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2.1 Teorias de estrutura de capital

2.1.3 Teoria de market timing

2.1.3.2 Teoria de equity market timing

Em um dos trabalhos mais influentes sobre equity market timing, Baker e Wurgler (2002) buscaram verificar como o comportamento de market timing afetava a estrutura de capital das empresas e se este comportamento gerava um impacto de curto ou longo prazo. O objetivo principal foi verificar quando o índice market-to-book (uma medida de oportunidade de market timing percebida pelos gestores) afetava a estrutura de capital por meio da emissão de ações e se seus efeitos eram persistentes a ponto de explicar as mudanças na alavancagem ao longo do tempo.

Segundo os autores é possível esperar pelo menos um impacto mecânico25 de curto prazo do índice market-to-book sobre a estrutura de capital, no entanto, se as empresas reajustarem os efeitos das decisões ligadas a market timing em momentos subsequentes, como previsto pela teoria de trade-off, o market timing não terá impactos persistentes sobre a estrutura de capital das mesmas.

De acordo com Baker e Wurgler (2002) existem duas abordagens da teoria de market timing presentes em estudos anteriores. A primeira delas se refere ao erro de precificação (mispricing) no mercado de capitais, onde a oportunidade de vender ações sobrevalorizadas induz empresas a utilizarem maior proporção de capital próprio. Sob esta abordagem, os gestores emitem ações quando acreditam que estão sobrevalorizadas e readquirem quando acreditam que estão subvalorizadas, tentando explorar expectativas extremas de investidores. Nesta primeira abordagem, o índice market-to-book pode ser considerado uma proxy da percepção dos gestores do possível erro de precificação e será relacionado positivamente com a emissão de ações e negativamente com a alavancagem. Segundo Baker e Wurgler (2002), caso as empresas não busquem um nível alvo ou ótimo de endividamento, os efeitos do market timing não serão revertidos no longo prazo e estas flutuações temporárias no índice terão efeitos permanentes sobre a alavancagem. Ainda de acordo com os autores, esta versão não necessita que o mercado seja eficiente e nem requer que os gestores sejam bem sucedidos em prever retornos acionários, mas apenas que acreditem na possibilidade de prever o momento mais adequado para as emissões.

A segunda abordagem de market timing está baseada no problema de seleção adversa examinado por Myers e Majluf (1984). Nesta abordagem, as oportunidades de market timing surgem conforme mudanças no grau de assimetria informacional. Korajczyk et al. (1990) verificaram que o preço da ação cai quando do anúncio de emissão, afirmando que este resultado pode ser explicado pelos modelos baseados na assimetria de informação. Em trabalho posterior, Korajczyk et al. (1991) argumentam que as empresas tendem a anunciar a emissão de ações logo após a divulgação de informações financeiras, fato que pode reduzir a assimetria informacional e a queda no preço após o anúncio de emissão, visto que o mercado estará mais informado sobre as perspectivas futuras das empresas. Os autores utilizaram a

25 Visto que o aumento do valor de mercado do patrimônio líquido e, consequentemente, do ativo a valor de mercado, reduz os níveis de alavancagem a valor de mercado.

divulgação de resultados trimestrais como proxy para evento informativo e encontraram suporte para estas proposições.

Bayless e Chaplinsky (1996) também verificaram que as emissões de ações se aglomeram em torno de períodos que tendem a ter menores efeitos derivados do anúncio de emissão. Constatou-se que a reação negativa no preço acionário é menor para empresas que emitem ações em períodos considerados “hot market”, em que o volume de emissão de ações no mercado está acima da média histórica. Ao contrário de Korajczyk e Levy (2003), as condições macroeconômicas não se mostraram significativas para as decisões de financiamento das empresas, apoiando a ideia de que o grau de assimetria informacional (e os custos de seleção adversa) varia no tempo, existindo janelas de oportunidade para a emissão de ações. Segundo os autores, isto pode ocorrer devido a investidores e administradores compartilharem de informações semelhantes sobre a empresa ou um projeto específico nos momentos em que o mercado está aquecido (hot markets), o que reduz os custos ligados à informação nestes períodos.

De acordo com Baker e Wurgler (2002), os resultados obtidos em seu trabalho não distinguem entre estas duas abordagens da teoria de market timing.

A amostra utilizada foi composta por todas as empresas que passaram a existir na base de dados Compustat no período 1968-1999. Posteriormente, a amostra ficou restrita a empresas para as quais era possível determinar uma data para a oferta pública inicial entre 1968 e 1998. Foram analisadas sub-amostras, levando em consideração os anos Pré-IPO, IPO e os anos posteriores a contar da data da IPO (IPO+1, IPO+2, ... , IPO+10).

