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CAPÍTULO 5 PROJETOS DE ORDENAÇÃO TERRITORIAL NO MARANHÃO (1972-1995)

5.5 TERRAS INDÍGENAS

Historicamente, os índios do Maranhão foram submetidos às entradas de captura e resgate, compra legal, guerra justa, aldeamento, escravidão e catequese, a fim de que não inviabilizassem o povoamento e se tornassem serviçais domésticos ou produtivos para o governo221, o que culminou em conflitos222.

220

MARANHÃO, op. cit., p. 3.

221Convém destacar que o decreto estadual de 10/04/1899 transformou as aldeias em colônias e a lei

n° 289/1901, que estadualizou a questão indígena e devolveu à União em 1910. Deve-se lembrar que, pela Lei n° 592/1911, o estado do Maranhão autorizou a cessão das terras devolutas ao governo federal com o intuito de fundar núcleos de colonos nacionais e de povoações indígenas, o que foi ratificado e justificado pela lei de 23/04/1917, os decretos n° 417/1921 e 4.028/1969. Através das cartas magnas de 1967 (ano em que a Lei n° 5.371 criou, em substituição ao Serviço de Proteção ao Índio – SPI -, a Fundação Nacional do Índio – FUNAI) e de 1969 o mencionado governo pretendia incorporar as terras indígenas ao patrimônio da União, bem como torná-las inalienáveis. Esses fatos foram reforçados pela Lei Federal nº6.001/1973, que instituiu o Estatuto do Índio.

222 A presença indígena no Maranhão pode ser conferida em MARQUES, op. cit. Nas primeiras

décadas do século XX registraram-e, por exemplo, o massacre de Alto Alegre (1901, com os Tenetehara do Alto Mearim), a chacina dos Kenkateyê (1913, da aldeia Chinella), além dos que envolveram os Krikati (1927), Krahô (1940) e Ramkokamekra-Canela, em 1963 (OLIVEIRA, 2006). A literatura das duas últimas décadas do século passado enfatiza a resistência cultural e, sobretudo, os “conflitos” e/ ou “confrontos” que envolvem a posse de terras, cujas referências, na nossa avaliação, são as contribuições de: ANDRADE, Maristela de P. Terra de índio: identidade étnica e conflito em terras de uso comum. São Luís: Edufma, 1999; as de COELHO, Elizabeth M. B. A política indigenista no Maranhão provincial, Natal, 1989. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais), Universidade Federal do Rio Grande do Norte, e ainda, Territórios em confronto: a dinâmica da disputa pela terra entre índios e brancos no Maranhão. São Paulo: Hucitec, 2002, que analisa a terra Cana Brava x povoado São Pedro dos Cacetes. Uma análise sobre o preconceito com o índio por parte de camponeses, técnicos de órgãos estatais e a população em geral, bem como acerca da luta pela terra pode ser encontrada em Sader, 1986 (segundo capítulo – A luta contra os indígenas – p. 72 a 93). Ver ainda, a nota n° 111.

Por isso, os índios do litoral foram sendo “empurrados” para o interior ficando “confinados” (FERREIRA, 1999); e os que já estavam no continente foram recuando em função do avanço da pecuária e do povoamento, de maneira que, gradativamente, se registrou a incorporação e apropriação das terras ocupadas por indígenas quando houve coação ao trabalho servil, desestruturação da vida tribal e alteração do perfil sócio-cultural desse segmento humano (ANDRADE, 1999; COELHO, 1989 e 2002).

Em decorrência de um contexto em que o regime militar utilizou a estratégia de implantar uma política assentada na “integração dos índios, à economia de mercado e impedir que eles se tornassem obstáculos à ocupação” (BRASIL, 1991b, p. 68), somada à implantação de projetos de colonização e/ ou povoamento no Maranhão, os quais cada vez mais se aproximavam das terras indígenas e em face da repercussão nacional e internacional que envolveu tal problemática, tornou-se necessário que as terras indígenas fossem identificadas, demarcadas e, posteriormente, regularizadas223 para que conflitos não se revelassem mais agravantes do que os ocorridos em tempos pretéritos, porque, apesar do senso comum, essas terras “não são áreas de preservação ambiental, mas como território coletivo individual, podem bloquear a fragmentação fundiária e, conseqüentemente, os impactos nocivos do uso da terra” (MELLO, 2002, p. 343).

Em decorrência desse quadro, entre 1981 e 1983 estavam sendo regularizadas quinze terras indígenas no território estadual, que ocupavam 1.789.164 hectares onde viviam 8.117 indivíduos pertencentes a oito etnias, das quais a Guajajara é mais expressiva porque ocorre em oito terras indígenas, seguida pela Gavião e a Canela. Tal área abrangia onze municípios que se localizam no centro-

223 As fases de regularização de terras indígenas são cinco: 1) estudo; 2) delimitação; 3) declaração; 4)

homologação; e 5) regularização. Esta última significa que a terra indígena já passou pelas anteriores e está devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis da comarca em que se situa a terra indígena e no Serviço do Patrimônio da União.

oeste maranhense.

Dessas quinze terras indígenas, oito estavam homologadas (Alto Turiaçu, Bacurizinho, Caru, Canela, Morro Branco, Porquinhos, Rio Pindaré e Rodeador), cinco já haviam sido demarcadas (Araribóia, Cana Brava, Governador, Urucu Juruá e Lagoa Comprida) e duas (Geralda/ Toco Preto e Krikati) estavam sendo identificadas (Quadro 15). Entre as terras demarcadas, urge ressaltar que a Cana Brava estava sob um litigioso processo que remonta à segunda metade da década de 1970 e contrapôs os Guajajaras e os moradores dos povoados de Alto Alegre e São Pedro dos Cacetes, o que se arrastou pelas duas décadas seguintes (COELHO, 2002).

