz-se necessário comunicar, com antecedência de pelo menos cinco dias, o início da paralisação à autoridade do Ministério do Trabalho.

2.1.3 Espanha

O artigo 28 da Constituição espanhola reconhece o direito de greve aos trabalhadores de forma bastante semelhante ao artigo 9º da Constituição brasileira, in verbis:

Se reconece el derecho a la huelga de los trabajadores para la defensa de sus intereses. La ley que regule el ejercicio de este derecho estabelecerá las garantías precisas para asegurar el mantenimiento de los servicio essenciales de la

comunidad.10

O direito de greve dos servidores públicos é garantido, mas é proibido para os membros das Forças Armadas e dos corpos de segurança, de acordo com a legislação infraconstitucional. Além disso, o Código Penal considera delituosa a prática de greve de servidores públicos de atividades caráter inadiável.

2.1.4 Estados Unidos

A Constituição norte-america não traz, em seu bojo, nenhuma disposição a respeito de direito dos trabalhadores, inclusive o de greve. A Lei Taft-Hartley (1947), modificada pela Lei Landrum Griffin (1959), proíbe a greve dos seus quase três milhões servidores públicos federais, sob pena de demissão e impedimento para voltar ao serviço.

Além disso, o ordenamento de 40 Estados e o do Distrito de Colúmbia (DF) veda o movimento grevista de funcionários públicos das áreas de segurança e saúde.

Vale ressaltar que o sindicato que congregar o maior número de trabalhadores da empresa ou de sua atividade fica responsável pelo movimento paredista.

10 Constituição Espanhola Disponível em:

(24)

2.1.5 França

A Constituição francesa, em seu preâmbulo, faz menção ao direito de greve, cujo exercício é estabelecido por leis, regulamentos e tem limites fixados pela jurisprudência. De acordo com o Código do Trabalho francês, um aviso prévio de paralisação precisa ser apresentado, por um ou vários sindicatos, com pelo menos cinco dias úteis de antecedência, especificando as razões, o local, a data e a hora de início do protesto e uma previsão de duração do movimento de grevista.

Quanto ao direito de greve dos servidores públicos, é assegurado ao pessoal das empresas públicas e das empresas encarregadas do serviço público. Todavia, também é exigido aviso prévio de cinco dias. Os servidores das Forças Armadas, policiais e magistrados são proibidos de entrarem em greve.

2.1.6 Inglaterra

O Trade Unions Act, de 1871, garante a liberdade de associação e, conseqüentemente, fica assegurado o direito de greve.

2.1.7 Itália

A Carta Magna italiana estabelece o direito de greve, nos termos da legislação ordinária, permitindo-a, com certas limitações, no serviço público. A Lei n° 146 de 1990 trata da greve nos serviços públicos essenciais e apresenta um rol, na opinião de alguns críticos, considerado contrário às deliberações do Comitê de Liberdade Sindical da OIT. Fica estabelecido que os grevistas devem avisar com, no mínimo, 10 dias de antecedência a deflagração do movimento paredista.

2.1.8 México

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Quanto ao direito de greve no serviço público, é assegurado desde que haja aviso prévio de, no mínimo, 10 dias à Junta de Conciliação e Arbitragem.

2.1.9 Portugal

A Constituição portuguesa reconhece o direito de greve e assevera que compete aos trabalhadores definir os interesses que serão defendidos e o seu âmbito. De forma semelhante ao que ocorre aqui, a prática do lockout é proibida.

No âmbito da Administração Pública, é garantido o direito de greve aos exercentes de funções públicas, ressalvados os integrantes “de forças militares e militarizadas”, de acordo com legislação infraconstitucional.

Nas atividades consideradas essenciais, é obrigatório o funcionamento dos serviços mínimos e, caso não haja voluntariedade dos grevistas para assegurar o atendimento mínimo à população, abre-se a possibilidade de requisição civil de trabalhadores, mediante Portaria, na qual é indicada a duração do movimento, a autoridade responsável pela sua execução e o regime de trabalho.

