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Anexo I Meireles: Exportações do Maranhão no período da Segunda Guerra

3 SUPEREXPLORAÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO: ASPECTOS

3.3 Teoria do valor de Marx

A determinação do valor da força de trabalho é a base para a definição das categorias da exploração e da superexploração. Apesar de ser considerada uma mercadoria especial, pelos motivos que serão expostos adiante, para Marx, em termos de determinação do seu valor, ela não se diferencia das demais mercadorias: “O valor da força de trabalho é determinado, como o de qualquer outra mercadoria, pelo tempo de trabalho necessário à sua produção e, por consequência, à sua reprodução.” (MARX, 2008, p. 200). Mas antes de continuarmos, é fundamental ver a caracterização marxiana sobre a natureza social, tanto da mercadoria, quanto do seu valor:

As mercadorias, recordemos, só encarnam valor na medida em que são expressão de uma mesma substância social, o trabalho humano; seu valor é, portanto, uma realidade apenas social, só podendo manifestar-se, evidentemente, na relação social em que uma mercadoria se troca por outra (MARX, 2008, p. 69).

As duas citações acima remetem à Teoria do Valor. Quando, no período da chamada acumulação primitiva, os trabalhadores foram apartados dos seus instrumentos de trabalho, ficando sem os meios para produzir mercadorias aptas a serem vendidas (com valor de uso),

restou-lhes uma e apenas uma mercadoria – seu último patrimônio, por ser esse inerente a seu ser – a força de trabalho.

Na Parte Segunda do volume I, Tomo I de o Capital (cap. IV: Como o dinheiro se transforma em capital, 3. Compra e Venda da Força de Trabalho), Marx (2008, p. 197) define:

Por força de trabalho ou capacidade de trabalho compreendemos o conjunto das faculdades físicas e mentais existentes no corpo e na personalidade viva de um ser humano, as quais ele põe em ação toda vez que produz valores-de-uso de qualquer

espécie (grifo nosso).

A força de trabalho – que é diferente de trabalho – como qualquer mercadoria, possui um valor. Mas ela só é considerada mercadoria quando, vendida no mercado, produz valores de uso. “Assim, a força de trabalho só pode aparecer como mercadoria no mercado enquanto for e por ser oferecida ou vendida como mercadoria pelo seu próprio possuidor [...]” (MARX, 2008, p. 197). O trabalho é a manifestação do consumo da força de trabalho. Em outras palavras, o trabalho é o valor de uso da mercadoria força de trabalho. É a substância do valor (nas palavras de Marcelo Carcanholo) criado pela atuação da força de trabalho sobre matérias- primas e insumos em determinado espaço físico – unidade de produção –, sob algum paradigma técnico.

No âmago da teoria do valor de Marx, habita incólume a força de trabalho. Segundo essa teoria o que determina o valor de uma mercadoria é a quantidade de força de trabalho

depreendida para a sua produção. Em suas próprias palavras: “a grandeza do valor de uma mercadoria representa apenas a quantidade de trabalho nela contida” (MARX, 2008, p.67). Dito de outra forma é [custo d]o tempo de trabalho socialmente necessário para sua produção. No caso da mercadoria especial força de trabalho, como ela é indissociável do seu proprietário – o trabalhador, Marx (2008, p. 201) concluiu que:

O tempo de trabalho necessário à produção da força de trabalho reduz-se, portanto, ao tempo de trabalho necessário à produção desses meios de subsistência, ou o valor

da força de trabalho é o valor dos meios de subsistência necessários à manutenção de seu possuidor. (Grifo nosso).

Tendo o capitalista – em dado momento histórico –, se firmado como proprietário dos meios de produção, só restou ao trabalhador, para garantir sua sobrevivência, a venda no mercado de sua força de trabalho (FT). Na prática contábil, o custo dessa mercadoria corresponde ao salário e nesse custo está não apenas a produção da força de trabalho, mas a reprodução da mesma, o que inclui, além da alimentação, gastos com vestuário, habitação,

saᵈde e educação da família do trabalhador. Isso lembra o “salário natural de Ricardo”, só que Marx (2008, p. 201-202) foi mais incisivo e rigoroso:

O proprietário da força de trabalho é mortal. Se tem de aparecer continuamente no mercado, conforme pressupõe a contínua transformação de dinheiro em capital, o vendedor da força de trabalho tem de perpetuar-se, ‘como todo ser vivo se perpetua através da procriação’. As forças de trabalho retiradas do mercado por desgaste ou por morte têm de ser incessantemente substituídas pelo menos por um número igual de novas forças de trabalho. A soma dos meios de subsistência necessários à produção da força de trabalho inclui também os meios de subsistência dos substitutos dos trabalhadores, os seus filhos, de modo que se perpetue no mercado essa raça peculiar [...] (grifo nosso).