Primeiro, os autores buscaram investigar a influência dos valores de mercado sobre a estrutura de capital analisando se a variação no nível de endividamento era gerada pela emissão líquida de ações, lucros retidos ou pela variação residual na alavancagem. O objetivo era verificar se o índice market-to-book afetava a alavancagem por meio da emissão líquida de ações, como sugerido pela teoria de market timing.

Além do índice market-to-book foram utilizadas as variáveis tamanho, tangibilidade, rentabilidade e endividamento defasado como variáveis de controle nas regressões tendo como variável dependente a variação da alavancagem. Os resultados indicaram que o efeito

do índice market-to-book sobre as variações do nível de endividamento ocorre por meio da emissão de ações, sendo que: quanto mais alto o índice market-to-book, maior a emissão líquida de ações; o índice market-to-book não é fortemente relacionado aos lucros retidos, eliminando a possibilidade de o índice market-to-book afetar a alavancagem por meio da previsão de lucros; o índice market-to-book é relacionado positivamente com o crescimento dos ativos, o que tende a aumentar a alavancagem.

Dentre as variáveis de controle, os resultados mais expressivos referem-se às variáveis rentabilidade e tamanho. Empresas mais rentáveis emitem menos ações, no entanto, este efeito é compensado pela grande utilização de lucros retidos, por isso, também apresentam baixa alavancagem. Empresas maiores emitem menos ações como percentual do ativo total, assim, a redução da alavancagem no momento da IPO é muito menor para estas empresas. Interessante notar que os resultados obtidos para a variável rentabilidade parecem estar de acordo com a teoria de pecking order, a não ser pelo fato de que estas empresas ainda assim emitem ações, mas em menor quantidade, em momentos oportunos.

Posteriormente, a análise buscou investigar a persistência do market timing nas decisões de financiamento. Caso a empresa não reajustasse a estrutura de capital em busca de um nível alvo, o market timing teria efeitos persistentes, explicando os índices de alavancagem das empresas.

Para testar tal persistência, os autores realizaram a regressão da alavancagem, como variável dependente, e da variável “média ponderada pelo financiamento externo do índice market-to-book” (M/Befwa)26, como variável independente, além das variáveis de controle

citadas anteriormente. Segundo os autores, a variável independente utilizada representa a relevância histórica das variações do valor de mercado e é obtida da seguinte forma:

, 1 0 1 0 1 , s t s t r r r s s t efwa B M d e d e B M       ⋅ + + =      

− = − = − em que: 26M/B

efwa: external finance weighted-average market-to-book ratio. Neste trabalho, optou-se por se referir a esta variável apenas como Média Ponderada do Índice Market-to-Book.

M/Befwa: média ponderada do índice market-to-book; e: emissão líquida de ações; d: emissão

líquida de dívida. Os somatórios se iniciam no ano da IPO. O peso de cada ano é dado pela soma das emissões líquidas de ações e dívida sobre o somatório das emissões de ações e dívida desde o primeiro ano até o ano t-1.

Esta variável assume altos valores para empresas que captaram recursos externamente quando o índice market-to-book estava alto e vice-versa, atribuindo maior peso para momentos em que decisões significativas de financiamento foram tomadas. Baker e Wurgler (2002) incluem simultaneamente na regressão as variáveis market-to-book defasada em um período (M/Bt-1) e

a média ponderada do índice market-to-book (M/Befwa, t-1), sendo o M/Bt-1 responsável por

controlar o atributo oportunidades de crescimento e, a variável M/Befwa, t-1, responsável por

captar a influência histórica do índice market-to-book sobre a estrutura de capital, ou seja, a persistência dos efeitos do market timing.

Os resultados evidenciaram que o efeito da variável M/Befwa, t-1 é mais forte e consistente que o

da variável M/Bt-1, principalmente na regressão que analisou a alavancagem a valor contábil,

onde a variável M/Bt-1 não se beneficia de uma relação mecânica com a variável dependente.

A influência e persistência dos valores históricos de mercado, refletidos na variável M/Befwa, t-1, contrastam com a teoria de trade-off, em que os gestores mantem a alavancagem a

um nível determinado por características correntes da empresa.