Quadro 15 - Maranhão: terras indígenas, 1981 – 1983.

Terra Indígena

Área (ha) Situação

٭ População (1981)

Etnia Município Alto Turiaçu 530.525 H 314 Urubu

Kaapor

Carutapera, Cândido Mendes, Monção e Turiaçu

Araribóia 413.288 D 2.061 Guajajara Amarante do Maranhão, Grajaú e Santa Luzia

Bacurizinho 82.432 H 1.042 Guajajara Grajaú Caru 172.667 H 103 Guajajara

/ Guajá

Bom Jardim Canela 125.212 H 681 Canela Barra do Corda Cana Brava 137.329 D 2.262 Guajajara Barra do Corda e Grajaú

Geralda/ Toco Preto

18.506 I 14 Timbira/

Gavião

Barra do Corda Governador 41.644 D 277 Gavião Amarante do Maranhão

Krikati 144.775 I 297 Timbira/ Krikati

Amarante do Maranhão, Montes Altos e Sítio Novo Urucu Juruá 12.697 D 118 Guajajara Grajaú

Lagoa Comprida

13.198 D 200 Guajajara Barra do Corda e Grajaú Morro

Branco

49 H 122 Guajajara Grajaú

Porquinhos 79.520 H 259 Canela Barra do Corda Rio Pindaré 15.003 H 367 Guajajara Bom Jardim e Monção

Rodeador 2.319 H - Gavião Barra do Corda

Total 1.789.164 - 8.117 - -

Fonte: Brasil, 1984; ALMEIDA, 1994.

٭D corresponde a demarcada, H a homologada e I a identificada.

Através do artigo 67, Título X (Ato das Disposições Constitucionais Transitórias), a Carta Magna de 1988 deu respaldo ao Estatuto do Índio, visto que ficou definido que a União deveria concluir em cinco anos (prazo esgotado em 1993)

a demarcação das terras indígenas, o que corroborou o artigo 231 dessa CF/ 88, o qual reconhece aos índios “sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam” (grifo nosso). As terras indígenas, contudo, só têm reconhecimento da sociedade após a regularização e registro no cartório de imóveis da comarca em que se situa e no Serviço de Patrimônio da União.

Antes da regularização, contudo, há a penúltima etapa e esta se atém à homologação. Neste caso, entre 1985 e 1995, no Maranhão, registrou-se enquanto novidade em termos da situação jurídica a homologação de seis terras indígenas que já haviam sido demarcadas entre 1964 e 1985 (Quadro 16), mais precisamente as denominadas Araribóia, Cana Brava, Geralda – Toco Preto, Governador, Lagoa Comprida, e Urucu – Juruá, que ocupavam 618.165 hectares e onde viviam 9.743 indivíduos. Quatro terras indígenas pertenciam à etnia Guajajara (Araribóia, Cana Brava, Lagoa Comprida e Urucu Juruá) e as demais se vinculavam à Timbira/ Gavião (Geralda/ Toco Preto) e à Gavião (Governador).

Outra novidade é que, através da Lei n° 8.746/1993, o então Ministério do Meio Ambiente e da Amazônia Legal assumiu a responsabilidade pela execução da Política Nacional do Índio (a FUNAI continuou vinculada ao Ministério da Justiça), assim como devido à criação de municípios nesse estado, em 1994, houve a redefinição da jurisdição dessas terras indígenas, pois a Araribóia passou a pertencer a cinco municípios (Amarante do Maranhão, Arame, Bom Jesus das Selvas, Buriticupu e Santa Luzia), a Cana Brava a dois (Barra do Corda e Jenipapo dos Vieiras), a Geralda - Toco Preto a outros dois (Itaipava do Grajaú e Arame), a Lagoa Comprida a dois (Itaipava do Grajaú e Jenipapo dos Vieiras), enquanto a Governador e a Urucu – Juruá ficaram em uma municipalidade, isto é, Amarante do Maranhão e

Itaipava do Grajaú, respectivamente.

Quadro 16 - Maranhão: terras indígenas homologadas, 1990 – 1994.

Terra Indígena

Área (ha) Decreto de homologação

População (1994)

Etnia Município

Araribóia 413.288 98.852/90 4.174 Guajajara Amarante do Maranhão, Arame, Bom Jesus das Selvas, Buriticupu e Santa Luzia

Cana Brava 137.329 246/91 3.924 Guajajara Barra do Corda e Jenipapo dos Vieiras Geralda/ Toco Preto 18.506 s/n° de 16/05/94 104 Timbira/ Gavião

Itaipava do Grajaú e Arame Governador 41.644 s/n° de

16/05/94

655 Gavião Amarante do Maranhão Lagoa

Comprida

13.198 313/91 470 Guajajara Itaipava do Grajaú e Jenipapo dos Vieiras

Urucu Juruá 12.697 382/91 416 Guajajara Itaipava do Grajaú

Total 618.165 - 9.743 - -

Fonte: Anuário Estatístico do Brasil – IBGE, 1998; Disponível em: <http://www.funai.gov.br>. Acesso em: 11 maio 2006; MARANHÃO, 2002.