2.1.10 Uruguai

Neste país, a greve é um direito sindical, compete ao Ministério do Trabalho disciplinar os serviços essenciais que deverão ser assegurados durante o movimento paredista.

2.2

Lei de Greve

No Brasil, como já afirmamos, o direito de greve é assegurado constitucionalmente aos trabalhadores (art. 9º da Constituição Federal de 1988). Contudo, tal direito não é absoluto, já que o interesse público deve se impor ao interesse coletivo da categoria.

Por outro lado, o §1º do artigo 9º, da mesma Constituição dispõe: §1º. "A lei definirá os

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comunidade". Nota-se que este parágrafo, condiciona o exercício do direito de greve em serviços ou atividades essenciais ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade. Assim, deve-se entender que, nessas atividades, um mínimo de serviços tem de continuar em funcionamento, a fim de possibilitar o atendimento de necessidades essenciais.

O direito de greve previsto na atual Constituição foi regulamentado pela Lei nº 7.783, de 28.6.89, que, além de definir os serviços ou atividades essenciais e proibir a paralisação dos serviços cuja cessação pode pôr em risco a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população; também estabeleceu requisitos e tomou diversas providências para o exercício do direito de greve.

A Lei de Greve deveria reger apenas o setor privado, porém é aplicável aos empregados que laboram no âmbito das empresas públicas, das sociedades de economia mista e de outras entidades que explorem a atividade econômica, por força do inciso II, do § 1º do artigo 173 da Constituição Federal. In verbis:

Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários;

2.2.1 Procedimento de greve

Segundo o art. 3º da Lei de Greve, a deflagração da greve está condicionada ao insucesso das negociações realizadas com o objetivo de obter a celebração da Convenção ou Acordo Coletivo de Trabalho, como também se verificada a impossibilidade de arbitragem. Dessa forma, uma prévia tentativa de negociação coletiva é requisito para deflagração do movimento grevista.

(27)

deliberação, deverão constar dos estatutos do sindicato. Na falta de entidade sindical, a assembléia será entre os trabalhadores interessados, que constituirão uma comissão para representá-los, inclusive se for o caso, perante a Justiça do Trabalho.

Em seguida, deve-se notificar ao empregador ou aos empregadores diretamente interessados, com antecedência mínima de 48 horas, ampliadas para 72 horas nas atividades essenciais. Nestas últimas, é obrigatório o anúncio da greve para conhecimento dos usuários com a mesma antecedência. Dessa forma, a lei nº 7.783 de 1989 deixa claro que é ilícita a greve surpresa, prática que era bastante comum, em nossa história recente.

Já durante o transcurso da greve, são assegurados aos grevistas: o emprego de meios pacíficos de persuasão a adesão ao movimento; a arrecadação de fundos, bem como, a livre divulgação do movimento. As empresas são impedidas de frustrar a divulgação do movimento, assim como, adotar meios de coação para o empregado a comparecer ao trabalho. Os grevistas não podem vedar o acesso ao trabalho daqueles que quiserem fazê-lo. Ainda, é vedada a rescisão do contrato de trabalho, bem como a contratação de trabalhadores substitutos, a não ser que greve seja considerada abusiva, nos termos da lei.

O exercício, mesmo que legítimo, do direito de greve pelo trabalhador suspende o seu contrato de trabalho, em todos os seus efeitos. Dessa forma, os salários e demais obrigações trabalhistas relativas ao período de paralisação devem ser regidos por acordo, convenção, laudo arbitral ou decisão da Justiça do Trabalho e, dependendo das negociações, há a possibilidade da transformação de suspensão em interrupção contratual (hipótese em que, embora não tenha havido prestação de serviços, há obrigações por parte do empregador).