Os resultados também indicaram forte relação positiva entre tamanho e alavancagem e forte relação negativa entre rentabilidade e alavancagem. Mesmo quando são utilizados dados de mais de 10 anos, os valores históricos de market-to-book influenciam muito mais a alavancagem que os valores correntes de market-to-book, tendo efeitos amplos e persistentes sobre a estrutura de capital.

Os autores também realizaram regressões utilizando variáveis de controle alternativas sugeridas por Fama e French (2002). Verifica-se que os efeitos da variável M/Befwa, t-1 são

independentes das diversas variáveis de controle utilizadas nas regressões, conhecidas pela literatura como importantes determinantes da estrutura de capital, são elas: market-to-book, tamanho, tangibilidade, rentabilidade, oportunidades de crescimento, dividendos, depreciação e gastos com pesquisa e desenvolvimento.

Baker e Wurgler (2002) ressaltam os dois principais resultados encontrados: 1) altos valores de mercado reduzem a alavancagem no curto prazo; e 2) altos valores de mercado históricos são associados com baixas alavancagens, afirmando que a conexão entre estes dois resultados evidencia que os efeitos do índice market-to-book são persistentes.

Os autores argumentam que estes resultados são difíceis de serem explicados pelas teorias tradicionais de estrutura de capital. Segundo a teoria de trade-off, as empresas ajustam suas estruturas de capital às mudanças ocorridas no índice market-to-book, visto que o aumento do índice leva a redução da alavancagem a valor de mercado. No entanto, a evidência encontrada é a de que o índice market-to-book tem uma longa influência sobre a alavancagem e que a estrutura de capital não é explicada por um nível ótimo determinado por características correntes das empresas.

Na teoria de pecking order, o índice market-to-book é proxy para oportunidades de crescimento. Na versão simples da teoria, os períodos de alto crescimento levarão os índices de endividamento a níveis críticos, chegando à capacidade total de endividamento da empresa, ou seja, a relação prevista entre oportunidades de crescimento e endividamento seria positiva. No entanto, Baker e Wurgler (2002) afirmam que na extensão em que altos níveis de market-to-book coincidem com altos níveis de investimento, os resultados encontrados sugerem que estes períodos reduzirão a alavancagem, pois as empresas financiarão estes investimentos com a emissão de ações.

Já na versão dinâmica da teoria de pecking order, de Myers (1984), as empresas de alto crescimento reduzirão a alavancagem por meio da utilização de recursos próprios, com o intuito de reservar capacidade de financiamento e evitar a emissão de ações quando oportunidades de investimento surgirem no futuro. Mas os resultados de Baker e Wurgler (2002) indicam que empresas com alto índice market-to-book reduzem a alavancagem por meio da emissão de ações e não por lucros retidos. Além disso, esta versão da teoria de pecking order prediz uma relação entre alavancagem e oportunidades de investimento futuras. Contudo, os resultados de Baker e Wurgler (2002) evidenciaram que a alavancagem é muito mais explicada por valores de market-to-book históricos, mesmo controlando a análise por valores correntes.

Os autores argumentam que uma teoria de estrutura de capital baseada no market timing constitui a explicação mais realista para os resultados encontrados, onde a estrutura de capital reflete o acúmulo de tentativas passadas de emitir ações em momentos favoráveis de mercado (“to time the equity market”), e afirmam que esta teoria ainda não havia sido articulada anteriormente.

Como visto ao longo deste tópico, diversas teorias tentam explicar as decisões de financiamento das empresas. Segundo Myers (2001), as teorias não são projetadas para serem gerais, mas são teorias condicionais de estrutura de capital, cada uma enfatizando certos custos e benefícios de estratégias alternativas de financiamento.

Myers (2001) ainda aponta para a importância do poder dos testes realizados, os quais usualmente confiam em medidas indiretas ou proxies para variáveis não observáveis que podem direcionar as decisões financeiras, sendo que uma proxy em particular pode responder por mais de uma teoria, segundo o referido autor. Titman e Wessels (1988) também apontam alguns problemas derivados da utilização de variáveis proxies, como a possibilidade de estarem mensurando diversos atributos diferentes. Por isso, utiliza-se neste trabalho diferentes variáveis proxies e diferentes abordagens empíricas para análise da estrutura de capital de empresas brasileiras, com o intuito de conferir maior confiabilidade aos resultados obtidos. Considerando, ainda, que se pretende analisar a influência do market timing sobre as decisões de financiamento de empresas brasileiras, torna-se importante evidenciar as diferenças das três principais abordagens teóricas (trade-off, pecking order e market timing) para a relação existente entre estrutura de capital e o atributo oportunidades de crescimento (ou oportunidades de investimento), dado que este atributo, representado pelo índice market-to-book, se constitui na principal variável de teste da teoria de market timing sob a abordagem de Baker e Wurgler (2002). No Quadro 2 é possível verificar estas diferenças.

