• Nenhum resultado encontrado

Capítulo I. Perspetivas Teóricas sobre o Envelhecimento

2. Teorias provenientes da Psicologia

2.1. Teorias Cognitivas e da Memória

As Teorias Cognitivas e da Memória foram evoluindo significativamente ao longo de todo o século XX. A referida evolução verificou-se no sentido da passagem de uma visão mais estática, mecânica e deficitária da velhice para uma outra mais dinâmica e que prevê ganhos adaptativos a par do processo de envelhecimento (Ferreira, 2007). O "modelo deficitário" de envelhecimento que prevê perdas a vários níveis com o aumento da idade, predominou durante toda a primeira metade do século XX. Para a difusão deste modelo contribuíram trabalhos como os de Yerks (1923). Estes trabalhos confirmavam os desempenhos inferiores dos mais velhos e concluíam que as pessoas com mais de 30 anos apresentavam piores resultados em termos cognitivos e de memória. Segundo estes estudos, estes resultados piorariam progressivamente com o aumento da idade.

Posteriormente, desenvolveram-se outras investigações que começaram a tirar conclusões algo diferentes das do "modelo deficitário". Passou-se para uma conceção mais ativa e dinâmica do processo de envelhecimento. A título de exemplo, cabe referir que nos estudos sobre a memória, predominou primeiro uma conceção que implicava a passagem progressiva da memória fluida (preponderante nos jovens) para a memória

cristalizada (preponderante nos seniores). Posteriormente, outros trabalhos sobre o mesmo tema mostraram vantagens adaptativas no desenvolvimento ao longo da vida de uma memória cristalizada, mais voltada para a especialização cognitiva em determinados domínios, mais sensível às realidades sociais e culturais "de longa duração", conseguindo relativizar os dados imediatos. Neste contexto, mudanças nas variáveis dos testes, incluindo aspetos da inteligência mais ligados à vida social e cultural, acabaram por permitir que se encontrassem vantagens cognitivas no processo de envelhecimento (Ferreira, 2007).

Realmente, as variáveis que interferem no funcionamento cognitivo são muitas, sendo que a idade, pelo menos até aproximadamente aos 75 anos, é apenas um desses fatores. Outros fatores explicativos enunciados são os fatores genéticos, o nível de instrução, o nível socioeconómico, a saúde e o grau de atividade (Barreto, 1988; Ferreira, 2007, Vaz Serra, 2000).

Na revisão da literatura, em termos de teorias cognitivas, encontramos três temáticas centrais na investigação psicológica do envelhecimento: os estudos sobre a lentidão das performances dos idosos, os estudos sobre a memória e os trabalhos sobre a inteligência. Relativamente às referidas funções encontramos um conjunto de perdas e alterações com o aumento da idade (Ferreira, 2007, p. 73).

Analisando as funções da memória Vaz Serra (2000) distingue três tipos de memória: a) memória primária, na qual se armazenam determinados conteúdos durante um

tempo limitado e curto, sendo posteriormente eliminados/esquecidos, implica conteúdos considerados de menor importância ou utilidade;

b) memória secundária, que exige algum tipo e reprodução ou transmissão da informação recebida recentemente (resposta), tem implicações nas tarefas diárias e a sua perda tem maior importância no quotidiano;

c) memória terciária que se relaciona com os acontecimentos fixados e vividos há muito tempo, implicando aspetos significativos e pessoais, afetivos e emocionais, sendo recordados/rememorados ao longo da vida.

As perdas de memória são consideradas também parcialmente responsáveis por outro dos problemas resultantes do envelhecimento, ou seja, o refreamento das funções cognitivas e intelectuais. O aumento da lentidão intelectual nos seniores é acompanhado

pelo aumento da lentidão das reações motoras, nomeadamente, a partir dos 70-75 anos. Esta maior lentidão com o aumento da idade deve associar-se com algumas alterações na perceção e no processamento da informação (Barreto, 1988).

Analisando agora os problemas relativos à memória, devemos dizer que ela tem um conjunto de funções consideradas essenciais no quotidiano, como movimentar-se num espaço e reconhecer objetos e pessoas. Na memória de curto prazo, os especialistas distinguem entre uma memória sensorial que permite adquirir informações do ambiente e a construção de significações. Ligada à anterior temos ainda uma memória processual da informação. Com o envelhecimento, as perdas nestes dois tipos de memória acentuam-se e isto tem implicações na performance e na "sensação objetiva de perda". Sobre a inteligência, entendida basicamente como a adaptabilidade aos problemas e situações novas a partir da capacidade de aprender pela experiência (Sternberg, 1995), na literatura consultada faz-se a distinção entre a inteligência fluida e a inteligência cristalizada.

A inteligência fluida indica a capacidade para resolver problemas a partir do processamento da informação em contextos específicos, sendo que os indivíduos mais jovens conseguem melhores performances nos testes efetuados. Relativamente à inteligência cristalizada, onde intervém a educação, a cultura e a experiência, os resultados dos testes melhoram com o aumento da idade (Morangas, 1991).

Contudo, apesar das perdas apontadas para os mais velhos na inteligência fluida, diversos autores (Barreto, 1988; Berger & Mailloux-Poirier, 1995; Vaz Serra, 2000) coincidem na consideração de que as perdas e alterações verificadas com a idade não são suficientes para modificarem substancialmente as condições e a qualidade de vida dos seniores. A permanência de atividades e responsabilidades, a estimulação em situações de segurança e equilíbrio, os contactos sociais frequentes e os exercícios apropriados ajudam os seniores a manterem-se ativos e produtivos, incrementando as suas capacidades de desenvolvimento.

Importa referir, neste momento da nossa revisão bibliográfica, os resultados da experimentação realizada por Baltes (1992) e seus colegas, no contexto da escola de Frankfurt. Este grupo de investigadores comparou o desempenho mnésico de dois grupos de indivíduos, um grupo de jovens e um grupo de seniores, tendo como base o

método dos Ioci, o qual faz apelo à memória episódica, entendida como a mais prejudicada com o envelhecimento. Esta experiência consistiu, numa primeira fase, em memorizar 30 palavras e o resultado foi igual nos dois grupos. Numa segunda fase da experiência, foi ensinado aos dois grupos o método dos Ioci e os sujeitos tiveram um treino de 38 sessões, onde os resultados foram sendo medidos. Estes resultados permitiram chegar a determinadas conclusões das quais se salientam as seguintes:

a) os dois grupos melhoraram os respetivos desempenhos;

b) o treino aumenta a heterogeneidade dentro dos dois grupos mas as diferenças são maiores dentro do grupo dos mais velhos;

c) o grupo dos mais velhos melhora mais do que o grupo dos jovens.

Face aos resultados obtidos, os investigadores concluíram que os seniores mantêm reservas latentes de recursos cognitivos embora estes declinem com a idade.

Importa atender à literatura mais recente sobre memória e envelhecimento e esta tem sistematizado algumas conclusões que passamos a apresentar:

O declínio da memória parece começar bastante cedo na vida adulta. Contudo, nem todos os tipos de memória são afetados com o envelhecimento (...). Por outro lado, nos casos da memória episódica, em défice quer no processo normal de envelhecimento quer no início da apresentação amnésica de uma demência do tipo Alzheimer provável, a forma de recuperação mnésica requerida numa dada situação pode tornar mais ou menos acentuada a deterioração do desempenho (...). O ato mnésico revela-se, assim, como uma função cognitiva complexa cujo conhecimento do funcionamento na idade adulta requer um aprofundamento de natureza concetual e várias preocupações metodológicas (...) (Pinho, 2012, p.158).

Documentos relacionados