Da combinação dos artigos 8º e 14 da Lei nº 7.783 de 1989 depreende-se que a Justiça do Trabalho, por iniciativa de qualquer das partes ou do Ministério Público do Trabalho, ao julgar o dissídio coletivo, decidirá sobre a legalidade ou ilegalidade da greve, sem prejuízo de exame do mérito das reivindicações, com o respaldo da Súmula 189 do Tribunal Superior do Trabalho11. Caso seja declarada a ilegalidade, cabe ao julgador determinar o retorno imediato dos grevistas ao trabalho.

(28)

Além disso, também compete à Justiça obreira deliberar sobre a cessação da greve, se antes não resolvida por conciliação das partes ou por iniciativa da entidade sindical. No que concerne à competência da Justiça do Trabalho para o processo e julgamento das ações que envolvam o direito de greve, colacionamos o escólio de Carlos Henrique Bezerra Leite que delimita a aplicabilidade do art. 114, inciso II (incluído pela EC No.: 45/2.004):

Com a promulgação da EC 45/2.004, que acrescentou o inciso II ao art. 114 da CF, houve, a nosso ver, uma recepção qualificada do referido art. 8º- da Lei No.: 7.783/89, para a Justiça do Trabalho processar e julgar as ações de greve oriundas da relação de emprego, abrangidos os servidores públicos regidos pela CLT, bem como os contratados temporariamente para atendimento a necessidades transitórias de excepcional interesse público (art. 37, IX). No tocante aos servidores contratados temporariamente, para fixar a competência da Justiça Especializada é preciso que a demanda de greve mencione que o regime de trabalho é o celetista ou que se trata de nulidade da contratação por violação ao art. 37, II, §2º-, da CF, ou seja, que se

trata de contrato de emprego rotulado de contrato administrativo. 12

Na hipótese de paralisação de serviços ou atividades de que possa resultar prejuízo irreparável pela deterioração irreversível de bens, máquinas e equipamentos, bem como daqueles essenciais à retomada das atividades da empresa quando da cessação do movimento devem ser mantidas em atividade equipes com o propósito de assegurar a manutenção de tais serviços, mediante negociação entre as partes. Caso o sindicato ou a comissão de negociação recusem tal acerto, o empregador poderá contratar tais serviços diretamente, enquanto durar o movimento paredista.

A Lei de Greve também obriga os sindicatos, os trabalhadores e os empregadores a garantirem, no decorrer da greve, a prestação de serviços indispensáveis ao atendimento das atividades inadiáveis à comunidade. Tais atividades são aquelas que, não atendidas, coloquem em risco iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população; e na hipótese de inobservância dessa determinação, estará caracterizado o abuso do direito de greve, cabendo ao Poder Público assegurar a prestação dos serviços indispensáveis.13

Quanto aos serviços ou atividades essenciais, a que se refere o artigo 11 da Lei de Greve, o artigo anterior estabelece-os como sendo: tratamento e abastecimento de água;

12 LEITE, Carlos Henrique Bezerra.

Curso de Direito Processual do Trabalho. 4ª- edição. São Paulo: LTR, 2.006, pág. 206.

13 Vale ressaltar que, neste caso, a Lei 7.783/89 não estabeleceu o modo como o poder público assegurará esta

(29)

produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; assistência médica e hospitalar; distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos; funerários; transporte coletivo; captação e tratamento de esgoto e lixo; telecomunicações; guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares; processamento de dados ligados a serviços essenciais; controle de tráfego aéreo e compensação bancária.

Por outro lado, a responsabilidade civil pelos danos materiais causados durante o movimento é uma das formas de reparação do abuso de direito praticado pelo sindicato, e a dispensa por justa causa é a sanção maior a que está sujeito o trabalhador pelos excessos que praticar.

A Lei 7.783 de 1989 proíbe o lockout, em seu artigo 17, quando estabelece que "fica vedada a paralisação das atividades, por iniciativa do empregador, com o objetivo de frustrar negociação ou dificultar o atendimento de reivindicações dos respectivos empregados". Vale ressaltar que o simples fechamento da instalação não deve ser considerado locaute, já que tal cessação das atividades da empresa deve ser uma forma de pressionar os empregados.