Quadro 2 - Previsões das principais teorias para a relação entre oportunidades de crescimento e estrutura de capital

Versão Simples da Pecking Order (Myers e Majluf, 1984) Teoria de Market Timing

Índice market-to-book é proxy para oportunidades de crescimento; Quanto maiores as oportunidades de crescimento, maior a utilização de dívida como fonte de financiamento (na ausência de recursos internos), o que levará o endividamento a níveis críticos.

Índice market-to-book é proxy para percepção dos gestores da sobrevalorização da empresa pelo mercado e coincidem com períodos de alto crescimento; logo, quanto maior o índice market-to-book, maior o volume de emissão de ações e menor o endividamento.

Versão Modificada da Pecking Order (Myers, 1984) Teoria de Market Timing

Empresas com grandes expectativas de crescimento desejarão reduzir a alavancagem para reservar capacidade de financiamento e evitar a emissão de ações quando oportunidades de investimentos surgirem no futuro. Estas empresas reduzirão a alavancagem utilizando lucros retidos ou folga financeira acumulada.

Empresas com altos índices market-to-book e altas expectativas de crescimento reduzirão a alavancagem por meio da emissão de ações e não pela utilizaçao de recursos internos.

Teoria de Trade-off Teoria de Market Timing

Quanto maiores as oportunidades de crescimento, representadas pelo índice market-to-book , maiores os custos de dificuldades financeiras devido aos valores de liquidação dos ativos no caso de default da dívida e falência. Assim, visto que ativos intangíveis não constituem bons colaterais para a dívida, espera-se uma relação negativa entre oportunidades de crescimento e endividamento. Esta relação está baseada no conflito de interesses entre administradores e credores. No entanto, esta relação negativa também pode ser fundamentada nos conflitos entre administradores e acionistas, considerando que empresas com grandes oportunidades de crescimento precisarão menos do papel disciplinador da dívida para controlar o uso discricionário do fluxo de caixa livre pelos gestores. Ainda, segundo a teoria de trade-off , outra hipótese é a de que as empresas ajustam sua estrutura de capital às mudanças ocorridas no índice market-to- book, logo, quando o índice sobe, a alavancagem a valor de mercado cai e a empresa emite dívida para reajustar a estrutura de capital, levando a uma relação positiva.

Índice market-to-book é proxy para percepção dos gestores da sobreavalorização da empresa pelo mercado e coincidem com períodos de alto crescimento; logo, quanto maior o índice market-to-book, maior o volume de emissão de ações e menor o endividamento. Portanto, apesar de a relação esperada também ser negativa, a motivação desta relação difere entre as teorias de trade-off e market timing. Ainda, de acordo com a teoria de market timing , as empresas não reajustariam a estrutura de capital devido à mudanças ocorridas no índice market-to-book e, consequentemente, na alavancagem a valores de mercado, como previsto pela teoria de trade-off . Assim, os efeitos do market timing sobre a estrutura de capital seriam permanentes.

Ainda sobre as diferenças entre as principais teorias, é importante ressaltar que para a teoria de market timing a emissão de ações ocorrerá quando o preço da ação for considerado alto em relação a valores históricos ou contábeis (hipótese de sobrevalorização) ou quando houver mudanças no grau de assimetria informacional, gerando janelas de oportunidades para a emissão devido à redução da queda no preço quando do anúncio de emissão.

Já para a teoria de pecking order, as emissões de ações ocorrerão raramente, não importando se as ações estão sobrevalorizadas ou não. De acordo com Myers e Majluf (1984), a emissão de ações poderia ocorrer somente quando: 1) a empresa está altamente endividada e prevê a ocorrência de custos de dificuldades financeiras; 2) a empresa deseja construir folga financeira em momentos em que não necessita de recursos para investimentos e objetiva apenas reduzir a alavancagem, ou seja, se mover novamente “para cima” na pecking order; e 3) na ausência de assimetria de informação. No entanto, Myers e Majluf (1984) assumem que a assimetria de informação é permanente e afirmam não ter derivado uma estratégia geral de

emissão dinâmica ótima de títulos em seu modelo. Nos próximos capítulos, serão apresentadas evidências empíricas das vertentes teóricas abordadas.

2.2 Evidências empíricas dos determinantes da estrutura de capital em outros