E por que a mercadoria FT é considerada especial, neste contexto teórico? De forma bem objetiva, é porque se trata da única mercadoria que quando consumida, gera valor! Além de gerar algo com valor de uso, através da transformação da matéria-prima e insumos em mercadoria, ela gera mais valor do que ela mesma custa (considerando que o trabalho

excedente não é pago), pois acrescenta valor a tudo que produz, através do tempo de trabalho (gasto pelo seu próprio consumo/desgaste) na produção. Esse mais valor ou mais valia, é apropriado pelo proprietário dos meios de produção – o capitalista – sob a forma de lucro (e suas partições). É assim que o dinheiro se transforma em capital: o capitalista compra meios de produção (máquinas, matéria-prima, insumos e força de trabalho), transforma matéria em mercadoria que adquire (pelo acréscimo de valor feito pela força de trabalho) um valor maior do que o que tinha quando se iniciou o processo de produção na condição de matéria sem valor de uso. Marx (208, p. 197) trata desse paradoxo da seguinte forma:

Para extrair valor de consumo de uma mercadoria, nosso possuidor de dinheiro deve ter a felicidade de descobrir [...], no mercado, uma mercadoria cujo valor de uso possua a propriedade peculiar de ser fonte de valor, de modo que consumi-la seja

realmente encarnar trabalho, criar valor, portanto. E o possuidor do dinheiro

encontra no mercado essa mercadoria especial: é a capacidade de trabalho ou força de trabalho.

A força de trabalho não só transforma bens naturais (materiais) em produtos próprios para a troca, mas, paradoxalmente, cria-lhes o seu valor. Tem ela, pois, essa dupla função: dotar as mercadorias de valor de uso, característica que lhes habilita para serem trocadas e, no seu próprio (força de trabalho) consumo – representado pelo trabalho realizado –, acrescenta valor aos objetos de sua criação. Essa dupla função é conhecida como paradoxo da força de trabalho: participar da fabricação de outras mercadorias e, ao consumir-se nesse processo, criar mais valor para essas mesmas mercadorias.

O mais valor ou mais valia gerado pela força de trabalho no processo de produção de mercadorias é fruto de trabalho não pago. A isso Marx denominou de exploração. Ele detalhou a extração da mais valia, como absoluta e relativa, mas ambas, na essência, representam a parte do valor acrescentado à mercadoria pela mercadoria especial força de trabalho e não pago ao proprietário desta – o trabalhador – pelo capitalista.

Em termos matemáticos o modelo construído por Marx para conceituar a teoria do valor, pode ser expresso, em sua essência, em apenas três relações: a taxa de mais valia, a composição orgânica do capital e a taxa de lucro. O capitalista se volta integralmente para esta última, mas ela está intimamente ligada à taxa de mais valia e à composição orgânica, como vamos demonstrar.

Em primeiro lugar é necessário precisar os conceitos dos componentes do capital em Marx e na contabilidade geral, que segue os preceitos neoclássicos. Para Marx o capital se divide em capital constante (c) e capital variável (v). O primeiro é formado por máquinas, equipamentos, instalações, matérias primas, combustíveis, energia, etc. O segundo, unicamente pelos salários. O paradigma neoclássico faz a seguinte divisão: capital fixo (máquinas, equipamentos, instalações) e capital circulante (matérias primas, combustíveis, energia e salários). Para tratarmos das relações fundamentais da teoria do valor, obviamente, vamos usar a terminologia marxiana. Chamando taxa de mais-valia de m’; mais-valia de m, capital constante de c e capital variável de v, as três relações são as seguintes:

- Taxa de mais-valia: é a razão entre mais-valia e capital variável (salários); - Composição orgânica do capital: é a razão entre capital constante capital

total;

- Taxa de lucro é a razão entre mais-valia e capital total.

A diferença entre taxa de mais-valia e taxa de lucro é que esta última leva em conta os salários e o trabalho social impregnado nas maquinas, equipamentos, matérias primas (ou seja, o capital total, c + v) e a taxa de mais-valia leva em conta apenas o capital variável (v), que no modelo marxiano é representado pelos salários e corresponde ao trabalho necessário.

Fazendo-se uma redução matemática da equação da taxa de lucro (

pode-se relacionar o lucro diretamente com a taxa de mais-valia (m) e com a composição orgânica do capital ( tornando desnuda uma lei do capitalismo que, antes de

Marx, era impossível de ser vista, pois a análise econômica ficava presa à aparência. Depois da redução, temos:

Observe-se que se aumentar a composição orgânica (q), a taxa de lucro diminuirá. Essa hipótese teórica tem gerado muitas controvérsias, desde 1867 (ano de lançamento do Livro I de o Capital), e não é objeto desta pesquisa aprofundar essa discussão. O que nos importa é verificar que a teoria, de acordo com seus pressupostos, possui coerência interna, que vai se relacionar com a lei da tendência à queda da taxa de lucro (OREIRO, s/d) que, por sua vez, se relaciona com as crises cíclicas do sistema. Para esta pesquisa, o importante é verificar que taxa de lucro e taxa de mais valia são grandezas diretamente proporcionais, logo, o aumento da mais-valia representa um aumento da taxa de lucro, ceterisparibus.