É louvável o reconhecimento, pela Lei de Greve, de que a prática do lockout constitui-se em conduta marcadamente anti-sindical, atentatória aos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.

Por último, quanto ao servidor público civil da Administração direta, autárquica e fundacional, fica estabelecido que:

Para os fins previstos no art. 37, VII, da Constituição, lei complementar definirá os

termos e os limites em que o direito de greve poderá ser exercido.14

Faz-se necessário tecer alguns comentários. Em primeiro lugar, após a Emenda Constitucional nº 19 de 1998, a Constituição estabelece que uma lei específica (ordinária) definirá os termos e limites da greve dos servidores públicos civis. Além disso, como afirmado anteriormente, a Lei de Greve é aplicável aos empregados públicos das empresas públicas, das sociedades de economia mista e de outras entidades que explorem a atividade econômica, por força do inciso II, do § 1º do artigo 173 da Constituição Federal.

(30)

2.3

Negociação Coletiva no setor privado

Como vimos anteriormente, a Lei 7.783 de 1989 condiciona o movimento grevista a uma prévia tentativa de negociação coletiva, sendo requisito para deflagração do movimento grevista. Daí a relevância deste tema para o nosso estudo.

O artigo 114 da Constituição Federal de 1988, com nova redação dada pela Emenda Constitucional nº. 45/2004, estabelece que as empresas paralisadas e os respectivos sindicatos de trabalhadores são legitimados para ajuizarem o chamado Dissídio Coletivo de Greve perante a Justiça do Trabalho, postulando a respectiva prestação jurisdicional.

De acordo com inciso II do supracitado artigo constitucional, “compete à Justiça do Trabalho processar e julgar ações que envolvam exercício do direito de greve”. Por seu turno, o § 3° do artigo 114 preceitua que em caso de greve em atividade essencial, com possibilidade de lesão do interesse público, o Ministério Público do Trabalho poderá ajuizar dissídio coletivo, competindo à Justiça do Trabalho julgar o conflito.

Apesar da clareza de tal mandamento, alguns doutrinadores sustentam que a Justiça do Trabalho não pode examinar a ação relativa à greve, em primeiro lugar, porque o art. 114, § 3º da Constituição Federal teria restringido a titularidade do dissídio coletivo de greve ao Ministério Público do Trabalho no caso de ela ocorrer em atividade considerada essencial à sociedade. Além disso, o art. 114, § 2º da Constituição Federal, exige que haja comum acordo

para o ajuizamento de um dissídio coletivo, ou seja, caso não se chegue a um acordo entre as partes, não poderá ser ajuizado esse dissídio coletivo de greve pela empresa de setor não-essencial ou pelo sindicato de seus empregados.

(31)

Além do mais, o próprio caput e inciso II do artigo 114 estabelecem, claramente, que a Justiça do Trabalho terá a competência material para julgar as ações em geral que envolvam o exercício do direito de greve. Observa-se que a Carta Magna não faz nenhuma restrição quanto a essencialidade dos serviços envolvidos no movimento paredista.

Por último, vale ressaltar que, como o artigo 114, inciso II, estatui a competência da Justiça obreira para julgar todas as ações relativas ao exercício de greve sem fazer qualquer tipo de distinção, não poderia o seu § 3º ser aplicado de forma alterar ou restringir o contido no "caput" do artigo, de acordo com as regras básicas para interpretação.

2.4

Negociação Coletiva no setor público

Conforme já observado, o artigo 37, inciso VII da Constituição Federal de 1988 garantiu o direito de greve aos servidores públicos, de uma forma geral. No entanto, o §3º do artigo 39 não reconheceu o direito de os servidores públicos firmarem acordos ou convenções coletivos. In verbis:

Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes.

(...)

§ 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII, XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(...)

XXVI - reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho;

Dessa forma, proibiu-se tacitamente a negociação coletiva. Tal proibição, entretanto,

não vale para os servidores das empresas públicas e sociedades de economia mista. Nas palavras de Rinaldo Guedes Rapassi, “se a demonstração de insucesso em negociação coletiva tendente ao acordo ou convenção coletiva figura como condição da ação (CR/88, art. 114, §§1º e 2º), o dissídio coletivo igualmente não foi facultado ao servidor público latu sensu”.15

15 RAPASSI, Rinaldo Guedes. Direito de Greve de Servidores Públicos. 1ª- edição. São Paulo: LTr, 2.005, pág.

(32)

Tal entendimento pode ser motivado pelo fato de que cabe somente à Administração Pública dirigir as relações de trabalho para com os seus funcionários públicos, fixando as condições de exercício e não podendo discuti-las.

Além do mais, como normalmente os trabalhadores reivindicam questões salariais, a Constituição resolveu impedir a negociação coletiva, porque a concessão de qualquer vantagem pecuniária ou de aumento salarial só pode ser estabelecida através de autorização específica na lei de diretrizes orçamentária, prévia dotação orçamentária e não pode exceder os limites fixados pela Lei de Responsabilidade Fiscal.16

Primeiramente, o Supremo Tribunal Federal, em julgamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade17, entendeu que não cabia a negociação coletiva aos servidores públicos civis, revogando-se as alíneas “d” e “e” do artigo 240 da Lei 8.112 de 1990. Em momento posterior, o Tribunal Excelsior aprovou a Súmula nº 679: “A fixação de vencimentos dos servidores públicos não pode ser objeto de convenção coletiva”.

Vale destacar que, a Orientação Jurisprudencial n. 05 da Seção de Dissídios Coletivos do Tribunal Superior do Trabalho, conforme o entendimento mais restritivo do STF, estabelece que:

DISSIDIO COLETIVO CONTRA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA. Aos servidores públicos não foi assegurado o direito ao reconhecimento de acordos e convenções coletivas de trabalho, pelo que, por conseguinte, também não se lhes é facultada a via do dissídio coletivo, à falta de previsão legal.

De acordo com o regramento jurídico nacional, constata-se a inviabilidade da negociação coletiva de servidores públicos, no que se refere a sua remuneração. Todavia, não há como se negar a existência de dissídios coletivos de natureza jurídica, no sentido de se interpretar cláusulas ou normas de índole coletiva, levando-se em conta os princípios básicos da Administração Pública.

16 Tais requisitos decorrem da literatura dos artigos 37,

caput, incisos X, XI, XII, XIII; 39, §1º; 61, §1º, inciso II,

alínea a; 169, §1º, incisos I e II, todos da Constituição Federal de 1988 e artigos 18 e 19 da Lei Complementar nº

101/2001.

17 ADIn – 492, Relator Ministro Carlos Velloso, Órgão Julgador: Plenário, DJ: 12/11/1992, DJU de 12/03/1993,

(33)

Em face do que foi exposto, duas correntes doutrinárias manifestam-se de forma diversa acerca do tema. Alguns doutrinadores sustentam a total impossibilidade jurídica da negociação coletiva no setor público, tendo em vista os princípios e regras precípuas da Administração Pública, em especial, o princípio da legalidade.

A orientação jurisprudencial do Pretório Excelso18 está no sentido de que aos servidores públicos não se aplicam os acordos e as convenções coletivas de trabalho, posto que em sede de Direito Administrativo vigora o princípio da legalidade, não podendo prevalecer o convencionado sobre o legislado, conforme ocorre no Direito Privado, em especial no Direito do Trabalho.

A segunda corrente afirma que há possibilidade de negociação coletiva dentro de certos limites. Para esses doutrinadores, a negociação coletiva no setor público seria possível, já que a omissão do artigo 39 em relação ao inciso XXVI do artigo 7º, ambos da Constituição Federal, não deveria ser tão relevante ao ponto de impedir gozo desse direito pelos servidores públicos. Se assim fosse, seria uma incoerência paradoxal a admissão da sindicalização do servidor público e do direito de greve, sem o reconhecimento do direito à negociação coletiva.

O Supremo Tribunal Federal, em decisões recentes19, firmou entendimento no sentido de conceder efetividade ao artigo 37, inciso VII da Constituição Federal, aplicando-se a Lei 7.783/1989, subsidiariamente, até que seja produzida lei regulamentadora da greve no serviço público.

18 Neste sentido preleciona o STF: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ART. 272, § 2º, DA

LEI COMPLEMENTAR N. 4 DO ESTADO DO MATO GROSSO. SERVIDORES PÚBLICOS. ACORDOS E CONVENÇÕES COLETIVAS DE TRABALHO. VIOLAÇÃO DO ART. 61, § 1º, II, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. 1. A celebração de convenções e acordos coletivos de trabalho consubstancia direito reservado exclusivamente aos trabalhadores da iniciativa privada. A negociação coletiva demanda a existência de partes formalmente detentoras de ampla autonomia negocial, o que não se realiza no plano da relação estatutária. 2. A Administração Pública é vinculada pelo princípio da legalidade. A atribuição de vantagens aos servidores somente pode ser concedida a partir de projeto de lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo, consoante dispõe o art. 61, § 1º, inciso II, alíneas "a" e "c", da Constituição, desde que supervenientemente aprovado pelo Poder Legislativo. Precedentes. Pedido julgado procedente para declarar inconstitucional o § 2º, do artigo 272, da Lei Complementar n. 4, de 15 de outubro de 1990, do Estado do Mato Grosso”. (ADIN No.: 554/MT, Relator: Min. Eros Grau, julgamento: 15/02/2.006. Fonte: DJ 05.05.2.006, pág. 17).

19 MI 670, MI 708 E MI 712 julgados no dia 25 de outubro de 2007. Disponíveis em:

(34)

3

GREVE E ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

3.1

Noção sobre Administração Pública

Diversas são as versões ligadas ao surgimento da palavra administração. Uma primeira tese afirma que o vocábulo seria formado da junção de ad (preposição do latim) com

ministro, as, are (verbo), significando servir, executar. Para outra corrente, a palavra seria

originária da expressão ad manus trahere, que passa a imagem de comando, orientação,

chefia ou gestão. Percebe-se que, em ambas as teses, há uma idéia de hierarquia, subordinação e dinamismo.

No que diz respeito à expressão Administração Pública, Diógenes Gasparini, seguindo orientação de Hely Lopes Meirelles, faz importante distinção ao afirmar que “se grafada com minúsculas (administração pública), indica atividade administrativa ou função administrativa; se registrada em maiúsculas (Administração Pública), significa Estado”.20

Por outro lado, a doutrina aponta dois aspectos diferenciados para classificar a expressão: sob o ponto de vista subjetivo, formal ou orgânico, pode ser definida como

conjunto de órgãos, pessoas jurídicas e agentes públicos responsáveis legalmente pela função administrativa do Estado. De acordo com o critério material, objetivo ou funcional, a

expressão significa a própria atuação dos entes referidos, sob o controle legal, com a finalidade de atender as necessidades coletivas.

Por seu turno, a Administração Pública divide-se em: Administração Direta, que é

composta pelas entidades estatais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, com personalidade jurídica de Direito Público Interno e atuando de forma centralizada. Já a

Administração Indireta, composta por pessoas jurídicas que exercem a função

administrativa de forma descentralizada, ou seja, exercem algumas funções que deveriam ser

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desempenhadas pelos órgãos da Administração Direta. As autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista são exemplos de entidades da Administração Indireta. É de ressaltar que a Administração Pública Indireta compõe-se de pessoas jurídicas de direito público ou de direito privado, estabelecidas por lei para o exercício de atividades administrativas ou para a prestação de serviços públicos.

3.2

Princípios da Administração Pública e Direito de Greve

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, estabelece que a Administração Pública, tanto a direta como a indireta, será regida pelos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.21 No entanto, além dos princípios expressos, a Administração Pública é orientada por outros princípios tão relevantes quanto os primeiros. Celso Antônio Bandeira de Mello, ao discorrer sobre os princípios reconhecidos,

assim chamados pela doutrina e jurisprudência; vaticina que:

Fácil é ver-se, entretanto, que inúmeros outros mereceram igualmente consagração constitucional: uns, por constarem expressamente na Lei Maior, conquanto não

mencionados no art. 37, caput; outros, por nele estarem abrigados logicamente, isto

é, como conseqüências irrefragáveis dos aludidos princípios; outros, finalmente, por serem implicações evidentes do próprio Estado de Direito e, pois, do sistema

constitucional como um todo. 22

Com relação ao direito de greve, faz-se necessário um estudo mais aprofundado dos princípios da supremacia do interesse público e o da continuidade do serviço público.

3.2.1. Princípio da supremacia do interesse público

A Administração Pública é sempre superior pelos interesses que defende, apresentando-se numa ascendência vertical em relação ao apresentando-servidor público que a repreapresentando-senta, e também sobre os particulares. De acordo, com o princípio da supremacia do interesse público, a Administração Pública na prática de seus atos deve sempre respeitar a lei e zelar para que o interesse público seja alcançado. Nos dizeres de Celso Antônio Bandeira de Mello:

21 Art. 37. da Constituição Federal: A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União,

dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência...

22 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 14. edição. São Paulo: Malheiros,

(36)

Trata-se de verdadeiro axioma reconhecível no moderno Direito Público. Proclama a superioridade do interesse da coletividade, firmando a prevalência dele sobre o do particular, como condição, até mesmo, da sobrevivência e asseguramento deste último. 23

Hely Lopes Meirelles utiliza a denominação princípio do interesse público, mas não modifica o seu conteúdo:

O princípio do interesse público está intimamente ligado ao da finalidade. A primazia do interesse público sobre o privado é inerente à atuação estatal e domina-a,

na medida em que a existência do Estado justifica-se pela busca do interesse geral.24

Utilizando-se da mesma denominação usada por Hely, a Lei 9.784 de 1999, em seu artigo 2°, estatui, in verbis:

Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da

legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

E complementa, em seu parágrafo único, afirmando que “nos processos administrativos serão observados os critérios de atendimento a fins de interesse geral, vedada a renúncia total ou parcial de poderes ou competências, salvo autorização em lei”. 25 A partir da leitura da

norma, parafraseando Maria Sylvia Di Pietro, “fica muito claro no dispositivo que o interesse público é irrenunciável pela autoridade administrativa”.26

Para exemplificar, são conseqüências da supremacia do interesse público: a presunção de veracidade e legitimidade dos atos administrativos; o benefício de prazos maiores para intervenção ao longo do processo judicial; prazos especiais para prescrição das ações em que é parte o Poder Público, dentre outros.

Durante uma greve no setor privado, o ônus da paralisação, em sua maior parcela, recai sobre o empregador, suportando perdas na lucratividade, e sobre a coletividade; enquanto que a greve no setor público faz transcender a ofensa da Administração Pública para todos os administrados de forma mais danosa.

23 MELLO, op. cit., p. 41.

24 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2002. p.99.

25 Lei nº 9.784, de 29 DE JANEIRO DE 1999. Regula o processo administrativo no âmbito da Administração

Pública Federal. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L9784.htm >. Acesso em: 31 de out. de 2007.

(37)

Todavia, sobreleva-se ressaltar que a greve dos servidores públicos apresenta certas particularidades, dentre as quais, certo enfrentamento com o princípio da supremacia do interesse público. Assim, ainda quando a referida supremacia deva ser posta em prática, como critério de solução de conflito de interesses ou bens constitucionais, não poderá ser absoluta, já que o administrador ou órgão jurisdicional deve agir com bom senso.

Ademais, não se pode afirmar que todos os serviços públicos são considerados essenciais e nem que a possível greve de servidores terá repercussão negativa sobre o interesse público.

3.2.2 Princípio da continuidade dos serviços públicos essenciais

De acordo com o princípio da continuidade, as atividades da Administração Pública não podem cessar, ou seja, a prestação do serviço público deve ser ininterrupta. Para Diógenes Gasparini, "os serviços públicos não podem parar porque não param os anseios da coletividade", e complementa afirmando que "os desejos dos administrados são contínuos".27

A ordem jurídica brasileira, desde a Carta Magna até a legislação infraconstitucional, apresenta diversos instrumentos de amparo a continuidade do serviço público. Dentre tais instrumentos, podemos destacar o artigo 9º, §1º da Constituição Federal de 198828 e o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº. 8.078/90), em seu artigo 22, caput, que expõe que: "os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos". Por último, a Lei de Greve (Lei nº 7783/89), em seu artigo 10, complementou a orientação constitucional ao estabelecer que:

Art. 10 São considerados serviços ou atividades essenciais:

I - tratamento e abastecimento de água; produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis;

II - assistência médica e hospitalar;

III - distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos; IV - funerários;

V - transporte coletivo;

27 GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p.16.

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VI - captação e tratamento de esgoto e lixo; VII - telecomunicações;

VIII - guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares;

IX - processamento de dados ligados a serviços essenciais; X - controle de tráfego aéreo;

XI compensação bancária.

Como visto, abstrai-se do artigo 11 caput e parágrafo único29 desta Lei que os serviços essenciais não podem sofrer paralisação total, devendo-se garantir sua prestação, a fim de que sejam atendidas as necessidades da coletividade.

Em razão da continuidade desses serviços essenciais, muito se discutiu, e, ainda se discute, a respeito possibilidade de realização de greve pelos servidores públicos. Aqueles que acenam para a impossibilidade de greve no serviço público, afirmam que a ausência de um serviço essencial gera revolta em seus destinatários, além de outras conseqüências ligadas ao caos. Neste ponto percebe-se que há nítida repercussão na ordem pública e, além disso, põe-se em risco a vida, a saúde, e outros direitos fundamentais dos cidadãos.

Para os que entendem pela viabilidade da greve de servidores públicos, o princípio da continuidade não seria problema, já que da mesma forma que a Lei nº 7.783/1989 tratou da regulamentação da greve em serviços essenciais, poder-se-ia garantir a ininterrupção dos serviços estatais. Neste sentido, Maria Sylvia Di Pietro afirma:

Na realidade, não devem ser poucas as dificuldades que o legislador federal enfrentará para regulamentar a greve do servidor público; não é especialmente por se tratar de serviço público, cuja continuidade fica rompida com a paralisação; se fosse essa a dificuldade, poderia ser contornada da mesma forma por que o foi nos artigos 10 a 13 da Lei 7.783/89, que cuida dos serviços considerados essenciais (a maior parte deles sendo serviços públicos) e estabelece normas que asseguram a sua

continuidade em períodos de greve.30

José dos Santos Carvalho Filho31 inter-relaciona os princípios da continuidade, o princípio da supremacia do interesse público e o da eficiência, dizendo que estão intimamente

29 Art. 11. Nos serviços ou atividades essenciais, os sindicatos, os empregadores e os trabalhadores ficam obrigados, de comum acordo, a garantir, durante a greve, a prestação dos serviços indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.

Parágrafo único. São necessidades inadiáveis da comunidade aquelas que, não atendidas, coloquem em perigo iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população.

30 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 14. ed. São Paulo:Atlas, 2002. p. 460.

31 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 14. edição. Rio de Janeiro: Lumen

Referências

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